PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
Ensino no Brasil século XXI desafios qualidade formação
1. ENSINAR NO SÉCULO XXI
UMA PROPOSTA METODOLÓGICA PARA A GEOGRAFIA
Dra. Janine Le Sann
No século XXI a humanidade enfrenta desafios capitais para sua sobrevida. As
novas gerações terão de se adaptar drasticamente às novas condições de vida,
resultados de atitudes irresponsáveis tomadas na euforia do desenvolvimento
das sociedades pós-guerras, tanto capitalistas quanto socialistas ou
comunistas. Os descuidos com o meio ambiente, a exploração inconsequente
dos recursos naturais, a explosão demográfica em alguns países e a
sobrevalorização do consumo e do dinheiro são os exemplos mais conhecidos.
Para enfrentar esses desafios, a humanidade deverá promover incontornáveis
adaptações em larga escala. Assim, é urgente adequar a formação básica dos
jovens às necessidades de uma sociedade cada vez mais dependente da
globalização da economia.
Por outro lado, a aceleração das mudanças, que ocorreram nos modos de
produção da indústria e na sociedade pós-moderna, foi o resultado de rupturas
tecnológicas tais como a invenção dos transistores, dos fonógrafos e discos de
vinil, das máquinas de reprodução (scaner), dos satélites de comunicação, do
computador pessoal e da Internet, entre outros (CHRISTENSEN, 2009).
Na primeira década do século XXI fica patente que o emprego, nos moldes do
século passado, não existe mais. O mercado de trabalho exige dos
profissionais novas capacidades de flexibilidade, adaptação e inovação para as
quais a escola não os preparou.
A sociedade brasileira do século XXI precisa enfrentar esses desafios de
escala global. Crise econômica internacional, aquecimento global, mudanças
das relações de trabalho, riscos de falta de água potável e de crise no
1
2. abastecimento em alimentos, são alguns dos mais comentados na mídia,
nesse início de século.
Os desafios globais e as novas tecnologias estão presentes na vida das
pessoas, na consciência popular. O ensino do cotidiano traz, para alguns
brasileiros, o mundo real das drogas, da violência doméstica e das ruas e, para
outros, as tecnologias de ponta tais como a Internet com acesso ao mundo
virtual pelo Google, a Wikipédia e similares, pelos jogos eletrônicos, pela
televisão a cabo, assim como, o mundo real, em outra escala, por meio de
viagens internacionais.
A escola não acompanhou essas mudanças no mesmo ritmo, o que provocou
uma defasagem entre a vida real e os aprendizados trabalhados em ambiente
escolar. Por exemplo, muitas crianças e adolescentes tiveram a oportunidade
de usar um Global Position System (GPS) muito antes de sua apresentação em
sala de aula. Por outro lado, a maioria ouviu falar dessa tecnologia, mas, não
teve contato direto com um GPS. Isso revela outro grave problema: a
aprendizagem em ritmos diferentes por parte de alunos pertencentes a uma
mesma sociedade, fato que agrava as clivagens sociais.
ENSINAR NO BRASIL, NO SÉCULO XXI
UNIVERSIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS
O sistema de ensino brasileiro, do básico à universidade, está passando por
um processo de mutação.
Numa tentativa de atender à diversificação acelerada das necessidades da
sociedade do século XXI, e de captar cada vez mais alunos atraídos pelos
conceitos da moda, tais como “meio ambiente”, “sustentabilidade”, “gestão”, por
exemplo, instituições privadas diversificaram a oferta de cursos. Para tanto,
criaram alternativas que, muitas vezes, entraram em competição na disputa por
candidatos, numa mesma região, sobretudo à licenciatura, levando, até, ao
fechamento desses cursos, como observado no interior de Minas Gerais.
2
3. Assistimos, ainda, a uma concorrência de mercado entre instituições de ensino
privadas. Os critérios de concorrência passaram a ser relativos a preços de
mensalidades em vez de qualidade de ensino. O tempo de integralização dos
cursos está sendo reduzido, cada vez mais, visando obviamente a custos
reduzidos para os estudantes e maior lucratividade para as instituições, com
anuência do Ministério da Educação e Cultura. É conhecido o fato que, de uma
turma de 40 alunos, forma-se aproximadamente a metade, ao final de quatro
anos! Evasão significa prejuízo econômico. Para cursos de curta duração, esse
fato tem um impacto muito menor, o que garante o lucro da instituição de
ensino.
