A submersão em dívida é de todo o interesse do sistema financeiro, favorece a aceitação de aumentos na punção fiscal e, ao aumentar as desigualdades entre os povos da Europa, alimenta taras nacionalistas e fascizantes, das quais nada virá de tranquilizador.
1 - O aumento geral dos níveis de endividamento
2 - A dívida global nos países da Zona Euro
2.1 - A dívida das famílias
2.2 - A dívida das empresas
2.3 - A dívida pública
2.4 - Composição da dívida em cada país (2000 e 2018)
2.5 – A submersão em dívida
2.6 - Evolução da divida portuguesa
1. grazia.tanta@gmail.com 4/6/2019 1
Europa - os devedores de uma dívida não pagável
A submersão em dívida é de todo o interesse do
sistema financeiro, favorece a aceitação de
aumentos na punção fiscal e, ao aumentar as
desigualdades entre os povos da Europa, alimenta
taras nacionalistas e fascizantes, das quais nada
virá de tranquilizador.
1 - O aumento geral dos níveis de endividamento
2 - A dívida global nos países da Zona Euro
2.1 - A dívida das famílias
2.2 - A dívida das empresas
2.3 - A dívida pública
2.4 - Composição da dívida em cada país (2000 e 2018)
2.5 – A submersão em dívida
2.6 - Evolução da divida portuguesa
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1 - O aumento geral dos níveis de endividamento
A lógica do capitalismo exige a permanente reprodução de capital; e esta reprodução terá de
ser utilizada para uma nova reprodução, num processo que se pretende sem fim e que se
interrompe na próxima crise financeira, cuja causa próxima, local ou momento de explosão,
dificilmente se prevêem. Um quadro, portanto, de grande imprevisibilidade, de incerteza, que
tem como único elemento certo, o desabar da crise sobre seres humanos, de modo mais ou
menos regionalizado, essencialmente trabalhadores, reformados, jovens, desempregados,
pobres.
O grande instrumento para a acumulação de capital é, hoje, a sua criação através do sistema
financeiro e muito menos a partir da mais-valia subtraída aos trabalhadores industriais, como
no século XIX. E daí o papel central da dívida, da sua reprodução e reciclagem, da concertação
entre o sistema financeiro e os Estados (e instituições supranacionais) para a captura dos
povos e do seu futuro, como instrumentos para a acumulação de capital.
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Como dissemos recentemente vamos proceder a uma análise conjunta, integrada, da dívida
pública, daquela que é assumida pelas empresas e ainda, da que onera as famílias, os
indivíduos.
Sabe-se que quanto à primeira, a classe política se encarrega de onerar empresas e sobretudo
familias ou indivíduos para o seu pagamento, num processo auto-reprodutivo; há toda uma
ladaínha no seio das classes políticas em torno do deficit, do gasto público em investimento,
modernização, racionalização, que se repercutam na dívida pública, apesar do aumento da
carga fiscal, num contexto em que têm prioridade os apoios concedidos para salvar bancos ou
empresas nacionais com caráter majestático.
As empresas endividam-se para investimento ou melhoria dos seus indicadores financeiros
procurando agregar capital através do aumento das taxas de lucro, impondo perdas reais nos
salários dos trabalhadores ou aumentando os preços daquilo que vendem… para além
procurarem apoios estatais. Para as famílias e particulares resta apenas dimensionar o volume
da dívida, ou melhor, das prestações para o seu pagamento, aos níveis salariais atuais ou
futuros, reais ou admissíveis. A dívida é uma forma de captura.
