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No chão da escola:
Acontencências
de
um
universo
apaixonante
ii
Organização
Hellenice Ferreira
Conselho Editorial
Amanda Guerra
Cristina Silveira
José Alexandre da Silva
Marcia Oliveira Ferreira
Marluce Moraes dos Santos
Revisão
Izis da Costa Guimarães de Oliveira
Marcos Vinícius Knupp Barretto
Tiago da Silva Ribeiro
Fotografia da Capa
Everton Barsan
Projeto Gráfico
José Eustáquio de Queiroz Cauper
F441c
Ferreira, Hellenice de Souza, organização.
No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante / vários autores. –
Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias, RJ: H. Ferreira, 2011.
1. Escola. 2. Memória. 3. Professores. 4. Sala dos Professores Mestre Paulo Freire
– Brasil. I. Título.
iii
Prefeito
José Camilo Zito dos Santos Filho
Vice-Prefeito
José Amorelli
Secretaria Municipal de Educação
Roberta Barreto de Oliveira
Subsecretaria de Planejamento Pedagógico
Myrian Medeiros da Silva
Subsecretaria de Gestão de Pessoal
Sônia Pegoral da Silva
Assessoria Especial
Angela Regina Figueiredo Lomeu
Departamento de Educação Básica
Mariângela Monteiro
Coordenadoria de Tecnologias da Informação
José Eustáquio de Queiroz Cauper
Sala dos Professores Mestre Paulo Freire
Hellenice Ferreira
iv
“Não sou apenas objeto da História,
mas seu sujeito igualmente”
Paulo Freire
v
SUMÁRIO
Apresentação ...............................................................................................................vi
No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante......................................1
Escola da minha vida......................................................................................................4
Memória sinestésica......................................................................................................5
Ensino Temperado com Afeto ........................................................................................7
A turma do sonho..........................................................................................................8
Momentos de um dia-a-di@... .......................................................................................9
Tempo, tempo, tempo, tempo .....................................................................................10
Do pátio da escola ao palco da vida..............................................................................12
Educar, um ato de amor...............................................................................................14
Sei onde estou: a história de Salviano, por ele mesmo..................................................16
Questão de tempo.......................................................................................................18
Que surpresa...!!!! .......................................................................................................19
As pequenas histórias que mudaram tudo ...................................................................20
Esquecimento..............................................................................................................23
A árvore de Músicas ....................................................................................................24
A menina que despertou para o universo mágico da leitura .........................................25
Santo de casa faz ou não faz milagre? ..........................................................................28
Legalização: mais do que um ato legal..........................................................................30
Mãe Coragem ..............................................................................................................31
Uma nova chance ........................................................................................................33
No chão da escola........................................................................................................35
Chão de escola.............................................................................................................37
Mediar, ação literária de amor.....................................................................................38
Crianças.......................................................................................................................40
Chão da Escola.............................................................................................................41
Uma flor no Jardim Gramacho .....................................................................................42
Construindo um futuro ................................................................................................44
Pó de Giz .....................................................................................................................46
Mosaico chão de escola ...............................................................................................47
vi
Apresentação
Através da educação, deparamo-nos com novas e inusitadas possibilidades de ver o
mundo e, consequentemente, atuar nele. Um dos conceitos de educação inovadora e de
qualidade é o que destaca a capacidade que o professor tem de ser eterno aprendiz e
pesquisador, reconstruindo-se, moldando-se e emoldurando-se, na rapidez das transformações
conceituais.
Já sabemos que o professor é um gestor da sua turma, dos grupos, dos conteúdos, da
disciplina. É ele o gestor do chão da sala de aula, dos passos dos estudantes e dos aparatos que
enriquecerão os seus saberes.
Ao fazer a gestão de sua aula, o professor é capaz de tomar várias decisões. Muitas delas
são pautadas em estudos, pesquisas e leituras, oferecendo resultados mais significativos no
desempenho dos seus alunos. Destaca-se, ainda, o fato de que o estímulo ao confronto de
opiniões, à prática de contextualização e à integração de conhecimentos múltiplos do processo
decisório cria um ambiente apropriado para o aprendizado contínuo.
De fato, não se constrói essa inovação educacional sem alianças, pois muitas vezes a
escola não dispõe de toda a estrutura necessária para motivar o professor. Assim, ambientes
fortalecedores e que propiciam novas oportunidades e criatividade para o professor, tais como
a Sala dos Professores – Paulo Freire, da Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias,
renovam formatos essenciais para o crescimento e para soluções inteligentes, no âmbito da
qualificação profissional.
Hoje, espaços como esse são um pilar imprescindível para bons resultados da união
entre gestão, professor e alunos. A decisão de frequentar e de estruturar esse cenário é apenas
do professor. A decisão de manter um pedacinho do chão da escola no dia-a-dia da
administração é uma “acontecência” coletiva e uma vitória de todos nós.
Roberta Barreto
Secretária de Educação de Duque de Caxias
No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante
Está quase na hora. Sei que, muito em breve, serei passarela para muitos atores mirins
que por mim passarão com um uníssono objetivo: a instigante busca por conhecimentos
diferentes dos que são aprendidos em outros chãos: o da rua, o de casa, o da pracinha, o do
comércio local, o das casas de familiares e de vizinhos. Enfim, espaços por onde esses
protagonistas circulam e onde aprendem diversas informações que lhes são também úteis no
decorrer de suas caminhadas como cidadãos.
Entretanto, antes da chegada desses personagens tão aguardados por todos que fazem
parte do universo escolar, há toda uma preparação para recebê-los: limpeza (passam-me panos
e até cera para que eu fique brilhante e cheiroso. E devo confessar que adoro esses mimos
feitos pelos profissionais da limpeza! Ah, como é bom sentir a vassoura massageando-me
todo!), organização das carteiras (às vezes, acho que me arranham em demasia) ou,
dependendo da sala, das mesas que serão instrumentos essenciais para a execução das tarefas
propostas por um ator não menos importante: o professor. E lá vem ele, passos firmes,
sincronizados, à espera de dar início a mais uma série de passos que levarão seus discípulos ao
crescimento intelectual. É interessante sentir a desenvoltura desses profissionais que – por
vezes – se emocionam e também se aborrecem com a atitude de certos atores que ainda não
descobriram a importância de sobre mim estarem. Sim, é terrível narrar quantas vezes sou
arranhado, maltratado, pisado com brutalidade por aqueles que ainda não perceberam que
estão em um palco onde têm a chance de errar; já que, em outros chãos, normalmente o erro
implica demissão, punição – enfim – chateação.
Confesso que me sinto deveras importante, uma vez que sobre mim passaram vultosas
personagens. Percebo que isso me sensibiliza. Afinal profissionais de todas as áreas têm de
(devo usar DE quando houver o intuito de marcar obrigatoriedade. Aprendi – certo dia – na aula
de Português, ou você pensa que fico à toa o dia inteiro?) frequentar uma escola e por mim
desfilar. Sei que você estranhou minha nota de tom pessoal feita há pouco, mas saiba que
presto bastante atenção e que – nesses anos – em que sirvo de passarela a todos – também
acumulo conhecimento. Às vezes, divirto-me com a angústia de alguns alunos que – ao fazerem
avaliações – pelas diversas batidas em mim, feitas pelos tênis – sinalizam o nervosismo que
estão sentindo. Ah, se eu pudesse ajudá-los!!! Mas também daria uma boa bronca nesses, já
que – no momento em que a professora estava explicando e com a turma construindo o
conhecimento – aquele nervosinho simplesmente ignorava a tudo e a todos por estar dando
batidinhas com os pés ao lembrar de uma música de que tanto gosta. (Isso é só um dos motivos
que levam muitos a perderem momentos, considerados por mim, imperdíveis!) Veja se o
resultado disso será bom! Não há como acertar mesmo qualquer questão!
Não posso aqui deixar de relatar também os passos de outros que demonstram, pela
segurança no andar, que dirigem com sabedoria e com firmeza a escola: o diretor, figura que – ao
2
caminhar em direção à sala de aula – transforma a postura de grande parte do corpo discente.
Falo grande parte, pois sempre existem aqueles que – mesmo sabendo da importância de ter uma
postura de respeito na escola – teimam em fazer estripulias, que levam a repreensões necessárias
para se manter o espaço escolar disciplinado.
Como me emociono à toa, caro leitor! Também o que não faltam são cenas dignas de
Hollywood. Certo dia, caminhava sobre mim – com muita dificuldade de locomoção – uma linda
menininha. Pelo tamanho de seu pequenino par de tênis, deveria ter – no máximo – sete anos.
Mas apesar de sua dificuldade, seus passinhos me passavam uma vontade e um orgulho em
poder estar pisando o chão da escola, já que – se não fosse o trabalho em conjunto de pessoas
tão interessadas em fazer com que cada brasileirinho saiba o que é ser cidadão – por mim, essa
artista mirim não teria como circular. E captar a energia boa que dela saía e a emoção de pisar-
me pela primeira vez – são cenas que muito me fazem ter orgulho de ser um chão escolar. Mas
não é só isso, há poucos dias – também recebi um aluno especial. A princípio, estranhei o fato
de não sentir seus passos, apenas pneus de uma novinha cadeira de rodas. Depois inferi
(sinônimo de concluir. Já lhe disse, caro leitor, que fico atento às aulas, principalmente de
Português, que é ministrada por uma professora cujos sapatos são enormes! Parece calçar 40!!!
Percebo que é uma mulher grande e forte, mas com uma suavidade e com um carinho com seus
pequenos que me cativa. Acho que estou apaixonado...). Não é muita emoção para um já velho
e gasto chão, minha gente? Não há palavras que consigam dar conta do que senti e do orgulho
que tive ao saber da chegada de alunos inclusivos, que têm o direito, como qualquer outra
criança ou jovem, mas que – sem essa cadeira – ficavam impossibilitados de por mim passar.
Mas isso é passado na história deles, e o que importa é saber que diariamente aquelas rodinhas
circularão freneticamente a caminho da sala de aula, também com uma rampa de acesso (feita
de um primo meu, que veio especialmente para fazer junto a mim um chão que sirva a todos e
onde não haja exclusão) preparada para a livre circulação desses especiais alunos!
Como resolvi me abrir e tive essa chance pela qual muito estou grato, afinal não é sempre
que um simples (isso só para os que não veem em mim a beleza e a importância que tenho) chão
tem a oportunidade de falar tudo o que sente por ser parte integrante desse essencial momento de
vida de qualquer cidadão: ser aluno. Aproveito também para contar que, ao final de um turno, fico
muito deprimido, já que sobre mim jazem pontas de lápis, bolinhas de papel (coitadas das árvores!
Ouço professores que dizem: “Meninos, não arranquem folhas à toa, usem o corretivo.”
Infelizmente, poucos estudantes lhes dão ouvidos e preferem fazer de mim um mar de lixo!) Isso
tudo acontece – bem sei – apesar das constantes conversas que acontecem logo no início do ano,
momento em que o regimento escolar é passado a todos pela equipe diretiva da escola. Só que há
alunos que parecem não ter ouvido nada do que foi dito, ou apenas não veem problema algum em
sujar-me.
Ainda bem que não é só de tristeza que me alimento, visto que todos os profissionais
que são importantes na vida das pessoas (médico, assistente social, psicólogo, professor,
3
políticos) por mim desfilaram e disso sinto-me honrado. Não sei, mas minha afinada percepção
já demonstrava que aqueles passinhos de criança se transformariam em passos importantes
para o futuro e para o desenvolvimento de nosso país. (Estou sentindo as lágrimas escorrerem...
É melhor parar de pensar nisso; já que aprendi, na aula de Ciências, que devemos controlar as
emoções e que, quanto maior a idade, maiores as chances de termos um enfarte!). Prefiro não
citar nomes desses alunos também especiais para não deixar ninguém de fora da enorme lista;
mas basta você, caro leitor, pensar que todos – independentemente da função que exerçam ou
que já tenham exercido fizeram jus aos assíduos passos que deram no decorrer de sua
caminhada diária por mim, velho e gasto chão da escola.
Já está na hora de terminar minhas anotações, já que tenho de me preparar para
recepcionar mais um imenso grupo de alunos que chegarão ansiosos e curiosos para me
explorar. Falo isso; pois – depois que me conhecerão como um todo – muitos até por mim
rolarão (brincadeiras de que muito gosto, pois é um momento em que mais próximo a eles fico
e que posso abraçá-los e senti-los mais perto de mim!) e mais tarde – quando afastados da
escola estiverem, lembrar-se-ão (é mais um uso que devo àquela professora de Português....)
dos mágicos tempos de escola e de tudo por que passaram nela...
Bom, caro leitor, diante desse emocionante texto feito por mim, um tão ignorado chão
de escola, só me resta concluir o seguinte: sou um chão escolar e orgulho-me muito de sê-lo.
Sim é essa a minha simples, todavia apaixonante conclusão! E, como não poderia deixar de
agradecer, sou grato a todos que – de alguma forma – zelaram pela minha manutenção e pela
limpeza de meu corpo tão gasto pelas pisadelas de muitos que de mim nem se lembrarão, mas
que terão belíssimas histórias para relatar desses saudosos tempos de escola! Peço apenas, que
– a partir dessa leitura – todos que por mim circularem retirem um tempo – nem que seja um
segundo – para me contemplar como parte integrante do incrível, emocionante e apaixonante
universo escolar!
Fernanda Lessa Pereira
Divisão de Educação Infantojuvenil – Língua Portuguesa
4
Escola da minha vida
Ao ouvir certos discursos sobre a necessidade de tornar a escola um espaço prazeroso,
volto ao tempo e perco-me em minhas reminiscências, pois nunca vivi a escola de uma forma
que não fosse prazerosa. Penso, com certa nostalgia, nos espaços e pessoas e, em todas as
situações vivenciadas, com muita euforia e dinamismo: os recreios e horas vagas, envolvidas
pelos jogos de queimado, pique bandeira, garrafão, elástico... E o despertar para literatura.
Ah, os livros! A fantasia de histórias como: “A Ilha Perdida”, “Cachorrinho Samba”, “O Menino
do Dedo Verde” e, como esquecer, os suspenses de Agatha Christie... As rodinhas de conversa
com os professores e o exercício constante de nossa criatividade: fazíamos teatro, dança,
festivais de música. Tantas as performances! Éramos envolvidos pelas mais diversas
linguagens artísticas. E o envolvimento com o Grêmio Estudantil, as reuniões de
representantes de turma, o despertar do ser político e da consciência da necessidade do
envolvimento nos movimentos que cercavam o nosso Universo.
Caminhávamos confiantes, certos do pertencimento aquele espaço.
Muito do entusiasmo e da eterna certeza de que a escola é o espaço da diferença em
nossas vidas vem desta escola impressa em mim. Registros de um tempo de vivências
significativas e, acima de tudo, prazerosas, que ainda hoje endossam minhas ações e
posicionamentos ao pensar, planejar e realizar em relação à esta Instituição.
Roseli Ramos Duarte Fernandes
Secretária de Educação (06/2010 a 07/2011)
Atual Secretária de Ação Social
5
Memória sinestésica
Tudo era muito estranho, novo e intrigante. Sonhara com aquele momento por diversas
noites desde que minha mãe falara que eu iria estudar. Meu irmão já estava estudando e eu
desejava isto mais que tudo.
Havia muita gente na calçada em frente da escola: crianças, pais, bicicletas, tudo que
hoje ainda existe. Mas lá na porta da sala havia uma mulher que hoje não está mais lá, Dona
Maria.
Era uma mulher não muito alta nem muito baixa que usava um jaleco branquinho, muito
comprido. Seus cabelos vermelhos, que depois descobrimos que era pintado, mas não deixava
de ser bonito, não apresentava um fio fora do lugar. Seu rosto, humm... tinha um cheiro bom de
pó de arroz. A boca, esta era muito diferente, era um leve e fino traço de batom no rosto; olhos
claros e com um brilho que me perdia na tomada de lição. Sinto seu perfume até hoje: Madeiras
do Oriente – vendia na farmácia, minha mãe também usava, havia dois palitinhos amarrados
dentro do vidro, eu ficava balançando o vidro horas para vê-los descer lentamente até o fundo
do vidro.
Mas ela não era a única. Havia outras, muito, mas muito atentas às bagunças que
fazíamos. Havia duas que não posso e não quero nunca esquecer o cheiro e os rostos, Dona
Paulina e Dona Arlete. Dona Paulina era uma negra não mais jovem, mas cheia de disposição.
Tinha um jeito mineiro de falar, olhar terno que aquecia quem olhasse. Dona Arlete tinha um
jeitão meio portuguesa, falava alto, mas não deixava de ser terna conosco. Tinha braços fortes,
mãos grandes e dedos gordinhos, muito branquinhos. Elas usavam lenços amarrados na cabeça,
igualzinho quando minha mãe fazia touca no cabelo, mas elas não estavam de touca. Eram as
merendeiras. Nossa, que cheiro gostoso vinha daquela pequena cozinha... Quando chegávamos
para pegar nossos pratos, elas nos serviam com um sorriso nos lábios e uma frase milhões de
vezes repetidas... Cuidado! Está quente!
Ah! Como eu gostava do macarrão com salsicha, da sopa... era tudo novidade; era tudo
como devia ser. Colorido, cheiroso e alegre.
Lembro-me das paredes da sala de aula emprestada – sim, emprestada, já que a escola
funcionava em um prédio cedido pelo Centro Espírita Thiago Apóstolo, que também era o nome
da escola: Escola Municipal Thiago Apóstolo. Era um grande salão dividido por biombos de
madeira em três partes. O telhado de telha de barro ficava tão longe que parecia o céu. As
janelas eram altas e as paredes eram grossas, mas mesmo assim os meninos viviam pulando pra
dentro e para fora quando a professora se distraía.
Havia uma grande mesa com muitos bancos a sua volta e muitos, mas muitos cartazes com
abelhinha, dado, escova, mapas, esqueletos humanos, muitas imagens, sons...
6
Eu gostava de desenhar. Era mágico falar com o papel e ver sair dele esqueletinhos, se
mexendo e falando comigo. Jardins floridos, casas no topo de colinas, nuvens em um céu muito
azul.
A diretora tinha cheiro de jardim, parecia uma atriz de novela, todas, todas pareciam ter
saído de uma página da revista.
Gostava de ver a bagunça que as letras faziam no papel e de tentar entender como era
possível realizar uma divisão tão grande. E pra que dividir se o que eu queria era ficar com todas
as bolinhas de gude.
Em julho era a quadrilha. O ensaio era no terreno baldio próximo da escola. Ele tinha
sido aterrado recentemente, e o barro era bem vermelho, a poeira subia e ficávamos com as
meias da cor da terra.
No dia da festa, meu pai se vestiu a caráter, calça jeans e chapéu de palha; minha mãe
preparou um bolo do norte, aquele de massa puba. Tudo muito enfeitado com pindoba e
bandeirinhas que nós mesmos fizemos.
As prendas... era muito engraçado na pescaria pegar de volta o seu trabalho de
artes...
Tudo tinha cheiro, cor, sabor, tudo era como deveria ser, alegre e novo, tudo.
Todos os anos minha mãe me fazia bordar um tapete de juta com lã em ponto cruz, para
dar de presente no dia do professor.
Mas, no dia das mães, os mais levados eram escolhidos para apresentar versinhos,
cantar músicas, assim como hoje, mas era diferente. Eu chorava todas as vezes que ia recitar o
versinho que tanto ensaiei... eu não sabia porque chorava, até hoje não sei por quê!!!
Ah, quase me esqueci. Por várias vezes soldados iam à escola e faziam perguntas
engraçadas, que eu não sabia como responder: Quem de vinte e cinco tira? E na verdade ele
queria dizer: Quem de vinte, cinco tira, fica com?
Quinze! Quinze era a resposta. Outras vezes iam com médicos, vacinas. Puxa... meu
braço tem a marca até hoje!
E então veio a quinta série. Lá não podíamos mais ficar. Deveríamos fazer o curso de
férias no Fluminense, e a prova do Aquino. Era outro universo, participar da banda marcial, dos
desfiles cívicos, queimada na praça da igreja... Tudo tinha cheiro, cor, sabor. Tudo era como
deveria ser: alegre e novo, tudo...
Lavínia Dolores da Costa
Coordenadoria de Nutrição Escolar
7
Ensino Temperado com Afeto
Quando minha mãe separou-se de meu pai, fui enviada para casa de minha tia, que morava no
Espírito Santo. Um lugar estranho para mim, com uma família desconhecida. Eu tinha apenas 5 anos e
encontrei lá mais duas crianças. Eu era a mais velha do grupo. Logo depois, nos mudamos para
Marapé, distrito de Cachoeira do Itapemirim, e lá chegaram mais 4 crianças. Eu teria que lavar, passar,
cozinhar para todos, num total de 7 crianças, contando comigo. Mas, nesse lugar, já na terceira série,
encontrei uma professora que fez a diferença em minha vida. Vivendo nos dias de hoje posso
perceber que ela tinha visão futurista.
Eu estudava à tarde, quando ouvia a sirene tocar para saída do turno da manhã às 12h. Corria
para o rio, tomava banho, colocava o uniforme, do qual me lembro até hoje: saia vermelha
pregueada, blusa de pano de saco, esse que utilizamos como pano de chão, e uma gravata vermelha;
o cabelo ficava para cima. Sapato não tinha, ia descalço mesmo. Às vezes não dava tempo de tomar
banho, aí eu ia assim mesmo e a professora não se importava com o cheiro de xixi, que fazia todos os
dias na cama. Acho que era ansiedade. Para ela isso não significava nada, pois o mais importante era
não faltar aula. O caderno era apenas um. O livro chamava-se meu tesouro e continha todas as
matérias. Era bem grosso e ficava na escola, já que passava de um para o outro a cada ano.
Me lembro dela nitidamente: era alta de pele clara, cabelo pretos, óculos quadrados, grandes
e pretos. Era filha de fazendeiros, não tinha salário, mas estava além de seu tempo. Em apenas quatro
horas de trabalho por dia, ensinava tudo, até mesmo tabuada com premiação, além de ensinar a
cuidar da horta de onde tirávamos a merenda escolar, da qual sinto o gosto até hoje. Tínhamos um
caderno de dedicatória, que ela deu um para cada aluno. Nele, escrevíamos poesias e dedicatórias
para os colegas em casa. Eles transitavam na sala de aula o tempo todo. Lia histórias, fazia brinquedos
cantados e folclóricos conosco num campo de futebol próximo à escola e, nos últimos meses de aula,
dava para cada aluno um poema bem grande para decorarmos no dia de encerramento das aulas.
Nesse dia, íamos sem uniforme com nossa melhor roupa, subíamos na cadeira para declamar e todos
da classe aplaudiam. Ela ainda arranjava tempo para desenhar no canto das folhas de nossos cadernos
e, no final da aula, nos oferecia toquinhos de giz. Em casa, dava aula para as crianças de sabugos de
milho feitos por mim nas horas vagas. Eu sentia muita falta da minha mãe, mas o carinho dela me
fazia sonhar. Sonhar em ser professora. Passei pelas mãos de centenas de professores, muitos
esquecidos, mas ela marcou minha infância e guardo até hoje o nome dela: Genilda Cabelini. Em
minha trajetória educacional e de vida, a tenho como exemplo.
Preciso parar por aqui, pois senão escreverei um livro sobre esse tempo. Acho que meu
talento para arte trouxe de lá. Ela viverá em minhas lembranças para sempre e, onde quer que
ela esteja, tenho a certeza que está feliz, pois seu esforço foi recompensado. Até hoje tenho
meu caderno de dedicatória guardado.