Nesse início de século, o governo brasileiro criou novas universidades federais
em regiões afastadas dos grandes centros, para responder a uma demanda
real. Nas unidades existentes, ampliou a quantidade de vagas com a criação
de turmas e a diversificação dos cursos tradicionalmente oferecidos e, ainda,
pretende facilitar o acesso às universidades com a política de reservas de
vagas por meio de cotas e mudança das modalidades de entrada: a
classificação no ENEM, um vestibular federal único, entre outros, são assuntos
em pauta.
A entrada nas universidades garantida por cotas, não por competência,
provocará, em curto prazo, mais discriminação do que inserção social. A
política de cotas para ingressar, baseada em critérios socioeconômicos, por
mais “democrática” que pareça ser, aparentemente, traz em si consequências
que poderão ser desastrosas no futuro.
Qualidade, conteúdos ou métodos de ensino não são temas em discussão. O
critério quantidade passa antes do de qualidade.
QUALIDADE DO ENSINO
As associações de profissionais, em particular as de médicos e de advogados,
denunciam o baixo nível de conhecimento dos egressos das faculdades
privadas. Até mesmo universidades públicas formam profissionais com
capacidade aquém do desejável.
3
4. Um profissional precisa ter recebido uma formação de qualidade que lhe traga
bases para enfrentar os desafios do mercado de trabalho. Essa formação
passa, obrigatoriamente, por uma alfabetização de qualidade. Quantos
profissionais com formação superior não conseguem expressar-se
corretamente por escrito e oralmente! Diariamente erros básicos de linguagem
de jornalistas, engenheiros, médicos podem ser lidos, vistos e ouvidos em
jornais e outras mídias. Dissertações de mestrado, teses de doutorado
precisam ser revisadas por especialistas (e, muitas vezes, reescritas para ser
inteligíveis!). A maioria da população não sabe operar uma regra de três (até
mesmo alguns professores de matemática do ensino médio!).
No mundo da escola, a fragilidade e a inadequação da formação dos
professores ficam evidenciadas, quando um jovem formado em universidade
entra numa sala de aula qualquer. Dar conta de uma turma de 40 alunos (ou
mais) numa escola estadual, na periferia de uma metrópole, ou de outra turma,
formada por filhos da classe A, traz desafios que vão muito além dos
conteúdos de cada disciplina.
Tendo em vista a magnitude desses fatos é possível afirmar que são
consequência da mal-formação básica do estudante brasileiro que, por sua
vez, viria da mal-formação do corpo docente? Esses fatos revelam o
despreparo de várias gerações. Isso não é resultado do ensino universitário,
mas, do ensino básico.
O problema da formação, com qualidade, precisa ser encarado o mais cedo
possível, nos primeiros ciclos do ensino infantil e fundamental.
UNIVERSIDADE x CURSOS DE LICENCIATURA
Os cursos tradicionais de licenciatura foram as primeiras vítimas da expansão
de novos cursos de bacharelado, sobretudo no interior do país, o que vai
acentuar o déficit de professores, no Brasil, em curto prazo. Com efeito, a crise
de recrutamento para o ensino básico constitui um grave problema. A
4
5. crescente violência nas escolas, os baixos salários e a desvalorização da
profissão de professor, no Brasil, são algumas explicações dessa crise.
Segundo o Reuni/MEC (2009), a quantidade total de cursos foi multiplicada por
1,5 entre 2002 e 2008 (de 1.653 para 2.570) e deverá chegar a mais do dobro,
em 2012, comparado a 2002 (de 1.653 para 3.596) (Ver Tabela 1). Todavia, a
projeção para 2012 mostra uma diminuição relativa dos cursos de licenciatura
como revela o Gráfico 1.
Tabela 1: Cursos superiores no Brasil de 2002 a 2012
ANOS 2002 2008 2012
Licenciatura 593 931 1.198
Bacharelado 1.060 1.639 2.398
TOTAL 1.653 2.570 3.596
Fonte: Reuni/MEC, 2009.