2 - A dívida global nos países da Zona Euro (ZE)1
Tomámos para análise os dados – disponibilizados pelo BCE - relativos aos países europeus que
usam o euro como moeda e para dois momentos; o princípio do século (2000/02) e o passado
mais recente (2017/18). Os elementos fornecidos são expressos em percentagem do PIB dos
vários países, tratando-se, portanto de uma forma de avaliação da dimensão dos vários tipos
de dívida relacionada com a marcha das respetivas economias. Na sua totalidade, a dívida
constituída pelos países da ZE, nos momentos considerados, está representada no gráfico que
1
Note-se que houve vários momentos de adopção do euro, depois do tempo inaugural em 1999. Foram
os casos de Eslovénia (2007), Chipre e Malta (2008), Eslováquia (2009), Estónia (2011), Letónia (2014 e
Lituânia 2015), para além da Grécia que procedeu a essa adopção logo em 2001. Essa realidade obriga a
que se procure a existência de um padrão de impactos inequivocamente relacionados com a adopção da
moeda para os países citados. No caso da dívida das famílias há casos de redução do seu peso no PIB
(Estónia e Letónia), de quase estagnação (Eslovénia e Lituânia) e dois casos de franco crescimento da
dívida (Chipre e Eslováquia) que, após a adopção do euro mantêm a tendência anterior. No capítulo da
dívida das empresas e face às respetivas datas de integração na ZE, observou-se uma subida do seu peso
em Chipre, Malta e Lituânia; nos dois primeiros casos, em continuidade face ao período anterior; e,
finalmente na Letónia e na Eslovénia, há uma nítida quebra do endividamento. Quanto à dívida pública,
há um claro aumento da sua relevância em Chipre e na Eslovénia, na sequência da crise financeira mas,
bem mais moderada na Eslováquia; observam-se ainda reduções do seu peso no PIB em Malta, na
Letónia e na Lituânia, mantendo-se estável este tipo de endividamento na Estónia. Neste contexto, não
é possível estabelecer-se um padrão, uma relação comum entre o endividamento e a integração num
espaço de moeda única.
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se segue (Gráfico 1). Retiremos algumas notas sobre a sua leitura tendo em conta que os
indicadores referidos expressam um (sub)múltiplo do respetivo PIB:
A dívida global representava 2.5 vezes o PIB no princípio do século e 3.1 recentemente;
Todos os países aumentaram o seu grau de endividamento global excepto a Alemanha
que, em 2000/02 estava em linha com a média geral e que se situou aquém desta nos
últimos anos (2.3 vezes o seu PIB);
Em 2000 os países com os maiores indicadores de endividamento, eram Chipre (3.9),
Holanda (3.7) e Bélgica (3.1); atualmente, esse pódio é ocupado por Luxemburgo (5.6),
Chipre (5.2) e Irlanda (4.5);
Em termos relativos, os maiores aumentos de dívida registam-se na praça forte do
sistema financeiro, o Luxemburgo, (de 2.0 para 5.6 vezes o PIB, em 2000/2 e 2017/18,
respetivamente); na Irlanda, (de 2.5 para 4.5), onde as multinacionais encontram muitas
facilidades; na Grécia esmagada pela troika (de 1.7 para 3.1): e por Chipre, refúgio dos
capitais dos oligarcas russos e protagonista de uma crise financeira em 2012 (de 3.9 para
5.2);
Os menores indicadores de endividamento, em 2000/02 situavam-se nos países bálticos –
Lituânia 0.85, Letónia (1.0) e Estónia (1.3) - na Eslovénia (1.0), na Eslováquia (1.6) e na
Grécia (1.7) que, na ocasião, não eram adoptantes do euro, excepto a Grécia que fez essa
adopção em 2001. Note-se, porém que o euro foi criado em 1999 e que Malta ou Chipre,
que viriam a aderir em 2008 já apresentavam, no princípio do século, indicadores
correspondentes 2,1 e 3.9 do PIB, respetivamente;
Quanto às variações percentuais da dívida global, entre o princípio do século e a
atualidade, para a totalidade da ZE, registou-se um aumento de 25.3%. Para além da
Alemanha que regista uma redução de 10.2%, os acréscimos mais curtos observam-se na
Eslováquia (5.9%), Áustria (10.6%), Holanda (20.6%) e Malta (22.2%). Quanto aos maiores
aumentos nas responsabilidades, salientam-se o Luxemburgo (172.5%), Eslovénia
(103.4%) e Grécia (85.9%). Os dados da Alemanha, resultantes do seu potencial
exportador, permitem uma acumulação de capitais susceptíveis de serem colocados nos
países mais frágeis da UE;
Quanto a Portugal, o endividamento global, em 2000/01, já era elevado (2.5 vezes o PIB),
semelhante aos indicadores apresentados pela Irlanda, pela Alemanha ou pela Espanha,
todos ligeiramente acima da média da ZE; e todos somente ultrapassados por Chipre,
Holanda e Bélgica.
Quando se observa a situação na atualidade, o endividamento global português cifra-se
em 3.5 vezes o PIB, um indicador superado claramente pelo Luxemburgo, por Chipre,
Irlanda e Holanda e pouco abaixo do indicador francês.