Cleuza Maria Daniel de Souza – Equipe de Cerimonial e Eventos
8
A turma do sonho
A turma era 801B, classificada pelos professores como a “turma do agito”. Éramos todos
amigos dentro da escola e fora dela, pois morávamos no mesmo bairro. O pátio da nossa escola
era muito pequeno. Devido a isso, na hora do recreio, a diretora autorizava somente as turmas da
oitava série a irem à praça, que ficava em frente à escola. Isso era para nós como um prêmio, por
isso todos os alunos da escola, inclusive o jardim de infância, queriam chegar logo à oitava série.
Lá na praça, nós brincávamos de balanço, jogávamos bola, vôlei, mas o que nós mais
gostávamos era ficar conversando com o “Tião”. Ele era um morador de rua muito conhecido
por todos. A vizinhança cuidava dele, dando comida, roupas e tudo que ele precisasse. O Tião
era muito engraçado e sempre contava umas histórias sem pé nem cabeça, que a turma
adorava ficar ouvindo na hora do recreio.
Todos os dias cada um era responsável por comprar um sonho na padaria para o Tião, porque
o Tião só contava as histórias depois de comer o sonho. Quando acabava o recreio, nós voltávamos
para a escola e o Tião era nosso guardião: levava a turma toda até ao portão da escola, dava um
tchauzinho e abria aquela boca sem dente num sorriso que nos fazia rir mais ainda.
Até que um dia, o sinal do recreio bateu, corremos para a praça, e o Tião não estava lá.
Procuramos, procuramos, procuramos em todos os lugares. Perguntamos aos moradores se eles
tinham visto o Tião. E nada.
Antes de o sinal bater avisando que o recreio tinha acabado, voltamos para a sala de
aula. A diretora, Dona Estela, estranhou, pois todos os dias ia lá na praça buscar a gente, porque
fingíamos não ouvir o sinal comunicando o término do recreio. E assim passaram-se duas
semanas. E o Tião não aparecia.
O recreio não tinha a menor graça, a praça vazia. E ninguém tinha coragem de comer um
sonho da padaria. Os professores também estranharam, porque pela primeira vez a turma 801B
ficou caladinha nas aulas e nem uma confusão surgiu neste período. Foi então que durante a
aula da Dona Marly, professora de matemática, ouvimos uma gritaria lá na rua. Alguém batendo
no portão, gritando: “Sonho, sonho, sonho.”
Corremos para olhar na janela que dava de frente para a rua. Para a nossa surpresa era o
Tião. Saímos da sala correndo, cada um mais rápido que o outro. Quando chegamos ao portão,
o Tião falou assim: “Quero o meu sonho e com doce de leite”
Foi a maior felicidade. Nós abraçamos o Tião e o levamos para a nossa sala de aula. Nesse dia a
Dona Estela autorizou que ele assistisse à aula junto com a turma. Quando o sinal bateu corremos
para a padaria e cada um comprou um sonho pro Tião. Foi o melhor recreio das nossas vidas.
Cristina das Graças Ferreira Vianna
Equipe de Leitura
9
Momentos de um dia-a-di@...
Era um dia comum, como outro qualquer... Muitos afazeres, atividades normais de todos
os dias: ler emails, twittar, verificar agenda no docs, corrigir textos, fazer algumas ligações... Por
volta de 13h30, antes de sair pra almoçar, lembrei de ligar para casa e verificar como estavam as
coisas por lá. Minha querida mãe, com todo aquele carinho de sempre, me responde que está
tudo bem (mesmo ouvindo o bagunça dos meus filhos na casa). As crianças já chegaram da
escola, almoçaram e estão assistindo aos desenhos na televisão.
Desliguei o celular, já com saudade daquele barulhinho, e lembrei-me de quando eu tinha a
idade deles, de como era bom chegar da escola e contar as aventuras de uma manhã. E eram muitas...
A escola era um lugar de muita magia, muitos segredos, muitos medos. Era realmente
uma montanha-russa pra mim, mas eu amava aquilo tudo! Até porque eu era muito só, filha
única e cheia de imaginação... Lembrei-me de quando, nas manhãs de verão, ia me arrumar
para estudar. Minha casa tinha um quintal enorme, cheio de árvores e muitas plantas. O sol
entrava na casa junto a uma brisa delicada, que trazia o cheirinho do mato molhado do sereno
noturno. Eu tomava um copo de café com leite, mais leite do que café, uniformizada e ansiosa,
com os olhos atentos no relógio da vovó que ficava na cristaleira.
O sinal tocava e já estava na fila para a forma matinal... “Firme, cobrir, firme... rssss.
Nossa, parecia um quartel, mas a gente se divertia assim mesmo. Fazíamos barulho com os
braços e sempre pesávamos nossa mão no ombro do colega da frente, às vezes até fazíamos
cócegas... O Hino Nacional brasileiro era sempre cantado com muita emoção, e depois íamos
pra sala de aula.
Os professores eram parceiros de momentos únicos, como o de ensinar o plantio de
amêndoas em Técnicas Agrícolas; nos apresentar a arte e a Música com um concerto no Teatro
Municipal; aprender geometria medindo a quadra da escola; conjugar os verbos escrevendo
uma novelinha do jornal da escola. Tudo era ligado e interligado, era tudo junto e misturado e o
mais legal disso tudo: a gente aprendia!!!
O celular toca novamente. Era do trabalho. Precisava voltar para a SME, pois tinha um
professor precisando do auxílio da tecnologia e me esperava para atendê-lo. Volto para o
trabalho e ouço no caminho um som de sirene... Paro no sinal vermelho do trânsito engarrafado
e procuro a escola. Será o sinal da entrada? Será que ainda estou em meus pensamentos e não
acordei? Vejo uma ambulância passando na rua correndo... É... que pena, acordei. E volto para a
realidade de sempre: correria, e-mails, TV’s, DVD’s, notebooks, projetores. Mas feliz, muito feliz
com meu trabalho, meus amigos, minha vida!
Alexsandra Rosas dos Santos Azevedo
Coordenadoria de Tecnologias da Informação e da Comunicação –
Núcleo Tecnológico Educacional Municipal
10
Tempo, tempo, tempo, tempo
Estou a dois dias do recesso do mês de julho. Estava ansioso por esta parada tão
benéfica para nós, professores. Tempo de recarregar as baterias, refletir sobre os projetos,
rever rumos. Tempo de dar um tempo! Aproveito este intervalo para esvaziar as gavetas (meu
Deus, quanto papel!) e ouvir alguns CDs esquecidos na estante por conta do corre-corre do
cotidiano. Ouço as melodias de Cartola, Nana, Benito Di Paula (meu Deus, nem sabia que tinha
um CD do Benito!), Lenine, Roberta Sá... No momento, com o rádio ligado, Vanusa me diz que
“que hoje eu vou mudar, jogar fora sentimentos e ressentimentos tolos!” Escuto e acho que ela
tem razão. Pra que acumular tanta coisa? Prossigo esvaziando as gavetas e acreditando que a
vida ficará um pouco mais leve no segundo semestre.
Encontro, em meio aos papéis, muitas fotos antigas. Algumas, rasgo com veemência...
sentimentos e ressentimentos tolos. Outras, acaricio. Observo a simplicidade dos olhares, a
vulnerabilidade da vida, a inexperiência dos começos. Encontro uma foto antiga de uma turma
que tive. Paro por um instante. Volto no tempo e tento recordar o nome de cada criança que
sorri naquele registro. Meu Deus, essa foi a turma mais difícil que tive. Foi com ela que aprendi
a ser professor! Recordo-me que todo dia que ia começar a aula eu tinha que desarmá-los
primeiro:
– Coloquem as armas aqui!
E lá vinham para cima da minha mesa pedaços de canivete, ripas de bambu, soco inglês,
espelho quebrado. Quando eu ousava fazer algum passeio com eles era dor de cabeça na certa.
Iam cuspindo da janela do ônibus nas pessoas que passavam na rua da saída da escola até o
destino derradeiro. Eu voltava para casa chorando escondido dentro do ônibus me prometendo
que se eu conseguisse chegar vivo até o fim do ano, eu daria uma grande festa em
comemoração. Era uma turma tão barulhenta que eu já estava fazendo “xxxiiiii” até para papel
alumínio em casa. Como estratégia de sobrevivência, resolvi adotar o método do “Só por hoje”
dos Alcoólicos Anônimos. Fiz uma lista com regras básicas do tipo: não xingar, não matar, não
cobiçar a mulher do próximo e enumerei cada uma. No início da aula eu sorteava um número
que teria que ser vivenciado naquele dia: só por hoje. Eu sei que era só uma regra, mas se
naquele dia eles não xingassem, por exemplo, já seria um alívio.
Um dia começaram os preparativos para uma festa que aconteceria na escola e todas as
turmas teriam que apresentar uma coreografia. Começava ali o meu tormento! Querendo ser
democrático para parecer um professor “sangue bom”, pedi para os alunos trazerem músicas
para ensaiarmos. Pra que? Surgiram um monte de CDs piratas com aqueles funks mais
cabeludos de corar até os MCs da Furacão 2000. Depois de ouvir muitas pérolas da MPB para
garimpar algo que pelo menos não enfartasse a diretora, encontrei uma música do DJ Malboro
que lá no finalzinho dizia: chega de tristeza! Pronto! Era aquela! Agarrei aquela música como se
fosse o último bote do Titanic e fui para o ensaio. No dia da festa apresentamos. Fomos
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execrados! Alguns membros da comunidade acharam um absurdo eu ter colocado em evidência
na festa, alunos que tinham um péssimo comportamento. Naquele dia chorei um pouco mais no
ônibus. Tinha vontade de desistir, mas como já nos disse Chico Buarque: “meio-dia eu só penso
em dizer não. Depois penso na vida pra levar e me calo com a boca de feijão”. E assim eu fiz.
A partir dali comecei a levar para a escola alguns CDs que eu tinha. Quando eu dava
alguma tarefa para os alunos sempre colocava uma música suave de fundo. Músicas clássicas,
MPB, trilhas sonoras. Parecia que isto não fazia a mínima diferença. Um dia resolvi não colocar
mais as músicas durante as atividades, deixando apenas como fundo musical a balbúrdia
peculiar de cada dia. Um aluno se aproximou e perguntou timidamente:
– Hoje não tem música, professor?
Foi então que percebi que estava fazendo efeito. Quando fomos a uma apresentação
musical dos alunos da Escola de Música do Zeca Pagodinho, ouvimos “Aquarela do Brasil”
orquestrada. Um aluno veio me perguntar:
– Professor, é “Aquarela do Brasil”?
E eu, todo orgulho disse:
– É, sim.
No fim do ano, na Festa da Primavera, a minha turma dançou um bolero: “Solamente
uma vez”. As meninas de vestidos longos e os meninos com as gravatas emboladas no pescoço
num bailado sensível sob os olhares perplexos da plateia presente. Tudo isso por causa de
quem? Do Flávio? Não, do tempo. Aprendi que algumas respostas só o tempo pode dar. A foto
na minha mão me recordou algo que havia esquecido: estou em construção! Sem muitas
respostas, mas cada vez mais ávido pelas perguntas. Respeitando meus limites e oportunizando
algumas sementes. Olho a foto e tento por um momento imaginar o destino que cada aluno
tomou. Será que ainda lembram daquela loucura do “só por hoje!”? Tomara que sim. Tomara
que estejam ainda aplicando nas suas vidas, mas agora com novas regras embaladas pelas
muitas melodias que vivenciaram. Só por hoje serei feliz, só por hoje vou acreditar nos meus
sonhos, só por hoje ajudarei alguém a se reconhecer como gente, só por hoje vou sorrir, só por
hoje vou reservar um tempo para meus amigos e familiares, só por hoje, só por hoje...
solamente una vez!
Um barulho no rádio interrompe a música e desperta meus pensamentos. Minha filha
Helena trocou o CD. Agora, Pe. Fábio de Melo recita um poema que diz: “eu, sacerdote das
divinas causas. Ele, o tempo, sacerdote das humanas razões”. Acho que a vida é mesmo assim.
Flávio Valadares
E.M. Oswaldo Aranha
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Do pátio da escola ao palco da vida
A leitura está no ar há muito tempo na nossa unidade escolar. Nossas andanças por
esse mágico universo tem nos levado a momentos especiais recheados de risos, choros,
medos, sonhos... Ah! Os Sonhos! Como é bom tê-los e vivê-los. Sonhos movem ações, e
ações tornam-se realidade. Por tal motivo, lendo, relendo e representando juntos, já
sonhamos e vivemos muitas personagens. Com os pés no chão (literalmente), mas com
todos os apetrechos como manda o figurino, sempre fizemos e fazemos “acontecer”.
Por meio do teatro, que nada mais é que leitura em movimento, transformações
reais ocorrem: alunos mais responsáveis, mais parceiros, mais disciplinados, mais LEITORES!
Até mesmo aqueles mais inibidos são contagiados e motivados a deixar a timidez de lado
para viver sonhos!
Tenho convivido e me encantado por meninos e meninas que têm demonstrado
alegria e satisfação em realizar algo que acreditamos valer a pena. E como tem sido válido
cada sorriso, cada conquista, cada superação. Os que concluem o ensino fundamental, na
hora de partir, deixam muitas marcas e histórias inesquecíveis (que me emocionam só em
pensar). É, os que se tornam “ex” deixam saudades e, certamente, as têm também.
Contudo, como se diz, o mundo é pequeno e, às vezes, reencontramo-nos com fortes
abraços e belas lembranças.
Dia desses, uma das minhas estrelas apareceu ao vivo para me ver! Morando no
Canadá, falando inglês fluente, ela me deixou muito orgulhosa da sua vida por lá e por não
ter esquecido que um dia fez parte do grupo de teatro da escola e o quanto isso lhe fez bem
em vários aspectos.
Soube ainda que alguns já são pais e mães de família e a maioria, quem diria,
professores!
Em 2010, quando fomos fazer uma apresentação no Teatro Raul Cortez – como é
bom proporcionar aos meninos esse momento tão sublime que é o de pisar num palco de
verdade –, enquanto passávamos para o camarim, vi, na sala da administração, um rosto
conhecido. Porém, com toda a movimentação da apresentação, não consegui lembrar de
onde! Até que aquela moça bonita, educada, bem vestida veio até mim: – Oi, professora!
Lembra-se de mim?! Eu fui sua aluna de teatro. Nossa! Aí veio tudo a minha memória... e
que alegria! Alegria por vê-la bem, trabalhando (e olha só, no teatro), cursando faculdade
de Comunicação.
É muito gratificante ver minhas estrelinhas participando de algo que vão levar para
sempre em seus acervos pessoais, a ser recordado com satisfação e saudade. Um conjunto
de aprendizado que vão impulsioná-los para futuras conquistas. Alguns saem até dizendo
que ainda vou vê-los atuando como artistas! Torço, torço para que realmente sejam bons
profissionais, independente da área em que venham atuar. Torço para que sejam felizes e
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que façam a diferença por onde passarem. Que sejam sempre ESTRELAS, refletindo boas
ações e transformações no palco da vida real.
E assim seguimos em frente, “teatrando” daqui e dali, mesmo que descalços no chão
da escola, mas flutuando em sonhos e esperanças de que, na vida, o mais importante não é
a situação em que nos encontramos, e sim o rumo que damos a ela.
Izabel Cristina dos Santos Alvarenga Lopes
E.M. Nossa Senhora do Pilar
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Educar, um ato de amor
“O noturno é daqueles que, apesar de estarem
à margem, nunca perderam a esperança de
voltar ao mar”.
Assim, num momento de reflexão, defini a Educação de Jovens e Adultos, minha paixão
dentro do Universo da Educação. Um lugar onde me descobri mestre pela possibilidade de
aprender a me colocar no lugar de aprendiz. A emoção me toma ao falar desta construção.
Quem me conhece e acompanhou minha trajetória junto a este segmento sabe do que falo e do
sentimento que envolve meu discurso.
De toda esta história, não posso me furtar a registrar neste espaço um dos episódios
mais significativos de minha caminhada profissional. Lembro-me de que não só a necessidade
de melhor organizar meu tempo, mas também a frustração na realização de um trabalho, que
me parecia um perfeito desastre, levaram-me a um concurso de remoção, e a uma
oportunidade de trabalhar à noite, num ensino supletivo, que transitava para um então ensino
regular noturno.
O nome da Unidade Escolar, Escola Municipal Todos os Santos, era sugestivo para quem
tinha as pernas, e também o corpo todo trêmulo diante desse novo desafio.
Ao entrar na secretaria e me apresentar, fui focada por olhares descrentes, diante da
minha meninice, nos meus vinte anos, que mais pareciam quinze, tamanha a fragilidade física.
Pedi para aguardar na sala de aula, pois queria um tempo só, para melhor me articular. Ao
entrar na sala, a mesa do professor me pareceu enorme. Um certo constrangimento me
impediu de ocupá-la. Busquei uma cadeira na última fila de carteiras da sala, ali sentei e pensei:
“Se pudesse, nunca mais me levantaria daqui”. O tempo passou e os alunos foram chegando.
Ocupavam seus espaços, conversavam entre eles. Do lugar onde estava, fitava a cada um deles.
Em seus discursos, me apropriava um pouco de suas histórias de vida; ainda estavam despidos
da condição de alunos, e iam expondo um pouco de si mesmos. Alguns me olhavam curiosos,
mas não se aproximaram. Era comum essa rotatividade, a constante presença de novos rostos,
que com o tempo se adaptavam àquela dinâmica. Por um momento ou outro, me lembrava de
minha condição, quando indagavam: “Cadê a professora? No primeiro dia já vai chegar
atrasada?”
Todo aquele transe foi quebrado repentinamente, quando adentrou a sala a diretora da
escola, que me apresentou ao grupo. Por um tempo perdida entre o tempo e o espaço, fui
gradativamente retomando a consciência de minha própria existência, e, para minha surpresa, a
leveza que me invadiu e a empolgação diante de todo aquele rico universo, de múltiplas
possibilidades, me permitiram estar e, muito mais que estar, criar, construir caminhos
diferenciados. A riqueza de nossos contatos permitiu vínculos que até hoje se estabelecem, e,
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muito mais, permitiu uma construção interna de educadora, que se traduz na possibilidade de
compartilhar e de acreditar no potencial e nas possibilidades que envolvem cada ser humano.
Foi um período de desconstruções e reconstruções e, essencialmente, foi um momento
de tamanha amorosidade, a mesma amorosidade que com certeza inspirou tantos escritos de
Paulo Freire, o Mestre, que tão sabiamente nos levou a refletir que a Educação é
verdadeiramente um ato de amor.
Ana Cláudia Gomes Cunha de Carvalho
Assessoria de Comunicação
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Sei onde estou: a história de Salviano, por ele mesmo
“(...) A carta chegou e tinha o meu nome... sabia que era importante... Então eu abri e li.
Arrastado, mas li. Era minha aposentadoria. Fiquei muito emocionado por eu ter lido aquilo... Eu
ia ao médico, pois tinha que ir no clínico geral. Eu não sabia ler as placas das portas e ia parar
no cardiologista. Hoje não, mudou tudo. Eu leio na rua, paro na banca de jornal e até tiro uma
casquinha.”
Salviano ingressou na escola municipal Marcílio Dias, na classe de alfabetização de
Jovens e Adultos, depois cursou o Ciclo I, onde ficou dois anos e, por fim, o Ciclo II, onde
também permaneceu por dois anos.
Ele é um senhor de 60 anos, que diz ter 49, porque facilita a paquera. Grandão, com
cabelos grisalhos estilo Roberto Carlos, solteiro, católico, nascido na Paraíba, veio para Caxias
bem jovem.
“Eu sou da Paraíba, vim pra cá com 16 anos, falsifiquei documentos para poder vir para a
cidade. Só grandão que tirei a certidão de nascimento. Me levaram no cartório, fiquei lá cheio de
vergonha.”
Antes de se matricular na escola, já tinha carreira definida. Recebia um salário mínimo
de aposentadoria e complementava sua renda com o serviço de pintor de carros. Seu interesse
na escola não está voltado para o mercado de trabalho. Vai muito além. O que ele conta aponta
para significados mais profundos que a escola traz na sua vida:
“Pra mim é muito importante, porque eu não estudei quando era novo...”
Trabalha em Saracuruna, como lanterneiro; é famoso, conhecido como melhor pintor de
carros da localidade. Um funcionário da escola disse que chega a ter fila de espera para que ele
faça o serviço nos carros.
“Há algum tempo eu já queria estudar, mas eu não sabia onde tinha escola que pegasse
do início. Não tinha. Aí aqui abriu. Me levaram para uma sala, aí eu vi que tava no lugar errado.
Perguntei à professora e ela me levou para a sala certa”.
Quando perguntado quais eram suas metas, desejos em relação ao estudo, ele
respondeu:
“Eu quero aprender. Não tenho definição, eu quero aprender.”
Quando ele diz que estudar é muito importante, porque não estudou quando era novo,
ele demonstra acreditar que havia uma carência na sua vida. O fato de se autossustentar, se
manter financeiramente, não era suficiente para que se sentisse integrado e independente no
mundo. O que ele queria e precisava era saber onde estava, como agir, se virar sem precisar
estar o tempo todo pedindo ajuda.
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“A gente passa a entender alguma coisa, já pega jornal e fica sabendo das coisas. Pega
ônibus, endereço certo, lado par e ímpar da rua. Com pouca coisinha que tá aprendendo já não
precisa ficar alugando todo mundo”.
Relata também o seu olhar para as pessoas que ainda passam por aquilo que ele passou
um dia:
“Outro dia eu vi um sujeito novo para receber no banco, tendo que botar o dedão
(referência à assinatura com a utilização da impressão digital). Às vezes chega alguém no ponto
e pede para mostrar o ônibus, porque não está enxergando. Às vezes acredito, mas às vezes sei
que é porque não lê (os ônibus da cidade de Duque de Caxias se identificam pelo nome do bairro
e não por números)”.
Com essas duas falas, ele mostra, com situações reais e até bem comuns em seu meio,
como é a vida sem estudo, sem saber ler. E o que ele tenta destacar é que saber ou não saber
define o cotidiano de uma pessoa: aonde vai, como vai, sua independência e o seu brio. Para
esse aluno, não ter estudado significava estar uma categoria abaixo, era ser menos que os
outros. Ou, o que era mais grave, não ser ninguém. Ele se desqualificava, por não ter estudado,
independente da vida que possui hoje em dia, da família que criou, dos empregos que
conseguiu, da história de luta, da superação de obstáculos e até da melhoria de vida em relação
à vida de seus pais. Não ser instruído, não ter passado pelo processo de educação formal o
definia.
Hoje Salviano fala com orgulho da independência que conquistou. Não da financeira,
mas da moral, pois já avalia, vê em outros as “deficiências” que tinha e sabe que não tem mais.
“Antes eu não sabia de nada; hoje eu vou no banco e sei onde estou.”
Paula Figueiredo da Silva Camargo
Divisão de Educação Infantojuvenil – Filosofia
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Questão de tempo
Sempre que me pergunto: “por que sou professora?”, algum aluno resolve me lembrar
do motivo. Crianças sempre me motivam a escrever algo, geralmente engraçado. Entretanto,
desta vez será algo profundo, pelo menos pra mim. Durante uma roda de conversa, uma aluna
se levantou e começou a me contar que havia visto um programa chamado “Sai de baixo” na
noite anterior à aula. Lembrei que este programa era exibido no tempo em que eu tinha a
mesma idade que meus alunos e exclamei:
– Mas isso é do meu tempo!
Em seguida, outra aluna disse indignada:
– Mas, tia, seu tempo é agora!
Tentei explicar a ela a questão do tempo, que eu me referia a minha infância, porém ela
não se satisfez.