Gráfico 1: Evolução da quantidade de cursos superiores,
no Brasil, em 2002, 2008 e 2012
3000
2500
2000
Licenciatura
1500
Bacharelado
1000
500
0
1 2 3
Fonte: Reuni/MEC, 2009.
A tendência atual deverá agravar-se, o que vai ampliar a falta de professores
para o Ensino Fundamental e Médio.
QUALIFICAÇÃO DOS PROFESSORES
5
6. Os autores do livro Estatísticas dos Professores no Brasil (2003) analisaram as
diferenças de qualificação dos docentes, para o ensino básico, entre as zonas
urbanas e rurais.
Se na zona urbana já se observa carência de pessoal qualificado para atuar na
educação básica, no meio rural esse quadro é ainda mais crítico. No Brasil,
menos de 10% dos docentes da zona rural que atuam nas séries iniciais do
ensino fundamental têm formação superior, enquanto na zona urbana esse
contingente representa 38% das funções docentes (MEC/INEP, 2003).
Esses dados confirmam a hipótese da falta de qualidade na formação do corpo
docente evocada acima. A melhoria da qualificação dos docentes constitui um
grande desafio para o poder público num país com as dimensões do Brasil:
[...] melhorar a qualificação dos docentes que atuam nessas
áreas tem como fator limitador a disponibilidade de mão-de-
obra qualificada nessas localidades. Formação continuada para
os profissionais que já atuam na zona rural e políticas de
formação e melhoria das condições profissionais são tarefas
que podem ser fomentadas e implantadas pelo poder público
para diminuir a distância entre o meio urbano e o rural
(MEC/INEP, 2003).
Tendo em vista a necessidade de dar oportunidades iguais para todos os
brasileiros, mesmo àqueles distantes das universidades, que geralmente ficam
nos grandes centros, desenvolveu-se o ensino a distância. A Secretaria de
Educação à Distância (Seed/MEC) cuida da implantação dos projetos nas
instituições de ensino superior. Esse método de ensino apresenta como
característica principal ser centrado no aluno, uma vez que a relação professor-
aluno tem caráter individual.
Todavia, há outro aspecto a ser considerado no processo de ensino-
aprendizagem.
Perdeu-se o foco do ensino básico, quando os conteúdos passaram a
prevalecer em detrimento da formação básica do aluno. O ensino é básico,
quando inicia o aluno ao estudo em geral. O professor não é, e nem deve ser,
6
7. especialista em qualquer disciplina escolar. Os “licenciados em...” atuam no
Ensino Fundamental II. O papel do professor do Ensino Fundamental I é
preparar o aluno para adquirir conhecimentos, isto é, alfabetizar-se e dominar
um vocabulário diversificado, organizar o pensamento, raciocinar com lógica e
argumentar para defender pontos de vista; ensinar a lidar com números e
desenvolver um raciocínio lógico-matemático, a perceber o meio em que vive, a
localizar-se e a entender o espaço em escalas diversas. É papel do professor,
enfim, organizar atividades para o aluno desenvolver habilidades básicas para
observar, registrar, representar, questionar, entender o mundo atual e sua
comunidade.
PROPOSTA METODOLÓGICA DE ENSINO CENTRADO NO ALUNO
Cientistas de diversas áreas do conhecimento, entre os quais Christensen
(2009), Peña (2005) e Morin (2000), identificam uma ruptura conceitual no
mundo escolar semelhante às rupturas tecnológicas que aconteceram no
século XX: uma proposta metodológica de ensino centrado no aluno.
Morin (2000), em seu livro Os sete saberes necessários à educação do futuro,
descreve e analisa habilidades que precisam ser trabalhadas na escola para
garantir a formação de cada cidadão:
1. Conhecer o conhecimento, ou seja, sempre ter um olhar crítico com
relação ao risco de erro e de ilusão perceptiva. A lucidez é fundamental.
Para tanto, precisa-se entender como funciona o cérebro e as eventuais
interferências da cultura no julgamento e na formação do conhecimento.
Por exemplo, a teoria da evolução das espécies de Darwin, ainda, é
objeto de discussões ideológicas relacionadas a diferenças culturais.