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A dívida global abaixo referida para a ZE pode ser detalhada em três componentes – as partes
cujas responsabilidades recaem diretamente sobre os particulares/famílias, as empresas e os
Estados.
(em % do PIB)
Total Famílias Empresas Estados
2000/02 249.9 76.3 105.5 68.2
2017/18 313.2 94.7 135.7 82.8
(var %) 25.3 24.1 28.6 21.5
Gráfico 1
2.1 - A dívida das famílias
O crescimento das dívidas atribuidas às famílias, na sua globalidade, situa-se num nível
intermédio entre o observado para as empresas e o relativo aos Estados, como se observa no
quadro atrás. E, em termos globais, no período considerado, a dívida das famílias evidenciou
um crescimento que a aproxima do total do PIB, no último ano.
Gráfico 2
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Com a excepção da Alemanha, em todos os países o endividamento familiar tem um
crescimento que supera o do PIB. Na Alemanha, aquela dívida, no princípio do século era
a quarta mais elevada da ZE e, claramente acima da média do conjunto com um
endividamento correspondente a 1.1 vezes o PIB alemão; no último ano esse tipo de
dívida situava-se em 0.85 do PIB e, visivelmente abaixo da média global (0.95);
Em 2000 a Holanda surgia com o maior índice de endividamento familiar (1.7) muito
acima de Chipre (1.2), Irlanda (1.1) e da Alemanha, como referimos. No tempo presente, a
Holanda continua a destacar-se (2.1), muito acima do Luxemburgo (1.7) e de Chipre (1.6),
que tiveram conspícuos aumentos;
Em termos das variações entre 2000/02-2017/18 os casos de maiores aumentos –
Lituânia, Eslovénia, Estónia, Grécia e Letónia – registaram-se onde o endividamento das
famílias tinha, inicialmente, muito pouco significado comparativamente ao PIB.
Inversamente, as situações onde os acréscimos têm pouco significado observam-se onde
o nível de endividamento, no princípio do século, já era elevado – Áustria, Irlanda,
Holanda e Portugal;
Observe-se em seguida (Gráfico 3), a evolução da dívida das famílias (em % do PIB) para
os países mais afetados pela crise financeira. A Irlanda manteve-se sempre com um maior
endividamento das famílias do que os restantes e, também com variações mais
acentuadas. Portugal e Espanha, depois da crise financeira apresentam um perfil muito
idêntico. A Grécia, só a partir de 2013 mostra um endividamento familiar em
decrescimento mas, muito distanciado dos níveis observados no início do século.
Finalmente, a Itália apresenta não só o indicador mais baixo a partir de 2005 como
também o menos irregular;
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Gráfico 3
2.2 - A dívida das empresas
As empresas apresentam em todo o periodo um nível de endividamento muito superior ao
apresentado pelas famílias ou pelos Estados; e, para mais, com um ritmo de crescimento mais
elevado. Na globalidade, na ZE, as dívidas das empresas chegaram recentemente a 135.7% do
PIB, com um crescimento de 28.6% desde o princípio do século (Gráfico 4).
Entre as empresas registam-se apenas dois casos e, de pequena dimensão, de redução do
peso da dívida – Eslováquia (- 8.2%) para se fixar em 0.8 vezes o PIB nacional e Espanha (-
1%) fixando-se o endividamento em 1.24 vezes o PIB;
Em 2000, o maior endividamento empresarial localizava-se em Chipre (2.1 vezes o seu
PIB) na Holanda (1.5), Malta (1.4) e Bélgica (1.37). Em tempos recentes, a situação
mostra-se muito diferente, sobretudo no caso do Luxemburgo onde a dívida das
empresas atinge 3.7 vezes o seu PIB, contra 1.2 no início do século. Outro crescimento
assinalável revela-se na Irlanda (2.7 vezes o PIB, bem acima da paridade em 2000),
enquanto Chipre se posiciona em terceiro lugar com um indicador de 2.6;
Assim, é claro que os maiores aumentos no período considerado cabem ao Luxemburgo e
a Chipre, muito distanciados dos restantes paises, uma vez que Malta “apenas” regista um
aumento de 44.6% no que respeita ao endividamento das suas empresas;
O mais baixo nível de endividamento, no princípio, como no final do período em apreço,
observa-se na Grécia – com 0.4 e 0.6 vezes o PIB, respetivamente, em contraste total com
a dívida pública na qual o país ocupa lugares cimeiros;
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Portugal, em 2000, tinha um indicador (1.2 vezes o PIB) superior à média da ZE de então,
o que deixou de acontecer recentemente; assim, o crescimento do endividamento das
empresas portuguesas foi dos mais baixos da ZE (28.6%), só se cifrando acima da
Alemanha, da Estónia e da Áustria, para além dos países onde o endividamento
decresceu, como atrás observámos;
Entre os países mais afetados pela crise financeira, exceptuando a Irlanda e Chipre, o
endividamento das empresas manteve-se relativamente estável entre os dois pontos
extremos do período; e com graus indiciadores de baixa dinâmica do endividamento,
nomeadamente no caso da Espanha onde o indicador se manteve estável.