– Mas, tia, você está aqui agora, então também é o seu tempo.
Dei-me por vencida. O que poderia fazer diante desta imensa sabedoria lógica e infantil?
Não pude parar de pensar no que minha aluna disse. Uma criança me fez perceber que
todo tempo em que vivo é meu! Logo eu, saudosista inata, sempre sentindo falta do que
passou... Pensar que a vida é tão curta e que, se não sentirmos e vivermos cada “tempo” como
se fosse o último, podemos perder tanto! Enquanto eu estiver aqui, vivendo, será o meu tempo.
E pensar que uma menina tão pequena aprendeu isso antes de mim! Faço questão de
agradecer aos meus pequenos mestres sempre que posso pelas lições de vida, pelas pérolas
soltas durante as aulas e por alegrarem os meus dias. Obrigada.
Aline de Souza Fiorentini
Creche e Pré-escola Ayrton Senna
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Que surpresa...!!!!
Aquele foi o meu primeiro ano na Educação Infantil, e, apesar de gostar de cantar e
brincar com as crianças, nunca tive muito interesse em trabalhar com crianças muito pequenas.
Acho que tenho um vocabulário mais voltado para alunos com uma faixa etária mais elevada.
A turminha era composta de 20 alunos, sendo dois com síndrome de Down. A rotina
inicial corria bem como todos os dias e eu sempre dedicava uma atenção especial a esses dois
alunos. Num desses momentos, um deles gritou:
– Ô, professora, a Júlia está enchendo uma bola!!!!!
E eu respondi que já ia ver e continuei a ajudar esses alunos na atividade do momento.
De repente, outra criança grita com aquela bocona desdentada que quase todos com
cinco ou seis anos têm:
– Não é bola não, professora... É camisinha.....!!!!!!
Sinceramente, aquilo bateu no meu ouvido e ficou. Eu olhei na direção dos dois e percebi
que realmente a Júlia estava com uma camisinha na mão, quase ficando gigante. Então eu disse:
– Que camisinha o quê, Claudinei? Ninguém vai trazer uma camisinha pequenininha para
a escola. Me dá logo essa bola aí, Júlia.
– Não é bola não, professora, é camisinha – disse o Claudinei.
Olhei pra ele e percebi que ele estava achando muito engraçado o meu comentário.
Neste momento, solicitei que fosse na minha mesa, explicando:
– Meu filho, por acaso você sabe o que é camisinha?
– Claro, professora. É pra colocar onde a gente faz xixi.
Fui ficando vermelha e não sabia mais que rumo dar àquela conversa, mas mesmo assim
continuei falando com ele.
– Quem te ensinou isso?
– Meu pai, professora. Seu pai não te contou não, que fica esperando neném se não
vestir a camisinha?
Neste momento, resolvi mandar o Claudinei sentar no lugar dele e fui fazer uma lista de
coisas que podemos colocar na mochila para levar para a escola.
Na hora da saída, fiquei prestando atenção na chegada da mãe da Júlia, pois queria
conversar com ela sobre o ocorrido e pedir que tomasse mais cuidado com as coisas que a sua
filha pegava em casa. Para espanto meu, a resposta desta mãe foi:
– Só isso professora? Eu sempre dou as camisinhas para eles encherem e brincarem
quando estão me perturbando – e começou a rir.
Iná Maria Teixeira Lavradas – E. M. México
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As pequenas histórias que mudaram tudo
Esse texto não pretende ser um relato de como me tornei professora de crianças aos
“mais de quarenta” anos, mas acho que algumas explicações são válidas, pois não tive uma
carreira muito típica. Na adolescência, eu tinha (ainda tenho) horror à ideia de sujar os dedos
num mimeógrafo, por isso, fui estudar “um tal de Processamento de Dados”, que eu não fazia a
menor ideia do que se tratava, mas que me livraria do Curso Normal. O tal de “Processamento
de Dados” ficou conhecido como “Informática” e me levou a trabalhar em treinamento. E foi
por aí que eu cheguei à educação.
Eu nunca havia trabalhado com crianças, quando cheguei à escola naquela tarde de sol.
A turma com mais de vinte crianças na faixa etária de oito anos me seguiu, desconfiada. Na sala,
lembrei dos livros que tive acesso durante o curso de Pedagogia. Definitivamente, nenhum
autor mencionou que as crianças gritavam tanto! Ao final do primeiro dia de aula, senti um leve
desespero, acompanhado por um zumbido persistente no ouvido. Alguém me disse que era
normal e resolvi acreditar. Saí da sala de aula para assumir outro cargo, cinco anos depois.
Desse período, entre muitas coisas boas, ficaram lembranças de pequenas histórias que desejo
compartilhar.
A surpresa do banheiro
Um dia, uma menininha entrou no banheiro da sala de aula e encontrou, boiando dentro
do vaso, um solitário cocô. Foi um escândalo! Todos correram diante do assombro da colega e
ficaram se acotovelando na entrada do pequeno banheiro. Diante da confusão, organizei
rapidamente uma fila. O método era simples: a criança ficava na fila, entrava no banheiro,
olhava o cocô e voltava para seu lugar. Assim, depois que todos passaram pela fila, pude dar
descarga e tentar retomar a atividade normal. Foi então que a pergunta que não queria calar
veio à tona:
– Tia, aquele cocô era seu?
O saco sem santo
Eu adoro o Dia de Cosme e Damião. Quando criança, era um dia de doces e sorrisos. Ao
longo dos anos, venho mantendo a tradição de distribuir doces no dia 27 de setembro. Esse dia,
para mim, não se reveste de um caráter especificamente religioso, está mais ligado à memória
afetiva. Buscando respeitar a religião das crianças, avisei com antecedência que iria levar doces
para quem quisesse. Algumas crianças disseram que queriam, outras avisaram que não iriam
querer e um menino sugeriu que eu colocasse os doces num saco “sem santo”. E assim foi.
Estava certa de que os santos não se importariam de ficar sem sua imagem para que
algumas crianças pudessem comer doces sem culpa. No dia combinado, na hora da chamada, a
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criança levantava e pegava seu saquinho de doces, se quisesse. Quando, na letra C, chamei o
nome de uma menininha esperta, ela me disse:
– Tia, eu não posso pegar.
– Tudo bem. Eu respondi, e ela completou:
– Tia! Pede a alguém pra pegar para mim!
Caso de trânsito
Um dia, um homem foi atropelado. Ali perto, dentro de uma casa, uma mulher chorou
desesperadamente. O filho dessa mulher perguntou à avó por que a mãe chorava tanto e a
senhora respondeu que aquele homem atropelado era o pai que ele não conhecia. O menino
correu para conhecer seu pai, morto, quase na porta de sua casa. Alguns anos mais tarde,
dentro da sala de aula, o menino me contou essa história, como quem conta um sonho.
A caneta correta
Todos o conheciam na escola. Falava com todo mundo, contava histórias e foi o Rei
Mago mais perfeito que um auto de Natal pode ter. Um dia, fui lhe entregar o material enviado
para crianças como ele, com baixa visão, mas ninguém era como ele.
Quando entreguei o caderno de pauta larga e um lápis bem preto, ele me disse:
– Você não vai me dar uma caneta?
Então, lembrei das orientações sobre a espessura do traço, sobre a cor e demais
especificações técnicas de uma caneta adequada para pessoas com baixa visão e disse que iria
procurar. Não encontrei a caneta perfeita e um dia ele me disse uma frase mágica:
– Eu quero uma caneta que brilha!
E apontou para uma caneta usada na correção dos trabalhos dos alunos. Era uma caneta
com glitter, nada técnica, e ele acrescentou:
– Eu quero essa, mas rosa, não.
E, então, eu lhe dei uma caneta azul, com glitter, tecnicamente inadequada, mas
eficiente o bastante para fazer aquele menino sorrir.
Uma menina com a letra A
Naquela escola, o quarto ano de escolaridade carregava um mito: para aprovação, era
necessário que o aluno estivesse muito bem preparado, pois no quinto ano os alunos aprovados
participavam da festa de formatura. Portanto, dizia a lenda, que, para evitar decepções, era
melhor ficar reprovado no quarto ano do que no quinto.
Na minha turma de quarto ano de escolaridade, havia uma menina que não lia e não
escrevia. Apesar das dificuldades, havia nela uma admirável vontade de tentar e de fazer
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sempre de novo. Ao longo do ano, seu desempenho melhorou o suficiente para que a
possibilidade de reprovação se transformasse em dúvida.
Contrariando todas as regras, fui para a reunião de entrega dos resultados sem saber o
que dizer ao responsável por aquela menina de olhos assustados que já se sentia reprovada.
Seu pai era um homem muito simples que na primeira frase falou de seu grande amor pelas três
filhas. Ele me contou que ela havia procurado, sozinha, uma instituição que oferecia reforço
escolar e material de apoio. Disse também que ela fazia questão de "brincar de escola" para
ajudar as crianças menores. Fizemos, então, uma espécie de acordo. Ela seria aprovada e ele a
informaria que seria preciso esforço para não viver, no ano seguinte, a decepção tão anunciada.
Um ano depois, ela estava entre os aprovados do quinto ano de escolaridade sorrindo
em sua beca improvisada. Decerto acreditando, como nós, que vale a pena continuar tentando.
Fátima Denise Peixoto Fernandes
E.M. Walter Russo
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Esquecimento
Aquele dia estava muito agitado. Parecia que, de alguma forma, as crianças estavam a
220v. Essa situação se refletia no refeitório, onde algumas turmas esperavam impacientemente
o almoço que havia atrasado.
No meio daquela confusão, acabei chamando a atenção de uma das minhas alunas. Disse
que falaria com sua mãe. Por um momento, apaguei da mente o nome da mãe da minha aluna.
Por isso, perguntei à Natália o nome de sua mãe.
Ela olhou para mim assustada, coçando a cabeça como se eu tivesse feito uma pergunta
muito difícil. As meninas que estavam com ela indagavam surpresas:
– Natália, o que foi? Você esqueceu o nome da sua mãe?
Ela, na simplicidade que só uma criança seria capaz de ter, me respondeu, justificando
aquela situação.
– Ah, tia não sei. Eu só chamo ela de mãe!
Sorri diante da resposta dela e não forcei a situação. Alguns minutos depois levantou-se
de onde estava, veio correndo na minha direção e eufórica, como se fosse responder a uma
pergunta que valesse um milhão de reais, disse confiante com um sorriso de ponta a ponta:
– É Jaqueline, tia! O nome dela é Jaqueline!
Nice Neves Butta
E.M. Paulo Roberto de Moraes
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A árvore de Músicas
Era final da década de noventa, exatamente o ano de 1999. A turma era um quinto ano
de escolaridade dessa rede de ensino. Foi nessa turma que tudo aconteceu, mais ou menos,
como será descrito abaixo.
Eu lecionava para essa turma naquele horário horrível que existia na rede (existia?!) das
9h às 15h e, à noite, cursava o quarto período de Pedagogia.
Havia uma disciplina eletiva chamada “Arte e Educação: Teoria e Prática”. Nessas aulas,
aliada à teoria, o professor nos passava várias atividades práticas para que aplicássemos com
nossos alunos. Essas atividades estavam sempre atreladas a alguma produção escrita.
Resolvi propor uma delas a minha turma. Esse ano, por sinal, foi muito produtivo, a
turma era muito receptiva e tivemos muitas produções tanto artísticas quanto escritas, mas a
que me chamou mais a atenção foi a seguinte.
A proposta era “criar” um cenário que poderia ser interno (uma sala, um quarto, etc.) ou
externo, (uma paisagem qualquer, uma casa, etc.), porém esse cenário deveria ser “construído”
com recortes de revistas, jornais, ou encartes. Não poderia ser recortada uma figura inteira. A
sala, por exemplo, deveria ser montada com “coisas” que seriam encaixadas para formá-la.
Depois vinha a segunda parte que consistia na produção escrita, tomando por base o
cenário criado por cada um.
Um dos alunos que optou pela paisagem externa fez aquele cenário básico conhecido
por todos: uma casinha de um lado, uma árvore do outro, com muitas flores no meio. A árvore
foi feita em duas cores, marrom para o tronco, o verde que serviu para a copa foi retirado de
algum classificado, porém veio a composição escrita que muito me surpreendeu e foi mais ou
menos assim:
“Era uma vez um homem chamado Roberto Carlos que cantava e encantava multidões
com suas músicas que, segundo ele, eram escritas por ele mesmo.
Todo mundo conhecia as músicas desse cantor, o que era desconhecido por todos é que
esse homem tinha um grande segredo. Nos fundos da casa dele, havia uma árvore cheia de
letras de música. Quando ele queria alguma música diferente, era só ir até lá, no Pé de Músicas,
e pegar uma. E tinha cada uma mais bonita que a outra!
Ninguém nunca descobriu esse segredo e o cantor, o Roberto Carlos, continua cantando
e encantado até os dias de hoje”.
Ana Maria Oliveira
E.M. Ruy Barbosa
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A menina que despertou para o universo mágico da leitura
Larissa era uma menina tímida, olhava de soslaio, não conversava com ninguém. Logo
que cheguei à escola, ela chamou minha atenção. Vivia pelos cantos, parecia que tinha um
mundo só para ela, onde ninguém adentrava. Passei a observá-la e, quando ela percebia minha
presença, se escondia. Sendo sua professora, não poderia deixar que ficasse recolhida em seu
mundo. Precisava, prudentemente, descobrir a chave para desvendar o que a fazia assim, tão
distante de tudo...
Os dias se passavam e Larissa não se relacionava com o grupo. Cautelosamente, fui me
aproximando dela para trazê-la ao mundo da escola.
Ao entrar em sala de aula dei bom dia à turma, entretanto, Larissa apenas olhou-me. O
mais interessante é que ela dizia muito através dos seus olhos, e isso indicava sensibilidade.
Iniciei a aula com a história de Alice no País das Maravilhas e, logo após, pedi aos alunos que a
comentassem. Larissa continuou muda!
No segundo momento, pedi ao grupo que desenhasse e pintasse a história.
– Não vai desenhar? – perguntei para Larissa.
Ela fez que não, com a cabeça.
Convidei uma aluna para sentar-se ao seu lado e mostrar-lhe o que havia desenhado. Ela
ficou observando a colega pintar.
Tente fazer o seu desenho e pintá-lo – pedi a Larissa, apontando para sua folha vazia.
Você também consegue fazer um.
Larissa não mexeu o lápis. A menina deixava escapar de seus olhos um pedido de
socorro. Senti um rastro de esperança surgindo.
– Sente aqui pertinho de mim – convidei-a.
Ela sentou-se, entretanto, ficou silente.
Revelei-lhe que precisava conversar com sua mãe e entreguei-lhe um bilhete.
No dia seguinte, a mãe de Larissa estava lá para conversarmos a seu respeito. Fitou-me
desconfiada, nem me deu tempo de expor a situação, parecia que adivinhara o que eu iria
explanar. E com um semblante carrancudo, foi logo sentenciando: “Essa menina tem problema
de cabeça, professora”. Fiquei estupefata com a sua afirmação. Com calma, expliquei-lhe que
precisava de seu apoio e que não estava julgando sua filha e nem tampouco ela, como mãe.
Uma coisa era evidente: precisávamos nos unir para o bem de Larissa, pois o envolvimento da
família seria essencial para que a aluna pudesse transpor os obstáculos. Contei-lhe que havia
conversado com a orientadora e juntas fizemos o encaminhamento do caso de Larissa para
avaliação médica. A mãe de Larissa agradeceu-me, porém confidenciou-me não ter mais
esperanças. Não me deixei abater com suas palavras...
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Já em sala de aula, chamei Larissa para ler. Ela sentou-se ao meu lado e começou a
gaguejar. Sua voz saía rouca, e, aos poucos, esvaía-se até emudecer. Percebi que tinha medo de
errar, esse era seu fantasma!
Cada dia que se passava era um degrau que eu subia juntamente com ela. Larissa estava
começando a ler, entretanto, sua voz ainda sumia.
Enquanto esperávamos o resultado da avaliação, não poderia ficar de braços cruzados,
então, planejei o seguinte: pedi que ela lesse, enquanto eu corrigia uns testes (usei essa
estratégia para que Larissa não se intimidasse comigo prestando atenção na sua leitura). Na
verdade, eu estava prestando bastante atenção na sua leitura, só queria deixá-la à vontade. Foi
então que a luz se acendeu entre mim e Larissa: ela começou a ler perfeitamente, sua voz saía
como canto mavioso, mas notando que eu a olhava começou a gaguejar.
Paulatinamente, Larissa foi se libertando de seus medos. Havia lhe explicado que o erro
faz parte da vida e com ele aprendemos a alçar voos longos e seguros.
Chamei sua mãe novamente e participei-lhe que, segundo a avaliação médica, Larissa
era uma criança normal. Sua mãe ficou surpresa! Deu um suspiro de alívio e, emocionada,
proferiu as seguintes palavras: “Eu ajudo de lá e a senhora ajuda de cá!” Assim, despediu-se,
com um sorriso nos lábios.
De repente, ouvi um: “Bom dia, professora!” E quando olhei para trás, avistei Larissa
sorrindo. Uma enorme satisfação tomou conta de mim, afinal de contas a minha menina estava
se comunicando. Isso era motivo de festejar, e muito!
Aos poucos, Larissa foi obtendo confiança e se desinibindo. Com a minha ajuda e a dos
colegas de classe a menina progredia. Os amigos a encorajavam, auxiliando-a na leitura ou
mesmo nas atividades de escrita. Integrou-se ao grupo de dança, dizia que queria ser bailarina.
Larissa estava se socializando e isso era crucial na sua caminhada. Os meses foram se passando
e, a cada mês, o progresso de Larissa e da turma era irrefutável.
Um dia, a orientadora tomou a lição de todos os alunos. Fiquei aguardando o resultado.
Larissa voltou e disse baixinho que a orientadora solicitava a minha presença em sua sala. Fui
pelo corredor a passos largos, tamanha era a minha vontade de saber do desempenho de meus
alunos. Chegando lá, fui saudada pela orientadora: “Parabéns, professora, todos estão ótimos!”
– O que você está fazendo? – perguntou-me.
– Estou realizando várias atividades pertinentes à aquisição da leitura e conscientizando-
os da importância do letramento em suas vidas, uma vez que ampliará seus horizontes –
respondi, com um largo sorriso. – Podemos viajar pelo mundo que o livro nos desvenda!
– E quanto a Larissa? – perguntou ela, segurando minhas mãos.
27
– Eu li o olhar dela clamando e ouvi a voz do meu coração – revelei. – Com o meu auxílio,
da família e dos amigos, seu desempenho melhorou e, consequentemente, sua autoestima
também.
A Festa da Primavera chegou e Larissa juntamente com seus amigos dançaram muito
bem, arrancando aplausos calorosos da plateia. Eu, orgulhosa da turma, sorria.
Larissa é um exemplo vivo de que, com dedicação, união, compreensão e vontade firme,
é possível plantar a semente, vê-la germinar, crescer, desfrutar de sua sombra amiga, saborear
seus frutos e sentir o perfume de suas flores.
Jurema Nascimento da Silveira
E.M. Eulina Pinto
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Santo de casa faz ou não faz milagre?
Costumamos dizer, vulgarmente, que “santo de casa não faz milagre”. Como não
acredito nem em santo nem em milagre, resolvi usar esse provérbio para demonstrar o quanto
somos importantes também em nossas casas. Sim, porque não somos professoras somente com
os nossos alunos. Muitas vezes, temos jornada tripla, ou seja, duas na escola e uma terceira com
os nossos filhos ou com os filhos dos nossos amigos, como é o caso que vou relatar.
Eu, Levada, e minha amiga Fofucha trabalhamos juntas desde 2003, quando atuávamos
no projeto “De professor para professor: um convite ao trabalho cooperativo”, que foi
maravilhosamente bem organizado e coordenado pelas professoras Tereza Barreiros e Marliza
Bodê na rede municipal de Duque de Caxias, onde trabalhamos até hoje. Além disso,
morávamos perto uma da outra nessa época e ela vinha de carona comigo depois das incríveis
reuniões do projeto que ocorriam segunda-feira à noite. Para completar, dois de nossos filhos
estudavam na mesma sala de aula de uma escolinha aqui na Penha.
No ano seguinte, nos separamos, porque o projeto, infelizmente, acabou e só nos
reencontramos em 2007 numa escola onde fomos trabalhar. Em 2009, vivemos uma arriscada
experiência em uma outra escola municipal, onde fomos com o nosso grupo todo tentar fazer
um trabalho sério e diferente. No fim do mesmo ano, nos mudamos para uma outra e hoje,
vivemos no paraíso, a Escola Municipal Zilda Arns Neumann, com parte daquele nosso grupo de
2009. Fazemos um trabalho muito bonito e somos realmente um grupo em todos os momentos.
Estamos conseguindo realizar parte do nosso sonho de ser feliz e trabalhar da melhor maneira
que podemos, mesmo encontrando dificuldades de todos os tipos.
Contei um pouco da nossa trajetória nessa rede para contextualizar a linda vivência que
compartilhamos desde o ano passado.
Em 2010, eu tinha uma turminha fofa de primeiro ano (Turma Maluquinha) e Fofucha
fazia o seu trabalho especial na Sala de Leitura. Conversando, ela me disse que sua filha estava
com muitos problemas para se alfabetizar e que adoraria que ela fosse minha aluna. Eu disse
que ela trouxesse a menina para estudar na minha sala, mas, como moravam em outro
município, isso não era possível. Fui para casa, pensando num jeito de ajudar minha amiga e, a
cada atividade diferente que eu fazia com a turma e que causava alguma euforia, eu pensava
“Joice ia adorar isso”. Tanto pensei, que fui iluminada com uma ideia simples, que acabou
ajudando nesse processo tão metamórfico que é a alfabetização.
Comprei um caderno, encapei, e escrevi um bilhete para a menina, convidando-a para
que participasse da minha ideia: ela receberia aquele caderno toda semana com uma atividade
para cada dia. Faria a atividade e expressaria como se sentiu fazendo através do desenho de
uma carinha feliz se tivesse gostado muito; séria se tivesse suportado; e triste se não tivesse
gostado. Mostrei correndo minha ideia para a Fofucha, que na hora ficou entusiasmada (ainda
tenho na minha mente a carinha dela) e levou o material para casa como se fosse ouro.
29
Precisei aguardar uma semana até que Fofucha voltasse com o caderno para saber como
tinha sido esse primeiro momento. Felizmente, Joice gostou e fez as atividades com capricho e
muita ajuda da mãe e do pai.
Durante todo o ano passado, o caderno foi sendo preenchido e virou um meio de
comunicação entre nós duas. As atividades eram variadas e divertidas. Foram ficando mais
difíceis e ela acompanhando tudo. Ela me mandava desenhos, perguntava a mãe como eu era
fisicamente, me escrevia bilhetes. Eu mandava adesivos, bilhetes de incentivos, lápis de cor para
pintar as tarefas. A nossa pombo-correio nunca falhava e me dizia como tudo tinha sido. Se ela
precisou de ajuda, se desejou fazer, se teve dificuldade, enfim, ia me dando elementos para eu
pensar nas próximas atividades. O esquisito era que a aluna sempre fazia com prazer as minhas
atividades, mesmo que com ajuda, e odiava as que recebia na escola em que estuda. Joice veio
lutando ferozmente e, com a ajuda de todos, alfabetizou-se no fim de 2010.
Em 2011, contamos essa experiência para nossas colegas de escola e duas delas
choraram ao ver o caderno e ouvir nossos relatos. Isso mexeu tanto comigo que resolvi escrever
para dizer que santo de casa faz milagre, sim. Eu tive a ideia e providenciei os meios para que
tudo ocorresse, mas Fofucha e Marcos Paulo fizeram a coisa acontecer. Se eles não tivessem se
proposto a isso, o caderno não teria tido nenhum efeito.