2. Entender um problema em seu contexto escalar, atribuindo-lhe a devida
importância local, regional ou global. “È necessário ensinar os métodos
que permitem apreender as relações mútuas entre as partes e o todo
num mundo complexo” (p. 12).
3. Entender a condição humana em sua complexidade. Para tanto, é
necessário organizar os conhecimentos desenvolvidos nas ciências
humanas e da natureza, na literatura e na filosofia, para revelar “a
7
8. ligação indissolúvel entre a unidade e a diversidade de todo o que
constitui o humano” (p. 13).
4. Entender o destino doravante planetário da humanidade. A dimensão
global das ações humanas, isoladas e coletivas, coloca em risco a
sobrevida no planeta.
5. Encarar as incertezas por meio da gestão. Para tanto, os princípios da
estratégia flexível por meio da assimilação das informações obtidas no
decorrer da ação, ou seja, seu monitoramento contínuo, devem fazer
parte da formação dos jovens no lugar de uma aprendizagem estática de
um mundo ultrapassado. Os conceitos evoluem mais rapidamente na
vida real. O ensino em ambiente escolar custa a acompanhar essas
mudanças.
6. Desenvolver a capacidade de compreender. Entender o outro, próximo
ou estrangeiro, significa entender “as raízes dos racismos, xenofobias,
desprezo”. Isso “constituiria ao mesmo tempo uma das bases mais
seguras de educação para a paz” (p. 15).
7. Desenvolver a ética por meio da democracia, uma vez que “a ética do
indivíduo da espécie requer, no século XXI, a solidariedade
terrestre” (p. 15). O desenvolvimento humano exige o desenvolvimento
de todos, indivíduos e coletividades, e depende da tomada de
consciência de pertencer a uma mesma comunidade, a espécie
humana.
Uma escola que objetiva preparar o cidadão do século XXI precisa abandonar
a perspectiva da transmissão de conteúdos das disciplinas escolares para
focalizar-se na formação de um aluno autônomo, ciente e atuante no mundo
em que vive. Isso passa por uma mudança de ponto de vista do profissional do
ensino: de professor transmissor de um conhecimento estabelecido por
especialistas para o de orientador de formação de uma mente aberta para o
estudo de um mundo em mutações permanentes.
Em seu livro, Christensen (2009) traz um histórico do sistema escolar dos
Estados Unidos da América, e análises das novas teorias educacionais e do
impacto das novas tecnologias na sociedade do século XXI. O autor descreve a
8
9. ruptura tecnológica provocada pelo uso do computador e demonstra como esse
instrumento pode constituir-se no meio ideal para o desenvolvimento de uma
pedagogia centrada no aluno:
Os computadores podem desempenhar importante papel no
aperfeiçoamento e na melhoria de nossas escolas, mas um
elemento de bem maior importância é o que diz respeito a
como eles são usados e implementados, em vez da simples
questão da adesão a este instrumento (p.29) (grifo nosso).
COMPUTADOR E ENSINO CENTRADO NO ALUNO
A teoria da ruptura pela inovação (CHRISTENSEN, 2009) traz elementos de
reflexão aplicáveis à escola. Na escola, uma ruptura pela inovação seria
“mudar para um aprendizado centrado no aluno, por meio da implementação
da ruptura no aprendizado baseado em computadores” (p. 57).
Na maioria dos casos, nas escolas, usam-se “os computadores como uma
ferramenta e um tópico, não na condição de mecanismo primário de instrução
que ajuda os alunos a aprender em formas customizadas de acordo com os
respectivos tipos de inteligência” (p. 90), o que significa que a colocação de
computadores nas escolas não resolveu o problema didático, nem melhorou a
aprendizagem dos alunos. Por quê?
Muitos artigos, que a fragmentada e marginalmente lucrativa
indústria do software educacional vem produzindo, tentam
realmente atingir os alunos das mesmas formas pelas quais as
matérias têm sido ensinadas. Como resultado disso, acaba
abastecendo o mesmo tipo de inteligência historicamente
privilegiado em cada matéria (p. 74).
Mesmo em ambiente escolar, o uso do computador limita-se a escrever textos,
acessar internet, jogar e trocar mensagens com amigos e desconhecidos, o
que favorece o mesmo modelo de ensino: “os professores usam esses jogos
para suplementar e reforçar o modelo existente de ensino” (p. 91).