Gráfico 4
2.3 - A dívida pública
A divida pública é aquela que tem uma evolução menos acentuada para o conjunto da ZE. Em
2000/02 somente três países apresentavam dívidas públicas com níveis superiores à média
geral, então de 68.2% do PIB – Bélgica (109%), Itália (105%), Grécia (105%), todos evidentes
incumpridores das regras para a adopção do euro que se fixavam em 60% e cuja situação real
fez abrandar os ímpetos uniformizadores das instituições da UE.
Passadas cerca de duas décadas, com uma violenta crise financeira de permeio, conviria que as
entidades políticas, oligárquicas e sem qualquer suporte ou validação popular (Comissão, BCE,
Eurogrupo) tivessem apostado na coesão usando, eventualmente, terapias distintas, caso a
caso, num contexto de repartição solidária dos custos da crise, com uma dívida global também
solidariamente assumida e anulada nas suas parcelas ilegítimas. Tudo isto, ainda que
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compreendido num contexto global de capitalismo; ou não sejam as instituições europeias ou
nacionais, esmerados gestores dos interesses do sistema financeiro, das multincionais e do
capital mafioso, oriundo do crime.
Pelo contrário, descuraram a oportunidade de domar e reformular a atuação do fragilizado
sistema financeiro, acentuando as desigualdades nacionais e regionais no seio da UE. E, em
simultâneo, a fina flor dos gangs políticos europeus aceitou a participação - como
subservientes grumetes dos piratas Clinton, Bush Júnior ou Obama - nas aventuras dos EUA
nos bordos Sul e Leste do Mediterrâneo. Essa atuação, com a confrontação dos fluxos de
fugidos das guerras em que a UE se empenhou, promoveu o surgimento ou engrandecimento
de taras nacionalistas, xenófobas e fascistas que tanto se têm revelado nas forças políticas
mais à direita ou, nas mais discretas, ditas de “esquerda”; sem nada contribuir para a redução
das desigualdades que separam as margens do Mediterrâneo.
A confrontação com o gráfico seguinte (Gráfico 5) torna fracassada e até ridícula a ideia inicial
de uma dívida pública abaixo dos 60% do PIB, quando nos tempos que correm, sete países têm
realidades que ultrapassam largamente essa meta – Grécia (1.7 vezes o PIB), Itália (1.3),
Portugal (1.2), Bélgica (0.99), França (0.97), Espanha (0.95) e Chipre, para além da Áustria e da
Eslovénia que também não cumprem a premissa inicial para a integração na ZE. Aliás, o
conjunto da ZE não a cumpre atualmente pois a dívida pública global é de 82.8% do PIB,
piorando face à situação inicial que já ultrapassava os limites definidos pelos cinzentos
burocratas de Bruxelas ou Frankfurt, onde se situa o opaco BCE, criado à imagem do vizinho
Bundesbank; este, desde sempre obcecado com a inflação, apontado como o principal
elemento a controlar na conjuntura da ZE. Assim, as profundas desigualdades nas dinâmicas
demográficas existentes na UE, como se não traduzem em unidades monetárias, não contam
para os burocratas de Frankfurt.