Ainda esse ano, Joice veio à nossa escola e o nosso encontro foi incrível. Parece que nos
conhecemos há muito tempo. Ela ficou grudada comigo e, na hora de ir embora, adivinhem?
Pediu o caderno com as atividades da semana, que eu havia esquecido na minha sala. Hoje,
coloco atividades mais elaboradas com textos, fazemos concurso de adivinhas, escrita de
bilhetes e ela faz tudo com mais autonomia. Já não precisa mais do caderno, mas gosta da
atenção e carinho que recebe por conta dele.
Foi muito gratificante ter participado a distância do processo de alfabetização de uma
criança que, se não tivesse os pais que tem, com seus olhares bem atentos, conhecimento
pedagógico e disposição, poderia ter sido mais uma das muitas crianças que a escola não
consegue ajudar.
Quem diria que, no tempo da internet, um caderno, com atividades coladas, iria cativar
uma criança do mundo moderno? Parece que ela conseguiu sentir o tanto de envolvimento que
todos nós colocamos nesse projeto tão simples e correspondeu à nossa expectativa com o que
tinha de melhor.
Obrigada, Joice. Nunca mais serei a mesma depois dessa experiência.
Luciane Maciel Ceccopieri Belo
E.M. Dra. Zilda Arns
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Legalização: mais do que um ato legal
Chego apressada depois de enfrentar um megaengarrafamento e procuro uma vaga para
estacionar. Em vão... Meu horário adiantado rapidamente transforma-se em atraso. A reunião
interna vai começar e preciso apressar‐me. A pauta está pronta e os assuntos são extensos. Os
processos não param de chegar, fruto dos mapeamentos realizados no município. Escolas
nascem de um dia para o outro e precisamos legalizá-las. A Comissão precisa prestar atenção...
mapear não é tarefa fácil, não! Demanda persistência. Bato à porta e nada! O barulho da
criançada ecoa de longe, mas a pessoa que vem à porta jura que naquele espaço não existe uma
escola. Entretanto, o convite está em mãos e calmamente é entregue à senhora que gostaria
muito de ter convencido, mesmo com sua argumentação sem sentido.
Em breve, receberemos nossos convidados em nosso quartel-general. Sim, quartel-
general! Afinal, é na nossa sala de trabalho que encontramos o espaço para as trocas, as
mediações e a aprendizagem coletiva. É nesse cantinho que o administrativo e o pedagógico
dão as mãos, construindo a união necessária à legalidade da educação formal.
Mais uma escola comparece na hora marcada. Chega ansiosa para receber orientações
sobre os procedimentos de autorização para funcionar. Teme que sua escola seja fechada!
Entretanto, entre a orientação acompanhada de um café e um sorriso, a calma e a tranquilidade
se estabelecem. Conquistamos mais uma amiga. Coisa boa... trabalhar e ainda fazer amigos!
Mas o tempo passa muito rápido e mais uma e outra e outra, as escolas são pontuais,
comparecem!
– Hoje viemos entregar documentos. – Hoje passei só para ver vocês. – Preciso de
orientações sobre o regimento escolar...
Amanhã teremos comissão, vamos visitar três escolas! Os processos já estão separados,
os termos de visita também. Escola, lugar do educador que tem como ideal a educação de
qualidade, a educação legal. Ela nos aguarda! Visitar uma escola não é tarefa simples, na
primeira visita é necessário um diagnóstico geral e, assim, olhares atentos! Olhos
administrativos e pedagógicos bem abertos. São três pares de olhos a olhar e a olhar. Em breve,
retornaremos e, de visita em visita, a escola vai se modificando. Logo, logo, será encerrado mais
um processo, emitido mais um parecer. Nossa lista é ampliada e agora é garantir a qualidade da
instituição, do projeto pedagógico, das nossas relações. Legalizamos escolas e a parte legal é
conhecer tantas gentes, tantos lugares, tantas realidades. Descobrir “gentes que fazem” é a
nossa especialidade e, por mais complicado que pareça, é muito legal!
Maria Celeste Rodrigues Pais Alves &
Equipe de Inspeção Escolar
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Mãe Coragem
Numa noite estrelada de uma terça-feira qualquer, a menina que cursava a terceira série
primária chorava compulsivamente diante de uma folha de papel de pão onde ela costumava
fazer os seus rascunhos escolares. A mãe, depois de uma longa jornada de trabalho, e já de
volta ao lar, percebendo a aflição em que se encontrava a filha, resolveu perguntar-lhe o que
podia fazer para ajudá-la, uma vez que o choro dela a entristecia por demais. A menina,
mergulhada num choro melancólico e profundo diante de sua dificuldade, não respondia às
indagações feitas pela mãe. Num gesto extremamente afetuoso, a mãe pôs a menina no colo e
perguntou-lhe novamente o motivo do choro. A menina, muito fragilizada, olhou para a mãe
com os olhos vermelhos e lacrimejantes e disse: “Estou muito triste porque não sei fazer a conta
de dividir com dois algarismos”. A mãe olhou para o papel de pão já amassado devido à
quantidade de vezes que a operação matemática fora apagada, disse: “Mas isso é muito
simples, eu vou te ensinar”.
As tentativas da mãe foram inúteis, a menina já bloqueada não acreditava no
conhecimento da mãe, dizia que ela não sabia resolver a questão, pois a única pessoa que sabia
resolver o problema era a professora, Dona Nair. A mãe, já esgotada de tantas tentativas
fracassadas, pois a menina não dava ouvidos às suas explicações, silenciou-se.
Na manhã seguinte a filha ficou surpresa ao perceber que a mãe faltara ao trabalho. Ao
longo de sua vida, a menina não se lembrava de ter testemunhado tal situação. A mãe nunca
faltava ao trabalho. A menina tinha em mente as palavras sempre proferidas com muita
dignidade pela mãe: “O trabalho está acima de tudo, dependemos dele para sobreviver”. Então
a menina perguntou: “Mãe, a senhora vai ficar em casa hoje?” “Vai faltar ao trabalho?” A mãe,
de uma forma bem natural, respondeu que aquele dia ela iria ao médico. Então a menina se deu
por satisfeita e não questionou mais a mulher.
Às 10h30 da quarta-feira, a menina, como em todos os dias do ano, saiu para fazer o seu
trajeto rotineiro de ir para a escola. Naquele dia a mãe seguiu a menina sorrateiramente. Sem
que a menina percebesse, a mãe entrou e esperou que as turmas fossem para as salas de aula.
Aproximadamente às 11h30, alguém bateu na porta da turma 303 da professora Nair, toc, toc,
toc.... Tamanha foi a surpresa de todos ao ouvir uma mulher dizer as seguintes palavras para a
professora: “Bom dia, professora!” “Tudo bem com a senhora?” A professora respondeu
educadamente. Então a mãe continuou: “Eu me chamo Maria, sou a mãe da Joana e vim aqui
para pedir a sua ajuda”. A professora convidou a mãe a entrar na sala.
A menina ao perceber que aquela era a sua mãe afundou na carteira toda
envergonhada. Os colegas de classe começaram a caçoar da menina que àquela altura já estava
chorando. Então a professora perguntou à mãe: “Em que posso ajudá-la, dona Maria?”. Ela com
muita determinação, sempre peculiar a sua pessoa, disse: “Eu hoje faltei ao trabalho para vir até
aqui pedir à senhora que me ensine a resolver a conta de dividir por dois algarismos, pois tentei
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ensinar a minha filha e ela disse que o meu “jeito” de resolver a conta estava errado, apenas a
senhora sabia resolver a conta corretamente. A professora, muito solícita, disse: “Gostaria de
ver o seu ‘jeito’ de resolver a conta”. “A senhora se importa de vir até o quadro”? Nesta altura a
menina já estava de cabeça baixa soluçando. A turma impactada, não tirava os olhos daquela
senhora negra, magra, alta, dona de uma altivez de dar inveja. A professora então passou uma
conta para a mãe de Joana no quadro e entregou um pedaço de giz a ela. Imediatamente, ela
começou a resolver a conta e ao mesmo tempo em que resolvia a operação, narrava em voz
alta: “...quatro vezes cinco, vinte, para vinte e dois, dois..” e desta maneira Dona Maria resolveu
a operação até o final. A professora, uma senhora negra, baixinha e muito segura, olhou
fixamente para a menina que estava sentada no meio da sala, e com muito orgulho disse:
“Joana, sua mãe sabe muito bem resolver esta operação. Parabéns! A senhora merece CEM.” A
turma veio à loucura. Todas as crianças começaram a aplaudir a mãe de Joana. A senhora
humildemente agradeceu a professora, olhou para a menina e disse: “Quando você voltar hoje
pra casa, mamãe vai te ensinar as continhas.”
Aquele foi um dia que ficou marcado na vida de Joana, provavelmente também da
professora e de muitas crianças que testemunharam aquele ato de coragem.
Norma Santos
Subsecretaria de Planejamento Pedagógico
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Uma nova chance
Caminhava devagar, tinha a cabeça povoada por dúvidas e lembranças, enquanto
crianças agitadas passavam correndo à sua volta. Deveria realmente ir até lá? O medo era
grande, mas não tanto quanto sua esperança.
Havia acordado bem cedinho, num sobressalto, após a noite mal dormida. Estava muito
ansiosa. Pensou em todas as coisas que faria ao longo do dia e não pôde conter o sorriso, ao
pensar no final do mesmo.
Levantou-se. Depois do banho, passou o pente de dentes quebrados pelos cabelos,
olhou no espelho e gostou do que viu. Já nem se lembrava mais da última vez em que estivera
naquele estado, tão empolgada e confusa ao mesmo tempo. Sentia as emoções num turbilhão
dentro de si, um misto de medo, curiosidade e felicidade que eram concomitantes. Seu coração
estava irrequieto e sua cabeça se negava a focar em outra coisa.
Resolvendo não se antecipar, decidiu não pensar no que a aguardava, não naquele
momento. Foi até a cozinha, preparou o café da manhã da família, regou as plantas, fez comida,
acariciou o cachorro e brincou com o neto, na esperança de viver um dia normal. Mesmo
sabendo ser impossível.
Tentou assistir à TV, mas sempre se distraía. Descobriu não ter sido capaz de gravar uma
única cena, passada na programação diária. Ligou o rádio, fez crochê, mas foi em vão, errou os
pontos repetidos, com destreza, tantas vezes antes. Repousou as palmas das mãos sobre o
rosto e receou passar mal.
Estava tão perto que passou o dia inteiro ouvindo o som da bagunça provocada pelas
crianças excitadas. Por um momento as invejou e desejou que as horas passassem mais
depressa. Conferiu o relógio da parede e percebeu que era a quinta vez em menos de meia
hora, que seus olhos seguiam aquela direção. A sensação que tinha era a de que o tempo não
estava passando, ou então passava mais lentamente como se, egoísta, a envolvesse em uma
brincadeira cruel e indecente.
Pegou papel e caneta, pensou, respirou fundo, olhou-os fixamente, mas não se atreveu a
arriscar. Balançou a cabeça em sinal de negação. Rindo de si mesma, apertou-os contra o peito,
cheirou a folha em branco, após passar suas mãos sobre ela e guardou tudo de novo.
Foi até a cozinha, descobriu-se com a geladeira aberta, embora não tivesse a menor
ideia do que tinha ido procurar ali. Aproveitou e bebeu água.
Foi limpar a casa, a poeira retirada dos móveis parecia solicitar a retirada da poeira
existente nas gavetas de sua memória. Pensou nos dias difíceis vividos na infância, nos sonhos
trocados por vassouras e ferro de passar, nas linhas, agulhas e máquinas de costura na
adolescência. Em como sua vida tinha se desenrolado até aquele momento e no quanto do
mundo ainda tinha a descobrir. Olhou as mãos ásperas e calejadas e não se conteve ao
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relembrar tantas pessoas, tantos momentos, quantos sentimentos e tempo que tinham
escorrido por ali.
Perdeu a conta de quanto tempo tinha estado parada em frente ao móvel, inerte,
perdida em seus próprios pensamentos. Olhou novamente o relógio e resolveu se arrumar.
Colocou uma roupa bonita, prendeu os cabelos em um coque, arrumou suas coisas com
cuidado, tinha comprado cada objeto com muito carinho. Guardou na bolsa o caderno bonito,
ajeitou no estojo o lápis, a borracha, as canetas. Pegou a bolsa e saiu de casa, com a sensação
de exploração de um mundo novo.
Agora estava ali, parada diante do portão. Seu coração batia acelerado como num
compasso de escola de samba. Respirou fundo, ouviu o toque do sinal e os portões abriram-se
lentamente a atraindo como um ímã é atraído à geladeira.
Quando se deu conta, já estava sentada em uma carteira, bem na primeira fila que era
pra não perder de vista nem uma letrinha sequer. Correu os olhos pela sala, viu as paredes
coloridas por letras e desenhos de crianças que tinham estado ali anteriormente, observou a
professora, olhou nos olhos dos colegas de turma e não pôde impedir que uma lágrima solitária,
grata e feliz, se deslocasse de seus olhos e encontrasse seu sorriso.
Sirlane Araujo Marques
E.M. Albert Sabin
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No chão da escola
No chão da escola
Olhares que se deitam
Olhares tão pequenos
Horizontes de outros passos
Passos para novas terras,
Passos para novas conquistas,
Passos para ir em frente
Caminhar constante
Corrida permanente
De pés que precisam flutuar neste chão.
Flutuar neste chão?
Pode ser barco de nuvem
Para carregar olhos colados de poeira triste,
E abri-los aos céus.
No chão da escola
Olhares se sentam:
Para ouvir expectativas
Para dizer versos da vida
Para chorar junto algumas tristezas
Para pedir um colinho
Quando a dor aperta
E para pular levadices
Quando a alegria faz sorrir girassóis.
No chão da escola
Olhares que buscam
Olhares que pedem
Olhares que se constroem
Olhares que construímos
Olhares que destruímos?
Viver de reconstruções,
Porque não há como fugir da vida!
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Vivências de quem caminha,
Olhares de quem deseja,
Andar sem ferir os pés.
Mistério de um chão tão mágico
Construído na realidade
Encantado por fadas e bruxas,
Transformador de sapos em príncipes,
Fazendo a vez de todas as cinderelas.
Ensinando que é no chão
Que plantamos sementes
Que serão flores e alimento.
No chão a gente aprende
A brincar de roda e amarelinha
Construir castelinhos de areia
Sorrir junto, cair junto e levantar junto.
Porque cair no chão dói, rala!
A gente chora!
Depois aprende que é só passar merthiolate que sara
E aí vai em frente,
Porque não há como fugir da vida!
No chão da escola,
Aprende-se tudo.
O chão da escola é estrada de todos.
Passamos por ele em todas as vivências.
Pois se a vida é uma escola
A escola que vive,
Sabe transformar acontecimentos
Em um universo apaixonante.
Fabíola de Souza Alves
E.M. Bairro Califórnia
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Chão de escola
O chão da escola não é vazio nem frio
é cheio de vida
vidas secruzamselaçamentrelaçameseabraçam ali
o ontem, o hoje, o amanhã.
Quem aprende? Quem ensina?
Cada um deixa uma parte de si no outro
marca única, inconfundível e insubstituível.
O chão da escola não é estéril
nele germinam ideias sorrisos lágrimas
histórias sonhos amigos amores valores...
eu germinei, tu germinaste... nós germinamos...
no chão da escola.
O chão da escola não é inerte
estremece ao pulsar dos corações
nos primeiros amores
(o despertar das emoções)
treme com a energia pura da criança
pulando amarelinha
ou saltando a distância.
Certo dia, no chão de uma escola,
um menino se olhou no espelho
sonhando seu futuro.
Hoje, no chão de uma outra escola,
em um outro espelho,
um homem se olha
sonhando o futuro
de outros meninos...
José de Freitas Silva
E.M. Parque Capivari
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Mediar, ação literária de amor
Ensinar o Bê-a-Bá
E também a escrever
Pro professor importante
Com certeza o seu dever.
O desafio do percurso
É criar paixão por ler.
Paixão pela poesia,
Pelo livro, pela história,
Por aquela mais humilde
E outra cheia de glória.
Pra quem é apaixonado
Ler não tem escapatória.
Pra saciar esta angústia
De todo bom professor,
Que promove a leitura
Com carinho e amor,
Abraçamos o projeto
Do “Jovem Mediador”.
Projeto que quer o aluno
Disseminando leitura
Nas escolas de Caxias
Em todas da prefeitura
Fazendo leitura em rodas
Que ao girar ninguém segura.
O mediador de leitura
É um sujeito especial
Lê e fala com postura
Não é aluno normal
Na escola se destaca
Da maneira especial.
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Pra ser bom mediador
Precisa se preparar
Ler jornal, poema, história,
De tudo apreciar,
Pra escolher o melhor livro
E com classe mediar.
Com seu livro de história,
Colcha e almofada à mão,
Lá vai o mediador
Cumprir com sua missão
De disseminar leitura
Pro pequeno e pro grandão.
Este aluno no futuro
Criará comunidade
Comunidade Educadora
Transformará a cidade
Cidadão que faz história
Melhora a sociedade.
Viviane Alves Guimarães
E.M. Presidente Costa e Silva
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Crianças
Entre sorrisos e encantos
Perco-me por vezes infinitas
Num perder-se que, entretanto,
Leva-me ao encontro da vida
A cada olhar que me ensina
E um convite me faz
De ser menino ou menina
De ser artífice da Paz.
Cada um é tão real!
Não a promessa de um futuro,
É a certeza de um ideal e
Não um caminho no escuro.
Em seus gestos delicados
Que transbordam energia,
As crianças, aos bocados,
Revelam tamanha alegria!
E sendo assim como são,
Pequeninas e grandiosas,
Elas, em suas emoções,
São as almas dadivosas
Que ensinam mais que aprendem
No universo escolar
Àqueles que as compreendem
De maneira singular.
A escola é, então, um jardim
Em que cada flor cultivada
Transforma o mundo, enfim,
Com o amor e a paz almejada
É ainda mais que um espaço,
É mais que um tempo, ou lugar...
Na escola, cria-se o mundo que,
Enfim se quer transformar
E na criança, esse mundo
Buscamos realizar!
Fatima Anselmo
Divisão de Educação Infantojuvenil
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Chão da Escola
Chão de luta e labuta
Força, fé na conduta
Chão de histórias de vidas
Entrelaçadas e aguerridas
Chão que pulsa saber
Troca, mistura e dá prazer
Chão de conhecimento, afeto e emoção
Que faz diferença na população
Chão do valor eterno de aprender
Cidadania, direito e dever
Formação solidária
Chão de vida humanitária
Pise firme neste chão
Escola é a solução
Chão que rege uma Nação
Que não progride sem Educação.
Maria Fátima Martins D’Aqui
E.M. Expedicionário Aquino de Araújo
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Uma flor no Jardim Gramacho
Quando cheguei ao Jardim Gramacho,
não vi jardim, nem flor, nem riacho,
mas em pleno verão vi o rastro
de luz brilhando nos muros azuis
da Escola Municipal Mauro de Castro.
Talvez aqui esteja o jardim
Esperançoso pensei assim
Estaria oculto entre as salas?
Não, não senti o aroma das flores
nem vislumbrei das frutas e folhas as cores.
Diziam: “ali a terra é dura,
não há jeito, é um mal sem cura.”
Mas quando a sala olhei por inteiro,
vi em cada aluno uma semente.
Concluí: “Mais que professor, serei jardineiro”
A turma do sexto ano fervia como o verão
Euforia, gritaria, hormônios em ebulição.
Tantos cadernos, professores: tudo novidade!
Ah! nas paredes o cheiro de tinta fresca,
Nas sementes o sonho da felicidade!
O sétimo ano chegou lento como o outono
Muitas sementes se perdem sem dono.
Muitos vão, muitos chegam sem esperança
Cadê a Jéssica, o Maicon, o Ernani?
Está grávida, está trabalhando, está de mudança.
Eis o oitavo ano, frio que nem o inverno
muitas mentes inertes em sono eterno.
Os jardineiros debatemos na reunião:
como cuidar do ramo que desponta?
como salvar a nossa plantação?
Mas com o nono ano irrompe a primavera
e se sempre alcança quem espera
nossos brotos já germinam com vigor
algumas sementes ainda resistem a vingar
enquanto algumas já têm caule e até flor.
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Aconteceu então certo dia
quando eu da sala já saía
encontrei uma dessas flores tão abatida
com olhar distante e pétalas caídas
“O que te aflige, o que te faz tão dolorida?”
Seu nome era Deise, só eu, professor
de inglês sabia que ali estava uma flor.
Mas a margarida de pele negra reluzente
não sorria mais como antigamente
não brilhava mais ao sol nascente.
“Descobri que tenho problema no coração,
não posso brincar, correr: tudo agora é em vão.
Minha vida agora é remédio e hospital
Nada tem mais graça, nem amigos, nem escola
Agora é só aguardar com dó o meu funeral.”
Como um jardineiro, com o olhar atento,
não perdi tempo, nem o alento:
“Coragem, menina, abraça tua vida!
Olha o que tens, vive a cada dia
como se fosse único, alegre e decidida!”
Continuei com palavras aquela flor a regar
E a cada dia cultivava e alegre vi brotar
novas pétalas de esperança
naquele caule adubado em dor,
renascia naquele rosto o sorriso de criança!
O tempo passa, floresceu aquele jardim,
rosa e cravo, azaleia e jasmim,
mas como anda a nossa margarida?
alegrando a terra de outros canteiros
cheia de brilho, cheia de vida!
Como na parábola, muitas sementes no caminho
se perderam, isoladas, sem carinho.
Nessa semeadura, o que nos consola
é descobrir que a cada ano se renova
a confiança de se colher no chão da escola!
André Luiz Lacerda Deschamps
E.M. Mauro de Castro
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Construindo um futuro
Quem disse que professor sabe tudo
Vive uma vida de ilusão.
No chão da primeira escola aprendi
Que ser professor é mais que profissão.
Na sala repleta de alunos
O pequeno menino se apresentou.
Não sabia ler nem falava direito,
Mas muitas lições nos ensinou.
A aula ficava emocionante
Com toda experiência que trazia.
E cada assunto que falava
Era motivo de muita alegria.
Um dia o menino triste chegou.
Procurei uma explicação.
Descobri que a violência o marcou,
Ferindo seu pequeno coração.
Quem poderia ter a coragem
De maltratar o menino sonhador?
O que fizeram da aprendizagem
Que o pequeno sempre ensinou?
Mesmo com toda essa tristeza,
O menino voltou a sorrir.
E essa experiência de vida
Tive que registrar aqui.
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Nossos alunos passam problemas
E cada um tem uma reação.
O que você tem feito, professor,
Para amenizar essa situação?
Uns colocam de castigo,
Outros mandam para a Direção.
E o menino que está entristecido
Não vê esperança na Educação.
Por isso, em cada escola que piso,
Deixo as marcas do amor.
Prefiro educar o menino
Para, quem sabe, torná-lo doutor.
Nossas mãos são preciosas
E nossas palavras têm poder.
Eduque, você também, o menino
Para que ele não venha a se perder.
Eloiza Cristina de Freitas da Conceição
E.M. Sônia Scudese
46
Pó de Giz
Nas batidas das horas
Assim começa o dia
Com o pó de giz
a construir linhas infinitas
Faz casa e árvore. Casa na árvore.
Casa-árvore, João-de-barro.
E o mundo inteiro
a arder pelas pupilas.
