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Revista da SOCERJ - Out/Nov/Dez 2004                                                                                                      257

Artigo
de Revisão                                                                                                                              4
             Elementos Significativos do Eletrocardiograma nos Recém-
                Natos e na Primeira Infância: suas utilidades clínicas
                               Dirson de Castro Abreu1, José Feldman2, Waldemar Deccache3, Gerson P. Goldwasser4

                                 Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro,
                                       Faculdade de Medicina Souza Marques e Universidade Gama Filho



            Palavras-chave: Fisiologia da circulação fetal,                                entre oxigênio e gás carbônico ocorre na placenta.
            Hemodinâmica nas cardiopatias congênitas,                                      O sangue chega ao átrio direito através das duas
            Eletrocardiograma no recém-nato                                                veias cavas e seguem fluxos preferenciais. A veia
                                                                                           cava inferior recebe sangue arterializado das
                                                                                           veias umbelicais. Este fluxo sanguíneo alcança o
            Resumo                                                                         átrio direito e, através do foramen ovale, passa ao
                                                                                           átrio esquerdo onde se mistura com o sangue
            Durante a vida fetal, o ventrículo direito trabalha                            venoso proveniente dos pulmões. A veia cava
            contra uma alta resistência, pois impulsiona o fluxo                           superior recebe o sangue da cabeça e das
            sanguíneo para regiões de alta pressão, como o                                 extremidades superiores. Este fluxo sanguíneo
            tronco, os membros e, principalmente, os pulmões                               insaturado alcança o átrio direito e segue para a
            ainda não expandidos. A normalização fisiológica                               artéria pulmonar. A maior parte deste fluxo é
            das pressões, na pequena circulação e no ventrículo                            dirigida para a aorta, via ductus arteriosus e, em
            direito, ocorre progressivamente ao longo dos dois                             menor parte para os pulmões pelos ramos
            primeiros anos de vida. Portanto, o recém-nato                                 principais da artéria pulmonar, porém sem ser
            apresenta fisiologicamente o padrão hemodinâmico                               oxigenado1.
            e eletrocardiográfico de sobrecarga ventricular
            direita. Os autores apresentam uma revisão sumária                             Durante a vida fetal o trabalho do ventrículo direito
            da circulação e da fisiologia fetal, dos padrões                               está aumentado, em razão de bombear contra uma
            hemodinâmicos observados em cardiopatias                                       alta resistência, pois impulsiona o sangue para o
            congênitas, e a análise sistematizada do                                       tronco e para as extremidades inferiores através do
            eletrocardiograma normal do recém-nato.                                        ductus arteriosus, e para os pulmões ainda colabados.
                                                                                           O ventrículo esquerdo impulsiona o sangue para
            Além disso, destacam os elementos no                                           as extremidades superiores e para a cabeça, e apenas
            eletrocardiograma que auxiliam no diagnóstico de                               uma parte para o tronco e para as extremidades
            algumas das principais cardiopatias congênitas.                                inferiores. A placenta determina queda da
                                                                                           resistência no território sistêmico, tornando
                                                                                           semelhantes as pressões intracavitárias nos dois
            Introdução                                                                     ventrículos (Figura1)1,2.

            Circulação fetal                                                               Na fase pré-natal, os pulmões são cheios de líquido,
            Durante a vida intra-uterina os pulmões não                                    não aerados e mal perfundidos, ocorrendo a
            oxigenam o sangue, uma vez que a troca gasosa                                  maturação pulmonar após o nascimento, com a

            1 Médico do Instituto de Cardiologia Aloísio de Castro. Professor da Faculdade de Medicina da UFRJ e da UERJ
              Ex-Pesquisador do Instituto Nacional de Cardiologia – México
            2 Professor da Faculdade de Medicina da UFRJ. Livre docente em Cardiologia pela UFRJ
              Ex-Pesquisador do Instituto Nacional de Cardiologia – México
            3 Professor Pesquisador do Curso de Pós-Graduação em Cardiologia – UFRJ
            4 Mestre em Cardiologia pela UFRJ. Professor da Escola de Medicina Souza Marques e da Universidade Gama Filho
              Santa Casa da Misericórdia – RJ – Nona Enfermaria – serviço do Prof. E.L. Pontes
258                                                                                                              Vol 17 No 4