No final do século XX, os governos de diversos países priorizaram a instalação
de computadores nas escolas. O projeto canadense “Autoroute de la
connaissance” previa o acesso a computadores para todos os lares de todas as
9
10. províncias de seu território. Consciente da necessidade de conteúdos de
qualidade, também, financiou projetos para o desenvolvimento de programas
educativos que dessem suporte ao aprendizado baseado em computadores.
Um dos projetos foi o Atlas do Québec para Internet. O modelo proposto pelos
pesquisadores 1 desse projeto coloca o aluno no centro da aprendizagem,
oferecendo-lhe ferramentas diversas para construir conhecimentos a partir de
um percurso individual, como mostra a Figura 1.
Figura 1: Arquitetura e conteúdos do protótipo do Atlas do Québec para Internet
Fonte: Cartografia para Escolares no Brasil e no mundo. Belo Horizonte, 2002 (p. 205-
224).
Nesse modelo, cada aluno escolhe o caminho que quiser, a partir de um
objetivo formulado por um professor ou, por interesse próprio.
Essa estrutura possibilita:
• a navegação individual, a partir do guia do site (Guide to www site). O
aluno pode começar onde quiser;
1
Dra. Jacqueline Anderson, da Concordia University; Dr. Jean Carrière, da Université du
Québec à Montréal e Dra. Janine Le Sann, da Universidade Federal de Minas Gerais.
10
11. • a aquisição e a verificação de conceitos, no glossário (Glossary). Três
níveis de dificuldade conceitual eram previstos para atender os alunos
em diferentes momentos de sua aprendizagem (ensinos Fundamental I,
II e Médio);
• a aquisição de conhecimentos, a partir de pequenos textos
explicativos/conceituais (Mapping concept, Concept of data, Concept of
base maps);
• o acesso a dados estatísticos atualizados em bancos de dados, interno
para os mais jovens e, externo para os outros (Hyperlinks);
• o acesso a mapas mudos para usar como suporte para as informações
colhidas e codificadas pelo aluno, no processo de elaboração e análise
de mapas temáticos (Base maps);
• o acesso a mapas prontos como os encontrados nos livros didáticos e
atlas escolares (Pre prepared mapas);
• a aprendizagem de habilidades necessárias ao desenvolvimento dos
conhecimentos (suitecases) sob a forma de exercícios dirigidos, com
animações. São trabalhadas as habilidades para ler, construir e analisar
tabelas de dados, gráficos e mapas; ler e analisar documentos
iconográficos (fotografias, fotografias aéreas, imagens de satélite, etc.).
O projeto do Québec inspirou-se na metodologia do projeto brasileiro Atlas
Escolar Interativo Municipal, que foi desenvolvido a partir de 1992 e produziu
quinze Atlas Escolares Interativos Municipais 2 .
Por diversas causas, o projeto canadense, iniciado em 2000, na Université du
Québec à Montréal (UQÀM), em colaboração com a Concórdia University,
também em Montréal, e a Universidade Federal de Minas Gerais, não passou
da etapa do protótipo. Fica sua estrutura como modelo de um método de
ensino centrado no aluno.
2
Foram produzidos atlas dos seguintes municípios: Contagem (1996); Gouveia (3 edições:
1997/98/99); São Gonçalo do Rio Preto (1998); Santo Antônio do Itambé (1999); Pedro
Leopoldo e Presidente Kubitschek (2000); Brumadinho (2 edições: 2002/2003); Lagoa da Prata,
Padre Paraíso e Datas (2002); Felício dos Santos (não publicado) (2002); Itamarandiba,
Carbonita e Carlos Chagas (2003).
11
12. MÉTODO DO ATLAS ESCOLAR INTERATIVO MUNICIPAL
A formação básica do aluno, por meio do estudo do espaço local e de vivência
do aluno, é o objetivo central do projeto Atlas Escolar Municipal Interativo
desenvolvido na Universidade Federal de Minas Gerais, a partir da década de
90.
A proposta metodológica do Atlas constitui-se em outro exemplo de ensino
centrado no aluno, uma vez que, nessa versão, não se previa o uso de um
computador 3 . Como parte da tese de doutorado intitulada Um material
pedagógico alternativo para o ensino de conceitos geográficos básicos, no
Ensino Fundamental, no Brasil, defendida em 1989, elaborou-se um conjunto
de fichas de exercícios 4 .