Pó que vai colorindo de vida
Os sonhos do aprendiz
Pó dissolvido no vento
Com restos de vozes
E risos em movimento
Pó de giz
Feito de um traço a outro,
entre um passa e outro,
A escrever no tempo
Tudo o que o sonho diz
Termina o dia e
Um pó de giz
cai no chão da sala.
No avesso do sentido,
A pá não o apaga.
Fica ali latente
para quem quiser resgatá-lo.
Aline Pupato Couto Costa
E.M. José Medeiros Cabral
47
Mosaico chão de escola
Chão de escola
Que te quero diverso
Qual mosaico de passos rápidos do fulgor da idade
Ou passos lentos da maior idade
Chão de escola
Mosaico de pegadas
Pegadas das rodas circulantes das cadeiras metálicas
Das pontas guias de bengalas que conduzem
Chão de escola
Mosaico de caminhos
De guias e trilhas
Caminhos que se mesclam
Que se diferenciam
Chão de escola molhado
Espelho que reflete tantas formas
Tantas linguagens
Reluz o balé dos corpos que conversam em línguas de sinais
Os rostos brilhantes
Matizes sem iguais
Chão de escola
Chão de vidas
Tão minhas
Tão suas
Tão nossas
Histórias
Ponto de chegada
Ponto de partida
De muitas trajetórias
Edicléa Mascarenhas Fernandes
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No chão da escola acontecências de um universo apaixonante

  • 1.
  • 2. No chão da escola: Acontencências de um universo apaixonante
  • 3. ii Organização Hellenice Ferreira Conselho Editorial Amanda Guerra Cristina Silveira José Alexandre da Silva Marcia Oliveira Ferreira Marluce Moraes dos Santos Revisão Izis da Costa Guimarães de Oliveira Marcos Vinícius Knupp Barretto Tiago da Silva Ribeiro Fotografia da Capa Everton Barsan Projeto Gráfico José Eustáquio de Queiroz Cauper F441c Ferreira, Hellenice de Souza, organização. No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante / vários autores. – Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias, RJ: H. Ferreira, 2011. 1. Escola. 2. Memória. 3. Professores. 4. Sala dos Professores Mestre Paulo Freire – Brasil. I. Título.
  • 4. iii Prefeito José Camilo Zito dos Santos Filho Vice-Prefeito José Amorelli Secretaria Municipal de Educação Roberta Barreto de Oliveira Subsecretaria de Planejamento Pedagógico Myrian Medeiros da Silva Subsecretaria de Gestão de Pessoal Sônia Pegoral da Silva Assessoria Especial Angela Regina Figueiredo Lomeu Departamento de Educação Básica Mariângela Monteiro Coordenadoria de Tecnologias da Informação José Eustáquio de Queiroz Cauper Sala dos Professores Mestre Paulo Freire Hellenice Ferreira
  • 5. iv “Não sou apenas objeto da História, mas seu sujeito igualmente” Paulo Freire
  • 6. v SUMÁRIO Apresentação ...............................................................................................................vi No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante......................................1 Escola da minha vida......................................................................................................4 Memória sinestésica......................................................................................................5 Ensino Temperado com Afeto ........................................................................................7 A turma do sonho..........................................................................................................8 Momentos de um dia-a-di@... .......................................................................................9 Tempo, tempo, tempo, tempo .....................................................................................10 Do pátio da escola ao palco da vida..............................................................................12 Educar, um ato de amor...............................................................................................14 Sei onde estou: a história de Salviano, por ele mesmo..................................................16 Questão de tempo.......................................................................................................18 Que surpresa...!!!! .......................................................................................................19 As pequenas histórias que mudaram tudo ...................................................................20 Esquecimento..............................................................................................................23 A árvore de Músicas ....................................................................................................24 A menina que despertou para o universo mágico da leitura .........................................25 Santo de casa faz ou não faz milagre? ..........................................................................28 Legalização: mais do que um ato legal..........................................................................30 Mãe Coragem ..............................................................................................................31 Uma nova chance ........................................................................................................33 No chão da escola........................................................................................................35 Chão de escola.............................................................................................................37 Mediar, ação literária de amor.....................................................................................38 Crianças.......................................................................................................................40 Chão da Escola.............................................................................................................41 Uma flor no Jardim Gramacho .....................................................................................42 Construindo um futuro ................................................................................................44 Pó de Giz .....................................................................................................................46 Mosaico chão de escola ...............................................................................................47
  • 7. vi Apresentação Através da educação, deparamo-nos com novas e inusitadas possibilidades de ver o mundo e, consequentemente, atuar nele. Um dos conceitos de educação inovadora e de qualidade é o que destaca a capacidade que o professor tem de ser eterno aprendiz e pesquisador, reconstruindo-se, moldando-se e emoldurando-se, na rapidez das transformações conceituais. Já sabemos que o professor é um gestor da sua turma, dos grupos, dos conteúdos, da disciplina. É ele o gestor do chão da sala de aula, dos passos dos estudantes e dos aparatos que enriquecerão os seus saberes. Ao fazer a gestão de sua aula, o professor é capaz de tomar várias decisões. Muitas delas são pautadas em estudos, pesquisas e leituras, oferecendo resultados mais significativos no desempenho dos seus alunos. Destaca-se, ainda, o fato de que o estímulo ao confronto de opiniões, à prática de contextualização e à integração de conhecimentos múltiplos do processo decisório cria um ambiente apropriado para o aprendizado contínuo. De fato, não se constrói essa inovação educacional sem alianças, pois muitas vezes a escola não dispõe de toda a estrutura necessária para motivar o professor. Assim, ambientes fortalecedores e que propiciam novas oportunidades e criatividade para o professor, tais como a Sala dos Professores – Paulo Freire, da Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias, renovam formatos essenciais para o crescimento e para soluções inteligentes, no âmbito da qualificação profissional. Hoje, espaços como esse são um pilar imprescindível para bons resultados da união entre gestão, professor e alunos. A decisão de frequentar e de estruturar esse cenário é apenas do professor. A decisão de manter um pedacinho do chão da escola no dia-a-dia da administração é uma “acontecência” coletiva e uma vitória de todos nós. Roberta Barreto Secretária de Educação de Duque de Caxias
  • 8. No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante Está quase na hora. Sei que, muito em breve, serei passarela para muitos atores mirins que por mim passarão com um uníssono objetivo: a instigante busca por conhecimentos diferentes dos que são aprendidos em outros chãos: o da rua, o de casa, o da pracinha, o do comércio local, o das casas de familiares e de vizinhos. Enfim, espaços por onde esses protagonistas circulam e onde aprendem diversas informações que lhes são também úteis no decorrer de suas caminhadas como cidadãos. Entretanto, antes da chegada desses personagens tão aguardados por todos que fazem parte do universo escolar, há toda uma preparação para recebê-los: limpeza (passam-me panos e até cera para que eu fique brilhante e cheiroso. E devo confessar que adoro esses mimos feitos pelos profissionais da limpeza! Ah, como é bom sentir a vassoura massageando-me todo!), organização das carteiras (às vezes, acho que me arranham em demasia) ou, dependendo da sala, das mesas que serão instrumentos essenciais para a execução das tarefas propostas por um ator não menos importante: o professor. E lá vem ele, passos firmes, sincronizados, à espera de dar início a mais uma série de passos que levarão seus discípulos ao crescimento intelectual. É interessante sentir a desenvoltura desses profissionais que – por vezes – se emocionam e também se aborrecem com a atitude de certos atores que ainda não descobriram a importância de sobre mim estarem. Sim, é terrível narrar quantas vezes sou arranhado, maltratado, pisado com brutalidade por aqueles que ainda não perceberam que estão em um palco onde têm a chance de errar; já que, em outros chãos, normalmente o erro implica demissão, punição – enfim – chateação. Confesso que me sinto deveras importante, uma vez que sobre mim passaram vultosas personagens. Percebo que isso me sensibiliza. Afinal profissionais de todas as áreas têm de (devo usar DE quando houver o intuito de marcar obrigatoriedade. Aprendi – certo dia – na aula de Português, ou você pensa que fico à toa o dia inteiro?) frequentar uma escola e por mim desfilar. Sei que você estranhou minha nota de tom pessoal feita há pouco, mas saiba que presto bastante atenção e que – nesses anos – em que sirvo de passarela a todos – também acumulo conhecimento. Às vezes, divirto-me com a angústia de alguns alunos que – ao fazerem avaliações – pelas diversas batidas em mim, feitas pelos tênis – sinalizam o nervosismo que estão sentindo. Ah, se eu pudesse ajudá-los!!! Mas também daria uma boa bronca nesses, já que – no momento em que a professora estava explicando e com a turma construindo o conhecimento – aquele nervosinho simplesmente ignorava a tudo e a todos por estar dando batidinhas com os pés ao lembrar de uma música de que tanto gosta. (Isso é só um dos motivos que levam muitos a perderem momentos, considerados por mim, imperdíveis!) Veja se o resultado disso será bom! Não há como acertar mesmo qualquer questão! Não posso aqui deixar de relatar também os passos de outros que demonstram, pela segurança no andar, que dirigem com sabedoria e com firmeza a escola: o diretor, figura que – ao
  • 9. 2 caminhar em direção à sala de aula – transforma a postura de grande parte do corpo discente. Falo grande parte, pois sempre existem aqueles que – mesmo sabendo da importância de ter uma postura de respeito na escola – teimam em fazer estripulias, que levam a repreensões necessárias para se manter o espaço escolar disciplinado. Como me emociono à toa, caro leitor! Também o que não faltam são cenas dignas de Hollywood. Certo dia, caminhava sobre mim – com muita dificuldade de locomoção – uma linda menininha. Pelo tamanho de seu pequenino par de tênis, deveria ter – no máximo – sete anos. Mas apesar de sua dificuldade, seus passinhos me passavam uma vontade e um orgulho em poder estar pisando o chão da escola, já que – se não fosse o trabalho em conjunto de pessoas tão interessadas em fazer com que cada brasileirinho saiba o que é ser cidadão – por mim, essa artista mirim não teria como circular. E captar a energia boa que dela saía e a emoção de pisar- me pela primeira vez – são cenas que muito me fazem ter orgulho de ser um chão escolar. Mas não é só isso, há poucos dias – também recebi um aluno especial. A princípio, estranhei o fato de não sentir seus passos, apenas pneus de uma novinha cadeira de rodas. Depois inferi (sinônimo de concluir. Já lhe disse, caro leitor, que fico atento às aulas, principalmente de Português, que é ministrada por uma professora cujos sapatos são enormes! Parece calçar 40!!! Percebo que é uma mulher grande e forte, mas com uma suavidade e com um carinho com seus pequenos que me cativa. Acho que estou apaixonado...). Não é muita emoção para um já velho e gasto chão, minha gente? Não há palavras que consigam dar conta do que senti e do orgulho que tive ao saber da chegada de alunos inclusivos, que têm o direito, como qualquer outra criança ou jovem, mas que – sem essa cadeira – ficavam impossibilitados de por mim passar. Mas isso é passado na história deles, e o que importa é saber que diariamente aquelas rodinhas circularão freneticamente a caminho da sala de aula, também com uma rampa de acesso (feita de um primo meu, que veio especialmente para fazer junto a mim um chão que sirva a todos e onde não haja exclusão) preparada para a livre circulação desses especiais alunos! Como resolvi me abrir e tive essa chance pela qual muito estou grato, afinal não é sempre que um simples (isso só para os que não veem em mim a beleza e a importância que tenho) chão tem a oportunidade de falar tudo o que sente por ser parte integrante desse essencial momento de vida de qualquer cidadão: ser aluno. Aproveito também para contar que, ao final de um turno, fico muito deprimido, já que sobre mim jazem pontas de lápis, bolinhas de papel (coitadas das árvores! Ouço professores que dizem: “Meninos, não arranquem folhas à toa, usem o corretivo.” Infelizmente, poucos estudantes lhes dão ouvidos e preferem fazer de mim um mar de lixo!) Isso tudo acontece – bem sei – apesar das constantes conversas que acontecem logo no início do ano, momento em que o regimento escolar é passado a todos pela equipe diretiva da escola. Só que há alunos que parecem não ter ouvido nada do que foi dito, ou apenas não veem problema algum em sujar-me. Ainda bem que não é só de tristeza que me alimento, visto que todos os profissionais que são importantes na vida das pessoas (médico, assistente social, psicólogo, professor,
  • 10. 3 políticos) por mim desfilaram e disso sinto-me honrado. Não sei, mas minha afinada percepção já demonstrava que aqueles passinhos de criança se transformariam em passos importantes para o futuro e para o desenvolvimento de nosso país. (Estou sentindo as lágrimas escorrerem... É melhor parar de pensar nisso; já que aprendi, na aula de Ciências, que devemos controlar as emoções e que, quanto maior a idade, maiores as chances de termos um enfarte!). Prefiro não citar nomes desses alunos também especiais para não deixar ninguém de fora da enorme lista; mas basta você, caro leitor, pensar que todos – independentemente da função que exerçam ou que já tenham exercido fizeram jus aos assíduos passos que deram no decorrer de sua caminhada diária por mim, velho e gasto chão da escola. Já está na hora de terminar minhas anotações, já que tenho de me preparar para recepcionar mais um imenso grupo de alunos que chegarão ansiosos e curiosos para me explorar. Falo isso; pois – depois que me conhecerão como um todo – muitos até por mim rolarão (brincadeiras de que muito gosto, pois é um momento em que mais próximo a eles fico e que posso abraçá-los e senti-los mais perto de mim!) e mais tarde – quando afastados da escola estiverem, lembrar-se-ão (é mais um uso que devo àquela professora de Português....) dos mágicos tempos de escola e de tudo por que passaram nela... Bom, caro leitor, diante desse emocionante texto feito por mim, um tão ignorado chão de escola, só me resta concluir o seguinte: sou um chão escolar e orgulho-me muito de sê-lo. Sim é essa a minha simples, todavia apaixonante conclusão! E, como não poderia deixar de agradecer, sou grato a todos que – de alguma forma – zelaram pela minha manutenção e pela limpeza de meu corpo tão gasto pelas pisadelas de muitos que de mim nem se lembrarão, mas que terão belíssimas histórias para relatar desses saudosos tempos de escola! Peço apenas, que – a partir dessa leitura – todos que por mim circularem retirem um tempo – nem que seja um segundo – para me contemplar como parte integrante do incrível, emocionante e apaixonante universo escolar! Fernanda Lessa Pereira Divisão de Educação Infantojuvenil – Língua Portuguesa
  • 11. 4 Escola da minha vida Ao ouvir certos discursos sobre a necessidade de tornar a escola um espaço prazeroso, volto ao tempo e perco-me em minhas reminiscências, pois nunca vivi a escola de uma forma que não fosse prazerosa. Penso, com certa nostalgia, nos espaços e pessoas e, em todas as situações vivenciadas, com muita euforia e dinamismo: os recreios e horas vagas, envolvidas pelos jogos de queimado, pique bandeira, garrafão, elástico... E o despertar para literatura. Ah, os livros! A fantasia de histórias como: “A Ilha Perdida”, “Cachorrinho Samba”, “O Menino do Dedo Verde” e, como esquecer, os suspenses de Agatha Christie... As rodinhas de conversa com os professores e o exercício constante de nossa criatividade: fazíamos teatro, dança, festivais de música. Tantas as performances! Éramos envolvidos pelas mais diversas linguagens artísticas. E o envolvimento com o Grêmio Estudantil, as reuniões de representantes de turma, o despertar do ser político e da consciência da necessidade do envolvimento nos movimentos que cercavam o nosso Universo. Caminhávamos confiantes, certos do pertencimento aquele espaço. Muito do entusiasmo e da eterna certeza de que a escola é o espaço da diferença em nossas vidas vem desta escola impressa em mim. Registros de um tempo de vivências significativas e, acima de tudo, prazerosas, que ainda hoje endossam minhas ações e posicionamentos ao pensar, planejar e realizar em relação à esta Instituição. Roseli Ramos Duarte Fernandes Secretária de Educação (06/2010 a 07/2011) Atual Secretária de Ação Social
  • 12. 5 Memória sinestésica Tudo era muito estranho, novo e intrigante. Sonhara com aquele momento por diversas noites desde que minha mãe falara que eu iria estudar. Meu irmão já estava estudando e eu desejava isto mais que tudo. Havia muita gente na calçada em frente da escola: crianças, pais, bicicletas, tudo que hoje ainda existe. Mas lá na porta da sala havia uma mulher que hoje não está mais lá, Dona Maria. Era uma mulher não muito alta nem muito baixa que usava um jaleco branquinho, muito comprido. Seus cabelos vermelhos, que depois descobrimos que era pintado, mas não deixava de ser bonito, não apresentava um fio fora do lugar. Seu rosto, humm... tinha um cheiro bom de pó de arroz. A boca, esta era muito diferente, era um leve e fino traço de batom no rosto; olhos claros e com um brilho que me perdia na tomada de lição. Sinto seu perfume até hoje: Madeiras do Oriente – vendia na farmácia, minha mãe também usava, havia dois palitinhos amarrados dentro do vidro, eu ficava balançando o vidro horas para vê-los descer lentamente até o fundo do vidro. Mas ela não era a única. Havia outras, muito, mas muito atentas às bagunças que fazíamos. Havia duas que não posso e não quero nunca esquecer o cheiro e os rostos, Dona Paulina e Dona Arlete. Dona Paulina era uma negra não mais jovem, mas cheia de disposição. Tinha um jeito mineiro de falar, olhar terno que aquecia quem olhasse. Dona Arlete tinha um jeitão meio portuguesa, falava alto, mas não deixava de ser terna conosco. Tinha braços fortes, mãos grandes e dedos gordinhos, muito branquinhos. Elas usavam lenços amarrados na cabeça, igualzinho quando minha mãe fazia touca no cabelo, mas elas não estavam de touca. Eram as merendeiras. Nossa, que cheiro gostoso vinha daquela pequena cozinha... Quando chegávamos para pegar nossos pratos, elas nos serviam com um sorriso nos lábios e uma frase milhões de vezes repetidas... Cuidado! Está quente! Ah! Como eu gostava do macarrão com salsicha, da sopa... era tudo novidade; era tudo como devia ser. Colorido, cheiroso e alegre. Lembro-me das paredes da sala de aula emprestada – sim, emprestada, já que a escola funcionava em um prédio cedido pelo Centro Espírita Thiago Apóstolo, que também era o nome da escola: Escola Municipal Thiago Apóstolo. Era um grande salão dividido por biombos de madeira em três partes. O telhado de telha de barro ficava tão longe que parecia o céu. As janelas eram altas e as paredes eram grossas, mas mesmo assim os meninos viviam pulando pra dentro e para fora quando a professora se distraía. Havia uma grande mesa com muitos bancos a sua volta e muitos, mas muitos cartazes com abelhinha, dado, escova, mapas, esqueletos humanos, muitas imagens, sons...