Como se pode observar no gráfico, os maiores acréscimos relativos do peso da dívida
pública recairam claramente nos países que protagonizaram a “crise da dívida” – Grécia,
Irlanda, Itália, Portugal, Espanha, Eslovénia e Chipre. Embora os endividamentos da
França e da Bélgica sejam também elevados, não mereceram muitos comentários dos
eurocratas porque “a França é a França” enquanto a Bélgica tem o estatuto de …membro-
fundador e sede das principais instituições da UE; argumentos idiotas do tipo … “porque
sim” ou “porque não”;
As reduções do peso da dívida no PIB observam-se em Malta (-31%), Eslováquia (-11%),
Holanda (-10%), Bélgica (-9.3%) e Alemanha (-8.8%);
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Gráfico 5
A Bélgica, com a Grécia e a Itália preenchiam o pódio dos mais elevados níveis de dívida
pública em 2000. Em 2018, a Grécia destaca-se no primeiro lugar, à frente da Itália e, em
terceiro lugar, destronando a Bélgica, coloca-se Portugal, recentemente entrado no clube
das elevadas dívidas. A Letónia e o Luxemburgo têm os aumentos proporcionalmente
mais elevados mas a dimensão das suas dívidas era relativamente baixa no princípio do
século e continua a ser. A Estónia destaca-se pelo seu muito baixo nível de endividamento
público (5.1% do PIB em 2000 e 7.5% atualmente).
2.4 - Composição da dívida em cada país (2000 e 2018)
Em seguida, disponibilizamos dois gráficos, relativos a 2000/02 e 2018/20, onde é possível
observar os contributos, em cada país, dos vários tipos de dívida – das famílias, das empresas e
dos Estados – para o total das respetivas dívidas.
Gráfico 6
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Gráfico 7
Para sintetizar, evidenciamos no quadro seguinte a hierarquia dos sectores endividados, por
ordem decrescente, para cada país e em cada um dos anos que balizam os intervalos de dados.
Assim, esses sectores – Estado, empresas e familias – serão representados, respetivamente
por P, E e F; e, por exemplo, EFP, significa que o país com esse timbre, tem o conjunto das
empresas como o maior devedor, F (famílias) o segundo e P (Estado) como o menos
endividado. Excluimos Malta porque não apresenta elementos para o endividamento das
famílias.
País 2002/02 2018/20 País 2002/02 2018/20
Austria EFP EFP Italy PEF PEF
Belgium EPF EFP Lithuania EPF EPF
Cyprus EFP EFP Luxembour. EFP EFP
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Germany FEP EFP Latvia EPF EFP
Estonia EFP EFP Netherlan. FEP FEP
Spain EFP EFP Portugal EFP EPF
Finland EFP EFP Slovakia EPF EFP
France EPF EPF Slovenia EPF EFP
Greece PEF PFE Euro area EFP EFP
Ireland FEP EFP
2.5 – A submersão em dívida
Nas sociedades e no plano global há uma óbvia ligação entre os três tipos de dívida – familiar,
empresarial e pública. As sequelas da sua existência, direta ou indiretamente, são fruto das
manobras de empresas e dos Estados para reciclarem as suas dívidas e alijarem as suas
responsabilidades sobre a população; para além da dívida familiar, ancorada no consumismo
ou, resultante à outorga pelos Estados à chamada iniciativa privada (leia-se especuladores
imobiliários e sistema financeiro) da resolução da questão da habitação, muitas vezes
contemplada nas Constituições como uma obrigação… estatal.
A submersão das pessoas em dívida – particularmente no chamado Ocidente – torna-as mais
dependentes do trabalho, cada vez mais extenso em termos de dedicação horária e menos
racional; e submissas porque sabem ter a sua vida balizada por décadas de dívida que, em
muitos casos, se não extinguirão até ao momento da morte.
A volúpia da dívida pode, por consequência, ser avaliada em termos do peso dessa dívida no
total, individualizada em cada um dos estados-nação da ZE.
Vejamos, em primeiro lugar o valor médio de dívida (global) por habitante, nos pontos
extremos do intervalo de dados – 2000 e 2018 – bem como a variação percentual do total da
dívida nesse período que impende sobre os seres humanos que vivem nos estados-nação
incluidos na ZE. E isso, sem que a situação naqueles países que não são membros da ZE
constitua uma vacina contra o endividamento dos seus povos.