Numa segunda etapa, a pesquisa prosseguiu, utilizando-se como laboratório
duas salas de aulas de primeira série do Ensino Fundamental 5 , numa escola
da prefeitura de Contagem, cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte
(RMBH-MG). O material foi testado nas duas salas, durante três anos. No
decorrer do quarto ano, ficou evidente a necessidade de se organizar um
material de conteúdo geográfico relativo ao espaço vivido pelas crianças
daquelas salas, no município de Contagem. Esse primeiro Atlas foi publicado
em 1996, após vários anos de pesquisa. Em seguida, outro projeto foi
desenvolvido para o Alto Vale do Jequitinhonha, região de estudos do Pólo
Jequitinhonha da Universidade Federal de Minas Gerais 6 .
3
Pretende-se desenvolver uma formatação digital desse modelo metodológico para a
elaboração de Atlas Escolar Interativo Municipal.
4
Esse material foi publicado com o título A caminho das noções básicas de Geografia, em
2000, cujas fichas foram divididas em quatro anos (1ª à 4ª série). Reeditado numa versão
revisada e complementada nomeada Trilhas para a Geografia: espaço e tempo, em 2007, pela
editora Dimensão, a nova versão conta com cinco livros (10 ao 5º ano) e propõe uma
estruturação do conceito de tempo, ao longo do currículo do Ensino Fundamental I.
5
Atualmente denominado 2º ano.
6
Uma parte do projeto foi financiada pela FAPEMIG, órgão patrocinador da pesquisa no
Estado. Essa parte foi finalizada em julho de 1999. A FINEP patrocinou outra parte dessa
mesma pesquisa.
12
13. O objetivo principal do projeto era desenvolver um método de ensino-
aprendizagem para a aquisição de habilidades e conceitos básicos para o
estudo de Geografia, ao longo do Ensino Fundamental I, para introduzir a
Geografia como ciência, no Ensino Fundamental II. O método é centrado no
aluno e desenvolvido a partir do entendimento e do conhecimento do meio em
que se vive.
Além de possibilitar o acesso a informações atualizadas e relevantes, o objetivo
principal do Atlas Escolar Interativo Municipal é ajudar a criança a desenvolver
opiniões próprias e tomar atitudes, como futuro cidadão responsável, por meio
do conhecimento do espaço em que vive. A criança vai perceber, representar e
conhecer esse espaço; analisar, tratar e interpretar dados provenientes de
observações pessoais, de registros estatísticos ou de qualquer outra fonte de
informação; exercitar raciocínios lógico e lógico-matemático, respeitando os
diversos pontos de vista de outras pessoas.
Muito além das informações atualizadas e das noções básicas para a formação
de conceitos, o Atlas propõe a construção do saber, a partir da aquisição de
habilidades. Considerando-se que o aprendizado se dá, exclusivamente, pela
ação do aluno, a apreensão – ou ação de prender consigo – é facilitada pela
participação ativa do aluno no processo de construção do saber. O aluno
adquire conhecimentos sob a orientação do professor, que não é mais o
depositário dos saberes acadêmicos a serem transmitidos. Trata-se de uma
mudança de postura fundamental com relação ao processo de ensino-
aprendizagem. O Atlas Escolar Interativo Municipal possibilita a aquisição de
habilidades de naturezas diferentes e diversas.
No Quadro 1, as habilidades trabalhadas foram organizadas em categorias
ordenadas numa sequência lógica. Essa estrutura corresponde às etapas de
uma pesquisa científica, semelhante à sequência para aquisição de qualquer
tipo de conhecimento. Esse quadro não é exaustivo. Como o Atlas é uma “obra
aberta”, na qual cada um coloca um pouco de si, de sua experiência, de sua
vida, está certo que outras habilidades vão aparecer, dependendo dos usuários
e dos temas estudados.