  • 13. 6 Eu gostava de desenhar. Era mágico falar com o papel e ver sair dele esqueletinhos, se mexendo e falando comigo. Jardins floridos, casas no topo de colinas, nuvens em um céu muito azul. A diretora tinha cheiro de jardim, parecia uma atriz de novela, todas, todas pareciam ter saído de uma página da revista. Gostava de ver a bagunça que as letras faziam no papel e de tentar entender como era possível realizar uma divisão tão grande. E pra que dividir se o que eu queria era ficar com todas as bolinhas de gude. Em julho era a quadrilha. O ensaio era no terreno baldio próximo da escola. Ele tinha sido aterrado recentemente, e o barro era bem vermelho, a poeira subia e ficávamos com as meias da cor da terra. No dia da festa, meu pai se vestiu a caráter, calça jeans e chapéu de palha; minha mãe preparou um bolo do norte, aquele de massa puba. Tudo muito enfeitado com pindoba e bandeirinhas que nós mesmos fizemos. As prendas... era muito engraçado na pescaria pegar de volta o seu trabalho de artes... Tudo tinha cheiro, cor, sabor, tudo era como deveria ser, alegre e novo, tudo. Todos os anos minha mãe me fazia bordar um tapete de juta com lã em ponto cruz, para dar de presente no dia do professor. Mas, no dia das mães, os mais levados eram escolhidos para apresentar versinhos, cantar músicas, assim como hoje, mas era diferente. Eu chorava todas as vezes que ia recitar o versinho que tanto ensaiei... eu não sabia porque chorava, até hoje não sei por quê!!! Ah, quase me esqueci. Por várias vezes soldados iam à escola e faziam perguntas engraçadas, que eu não sabia como responder: Quem de vinte e cinco tira? E na verdade ele queria dizer: Quem de vinte, cinco tira, fica com? Quinze! Quinze era a resposta. Outras vezes iam com médicos, vacinas. Puxa... meu braço tem a marca até hoje! E então veio a quinta série. Lá não podíamos mais ficar. Deveríamos fazer o curso de férias no Fluminense, e a prova do Aquino. Era outro universo, participar da banda marcial, dos desfiles cívicos, queimada na praça da igreja... Tudo tinha cheiro, cor, sabor. Tudo era como deveria ser: alegre e novo, tudo... Lavínia Dolores da Costa Coordenadoria de Nutrição Escolar
  • 14. 7 Ensino Temperado com Afeto Quando minha mãe separou-se de meu pai, fui enviada para casa de minha tia, que morava no Espírito Santo. Um lugar estranho para mim, com uma família desconhecida. Eu tinha apenas 5 anos e encontrei lá mais duas crianças. Eu era a mais velha do grupo. Logo depois, nos mudamos para Marapé, distrito de Cachoeira do Itapemirim, e lá chegaram mais 4 crianças. Eu teria que lavar, passar, cozinhar para todos, num total de 7 crianças, contando comigo. Mas, nesse lugar, já na terceira série, encontrei uma professora que fez a diferença em minha vida. Vivendo nos dias de hoje posso perceber que ela tinha visão futurista. Eu estudava à tarde, quando ouvia a sirene tocar para saída do turno da manhã às 12h. Corria para o rio, tomava banho, colocava o uniforme, do qual me lembro até hoje: saia vermelha pregueada, blusa de pano de saco, esse que utilizamos como pano de chão, e uma gravata vermelha; o cabelo ficava para cima. Sapato não tinha, ia descalço mesmo. Às vezes não dava tempo de tomar banho, aí eu ia assim mesmo e a professora não se importava com o cheiro de xixi, que fazia todos os dias na cama. Acho que era ansiedade. Para ela isso não significava nada, pois o mais importante era não faltar aula. O caderno era apenas um. O livro chamava-se meu tesouro e continha todas as matérias. Era bem grosso e ficava na escola, já que passava de um para o outro a cada ano. Me lembro dela nitidamente: era alta de pele clara, cabelo pretos, óculos quadrados, grandes e pretos. Era filha de fazendeiros, não tinha salário, mas estava além de seu tempo. Em apenas quatro horas de trabalho por dia, ensinava tudo, até mesmo tabuada com premiação, além de ensinar a cuidar da horta de onde tirávamos a merenda escolar, da qual sinto o gosto até hoje. Tínhamos um caderno de dedicatória, que ela deu um para cada aluno. Nele, escrevíamos poesias e dedicatórias para os colegas em casa. Eles transitavam na sala de aula o tempo todo. Lia histórias, fazia brinquedos cantados e folclóricos conosco num campo de futebol próximo à escola e, nos últimos meses de aula, dava para cada aluno um poema bem grande para decorarmos no dia de encerramento das aulas. Nesse dia, íamos sem uniforme com nossa melhor roupa, subíamos na cadeira para declamar e todos da classe aplaudiam. Ela ainda arranjava tempo para desenhar no canto das folhas de nossos cadernos e, no final da aula, nos oferecia toquinhos de giz. Em casa, dava aula para as crianças de sabugos de milho feitos por mim nas horas vagas. Eu sentia muita falta da minha mãe, mas o carinho dela me fazia sonhar. Sonhar em ser professora. Passei pelas mãos de centenas de professores, muitos esquecidos, mas ela marcou minha infância e guardo até hoje o nome dela: Genilda Cabelini. Em minha trajetória educacional e de vida, a tenho como exemplo. Preciso parar por aqui, pois senão escreverei um livro sobre esse tempo. Acho que meu talento para arte trouxe de lá. Ela viverá em minhas lembranças para sempre e, onde quer que ela esteja, tenho a certeza que está feliz, pois seu esforço foi recompensado. Até hoje tenho meu caderno de dedicatória guardado. Cleuza Maria Daniel de Souza – Equipe de Cerimonial e Eventos
  • 15. 8 A turma do sonho A turma era 801B, classificada pelos professores como a “turma do agito”. Éramos todos amigos dentro da escola e fora dela, pois morávamos no mesmo bairro. O pátio da nossa escola era muito pequeno. Devido a isso, na hora do recreio, a diretora autorizava somente as turmas da oitava série a irem à praça, que ficava em frente à escola. Isso era para nós como um prêmio, por isso todos os alunos da escola, inclusive o jardim de infância, queriam chegar logo à oitava série. Lá na praça, nós brincávamos de balanço, jogávamos bola, vôlei, mas o que nós mais gostávamos era ficar conversando com o “Tião”. Ele era um morador de rua muito conhecido por todos. A vizinhança cuidava dele, dando comida, roupas e tudo que ele precisasse. O Tião era muito engraçado e sempre contava umas histórias sem pé nem cabeça, que a turma adorava ficar ouvindo na hora do recreio. Todos os dias cada um era responsável por comprar um sonho na padaria para o Tião, porque o Tião só contava as histórias depois de comer o sonho. Quando acabava o recreio, nós voltávamos para a escola e o Tião era nosso guardião: levava a turma toda até ao portão da escola, dava um tchauzinho e abria aquela boca sem dente num sorriso que nos fazia rir mais ainda. Até que um dia, o sinal do recreio bateu, corremos para a praça, e o Tião não estava lá. Procuramos, procuramos, procuramos em todos os lugares. Perguntamos aos moradores se eles tinham visto o Tião. E nada. Antes de o sinal bater avisando que o recreio tinha acabado, voltamos para a sala de aula. A diretora, Dona Estela, estranhou, pois todos os dias ia lá na praça buscar a gente, porque fingíamos não ouvir o sinal comunicando o término do recreio. E assim passaram-se duas semanas. E o Tião não aparecia. O recreio não tinha a menor graça, a praça vazia. E ninguém tinha coragem de comer um sonho da padaria. Os professores também estranharam, porque pela primeira vez a turma 801B ficou caladinha nas aulas e nem uma confusão surgiu neste período. Foi então que durante a aula da Dona Marly, professora de matemática, ouvimos uma gritaria lá na rua. Alguém batendo no portão, gritando: “Sonho, sonho, sonho.” Corremos para olhar na janela que dava de frente para a rua. Para a nossa surpresa era o Tião. Saímos da sala correndo, cada um mais rápido que o outro. Quando chegamos ao portão, o Tião falou assim: “Quero o meu sonho e com doce de leite” Foi a maior felicidade. Nós abraçamos o Tião e o levamos para a nossa sala de aula. Nesse dia a Dona Estela autorizou que ele assistisse à aula junto com a turma. Quando o sinal bateu corremos para a padaria e cada um comprou um sonho pro Tião. Foi o melhor recreio das nossas vidas. Cristina das Graças Ferreira Vianna Equipe de Leitura
  • 16. 9 Momentos de um dia-a-di@... Era um dia comum, como outro qualquer... Muitos afazeres, atividades normais de todos os dias: ler emails, twittar, verificar agenda no docs, corrigir textos, fazer algumas ligações... Por volta de 13h30, antes de sair pra almoçar, lembrei de ligar para casa e verificar como estavam as coisas por lá. Minha querida mãe, com todo aquele carinho de sempre, me responde que está tudo bem (mesmo ouvindo o bagunça dos meus filhos na casa). As crianças já chegaram da escola, almoçaram e estão assistindo aos desenhos na televisão. Desliguei o celular, já com saudade daquele barulhinho, e lembrei-me de quando eu tinha a idade deles, de como era bom chegar da escola e contar as aventuras de uma manhã. E eram muitas... A escola era um lugar de muita magia, muitos segredos, muitos medos. Era realmente uma montanha-russa pra mim, mas eu amava aquilo tudo! Até porque eu era muito só, filha única e cheia de imaginação... Lembrei-me de quando, nas manhãs de verão, ia me arrumar para estudar. Minha casa tinha um quintal enorme, cheio de árvores e muitas plantas. O sol entrava na casa junto a uma brisa delicada, que trazia o cheirinho do mato molhado do sereno noturno. Eu tomava um copo de café com leite, mais leite do que café, uniformizada e ansiosa, com os olhos atentos no relógio da vovó que ficava na cristaleira. O sinal tocava e já estava na fila para a forma matinal... “Firme, cobrir, firme... rssss. Nossa, parecia um quartel, mas a gente se divertia assim mesmo. Fazíamos barulho com os braços e sempre pesávamos nossa mão no ombro do colega da frente, às vezes até fazíamos cócegas... O Hino Nacional brasileiro era sempre cantado com muita emoção, e depois íamos pra sala de aula. Os professores eram parceiros de momentos únicos, como o de ensinar o plantio de amêndoas em Técnicas Agrícolas; nos apresentar a arte e a Música com um concerto no Teatro Municipal; aprender geometria medindo a quadra da escola; conjugar os verbos escrevendo uma novelinha do jornal da escola. Tudo era ligado e interligado, era tudo junto e misturado e o mais legal disso tudo: a gente aprendia!!! O celular toca novamente. Era do trabalho. Precisava voltar para a SME, pois tinha um professor precisando do auxílio da tecnologia e me esperava para atendê-lo. Volto para o trabalho e ouço no caminho um som de sirene... Paro no sinal vermelho do trânsito engarrafado e procuro a escola. Será o sinal da entrada? Será que ainda estou em meus pensamentos e não acordei? Vejo uma ambulância passando na rua correndo... É... que pena, acordei. E volto para a realidade de sempre: correria, e-mails, TV’s, DVD’s, notebooks, projetores. Mas feliz, muito feliz com meu trabalho, meus amigos, minha vida! Alexsandra Rosas dos Santos Azevedo Coordenadoria de Tecnologias da Informação e da Comunicação – Núcleo Tecnológico Educacional Municipal
  • 17. 10 Tempo, tempo, tempo, tempo Estou a dois dias do recesso do mês de julho. Estava ansioso por esta parada tão benéfica para nós, professores. Tempo de recarregar as baterias, refletir sobre os projetos, rever rumos. Tempo de dar um tempo! Aproveito este intervalo para esvaziar as gavetas (meu Deus, quanto papel!) e ouvir alguns CDs esquecidos na estante por conta do corre-corre do cotidiano. Ouço as melodias de Cartola, Nana, Benito Di Paula (meu Deus, nem sabia que tinha um CD do Benito!), Lenine, Roberta Sá... No momento, com o rádio ligado, Vanusa me diz que “que hoje eu vou mudar, jogar fora sentimentos e ressentimentos tolos!” Escuto e acho que ela tem razão. Pra que acumular tanta coisa? Prossigo esvaziando as gavetas e acreditando que a vida ficará um pouco mais leve no segundo semestre. Encontro, em meio aos papéis, muitas fotos antigas. Algumas, rasgo com veemência... sentimentos e ressentimentos tolos. Outras, acaricio. Observo a simplicidade dos olhares, a vulnerabilidade da vida, a inexperiência dos começos. Encontro uma foto antiga de uma turma que tive. Paro por um instante. Volto no tempo e tento recordar o nome de cada criança que sorri naquele registro. Meu Deus, essa foi a turma mais difícil que tive. Foi com ela que aprendi a ser professor! Recordo-me que todo dia que ia começar a aula eu tinha que desarmá-los primeiro: – Coloquem as armas aqui! E lá vinham para cima da minha mesa pedaços de canivete, ripas de bambu, soco inglês, espelho quebrado. Quando eu ousava fazer algum passeio com eles era dor de cabeça na certa. Iam cuspindo da janela do ônibus nas pessoas que passavam na rua da saída da escola até o destino derradeiro. Eu voltava para casa chorando escondido dentro do ônibus me prometendo que se eu conseguisse chegar vivo até o fim do ano, eu daria uma grande festa em comemoração. Era uma turma tão barulhenta que eu já estava fazendo “xxxiiiii” até para papel alumínio em casa. Como estratégia de sobrevivência, resolvi adotar o método do “Só por hoje” dos Alcoólicos Anônimos. Fiz uma lista com regras básicas do tipo: não xingar, não matar, não cobiçar a mulher do próximo e enumerei cada uma. No início da aula eu sorteava um número que teria que ser vivenciado naquele dia: só por hoje. Eu sei que era só uma regra, mas se naquele dia eles não xingassem, por exemplo, já seria um alívio. Um dia começaram os preparativos para uma festa que aconteceria na escola e todas as turmas teriam que apresentar uma coreografia. Começava ali o meu tormento! Querendo ser democrático para parecer um professor “sangue bom”, pedi para os alunos trazerem músicas para ensaiarmos. Pra que? Surgiram um monte de CDs piratas com aqueles funks mais cabeludos de corar até os MCs da Furacão 2000. Depois de ouvir muitas pérolas da MPB para garimpar algo que pelo menos não enfartasse a diretora, encontrei uma música do DJ Malboro que lá no finalzinho dizia: chega de tristeza! Pronto! Era aquela! Agarrei aquela música como se fosse o último bote do Titanic e fui para o ensaio. No dia da festa apresentamos. Fomos
  • 18. 11 execrados! Alguns membros da comunidade acharam um absurdo eu ter colocado em evidência na festa, alunos que tinham um péssimo comportamento. Naquele dia chorei um pouco mais no ônibus. Tinha vontade de desistir, mas como já nos disse Chico Buarque: “meio-dia eu só penso em dizer não. Depois penso na vida pra levar e me calo com a boca de feijão”. E assim eu fiz. A partir dali comecei a levar para a escola alguns CDs que eu tinha. Quando eu dava alguma tarefa para os alunos sempre colocava uma música suave de fundo. Músicas clássicas, MPB, trilhas sonoras. Parecia que isto não fazia a mínima diferença. Um dia resolvi não colocar mais as músicas durante as atividades, deixando apenas como fundo musical a balbúrdia peculiar de cada dia. Um aluno se aproximou e perguntou timidamente: – Hoje não tem música, professor? Foi então que percebi que estava fazendo efeito. Quando fomos a uma apresentação musical dos alunos da Escola de Música do Zeca Pagodinho, ouvimos “Aquarela do Brasil” orquestrada. Um aluno veio me perguntar: – Professor, é “Aquarela do Brasil”? E eu, todo orgulho disse: – É, sim. No fim do ano, na Festa da Primavera, a minha turma dançou um bolero: “Solamente uma vez”. As meninas de vestidos longos e os meninos com as gravatas emboladas no pescoço num bailado sensível sob os olhares perplexos da plateia presente. Tudo isso por causa de quem? Do Flávio? Não, do tempo. Aprendi que algumas respostas só o tempo pode dar. A foto na minha mão me recordou algo que havia esquecido: estou em construção! Sem muitas respostas, mas cada vez mais ávido pelas perguntas. Respeitando meus limites e oportunizando algumas sementes. Olho a foto e tento por um momento imaginar o destino que cada aluno tomou. Será que ainda lembram daquela loucura do “só por hoje!”? Tomara que sim. Tomara que estejam ainda aplicando nas suas vidas, mas agora com novas regras embaladas pelas muitas melodias que vivenciaram. Só por hoje serei feliz, só por hoje vou acreditar nos meus sonhos, só por hoje ajudarei alguém a se reconhecer como gente, só por hoje vou sorrir, só por hoje vou reservar um tempo para meus amigos e familiares, só por hoje, só por hoje... solamente una vez! Um barulho no rádio interrompe a música e desperta meus pensamentos. Minha filha Helena trocou o CD. Agora, Pe. Fábio de Melo recita um poema que diz: “eu, sacerdote das divinas causas. Ele, o tempo, sacerdote das humanas razões”. Acho que a vida é mesmo assim. Flávio Valadares E.M. Oswaldo Aranha
  • 19. 12 Do pátio da escola ao palco da vida A leitura está no ar há muito tempo na nossa unidade escolar. Nossas andanças por esse mágico universo tem nos levado a momentos especiais recheados de risos, choros, medos, sonhos... Ah! Os Sonhos! Como é bom tê-los e vivê-los. Sonhos movem ações, e ações tornam-se realidade. Por tal motivo, lendo, relendo e representando juntos, já sonhamos e vivemos muitas personagens. Com os pés no chão (literalmente), mas com todos os apetrechos como manda o figurino, sempre fizemos e fazemos “acontecer”. Por meio do teatro, que nada mais é que leitura em movimento, transformações reais ocorrem: alunos mais responsáveis, mais parceiros, mais disciplinados, mais LEITORES! Até mesmo aqueles mais inibidos são contagiados e motivados a deixar a timidez de lado para viver sonhos! Tenho convivido e me encantado por meninos e meninas que têm demonstrado alegria e satisfação em realizar algo que acreditamos valer a pena. E como tem sido válido cada sorriso, cada conquista, cada superação. Os que concluem o ensino fundamental, na hora de partir, deixam muitas marcas e histórias inesquecíveis (que me emocionam só em pensar). É, os que se tornam “ex” deixam saudades e, certamente, as têm também. Contudo, como se diz, o mundo é pequeno e, às vezes, reencontramo-nos com fortes abraços e belas lembranças. Dia desses, uma das minhas estrelas apareceu ao vivo para me ver! Morando no Canadá, falando inglês fluente, ela me deixou muito orgulhosa da sua vida por lá e por não ter esquecido que um dia fez parte do grupo de teatro da escola e o quanto isso lhe fez bem em vários aspectos. Soube ainda que alguns já são pais e mães de família e a maioria, quem diria, professores! Em 2010, quando fomos fazer uma apresentação no Teatro Raul Cortez – como é bom proporcionar aos meninos esse momento tão sublime que é o de pisar num palco de verdade –, enquanto passávamos para o camarim, vi, na sala da administração, um rosto conhecido. Porém, com toda a movimentação da apresentação, não consegui lembrar de onde! Até que aquela moça bonita, educada, bem vestida veio até mim: – Oi, professora! Lembra-se de mim?! Eu fui sua aluna de teatro. Nossa! Aí veio tudo a minha memória... e que alegria! Alegria por vê-la bem, trabalhando (e olha só, no teatro), cursando faculdade de Comunicação. É muito gratificante ver minhas estrelinhas participando de algo que vão levar para sempre em seus acervos pessoais, a ser recordado com satisfação e saudade. Um conjunto de aprendizado que vão impulsioná-los para futuras conquistas. Alguns saem até dizendo que ainda vou vê-los atuando como artistas! Torço, torço para que realmente sejam bons profissionais, independente da área em que venham atuar. Torço para que sejam felizes e
  • 20. 13 que façam a diferença por onde passarem. Que sejam sempre ESTRELAS, refletindo boas ações e transformações no palco da vida real. E assim seguimos em frente, “teatrando” daqui e dali, mesmo que descalços no chão da escola, mas flutuando em sonhos e esperanças de que, na vida, o mais importante não é a situação em que nos encontramos, e sim o rumo que damos a ela. Izabel Cristina dos Santos Alvarenga Lopes E.M. Nossa Senhora do Pilar
  • 21. 14 Educar, um ato de amor “O noturno é daqueles que, apesar de estarem à margem, nunca perderam a esperança de voltar ao mar”. Assim, num momento de reflexão, defini a Educação de Jovens e Adultos, minha paixão dentro do Universo da Educação. Um lugar onde me descobri mestre pela possibilidade de aprender a me colocar no lugar de aprendiz. A emoção me toma ao falar desta construção. Quem me conhece e acompanhou minha trajetória junto a este segmento sabe do que falo e do sentimento que envolve meu discurso. De toda esta história, não posso me furtar a registrar neste espaço um dos episódios mais significativos de minha caminhada profissional. Lembro-me de que não só a necessidade de melhor organizar meu tempo, mas também a frustração na realização de um trabalho, que me parecia um perfeito desastre, levaram-me a um concurso de remoção, e a uma oportunidade de trabalhar à noite, num ensino supletivo, que transitava para um então ensino regular noturno. O nome da Unidade Escolar, Escola Municipal Todos os Santos, era sugestivo para quem tinha as pernas, e também o corpo todo trêmulo diante desse novo desafio. Ao entrar na secretaria e me apresentar, fui focada por olhares descrentes, diante da minha meninice, nos meus vinte anos, que mais pareciam quinze, tamanha a fragilidade física. Pedi para aguardar na sala de aula, pois queria um tempo só, para melhor me articular. Ao entrar na sala, a mesa do professor me pareceu enorme. Um certo constrangimento me impediu de ocupá-la. Busquei uma cadeira na última fila de carteiras da sala, ali sentei e pensei: “Se pudesse, nunca mais me levantaria daqui”. O tempo passou e os alunos foram chegando. Ocupavam seus espaços, conversavam entre eles. Do lugar onde estava, fitava a cada um deles. Em seus discursos, me apropriava um pouco de suas histórias de vida; ainda estavam despidos da condição de alunos, e iam expondo um pouco de si mesmos. Alguns me olhavam curiosos, mas não se aproximaram. Era comum essa rotatividade, a constante presença de novos rostos, que com o tempo se adaptavam àquela dinâmica. Por um momento ou outro, me lembrava de minha condição, quando indagavam: “Cadê a professora? No primeiro dia já vai chegar atrasada?” Todo aquele transe foi quebrado repentinamente, quando adentrou a sala a diretora da escola, que me apresentou ao grupo. Por um tempo perdida entre o tempo e o espaço, fui gradativamente retomando a consciência de minha própria existência, e, para minha surpresa, a leveza que me invadiu e a empolgação diante de todo aquele rico universo, de múltiplas possibilidades, me permitiram estar e, muito mais que estar, criar, construir caminhos diferenciados. A riqueza de nossos contatos permitiu vínculos que até hoje se estabelecem, e,
  • 22. 15 muito mais, permitiu uma construção interna de educadora, que se traduz na possibilidade de compartilhar e de acreditar no potencial e nas possibilidades que envolvem cada ser humano. Foi um período de desconstruções e reconstruções e, essencialmente, foi um momento de tamanha amorosidade, a mesma amorosidade que com certeza inspirou tantos escritos de Paulo Freire, o Mestre, que tão sabiamente nos levou a refletir que a Educação é verdadeiramente um ato de amor. Ana Cláudia Gomes Cunha de Carvalho Assessoria de Comunicação
  • 23. 16 Sei onde estou: a história de Salviano, por ele mesmo “(...) A carta chegou e tinha o meu nome... sabia que era importante... Então eu abri e li. Arrastado, mas li. Era minha aposentadoria. Fiquei muito emocionado por eu ter lido aquilo... Eu ia ao médico, pois tinha que ir no clínico geral. Eu não sabia ler as placas das portas e ia parar no cardiologista. Hoje não, mudou tudo. Eu leio na rua, paro na banca de jornal e até tiro uma casquinha.” Salviano ingressou na escola municipal Marcílio Dias, na classe de alfabetização de Jovens e Adultos, depois cursou o Ciclo I, onde ficou dois anos e, por fim, o Ciclo II, onde também permaneceu por dois anos. Ele é um senhor de 60 anos, que diz ter 49, porque facilita a paquera. Grandão, com cabelos grisalhos estilo Roberto Carlos, solteiro, católico, nascido na Paraíba, veio para Caxias bem jovem. “Eu sou da Paraíba, vim pra cá com 16 anos, falsifiquei documentos para poder vir para a cidade. Só grandão que tirei a certidão de nascimento. Me levaram no cartório, fiquei lá cheio de vergonha.” Antes de se matricular na escola, já tinha carreira definida. Recebia um salário mínimo de aposentadoria e complementava sua renda com o serviço de pintor de carros. Seu interesse na escola não está voltado para o mercado de trabalho. Vai muito além. O que ele conta aponta para significados mais profundos que a escola traz na sua vida: “Pra mim é muito importante, porque eu não estudei quando era novo...” Trabalha em Saracuruna, como lanterneiro; é famoso, conhecido como melhor pintor de carros da localidade. Um funcionário da escola disse que chega a ter fila de espera para que ele faça o serviço nos carros. “Há algum tempo eu já queria estudar, mas eu não sabia onde tinha escola que pegasse do início. Não tinha. Aí aqui abriu. Me levaram para uma sala, aí eu vi que tava no lugar errado. Perguntei à professora e ela me levou para a sala certa”. Quando perguntado quais eram suas metas, desejos em relação ao estudo, ele respondeu: “Eu quero aprender. Não tenho definição, eu quero aprender.” Quando ele diz que estudar é muito importante, porque não estudou quando era novo, ele demonstra acreditar que havia uma carência na sua vida. O fato de se autossustentar, se manter financeiramente, não era suficiente para que se sentisse integrado e independente no mundo. O que ele queria e precisava era saber onde estava, como agir, se virar sem precisar estar o tempo todo pedindo ajuda.