Gráfico 8
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Há notas interessantes a retirar deste gráfico 8:
Em 2000, só em dois países (Luxemburgo e Holanda), a capitação da dívida ultrapassava -
e por pouco - os 100000 €. Atualmente esse número de países passa a nove; isto é, quase
metade… No princípio do século nove países tinham uma dívida por habitante inferior à
média do conjunto (54809 €); atualmente restam quatro;
Em todos os países houve um aumento da dívida global por habitante. Porém, os países
onde os aumentos do endividamento foram mais notórios foram aqueles onde a dívida
era e continua a estar, muito abaixo da média global – Eslováquia, Eslovénia, Estónia,
Letónia e Lituânia;
Excluindo os países citados no ponto anterior, o maior acréscimo da dívida per capita
regista-se na Irlanda, onde o aumento do endividamento empresarial foi enorme, ainda
que suplantado pelo do Luxemburgo. Esta situação deve-se a legislação fiscal e facilidades
dadas às empresas globais para se domiciliarem naqueles países; um tratamento
benevolente que, de modo algum é extensivo às pessoas que vivem na ZE ou mesmo em
toda a UE;
Na Alemanha observa-se o mais baixo crescimento deste indicador porque o decréscimo,
no período, de dívidas das famílias e do Estado, foi mais do que compensado pelo
acréscimo das dívidas empresariais;
Portugal apresenta um crescimento do indicador da dívida média por habitante (113%)
um pouco acima do valor médio da UE (99.8%).
Outra forma de observar o grau de endividamento conjunto dos três elementos socio-
económicos dos países da ZE baseia-se na avaliação da sua dimensão, medida em anos de
rendimento médio (aproximadamente o PIB per capita).
13. grazia.tanta@gmail.com 4/6/2019 13
Gráfico 9
Os cálculos apontam que, para o conjunto da ZE, a não haver renovações e acréscimos à
dívida conjunta, esta desapareceria em 3.1 anos, contra 2.5 calculados para o ano 2000;
Em 2000, as dívidas mais duradouras, no âmbito atrás referido, revelavam-se em Chipre
(3.9 anos), na Holanda (3.7) e na Bélgica (3.1), enquanto as mais reduzidas se situavam na
Letónia (pouco mais de 9 meses) e a Eslovénia e a Letónia (um ano). Recentemente, a
dívida mais pesada mostrou-se no Luxemburgo (5.6 anos), seguindo-se-lhe Chipre (5.2) e
Irlanda (4.5); locais, como já se disse, que funcionam como refúgio de capitais, relapsos a
cargas fiscais elevadas ou como lavandarias;
Luxemburgo e Irlanda são os países onde mais cresceu a relação entre a dívida total e o
PIB. Em sentido contrário, onde o indicador teve maior proximidade entre os dois anos
considerados foi na Eslováquia e na Áustria, onde a variação foi mínima. Um caso especial,
único na ZE, é o da Alemanha, onde o indicador que estamos comentando se reduziu, de
2.5 para 2.3 anos;
O endividamento português, medido em anos de rendimento, em 2000 cifra-se em 2.5, o
valor coincidente com o que reflete todo o conjunto da ZE; porém, em 2018, cifra-se em
3.5 anos, acima da média global (3.1), encontrando-se situações indicadores de uma carga
debitória mais pesada nos casos de Luxemburgo, Bélgica e Holanda que constituem
plataformas logísticas do capital global, como da França e ainda de Chipre e Irlanda que,
como Portugal foram submetidos a intervenções musculadas de “requilíbrio financeiro”.
2.6 - Evolução da divida portuguesa
Tendo como referência a dimensão do PIB, como instrumento de medida das variações da
dívida, observámos dois elementos reveladores da marcha da economia nas duas últimas
14. grazia.tanta@gmail.com 4/6/2019 14
décadas – a evolução do valor do PIB e a das remunerações dos trabalhadores; aí, se observa
facilmente o grupo social mais prejudicado com a evolução da conjuntura política e
económica. Sinteticamente, este gráfico revela o caráter anti-social do actual regime pós-
fascista e o plano em que se vêm desenvolvendo níveis elevados de endividamento.
Gráfico 10
Neste século a dívida do Estado e as dos agregados familiares ou empresariais apresentam um
perfil que separa, claramente, um período pré-troika de um seguinte, pós-troika. Isto é,
2000/12 e 2012/18.
Nesses termos, o rendimento nominal só em 2015 volta a atingir o valor de 2008 ou 2010,
os máximos até então. Em 2010 inicia-se também um período de quebra relativa das
remunerações do trabalho que apenas cessa em 2016, sem que o afastamento em relação
à marcha do produto global, tenha diminuido, antes pelo contrário;
O gráfico seguinte (Gráfico 11) mostra que o peso da dívida, na sua totalidade, acelera até
2012 como resultado, essencialmente da redução do próprio PIB; o que nada tem de
positivo, pois a base de sustentação do pagamento da dívida, dos seus encargos ou, das
condições de vida da população, encolheu. Em 2000 o total da dívida equivalia a cerca de
2,5 vezes o PIB, para evoluir até 4.3 vezes, doze anos depois e regredir para 3.5 vezes no
ano transacto.