                                                      Padrões hemodinâmicos nas cardiopatias
                                                      congênitas

                                                      Coube a Sodi-Pallares4 e sua escola, que teve em
                                                      Enrique Cabrera o seu exponencial, utilizar a partir
                                                      de 1947 a interpretação dedutiva do traçado
                                                      eletrocardiográfico e, através do conhecimento do
                                                      processo de ativação dos átrios e ventrículos, inferir
                                                      as prováveis condições anatômicas e
                                                      fisiopatológicas do coração. Analisando os
                                                      potenciais epicárdicos e intracavitários através das
                                                      derivações unipolares precordiais (V1 a V6) e dos
                                                      membros (aVR e aVL) (Figura 2), formularam as
                                                      bases de diagnóstico dos crescimentos das câmaras
                                                      cardíacas e a correlação com o provável modelo
                                                      hemodinâmico existente, estabelecendo os conceitos
                                                      eletrocardiográficos clássicos da Escola Mexicana,
                                                      de sobrecarga diastólica (aumento de fluxo) e
                                                      sobrecarga sistólica ou hipertrofia ventricular
                                                      (aumento da pressão)5. A sobrecarga diastólica
                                                      ocorre na persistência do canal arterial, na
                                                      comunicação interventricular e atresia tricúspide em
                                                      relação ao VE, e na comunicação interatrial em
                                                      relação ao VD. A sobrecarga sistólica ocorre na
                                                      coarctação aórtica e estenose aórtica em relação ao
                                                      VE e na estenose pulmonar e hipertensão pulmonar
Figura 1                                              em relação ao VD.
Anatomia da circulação fetal1


completa formação dos alvéolos e vias aéreas e
aumento das estruturas pulmonares.

Existem diferenças entre as estruturas histológicas
dos vasos pulmonares na vida intra-uterina e nos
recém-natos. No feto, as artérias e arteríolas
apresentam paredes espessas e lumens estreitos,
com a parede representando 20% a 50% do calibre
do vaso. Depois do nascimento, ocorre a dilatação
das arteríolas e aumento dos lumens arteriolares em
razão da expansão dos pulmões, e as normalizações
histológicas e fisiológicas destes vasos completam-
se ao redor do segundo ano de vida, quando a
parede representa então, apenas 5% do calibre do
vaso. Após o nascimento, a queda da resistência nos
vasos pulmonares, os aumentos do volume
circulatório nos pulmões e da massa do ventrículo     Figura 2
esquerdos, ocorrem simultaneamente.                   Aspectos dos potenciais epicárdicos e intracavitários na
                                                      ativação elétrica do coração4
Esses eventos são fundamentais para a compreensão
do eletrocardiograma no recém-nato e na primeira      Atualmente, aceita-se que o padrão de sobrecarga
infância. No recém-nato o ECG apresenta o padrão      diastólica possa também corresponder a fases
de sobrecarga ventricular direita, que representa     iniciais ou moderadas de hipertrofia ventricular,
nada mais que o padrão fisiológico da circulação      enquanto que a sobrecarga sistólica seja o marcador
durante a vida intra-uterina. Assim, as               de fase avançada desta alteração (Figuras 3 e 4)6.
características eletrocardiográficas nos primeiros
dias de vida são distintas do período                 Em relação às cardiopatias, não se deve esperar um
subseqüente3.                                         padrão uniforme no ECG, uma vez que as suas
Revista da SOCERJ - Out/Nov/Dez 2004                                                                                      259
                                                                           Onda P (OP): no recém-nato, a onda P é alta,
                                                                           pontiaguda e assimétrica, relacionada com a
                                                                           taquicardia fisiológica. A duração média de 60ms
                                                                           (entre 30ms e 90ms até os 3 anos e entre 50ms e
                                                                           110ms após os 3 anos) e a amplitude, geralmente,
                                                                           não ultrapassa a 2,5mm (0,25mV) em D2 e 2,0mm
                                                                           (0,20mV) em V1; pode ser normalmente difásica
                                                                           (positivo/negativo) em V1; SâP situa-se,
                                                                           habitualmente, entre –30o e +90o (entre –60o e +120o
                                                                           até os 6 meses e entre “60o e +90o após os 6 meses).
                                                                           Observar que nas crianças com cardiopatias
                                                                           congênitas cianóticas, a onda P congenitale, ou seja,
            Figura 3                                                       P de grande voltagem e apiculada em D2, D1 e aVF,
            Modelo hemodinâmico na comunicação interatrial: o              com predominância positiva em V1 e SâP desviado
            fluxo aumentado (setas mais grossas) no átrio direito e        para a esquerda, sugere atresia tricúspide,
            ventrículo direito, justifica o ECG de sobrecarga diastólica   transposição dos grandes vasos ou tetralogia de
            do VD3, 5                                                      Fallot10. Onda P negativa em D1 sugere dextrocardia.