13
14. Quadro 1: Categorias de habilidades que podem ser trabalhadas na Geografia
Categorias Habilidades
Preparação para a aquisição de dados Levantar os conhecimentos atuais 7
Preparar um questionário
Preparar uma entrevista
Aquisição de dados Observar e registrar suas observações
Ler textos
Ler tabelas de dados estatísticos
Ler documentos fotográficos
Ler documentos iconográficos
Ler croquis
Ler gráficos
Ler mapas
Tratamento de dados Elaborar tabelas de dados
Ordenar dados
Organizar dados por categorias
Comparar dados e informações
Escolher classes
Representação das informações Elaborar gráficos
Elaborar legendas
Elaborar mapas
Elaborar textos analíticos
Elaborar textos sintéticos
Construir imagens mentais e conceitos
Aquisição de habilidades ligadas aos Reconhecer e usar uma escala
conceitos de base da geografia Orientar um mapa
Localizar-se em diversas escalas
Dominar a noção de espaço
Analisar tabelas de dados
Analisar gráficos
Analisar mapas
Analisar textos
Montar esquemas
Refletir
Sintetizar
Tirar conclusões
Formar opiniões
Formular e defender opiniões
Tomar decisões
Discutir e argumentar
Respeitar as opiniões dos outros
Ser criativo
Compreender as noções relativas à
população
Interpretar informações
Reconhecer os principais elementos da
geografia de um município
7
Trata-se de refletir para verificar o que é conhecido pelo aluno e, ou pelo grupo, a respeito de
um tema específico; de definir as dúvidas e decidir o que deverá ser pesquisado para ampliar
os conhecimentos sobre o tema em questão.
14
15. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A formação de um aluno para aprender a aprender, com certeza, é objetivo do
Ensino Fundamental. As deficiências patentes na alfabetização e nas bases
matemáticas, observadas nos adultos, hoje, são consequência da perda de
perspectiva do papel da escola, em cada momento do currículo escolar de um
indivíduo. Na ânsia de qualificar, com rapidez, esqueceram-se as
características essenciais do Ensino Fundamental.
O computador apareceu como “o” remédio paliativo, a panacéia, para resolver
os problemas do ensino. Todavia, trata-se de um mero instrumento,
instrumento importante, certo, porém com limitações práticas e técnicas. São
conhecidos os casos de computadores encontrados estragados, amontoados
numa sala, por falta de técnicos para instalá-los e de professores treinados
para usá-los. A substituição do retroprojetor pelo data show não melhorou a
qualidade do ensino, apenas, trouxe mais agilidade e praticidade para o
professor! É preciso mudar as atitudes. O papel do professor, dono do
conhecimento acadêmico “definitivo” e “certo”, e a apatia do aluno são partes
das causas dos fracos resultados obtidos na escola. Deve-se mudar a postura
do ensino, de centrado no professor para centrado no aluno.
A experiência mineira mostra que é possível desenvolver uma pedagogia
centrada no aluno com baixos custos 8 . Como por meio do Atlas, o
conhecimento relativo ao município era uma construção coletiva, toda a
comunidade beneficiava-se do trabalho 9 .
Os custos, em tempo, dinheiro e energia, para desenvolver programas de
computadores visando a atender os objetivos do ensino, por meio do uso dos
computadores, mesmo aqueles centrados no aluno, podem inviabilizar um
projeto. O caso do Atlas do Québec pode ser um exemplo.
8
Cada volume da última edição do Atlas Escolar Interativo Municipal (2002) ficou no valor de
R$ 5,00 a unidade. Esse custo era assumido pelas prefeituras.
9
Cada criança recebia um atlas de uso pessoal que, no decorrer do trabalho, era levado para
casa, de modo que a família participasse da construção do conhecimento sobre o município.
15
16. A elaboração do conhecimento, o desenvolvimento de habilidades para
aprender a aprender estão ao alcance de qualquer um, a baixo custo, sem
tecnologia sofisticada, sem formação técnica, que necessitem de constantes
atualizações. Basta rever os objetivos do ensino. Os métodos e os meios são
meros caminhos para alcançar os objetivos fundamentais apontados por Morin
(2000):
• Entender a condição humana e o seu destino doravante planetário;
• Saber agir localmente e pensar globalmente;
• Encarar as incertezas por meio da gestão;
• Desenvolver a capacidade de compreender e a ética;
• Formar um aluno autônomo por meio do ensino da vida centrado no aluno;
• Conhecer o conhecimento.
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16