No capitalismo avançado, a redução do caudal de endividamento constitui sempre um
sintoma de regressão da atividade económica, do investimento ou da geração de
rendimentos. O capitalismo é, por natureza, um sistema dinâmico, focado no crescimento
infinito do lucro, do PIB, do consumo; e a espiral da dívida alimenta essa dinâmica, de
modo permanente, como condição de sobrevivência, capturando e arrastando os seres
humanos nessa volúpia;
15. grazia.tanta@gmail.com 4/6/2019 15
Dívida Portuguesa (% do PIB) Gráfico 11
A evolução acima espelhada mostra um endividamento crescente para os três segmentos
mas, com momentos de retrocesso distintos. Para as famílias, o máximo do
endividamento, em percentagem do PIB sucede em 2009, regredindo a partir daí, como
reflexo do desemprego, da emigração, da estagnação ou regressão salarial, da perda de
poder de compra e ainda, devido à penúria de capitais no sistema bancário. Este último
foi objeto de uma enorme recomposição com a entrada de € 23800 M de dinheiro
público, reveladora da histórica atuação dos Estados em geral, a favor do capital; e isso
vem, em grande parte, permitindo a sobrevivência do sistema bancário que, na
sequência, tornou a concessão de crédito muito mais parcimoniosa, ao contrário do que
se verificara antes, como ressalta dos actos de gestão danosa e/ou corrupta que ainda se
não conhecem devidamente, mais de dez anos depois da sua concretização;
A retração da divida empresarial, face à evolução do PIB, começa em 2013 e ainda não
cessou, situando-se no último ano ao nível do registado em 2002. Continua, porém a
constituir o mais relevante dos três conjuntos, em termos de dívida;
A dívida pública, que se mantém com um crescimento anual moderado até 2008, explode
no ano seguinte até atingir 130.6% do PIB em 2014, regredindo desde então, porque
entretanto os governos encontraram uma forma eficaz de se financiar, de minorar os
deficits, com menor recurso à dívida – a punção fiscal. Aí se observam as típicas
discriminações sociais (Gráfico 12): os governos oneram o trabalho em detrimento do
empresariato que, como costumam dizer “cria empregos”, por coincidência precários e de
baixo salário, tal como gera desemprego, sem esquecer os trabalhadores obrigados a ser
“empresários”, os ditos “recibos verdes” e os frequentadores habituais da formação dada
pelo IEFP que, muitas vezes é somente um entretenimento (por exemplo, cursos de
16. grazia.tanta@gmail.com 4/6/2019 16
“empreendedorismo no feminino” ou de alemão para pessoas perto da reforma ou com
deficiências de português).
Gráfico 12
A dívida pública inicia o período com níveis de endividamento inferiores a metade da
dívida empresarial, o que deixa de acontecer em 2009, ano do início da sua grande
expansão. Embora quer a dívida pública, quer a privada venham a reduzir a sua dimensão
em termos de percentagem do PIB, a aproximação tem sido paulatina, podendo admitir-
se que o Estado possa assumir o pódio da dívida dentro de poucos anos.
A dívida das famílias sempre foi inferior à das empresas. Na comparação com a dívida
pública, esta última com o seu crescimento, foi-se aproximando da dimensão atingida
pela dívida familiar, com a paridade a ser alcançada em 2012; e, a partir de então, a
subida da relevância da dívida pública remete para o terceiro lugar a dívida familiar, que
reduz claramente o seu peso no produto social.
Como a situação económica em Portugal não apresenta um futuro pujante – à bolha
imobiliário-turística suceder-se-á a ressaca inerente a todas as bolhas – é a divida pública
que se vai mostrando como a mais dinâmica. Por um lado, porque as pequenas poupanças
subscrevem dívida pública para, na melhor das hipóteses, compensarem a inflação; e por
outro, nos leilões de dívida, surgem os especuladores em busca de títulos que possam ser
aceites, de imediato, como garantias pelo BCE, em troca de empréstimos em euros.
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