  • 24. 17 “A gente passa a entender alguma coisa, já pega jornal e fica sabendo das coisas. Pega ônibus, endereço certo, lado par e ímpar da rua. Com pouca coisinha que tá aprendendo já não precisa ficar alugando todo mundo”. Relata também o seu olhar para as pessoas que ainda passam por aquilo que ele passou um dia: “Outro dia eu vi um sujeito novo para receber no banco, tendo que botar o dedão (referência à assinatura com a utilização da impressão digital). Às vezes chega alguém no ponto e pede para mostrar o ônibus, porque não está enxergando. Às vezes acredito, mas às vezes sei que é porque não lê (os ônibus da cidade de Duque de Caxias se identificam pelo nome do bairro e não por números)”. Com essas duas falas, ele mostra, com situações reais e até bem comuns em seu meio, como é a vida sem estudo, sem saber ler. E o que ele tenta destacar é que saber ou não saber define o cotidiano de uma pessoa: aonde vai, como vai, sua independência e o seu brio. Para esse aluno, não ter estudado significava estar uma categoria abaixo, era ser menos que os outros. Ou, o que era mais grave, não ser ninguém. Ele se desqualificava, por não ter estudado, independente da vida que possui hoje em dia, da família que criou, dos empregos que conseguiu, da história de luta, da superação de obstáculos e até da melhoria de vida em relação à vida de seus pais. Não ser instruído, não ter passado pelo processo de educação formal o definia. Hoje Salviano fala com orgulho da independência que conquistou. Não da financeira, mas da moral, pois já avalia, vê em outros as “deficiências” que tinha e sabe que não tem mais. “Antes eu não sabia de nada; hoje eu vou no banco e sei onde estou.” Paula Figueiredo da Silva Camargo Divisão de Educação Infantojuvenil – Filosofia
  • 25. 18 Questão de tempo Sempre que me pergunto: “por que sou professora?”, algum aluno resolve me lembrar do motivo. Crianças sempre me motivam a escrever algo, geralmente engraçado. Entretanto, desta vez será algo profundo, pelo menos pra mim. Durante uma roda de conversa, uma aluna se levantou e começou a me contar que havia visto um programa chamado “Sai de baixo” na noite anterior à aula. Lembrei que este programa era exibido no tempo em que eu tinha a mesma idade que meus alunos e exclamei: – Mas isso é do meu tempo! Em seguida, outra aluna disse indignada: – Mas, tia, seu tempo é agora! Tentei explicar a ela a questão do tempo, que eu me referia a minha infância, porém ela não se satisfez. – Mas, tia, você está aqui agora, então também é o seu tempo. Dei-me por vencida. O que poderia fazer diante desta imensa sabedoria lógica e infantil? Não pude parar de pensar no que minha aluna disse. Uma criança me fez perceber que todo tempo em que vivo é meu! Logo eu, saudosista inata, sempre sentindo falta do que passou... Pensar que a vida é tão curta e que, se não sentirmos e vivermos cada “tempo” como se fosse o último, podemos perder tanto! Enquanto eu estiver aqui, vivendo, será o meu tempo. E pensar que uma menina tão pequena aprendeu isso antes de mim! Faço questão de agradecer aos meus pequenos mestres sempre que posso pelas lições de vida, pelas pérolas soltas durante as aulas e por alegrarem os meus dias. Obrigada. Aline de Souza Fiorentini Creche e Pré-escola Ayrton Senna
  • 26. 19 Que surpresa...!!!! Aquele foi o meu primeiro ano na Educação Infantil, e, apesar de gostar de cantar e brincar com as crianças, nunca tive muito interesse em trabalhar com crianças muito pequenas. Acho que tenho um vocabulário mais voltado para alunos com uma faixa etária mais elevada. A turminha era composta de 20 alunos, sendo dois com síndrome de Down. A rotina inicial corria bem como todos os dias e eu sempre dedicava uma atenção especial a esses dois alunos. Num desses momentos, um deles gritou: – Ô, professora, a Júlia está enchendo uma bola!!!!! E eu respondi que já ia ver e continuei a ajudar esses alunos na atividade do momento. De repente, outra criança grita com aquela bocona desdentada que quase todos com cinco ou seis anos têm: – Não é bola não, professora... É camisinha.....!!!!!! Sinceramente, aquilo bateu no meu ouvido e ficou. Eu olhei na direção dos dois e percebi que realmente a Júlia estava com uma camisinha na mão, quase ficando gigante. Então eu disse: – Que camisinha o quê, Claudinei? Ninguém vai trazer uma camisinha pequenininha para a escola. Me dá logo essa bola aí, Júlia. – Não é bola não, professora, é camisinha – disse o Claudinei. Olhei pra ele e percebi que ele estava achando muito engraçado o meu comentário. Neste momento, solicitei que fosse na minha mesa, explicando: – Meu filho, por acaso você sabe o que é camisinha? – Claro, professora. É pra colocar onde a gente faz xixi. Fui ficando vermelha e não sabia mais que rumo dar àquela conversa, mas mesmo assim continuei falando com ele. – Quem te ensinou isso? – Meu pai, professora. Seu pai não te contou não, que fica esperando neném se não vestir a camisinha? Neste momento, resolvi mandar o Claudinei sentar no lugar dele e fui fazer uma lista de coisas que podemos colocar na mochila para levar para a escola. Na hora da saída, fiquei prestando atenção na chegada da mãe da Júlia, pois queria conversar com ela sobre o ocorrido e pedir que tomasse mais cuidado com as coisas que a sua filha pegava em casa. Para espanto meu, a resposta desta mãe foi: – Só isso professora? Eu sempre dou as camisinhas para eles encherem e brincarem quando estão me perturbando – e começou a rir. Iná Maria Teixeira Lavradas – E. M. México
  • 27. 20 As pequenas histórias que mudaram tudo Esse texto não pretende ser um relato de como me tornei professora de crianças aos “mais de quarenta” anos, mas acho que algumas explicações são válidas, pois não tive uma carreira muito típica. Na adolescência, eu tinha (ainda tenho) horror à ideia de sujar os dedos num mimeógrafo, por isso, fui estudar “um tal de Processamento de Dados”, que eu não fazia a menor ideia do que se tratava, mas que me livraria do Curso Normal. O tal de “Processamento de Dados” ficou conhecido como “Informática” e me levou a trabalhar em treinamento. E foi por aí que eu cheguei à educação. Eu nunca havia trabalhado com crianças, quando cheguei à escola naquela tarde de sol. A turma com mais de vinte crianças na faixa etária de oito anos me seguiu, desconfiada. Na sala, lembrei dos livros que tive acesso durante o curso de Pedagogia. Definitivamente, nenhum autor mencionou que as crianças gritavam tanto! Ao final do primeiro dia de aula, senti um leve desespero, acompanhado por um zumbido persistente no ouvido. Alguém me disse que era normal e resolvi acreditar. Saí da sala de aula para assumir outro cargo, cinco anos depois. Desse período, entre muitas coisas boas, ficaram lembranças de pequenas histórias que desejo compartilhar. A surpresa do banheiro Um dia, uma menininha entrou no banheiro da sala de aula e encontrou, boiando dentro do vaso, um solitário cocô. Foi um escândalo! Todos correram diante do assombro da colega e ficaram se acotovelando na entrada do pequeno banheiro. Diante da confusão, organizei rapidamente uma fila. O método era simples: a criança ficava na fila, entrava no banheiro, olhava o cocô e voltava para seu lugar. Assim, depois que todos passaram pela fila, pude dar descarga e tentar retomar a atividade normal. Foi então que a pergunta que não queria calar veio à tona: – Tia, aquele cocô era seu? O saco sem santo Eu adoro o Dia de Cosme e Damião. Quando criança, era um dia de doces e sorrisos. Ao longo dos anos, venho mantendo a tradição de distribuir doces no dia 27 de setembro. Esse dia, para mim, não se reveste de um caráter especificamente religioso, está mais ligado à memória afetiva. Buscando respeitar a religião das crianças, avisei com antecedência que iria levar doces para quem quisesse. Algumas crianças disseram que queriam, outras avisaram que não iriam querer e um menino sugeriu que eu colocasse os doces num saco “sem santo”. E assim foi. Estava certa de que os santos não se importariam de ficar sem sua imagem para que algumas crianças pudessem comer doces sem culpa. No dia combinado, na hora da chamada, a
  • 28. 21 criança levantava e pegava seu saquinho de doces, se quisesse. Quando, na letra C, chamei o nome de uma menininha esperta, ela me disse: – Tia, eu não posso pegar. – Tudo bem. Eu respondi, e ela completou: – Tia! Pede a alguém pra pegar para mim! Caso de trânsito Um dia, um homem foi atropelado. Ali perto, dentro de uma casa, uma mulher chorou desesperadamente. O filho dessa mulher perguntou à avó por que a mãe chorava tanto e a senhora respondeu que aquele homem atropelado era o pai que ele não conhecia. O menino correu para conhecer seu pai, morto, quase na porta de sua casa. Alguns anos mais tarde, dentro da sala de aula, o menino me contou essa história, como quem conta um sonho. A caneta correta Todos o conheciam na escola. Falava com todo mundo, contava histórias e foi o Rei Mago mais perfeito que um auto de Natal pode ter. Um dia, fui lhe entregar o material enviado para crianças como ele, com baixa visão, mas ninguém era como ele. Quando entreguei o caderno de pauta larga e um lápis bem preto, ele me disse: – Você não vai me dar uma caneta? Então, lembrei das orientações sobre a espessura do traço, sobre a cor e demais especificações técnicas de uma caneta adequada para pessoas com baixa visão e disse que iria procurar. Não encontrei a caneta perfeita e um dia ele me disse uma frase mágica: – Eu quero uma caneta que brilha! E apontou para uma caneta usada na correção dos trabalhos dos alunos. Era uma caneta com glitter, nada técnica, e ele acrescentou: – Eu quero essa, mas rosa, não. E, então, eu lhe dei uma caneta azul, com glitter, tecnicamente inadequada, mas eficiente o bastante para fazer aquele menino sorrir. Uma menina com a letra A Naquela escola, o quarto ano de escolaridade carregava um mito: para aprovação, era necessário que o aluno estivesse muito bem preparado, pois no quinto ano os alunos aprovados participavam da festa de formatura. Portanto, dizia a lenda, que, para evitar decepções, era melhor ficar reprovado no quarto ano do que no quinto. Na minha turma de quarto ano de escolaridade, havia uma menina que não lia e não escrevia. Apesar das dificuldades, havia nela uma admirável vontade de tentar e de fazer
  • 29. 22 sempre de novo. Ao longo do ano, seu desempenho melhorou o suficiente para que a possibilidade de reprovação se transformasse em dúvida. Contrariando todas as regras, fui para a reunião de entrega dos resultados sem saber o que dizer ao responsável por aquela menina de olhos assustados que já se sentia reprovada. Seu pai era um homem muito simples que na primeira frase falou de seu grande amor pelas três filhas. Ele me contou que ela havia procurado, sozinha, uma instituição que oferecia reforço escolar e material de apoio. Disse também que ela fazia questão de "brincar de escola" para ajudar as crianças menores. Fizemos, então, uma espécie de acordo. Ela seria aprovada e ele a informaria que seria preciso esforço para não viver, no ano seguinte, a decepção tão anunciada. Um ano depois, ela estava entre os aprovados do quinto ano de escolaridade sorrindo em sua beca improvisada. Decerto acreditando, como nós, que vale a pena continuar tentando. Fátima Denise Peixoto Fernandes E.M. Walter Russo
  • 30. 23 Esquecimento Aquele dia estava muito agitado. Parecia que, de alguma forma, as crianças estavam a 220v. Essa situação se refletia no refeitório, onde algumas turmas esperavam impacientemente o almoço que havia atrasado. No meio daquela confusão, acabei chamando a atenção de uma das minhas alunas. Disse que falaria com sua mãe. Por um momento, apaguei da mente o nome da mãe da minha aluna. Por isso, perguntei à Natália o nome de sua mãe. Ela olhou para mim assustada, coçando a cabeça como se eu tivesse feito uma pergunta muito difícil. As meninas que estavam com ela indagavam surpresas: – Natália, o que foi? Você esqueceu o nome da sua mãe? Ela, na simplicidade que só uma criança seria capaz de ter, me respondeu, justificando aquela situação. – Ah, tia não sei. Eu só chamo ela de mãe! Sorri diante da resposta dela e não forcei a situação. Alguns minutos depois levantou-se de onde estava, veio correndo na minha direção e eufórica, como se fosse responder a uma pergunta que valesse um milhão de reais, disse confiante com um sorriso de ponta a ponta: – É Jaqueline, tia! O nome dela é Jaqueline! Nice Neves Butta E.M. Paulo Roberto de Moraes
  • 31. 24 A árvore de Músicas Era final da década de noventa, exatamente o ano de 1999. A turma era um quinto ano de escolaridade dessa rede de ensino. Foi nessa turma que tudo aconteceu, mais ou menos, como será descrito abaixo. Eu lecionava para essa turma naquele horário horrível que existia na rede (existia?!) das 9h às 15h e, à noite, cursava o quarto período de Pedagogia. Havia uma disciplina eletiva chamada “Arte e Educação: Teoria e Prática”. Nessas aulas, aliada à teoria, o professor nos passava várias atividades práticas para que aplicássemos com nossos alunos. Essas atividades estavam sempre atreladas a alguma produção escrita. Resolvi propor uma delas a minha turma. Esse ano, por sinal, foi muito produtivo, a turma era muito receptiva e tivemos muitas produções tanto artísticas quanto escritas, mas a que me chamou mais a atenção foi a seguinte. A proposta era “criar” um cenário que poderia ser interno (uma sala, um quarto, etc.) ou externo, (uma paisagem qualquer, uma casa, etc.), porém esse cenário deveria ser “construído” com recortes de revistas, jornais, ou encartes. Não poderia ser recortada uma figura inteira. A sala, por exemplo, deveria ser montada com “coisas” que seriam encaixadas para formá-la. Depois vinha a segunda parte que consistia na produção escrita, tomando por base o cenário criado por cada um. Um dos alunos que optou pela paisagem externa fez aquele cenário básico conhecido por todos: uma casinha de um lado, uma árvore do outro, com muitas flores no meio. A árvore foi feita em duas cores, marrom para o tronco, o verde que serviu para a copa foi retirado de algum classificado, porém veio a composição escrita que muito me surpreendeu e foi mais ou menos assim: “Era uma vez um homem chamado Roberto Carlos que cantava e encantava multidões com suas músicas que, segundo ele, eram escritas por ele mesmo. Todo mundo conhecia as músicas desse cantor, o que era desconhecido por todos é que esse homem tinha um grande segredo. Nos fundos da casa dele, havia uma árvore cheia de letras de música. Quando ele queria alguma música diferente, era só ir até lá, no Pé de Músicas, e pegar uma. E tinha cada uma mais bonita que a outra! Ninguém nunca descobriu esse segredo e o cantor, o Roberto Carlos, continua cantando e encantado até os dias de hoje”. Ana Maria Oliveira E.M. Ruy Barbosa
  • 32. 25 A menina que despertou para o universo mágico da leitura Larissa era uma menina tímida, olhava de soslaio, não conversava com ninguém. Logo que cheguei à escola, ela chamou minha atenção. Vivia pelos cantos, parecia que tinha um mundo só para ela, onde ninguém adentrava. Passei a observá-la e, quando ela percebia minha presença, se escondia. Sendo sua professora, não poderia deixar que ficasse recolhida em seu mundo. Precisava, prudentemente, descobrir a chave para desvendar o que a fazia assim, tão distante de tudo... Os dias se passavam e Larissa não se relacionava com o grupo. Cautelosamente, fui me aproximando dela para trazê-la ao mundo da escola. Ao entrar em sala de aula dei bom dia à turma, entretanto, Larissa apenas olhou-me. O mais interessante é que ela dizia muito através dos seus olhos, e isso indicava sensibilidade. Iniciei a aula com a história de Alice no País das Maravilhas e, logo após, pedi aos alunos que a comentassem. Larissa continuou muda! No segundo momento, pedi ao grupo que desenhasse e pintasse a história. – Não vai desenhar? – perguntei para Larissa. Ela fez que não, com a cabeça. Convidei uma aluna para sentar-se ao seu lado e mostrar-lhe o que havia desenhado. Ela ficou observando a colega pintar. Tente fazer o seu desenho e pintá-lo – pedi a Larissa, apontando para sua folha vazia. Você também consegue fazer um. Larissa não mexeu o lápis. A menina deixava escapar de seus olhos um pedido de socorro. Senti um rastro de esperança surgindo. – Sente aqui pertinho de mim – convidei-a. Ela sentou-se, entretanto, ficou silente. Revelei-lhe que precisava conversar com sua mãe e entreguei-lhe um bilhete. No dia seguinte, a mãe de Larissa estava lá para conversarmos a seu respeito. Fitou-me desconfiada, nem me deu tempo de expor a situação, parecia que adivinhara o que eu iria explanar. E com um semblante carrancudo, foi logo sentenciando: “Essa menina tem problema de cabeça, professora”. Fiquei estupefata com a sua afirmação. Com calma, expliquei-lhe que precisava de seu apoio e que não estava julgando sua filha e nem tampouco ela, como mãe. Uma coisa era evidente: precisávamos nos unir para o bem de Larissa, pois o envolvimento da família seria essencial para que a aluna pudesse transpor os obstáculos. Contei-lhe que havia conversado com a orientadora e juntas fizemos o encaminhamento do caso de Larissa para avaliação médica. A mãe de Larissa agradeceu-me, porém confidenciou-me não ter mais esperanças. Não me deixei abater com suas palavras...
  • 33. 26 Já em sala de aula, chamei Larissa para ler. Ela sentou-se ao meu lado e começou a gaguejar. Sua voz saía rouca, e, aos poucos, esvaía-se até emudecer. Percebi que tinha medo de errar, esse era seu fantasma! Cada dia que se passava era um degrau que eu subia juntamente com ela. Larissa estava começando a ler, entretanto, sua voz ainda sumia. Enquanto esperávamos o resultado da avaliação, não poderia ficar de braços cruzados, então, planejei o seguinte: pedi que ela lesse, enquanto eu corrigia uns testes (usei essa estratégia para que Larissa não se intimidasse comigo prestando atenção na sua leitura). Na verdade, eu estava prestando bastante atenção na sua leitura, só queria deixá-la à vontade. Foi então que a luz se acendeu entre mim e Larissa: ela começou a ler perfeitamente, sua voz saía como canto mavioso, mas notando que eu a olhava começou a gaguejar. Paulatinamente, Larissa foi se libertando de seus medos. Havia lhe explicado que o erro faz parte da vida e com ele aprendemos a alçar voos longos e seguros. Chamei sua mãe novamente e participei-lhe que, segundo a avaliação médica, Larissa era uma criança normal. Sua mãe ficou surpresa! Deu um suspiro de alívio e, emocionada, proferiu as seguintes palavras: “Eu ajudo de lá e a senhora ajuda de cá!” Assim, despediu-se, com um sorriso nos lábios. De repente, ouvi um: “Bom dia, professora!” E quando olhei para trás, avistei Larissa sorrindo. Uma enorme satisfação tomou conta de mim, afinal de contas a minha menina estava se comunicando. Isso era motivo de festejar, e muito! Aos poucos, Larissa foi obtendo confiança e se desinibindo. Com a minha ajuda e a dos colegas de classe a menina progredia. Os amigos a encorajavam, auxiliando-a na leitura ou mesmo nas atividades de escrita. Integrou-se ao grupo de dança, dizia que queria ser bailarina. Larissa estava se socializando e isso era crucial na sua caminhada. Os meses foram se passando e, a cada mês, o progresso de Larissa e da turma era irrefutável. Um dia, a orientadora tomou a lição de todos os alunos. Fiquei aguardando o resultado. Larissa voltou e disse baixinho que a orientadora solicitava a minha presença em sua sala. Fui pelo corredor a passos largos, tamanha era a minha vontade de saber do desempenho de meus alunos. Chegando lá, fui saudada pela orientadora: “Parabéns, professora, todos estão ótimos!” – O que você está fazendo? – perguntou-me. – Estou realizando várias atividades pertinentes à aquisição da leitura e conscientizando- os da importância do letramento em suas vidas, uma vez que ampliará seus horizontes – respondi, com um largo sorriso. – Podemos viajar pelo mundo que o livro nos desvenda! – E quanto a Larissa? – perguntou ela, segurando minhas mãos.
  • 34. 27 – Eu li o olhar dela clamando e ouvi a voz do meu coração – revelei. – Com o meu auxílio, da família e dos amigos, seu desempenho melhorou e, consequentemente, sua autoestima também. A Festa da Primavera chegou e Larissa juntamente com seus amigos dançaram muito bem, arrancando aplausos calorosos da plateia. Eu, orgulhosa da turma, sorria. Larissa é um exemplo vivo de que, com dedicação, união, compreensão e vontade firme, é possível plantar a semente, vê-la germinar, crescer, desfrutar de sua sombra amiga, saborear seus frutos e sentir o perfume de suas flores. Jurema Nascimento da Silveira E.M. Eulina Pinto
  • 35. 28 Santo de casa faz ou não faz milagre? Costumamos dizer, vulgarmente, que “santo de casa não faz milagre”. Como não acredito nem em santo nem em milagre, resolvi usar esse provérbio para demonstrar o quanto somos importantes também em nossas casas. Sim, porque não somos professoras somente com os nossos alunos. Muitas vezes, temos jornada tripla, ou seja, duas na escola e uma terceira com os nossos filhos ou com os filhos dos nossos amigos, como é o caso que vou relatar. Eu, Levada, e minha amiga Fofucha trabalhamos juntas desde 2003, quando atuávamos no projeto “De professor para professor: um convite ao trabalho cooperativo”, que foi maravilhosamente bem organizado e coordenado pelas professoras Tereza Barreiros e Marliza Bodê na rede municipal de Duque de Caxias, onde trabalhamos até hoje. Além disso, morávamos perto uma da outra nessa época e ela vinha de carona comigo depois das incríveis reuniões do projeto que ocorriam segunda-feira à noite. Para completar, dois de nossos filhos estudavam na mesma sala de aula de uma escolinha aqui na Penha. No ano seguinte, nos separamos, porque o projeto, infelizmente, acabou e só nos reencontramos em 2007 numa escola onde fomos trabalhar. Em 2009, vivemos uma arriscada experiência em uma outra escola municipal, onde fomos com o nosso grupo todo tentar fazer um trabalho sério e diferente. No fim do mesmo ano, nos mudamos para uma outra e hoje, vivemos no paraíso, a Escola Municipal Zilda Arns Neumann, com parte daquele nosso grupo de 2009. Fazemos um trabalho muito bonito e somos realmente um grupo em todos os momentos. Estamos conseguindo realizar parte do nosso sonho de ser feliz e trabalhar da melhor maneira que podemos, mesmo encontrando dificuldades de todos os tipos. Contei um pouco da nossa trajetória nessa rede para contextualizar a linda vivência que compartilhamos desde o ano passado. Em 2010, eu tinha uma turminha fofa de primeiro ano (Turma Maluquinha) e Fofucha fazia o seu trabalho especial na Sala de Leitura. Conversando, ela me disse que sua filha estava com muitos problemas para se alfabetizar e que adoraria que ela fosse minha aluna. Eu disse que ela trouxesse a menina para estudar na minha sala, mas, como moravam em outro município, isso não era possível. Fui para casa, pensando num jeito de ajudar minha amiga e, a cada atividade diferente que eu fazia com a turma e que causava alguma euforia, eu pensava “Joice ia adorar isso”. Tanto pensei, que fui iluminada com uma ideia simples, que acabou ajudando nesse processo tão metamórfico que é a alfabetização. Comprei um caderno, encapei, e escrevi um bilhete para a menina, convidando-a para que participasse da minha ideia: ela receberia aquele caderno toda semana com uma atividade para cada dia. Faria a atividade e expressaria como se sentiu fazendo através do desenho de uma carinha feliz se tivesse gostado muito; séria se tivesse suportado; e triste se não tivesse gostado. Mostrei correndo minha ideia para a Fofucha, que na hora ficou entusiasmada (ainda tenho na minha mente a carinha dela) e levou o material para casa como se fosse ouro.