                                                                           Intervalo PR (iPR): o iPR varia inversamente com
                                                                           a freqüência cardíaca, sendo que no recém-nato,
                                                                           situa-se geralmente, entre 70ms e 140ms, com valor
                                                                           médio de 100ms. Até a freqüência de 110bpm, o
                                                                           valor máximo de iPR é de 120ms, e acima de 150bpm
                                                                           é de 110ms. Intervalo PR prolongado na cardiopatia
                                                                           congênita pode sugerir defeito do canal
                                                                           atrioventricular ou transposição corrigida dos
                                                                           grandes vasos, e iPR curto com onda delta sugere
                                                                           enfermidade de Ebstein2,10.

                                                                           Complexo QRS: para o ventrículo direito, a
            Figura 4
                                                                           sobrecarga sistólica se caracteriza em V1 por onda
            Modelo hemodinâmico na Tetralogia de Fallot: a
                                                                           R ampla com onda T negativa e assimétrica, e a
            resistência aumentada ao ventrículo direito justifica o
                                                                           sobrecarga diastólica em V1 por onda r(pequena)-
            ECG de sobrecarga sistólica do VD3, 5
                                                                           s(pequena)-R’(R linha, grande) com onda T negativa
                                                                           e assimétrica. Para o ventrículo esquerdo, a
            modificações anatômicas e hemodinâmicas são                    sobrecarga sistólica se caracteriza em V5 ou V6 por
            variáveis, como ocorre na persistência do canal                onda R ampla com onda T negativa e assimétrica e
            arterial típico e naquele com hipertensão pulmonar             a sobrecarga diastólica em V5 ou V6 por onda q-R
            e até mesmo nas Tetralogias de Fallot, com crista              com onda T positiva, alta e pontiaguda11.
            supraventricular musculosa ou reduzida a uma
            simples membrana.                                              No recém-nato, devido à hipertrofia ventricular
                                                                           direita fisiológica, observa-se nas derivações
                                                                           precordiais direitas, V1 e V2, a onda R pura ou mais
            Análise do eletrocardiograma7,8                                freqüentemente R-S com R maior que S, e em V5 e
                                                                           V6 onda r-S ou q-r–S ou RS. Apesar das grandes
            Observação: a OMS classifica de recém-nata a                   amplitudes, geralmente, a onda R de V1 não
            criança de 0 a 29 dias de vida.                                ultrapassa a 18mm e a onda S de V6 não excede a
                                                                           11mm. Em V1, a presença de onda Q (qR) sugere a
            Freqüência cardíaca (FC): a freqüência cardíaca                sobrecarga de VD ou dilatação do átrio direito12. A
            habitual do recém-nato no período de vigília                   duração média do complexo QRS é 50ms, não
            oscila entre 100bpm e 180bpm. Freqüências mais                 ultrapassando a 80ms. SâQRS está situado à direita,
            lentas, menores que 80bpm, deve-se investigar                  entre +110o e +180o, desviando-se progressivamente
            uma possível doença cardíaca, por exemplo,                     para a esquerda após o nascimento, e aos 6 meses
            BAVT congênito. Taquicardia persistente,                       de idade, em 95% varia entre –30 o e +90 o .
            associada ao cansaço ao mamar, deve-se                         Usualmente, a partir dos 2 anos de idade e quase
            investigar possível miocardiopatia. Taquicardia                sempre após os 6 anos, o QRS é semelhante ao
            ventricular bidirecional, catecolaminérgica, está              adulto. No recém-nato com cardiopatia congênita,
            relacionada à morte súbita durante o sono9.                    o desvio do sâQRS para a esquerda, além de +30o,
260                                                                                                              Vol 17 No 4