  • 36. 29 Precisei aguardar uma semana até que Fofucha voltasse com o caderno para saber como tinha sido esse primeiro momento. Felizmente, Joice gostou e fez as atividades com capricho e muita ajuda da mãe e do pai. Durante todo o ano passado, o caderno foi sendo preenchido e virou um meio de comunicação entre nós duas. As atividades eram variadas e divertidas. Foram ficando mais difíceis e ela acompanhando tudo. Ela me mandava desenhos, perguntava a mãe como eu era fisicamente, me escrevia bilhetes. Eu mandava adesivos, bilhetes de incentivos, lápis de cor para pintar as tarefas. A nossa pombo-correio nunca falhava e me dizia como tudo tinha sido. Se ela precisou de ajuda, se desejou fazer, se teve dificuldade, enfim, ia me dando elementos para eu pensar nas próximas atividades. O esquisito era que a aluna sempre fazia com prazer as minhas atividades, mesmo que com ajuda, e odiava as que recebia na escola em que estuda. Joice veio lutando ferozmente e, com a ajuda de todos, alfabetizou-se no fim de 2010. Em 2011, contamos essa experiência para nossas colegas de escola e duas delas choraram ao ver o caderno e ouvir nossos relatos. Isso mexeu tanto comigo que resolvi escrever para dizer que santo de casa faz milagre, sim. Eu tive a ideia e providenciei os meios para que tudo ocorresse, mas Fofucha e Marcos Paulo fizeram a coisa acontecer. Se eles não tivessem se proposto a isso, o caderno não teria tido nenhum efeito. Ainda esse ano, Joice veio à nossa escola e o nosso encontro foi incrível. Parece que nos conhecemos há muito tempo. Ela ficou grudada comigo e, na hora de ir embora, adivinhem? Pediu o caderno com as atividades da semana, que eu havia esquecido na minha sala. Hoje, coloco atividades mais elaboradas com textos, fazemos concurso de adivinhas, escrita de bilhetes e ela faz tudo com mais autonomia. Já não precisa mais do caderno, mas gosta da atenção e carinho que recebe por conta dele. Foi muito gratificante ter participado a distância do processo de alfabetização de uma criança que, se não tivesse os pais que tem, com seus olhares bem atentos, conhecimento pedagógico e disposição, poderia ter sido mais uma das muitas crianças que a escola não consegue ajudar. Quem diria que, no tempo da internet, um caderno, com atividades coladas, iria cativar uma criança do mundo moderno? Parece que ela conseguiu sentir o tanto de envolvimento que todos nós colocamos nesse projeto tão simples e correspondeu à nossa expectativa com o que tinha de melhor. Obrigada, Joice. Nunca mais serei a mesma depois dessa experiência. Luciane Maciel Ceccopieri Belo E.M. Dra. Zilda Arns
  • 37. 30 Legalização: mais do que um ato legal Chego apressada depois de enfrentar um megaengarrafamento e procuro uma vaga para estacionar. Em vão... Meu horário adiantado rapidamente transforma-se em atraso. A reunião interna vai começar e preciso apressar‐me. A pauta está pronta e os assuntos são extensos. Os processos não param de chegar, fruto dos mapeamentos realizados no município. Escolas nascem de um dia para o outro e precisamos legalizá-las. A Comissão precisa prestar atenção... mapear não é tarefa fácil, não! Demanda persistência. Bato à porta e nada! O barulho da criançada ecoa de longe, mas a pessoa que vem à porta jura que naquele espaço não existe uma escola. Entretanto, o convite está em mãos e calmamente é entregue à senhora que gostaria muito de ter convencido, mesmo com sua argumentação sem sentido. Em breve, receberemos nossos convidados em nosso quartel-general. Sim, quartel- general! Afinal, é na nossa sala de trabalho que encontramos o espaço para as trocas, as mediações e a aprendizagem coletiva. É nesse cantinho que o administrativo e o pedagógico dão as mãos, construindo a união necessária à legalidade da educação formal. Mais uma escola comparece na hora marcada. Chega ansiosa para receber orientações sobre os procedimentos de autorização para funcionar. Teme que sua escola seja fechada! Entretanto, entre a orientação acompanhada de um café e um sorriso, a calma e a tranquilidade se estabelecem. Conquistamos mais uma amiga. Coisa boa... trabalhar e ainda fazer amigos! Mas o tempo passa muito rápido e mais uma e outra e outra, as escolas são pontuais, comparecem! – Hoje viemos entregar documentos. – Hoje passei só para ver vocês. – Preciso de orientações sobre o regimento escolar... Amanhã teremos comissão, vamos visitar três escolas! Os processos já estão separados, os termos de visita também. Escola, lugar do educador que tem como ideal a educação de qualidade, a educação legal. Ela nos aguarda! Visitar uma escola não é tarefa simples, na primeira visita é necessário um diagnóstico geral e, assim, olhares atentos! Olhos administrativos e pedagógicos bem abertos. São três pares de olhos a olhar e a olhar. Em breve, retornaremos e, de visita em visita, a escola vai se modificando. Logo, logo, será encerrado mais um processo, emitido mais um parecer. Nossa lista é ampliada e agora é garantir a qualidade da instituição, do projeto pedagógico, das nossas relações. Legalizamos escolas e a parte legal é conhecer tantas gentes, tantos lugares, tantas realidades. Descobrir “gentes que fazem” é a nossa especialidade e, por mais complicado que pareça, é muito legal! Maria Celeste Rodrigues Pais Alves & Equipe de Inspeção Escolar
  • 38. 31 Mãe Coragem Numa noite estrelada de uma terça-feira qualquer, a menina que cursava a terceira série primária chorava compulsivamente diante de uma folha de papel de pão onde ela costumava fazer os seus rascunhos escolares. A mãe, depois de uma longa jornada de trabalho, e já de volta ao lar, percebendo a aflição em que se encontrava a filha, resolveu perguntar-lhe o que podia fazer para ajudá-la, uma vez que o choro dela a entristecia por demais. A menina, mergulhada num choro melancólico e profundo diante de sua dificuldade, não respondia às indagações feitas pela mãe. Num gesto extremamente afetuoso, a mãe pôs a menina no colo e perguntou-lhe novamente o motivo do choro. A menina, muito fragilizada, olhou para a mãe com os olhos vermelhos e lacrimejantes e disse: “Estou muito triste porque não sei fazer a conta de dividir com dois algarismos”. A mãe olhou para o papel de pão já amassado devido à quantidade de vezes que a operação matemática fora apagada, disse: “Mas isso é muito simples, eu vou te ensinar”. As tentativas da mãe foram inúteis, a menina já bloqueada não acreditava no conhecimento da mãe, dizia que ela não sabia resolver a questão, pois a única pessoa que sabia resolver o problema era a professora, Dona Nair. A mãe, já esgotada de tantas tentativas fracassadas, pois a menina não dava ouvidos às suas explicações, silenciou-se. Na manhã seguinte a filha ficou surpresa ao perceber que a mãe faltara ao trabalho. Ao longo de sua vida, a menina não se lembrava de ter testemunhado tal situação. A mãe nunca faltava ao trabalho. A menina tinha em mente as palavras sempre proferidas com muita dignidade pela mãe: “O trabalho está acima de tudo, dependemos dele para sobreviver”. Então a menina perguntou: “Mãe, a senhora vai ficar em casa hoje?” “Vai faltar ao trabalho?” A mãe, de uma forma bem natural, respondeu que aquele dia ela iria ao médico. Então a menina se deu por satisfeita e não questionou mais a mulher. Às 10h30 da quarta-feira, a menina, como em todos os dias do ano, saiu para fazer o seu trajeto rotineiro de ir para a escola. Naquele dia a mãe seguiu a menina sorrateiramente. Sem que a menina percebesse, a mãe entrou e esperou que as turmas fossem para as salas de aula. Aproximadamente às 11h30, alguém bateu na porta da turma 303 da professora Nair, toc, toc, toc.... Tamanha foi a surpresa de todos ao ouvir uma mulher dizer as seguintes palavras para a professora: “Bom dia, professora!” “Tudo bem com a senhora?” A professora respondeu educadamente. Então a mãe continuou: “Eu me chamo Maria, sou a mãe da Joana e vim aqui para pedir a sua ajuda”. A professora convidou a mãe a entrar na sala. A menina ao perceber que aquela era a sua mãe afundou na carteira toda envergonhada. Os colegas de classe começaram a caçoar da menina que àquela altura já estava chorando. Então a professora perguntou à mãe: “Em que posso ajudá-la, dona Maria?”. Ela com muita determinação, sempre peculiar a sua pessoa, disse: “Eu hoje faltei ao trabalho para vir até aqui pedir à senhora que me ensine a resolver a conta de dividir por dois algarismos, pois tentei
  • 39. 32 ensinar a minha filha e ela disse que o meu “jeito” de resolver a conta estava errado, apenas a senhora sabia resolver a conta corretamente. A professora, muito solícita, disse: “Gostaria de ver o seu ‘jeito’ de resolver a conta”. “A senhora se importa de vir até o quadro”? Nesta altura a menina já estava de cabeça baixa soluçando. A turma impactada, não tirava os olhos daquela senhora negra, magra, alta, dona de uma altivez de dar inveja. A professora então passou uma conta para a mãe de Joana no quadro e entregou um pedaço de giz a ela. Imediatamente, ela começou a resolver a conta e ao mesmo tempo em que resolvia a operação, narrava em voz alta: “...quatro vezes cinco, vinte, para vinte e dois, dois..” e desta maneira Dona Maria resolveu a operação até o final. A professora, uma senhora negra, baixinha e muito segura, olhou fixamente para a menina que estava sentada no meio da sala, e com muito orgulho disse: “Joana, sua mãe sabe muito bem resolver esta operação. Parabéns! A senhora merece CEM.” A turma veio à loucura. Todas as crianças começaram a aplaudir a mãe de Joana. A senhora humildemente agradeceu a professora, olhou para a menina e disse: “Quando você voltar hoje pra casa, mamãe vai te ensinar as continhas.” Aquele foi um dia que ficou marcado na vida de Joana, provavelmente também da professora e de muitas crianças que testemunharam aquele ato de coragem. Norma Santos Subsecretaria de Planejamento Pedagógico
  • 40. 33 Uma nova chance Caminhava devagar, tinha a cabeça povoada por dúvidas e lembranças, enquanto crianças agitadas passavam correndo à sua volta. Deveria realmente ir até lá? O medo era grande, mas não tanto quanto sua esperança. Havia acordado bem cedinho, num sobressalto, após a noite mal dormida. Estava muito ansiosa. Pensou em todas as coisas que faria ao longo do dia e não pôde conter o sorriso, ao pensar no final do mesmo. Levantou-se. Depois do banho, passou o pente de dentes quebrados pelos cabelos, olhou no espelho e gostou do que viu. Já nem se lembrava mais da última vez em que estivera naquele estado, tão empolgada e confusa ao mesmo tempo. Sentia as emoções num turbilhão dentro de si, um misto de medo, curiosidade e felicidade que eram concomitantes. Seu coração estava irrequieto e sua cabeça se negava a focar em outra coisa. Resolvendo não se antecipar, decidiu não pensar no que a aguardava, não naquele momento. Foi até a cozinha, preparou o café da manhã da família, regou as plantas, fez comida, acariciou o cachorro e brincou com o neto, na esperança de viver um dia normal. Mesmo sabendo ser impossível. Tentou assistir à TV, mas sempre se distraía. Descobriu não ter sido capaz de gravar uma única cena, passada na programação diária. Ligou o rádio, fez crochê, mas foi em vão, errou os pontos repetidos, com destreza, tantas vezes antes. Repousou as palmas das mãos sobre o rosto e receou passar mal. Estava tão perto que passou o dia inteiro ouvindo o som da bagunça provocada pelas crianças excitadas. Por um momento as invejou e desejou que as horas passassem mais depressa. Conferiu o relógio da parede e percebeu que era a quinta vez em menos de meia hora, que seus olhos seguiam aquela direção. A sensação que tinha era a de que o tempo não estava passando, ou então passava mais lentamente como se, egoísta, a envolvesse em uma brincadeira cruel e indecente. Pegou papel e caneta, pensou, respirou fundo, olhou-os fixamente, mas não se atreveu a arriscar. Balançou a cabeça em sinal de negação. Rindo de si mesma, apertou-os contra o peito, cheirou a folha em branco, após passar suas mãos sobre ela e guardou tudo de novo. Foi até a cozinha, descobriu-se com a geladeira aberta, embora não tivesse a menor ideia do que tinha ido procurar ali. Aproveitou e bebeu água. Foi limpar a casa, a poeira retirada dos móveis parecia solicitar a retirada da poeira existente nas gavetas de sua memória. Pensou nos dias difíceis vividos na infância, nos sonhos trocados por vassouras e ferro de passar, nas linhas, agulhas e máquinas de costura na adolescência. Em como sua vida tinha se desenrolado até aquele momento e no quanto do mundo ainda tinha a descobrir. Olhou as mãos ásperas e calejadas e não se conteve ao
  • 41. 34 relembrar tantas pessoas, tantos momentos, quantos sentimentos e tempo que tinham escorrido por ali. Perdeu a conta de quanto tempo tinha estado parada em frente ao móvel, inerte, perdida em seus próprios pensamentos. Olhou novamente o relógio e resolveu se arrumar. Colocou uma roupa bonita, prendeu os cabelos em um coque, arrumou suas coisas com cuidado, tinha comprado cada objeto com muito carinho. Guardou na bolsa o caderno bonito, ajeitou no estojo o lápis, a borracha, as canetas. Pegou a bolsa e saiu de casa, com a sensação de exploração de um mundo novo. Agora estava ali, parada diante do portão. Seu coração batia acelerado como num compasso de escola de samba. Respirou fundo, ouviu o toque do sinal e os portões abriram-se lentamente a atraindo como um ímã é atraído à geladeira. Quando se deu conta, já estava sentada em uma carteira, bem na primeira fila que era pra não perder de vista nem uma letrinha sequer. Correu os olhos pela sala, viu as paredes coloridas por letras e desenhos de crianças que tinham estado ali anteriormente, observou a professora, olhou nos olhos dos colegas de turma e não pôde impedir que uma lágrima solitária, grata e feliz, se deslocasse de seus olhos e encontrasse seu sorriso. Sirlane Araujo Marques E.M. Albert Sabin
  • 42. 35 No chão da escola No chão da escola Olhares que se deitam Olhares tão pequenos Horizontes de outros passos Passos para novas terras, Passos para novas conquistas, Passos para ir em frente Caminhar constante Corrida permanente De pés que precisam flutuar neste chão. Flutuar neste chão? Pode ser barco de nuvem Para carregar olhos colados de poeira triste, E abri-los aos céus. No chão da escola Olhares se sentam: Para ouvir expectativas Para dizer versos da vida Para chorar junto algumas tristezas Para pedir um colinho Quando a dor aperta E para pular levadices Quando a alegria faz sorrir girassóis. No chão da escola Olhares que buscam Olhares que pedem Olhares que se constroem Olhares que construímos Olhares que destruímos? Viver de reconstruções, Porque não há como fugir da vida!
  • 43. 36 Vivências de quem caminha, Olhares de quem deseja, Andar sem ferir os pés. Mistério de um chão tão mágico Construído na realidade Encantado por fadas e bruxas, Transformador de sapos em príncipes, Fazendo a vez de todas as cinderelas. Ensinando que é no chão Que plantamos sementes Que serão flores e alimento. No chão a gente aprende A brincar de roda e amarelinha Construir castelinhos de areia Sorrir junto, cair junto e levantar junto. Porque cair no chão dói, rala! A gente chora! Depois aprende que é só passar merthiolate que sara E aí vai em frente, Porque não há como fugir da vida! No chão da escola, Aprende-se tudo. O chão da escola é estrada de todos. Passamos por ele em todas as vivências. Pois se a vida é uma escola A escola que vive, Sabe transformar acontecimentos Em um universo apaixonante. Fabíola de Souza Alves E.M. Bairro Califórnia
  • 44. 37 Chão de escola O chão da escola não é vazio nem frio é cheio de vida vidas secruzamselaçamentrelaçameseabraçam ali o ontem, o hoje, o amanhã. Quem aprende? Quem ensina? Cada um deixa uma parte de si no outro marca única, inconfundível e insubstituível. O chão da escola não é estéril nele germinam ideias sorrisos lágrimas histórias sonhos amigos amores valores... eu germinei, tu germinaste... nós germinamos... no chão da escola. O chão da escola não é inerte estremece ao pulsar dos corações nos primeiros amores (o despertar das emoções) treme com a energia pura da criança pulando amarelinha ou saltando a distância. Certo dia, no chão de uma escola, um menino se olhou no espelho sonhando seu futuro. Hoje, no chão de uma outra escola, em um outro espelho, um homem se olha sonhando o futuro de outros meninos... José de Freitas Silva E.M. Parque Capivari
  • 45. 38 Mediar, ação literária de amor Ensinar o Bê-a-Bá E também a escrever Pro professor importante Com certeza o seu dever. O desafio do percurso É criar paixão por ler. Paixão pela poesia, Pelo livro, pela história, Por aquela mais humilde E outra cheia de glória. Pra quem é apaixonado Ler não tem escapatória. Pra saciar esta angústia De todo bom professor, Que promove a leitura Com carinho e amor, Abraçamos o projeto Do “Jovem Mediador”. Projeto que quer o aluno Disseminando leitura Nas escolas de Caxias Em todas da prefeitura Fazendo leitura em rodas Que ao girar ninguém segura. O mediador de leitura É um sujeito especial Lê e fala com postura Não é aluno normal Na escola se destaca Da maneira especial.
  • 46. 39 Pra ser bom mediador Precisa se preparar Ler jornal, poema, história, De tudo apreciar, Pra escolher o melhor livro E com classe mediar. Com seu livro de história, Colcha e almofada à mão, Lá vai o mediador Cumprir com sua missão De disseminar leitura Pro pequeno e pro grandão. Este aluno no futuro Criará comunidade Comunidade Educadora Transformará a cidade Cidadão que faz história Melhora a sociedade. Viviane Alves Guimarães E.M. Presidente Costa e Silva
  • 47. 40 Crianças Entre sorrisos e encantos Perco-me por vezes infinitas Num perder-se que, entretanto, Leva-me ao encontro da vida A cada olhar que me ensina E um convite me faz De ser menino ou menina De ser artífice da Paz. Cada um é tão real! Não a promessa de um futuro, É a certeza de um ideal e Não um caminho no escuro. Em seus gestos delicados Que transbordam energia, As crianças, aos bocados, Revelam tamanha alegria! E sendo assim como são, Pequeninas e grandiosas, Elas, em suas emoções, São as almas dadivosas Que ensinam mais que aprendem No universo escolar Àqueles que as compreendem De maneira singular. A escola é, então, um jardim Em que cada flor cultivada Transforma o mundo, enfim, Com o amor e a paz almejada É ainda mais que um espaço, É mais que um tempo, ou lugar... Na escola, cria-se o mundo que, Enfim se quer transformar E na criança, esse mundo Buscamos realizar! Fatima Anselmo Divisão de Educação Infantojuvenil
  • 48. 41 Chão da Escola Chão de luta e labuta Força, fé na conduta Chão de histórias de vidas Entrelaçadas e aguerridas Chão que pulsa saber Troca, mistura e dá prazer Chão de conhecimento, afeto e emoção Que faz diferença na população Chão do valor eterno de aprender Cidadania, direito e dever Formação solidária Chão de vida humanitária Pise firme neste chão Escola é a solução Chão que rege uma Nação Que não progride sem Educação. Maria Fátima Martins D’Aqui E.M. Expedicionário Aquino de Araújo
  • 49. 42 Uma flor no Jardim Gramacho Quando cheguei ao Jardim Gramacho, não vi jardim, nem flor, nem riacho, mas em pleno verão vi o rastro de luz brilhando nos muros azuis da Escola Municipal Mauro de Castro. Talvez aqui esteja o jardim Esperançoso pensei assim Estaria oculto entre as salas? Não, não senti o aroma das flores nem vislumbrei das frutas e folhas as cores. Diziam: “ali a terra é dura, não há jeito, é um mal sem cura.” Mas quando a sala olhei por inteiro, vi em cada aluno uma semente. Concluí: “Mais que professor, serei jardineiro” A turma do sexto ano fervia como o verão Euforia, gritaria, hormônios em ebulição. Tantos cadernos, professores: tudo novidade! Ah! nas paredes o cheiro de tinta fresca, Nas sementes o sonho da felicidade! O sétimo ano chegou lento como o outono Muitas sementes se perdem sem dono. Muitos vão, muitos chegam sem esperança Cadê a Jéssica, o Maicon, o Ernani? Está grávida, está trabalhando, está de mudança. Eis o oitavo ano, frio que nem o inverno muitas mentes inertes em sono eterno. Os jardineiros debatemos na reunião: como cuidar do ramo que desponta? como salvar a nossa plantação? Mas com o nono ano irrompe a primavera e se sempre alcança quem espera nossos brotos já germinam com vigor algumas sementes ainda resistem a vingar enquanto algumas já têm caule e até flor.
  • 50. 43 Aconteceu então certo dia quando eu da sala já saía encontrei uma dessas flores tão abatida com olhar distante e pétalas caídas “O que te aflige, o que te faz tão dolorida?” Seu nome era Deise, só eu, professor de inglês sabia que ali estava uma flor. Mas a margarida de pele negra reluzente não sorria mais como antigamente não brilhava mais ao sol nascente. “Descobri que tenho problema no coração, não posso brincar, correr: tudo agora é em vão. Minha vida agora é remédio e hospital Nada tem mais graça, nem amigos, nem escola Agora é só aguardar com dó o meu funeral.” Como um jardineiro, com o olhar atento, não perdi tempo, nem o alento: “Coragem, menina, abraça tua vida! Olha o que tens, vive a cada dia como se fosse único, alegre e decidida!” Continuei com palavras aquela flor a regar E a cada dia cultivava e alegre vi brotar novas pétalas de esperança naquele caule adubado em dor, renascia naquele rosto o sorriso de criança! O tempo passa, floresceu aquele jardim, rosa e cravo, azaleia e jasmim, mas como anda a nossa margarida? alegrando a terra de outros canteiros cheia de brilho, cheia de vida! Como na parábola, muitas sementes no caminho se perderam, isoladas, sem carinho. Nessa semeadura, o que nos consola é descobrir que a cada ano se renova a confiança de se colher no chão da escola! André Luiz Lacerda Deschamps E.M. Mauro de Castro
  • 51. 44 Construindo um futuro Quem disse que professor sabe tudo Vive uma vida de ilusão. No chão da primeira escola aprendi Que ser professor é mais que profissão. Na sala repleta de alunos O pequeno menino se apresentou. Não sabia ler nem falava direito, Mas muitas lições nos ensinou. A aula ficava emocionante Com toda experiência que trazia. E cada assunto que falava Era motivo de muita alegria. Um dia o menino triste chegou. Procurei uma explicação. Descobri que a violência o marcou, Ferindo seu pequeno coração. Quem poderia ter a coragem De maltratar o menino sonhador? O que fizeram da aprendizagem Que o pequeno sempre ensinou? Mesmo com toda essa tristeza, O menino voltou a sorrir. E essa experiência de vida Tive que registrar aqui.
  • 52. 45 Nossos alunos passam problemas E cada um tem uma reação. O que você tem feito, professor, Para amenizar essa situação? Uns colocam de castigo, Outros mandam para a Direção. E o menino que está entristecido Não vê esperança na Educação. Por isso, em cada escola que piso, Deixo as marcas do amor. Prefiro educar o menino Para, quem sabe, torná-lo doutor. Nossas mãos são preciosas E nossas palavras têm poder. Eduque, você também, o menino Para que ele não venha a se perder. Eloiza Cristina de Freitas da Conceição E.M. Sônia Scudese
  • 53. 46 Pó de Giz Nas batidas das horas Assim começa o dia Com o pó de giz a construir linhas infinitas Faz casa e árvore. Casa na árvore. Casa-árvore, João-de-barro. E o mundo inteiro a arder pelas pupilas. Pó que vai colorindo de vida Os sonhos do aprendiz Pó dissolvido no vento Com restos de vozes E risos em movimento Pó de giz Feito de um traço a outro, entre um passa e outro, A escrever no tempo Tudo o que o sonho diz Termina o dia e Um pó de giz cai no chão da sala. No avesso do sentido, A pá não o apaga. Fica ali latente para quem quiser resgatá-lo. Aline Pupato Couto Costa E.M. José Medeiros Cabral
  • 54. 47 Mosaico chão de escola Chão de escola Que te quero diverso Qual mosaico de passos rápidos do fulgor da idade Ou passos lentos da maior idade Chão de escola Mosaico de pegadas Pegadas das rodas circulantes das cadeiras metálicas Das pontas guias de bengalas que conduzem Chão de escola Mosaico de caminhos De guias e trilhas Caminhos que se mesclam Que se diferenciam Chão de escola molhado Espelho que reflete tantas formas Tantas linguagens Reluz o balé dos corpos que conversam em línguas de sinais Os rostos brilhantes Matizes sem iguais Chão de escola Chão de vidas Tão minhas Tão suas Tão nossas Histórias Ponto de chegada Ponto de partida De muitas trajetórias Edicléa Mascarenhas Fernandes Coordenadoria de Educação Especial