deve sugerir defeito do canal atrioventricular, atresia   maiores que 600ms são fortemente indutores de
tricúspide ou ventrículo único.                           taquicardias ou fibrilação ventriculares, que podem
                                                          levar à morte súbita durante o sono – síndrome do
A grande amplitude das ondas R nas derivações             QT longo.
precordiais pode ser atribuída à pouca espessura
da parede torácica, com os eletródios mais próximos       Vetocardiograma (VCG): a alça vetorial do recém-
do coração. Pode-se encontrar o somatório das ondas       nato situa-se no quadrante inferior direito com
S de V1 + R de V5, maior que 65mm, sem evidências         rotação horária até o primeiro mês de vida. Após
de crescimento do VE. Com a normalização da               este período, entre a 6a e a 8a semanas, o VCG
resistência vascular pulmonar, o ECG evolui para          apresenta rotação anti-horária e a alça começa a se
as características apresentadas no adulto.                projetar da direita para a esquerda. Aos 2 anos o
                                                          VCG é qualitativamente semelhante ao adulto
Onda T (OT): nas primeiras 48 horas de vida, a onda       (Figura 5)15.
T é positiva em V1 e V2, tornando-se
progressivamente negativa em V1 até V4,
denominada de repolarização ou padrão infantil,           Comentários finais
podendo permanecer negativa até a adolescência.
Onda T positiva após a primeira semana de vida e          Apesar dos novos métodos complementares, o
até os 6 ou 7 anos de idade indicaria sobrecarga do       eletrocardiograma permanece como método de
ventrículo direito. Em V5-V6, é positiva após a           primeira escolha na abordagem cardiológica. No
primeira semana de vida.                                  recém-nato e na primeira infância, traz subsídios
                                                          que permitem a dedução de um modelo
Ondas T negativas em D1, aVL e V6 ou imagem de            hemodinâmico, conduzindo ao diagnóstico de
cor pulmonale agudo com bloqueio de ramo direito          várias cardiopatias congênitas.
e isquemia do ventrículo direito podem identificar
anomalia de artéria coronária (origem e                   As características do ECG no recém nato e na criança
distribuição)13.                                          mais freqüentemente observadas, são:
                                                          1. freqüência cardíaca mais rápida;
                                                          2. intervalo PR mais curto;
Intervalo QT (iQT): varia em relação à FC, devendo        3. onda P mais apiculada;
ser corrigido para a freqüência observada, isto é,        4. complexo QRS com padrão de sobrecarga
iQTC (corrigido) – índice de Bazett14. Intervalo QTC         ventricular direita;
normal é menor ou igual a 440ms; valores superiores       5. presença de onda T negativa nas derivações
a 480ms devem ser avaliados cuidadosamente e                 precordiais direitas.




Figura 5
VCG normal – evolução do recém-nato ao adulto3, 5
Revista da SOCERJ - Out/Nov/Dez 2004                                                                                        261




            Figura 6
            ECG em criança de 8 meses com coração normal
            Observar: FC=100bpm, iPR=120ms, QRS com Rs em V1 e qR em V6 e onda T negativa de V1 a V3 (repolarização
            infantil) (Goldwasser GP) 7, 11




            Referências bibliográficas

            1. Montenegro CA, Rezende Filho J. Medicina fetal. Atlas      9. Cruz FES, Maia IG. Eletrofisiologia clínica das
               comentado. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan; 1998.             arritmias cardíacas. Rio de Janeiro: Revinter; 1995.
            2. Cassel DE, Ziegler RF. Electrocardiography infants         10. Burch GE, De Pasquale NP. Electrocardiography in
               and children. A Symposium sponsored by the                     the diagnosis of congenital heart diseases.
               American College of Chest Physicians. New York:                Philadelphia: Lea & Febiger;1967.
               Grune & Stratton; 1996.                                    11. Goldwasser, GP. Eletrocardiograma orientado para o
            3. Cabrera E. Curso de vectocardiografía y                        clínico. 2a ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2002.
               electrocardiografía. Recife: Universidade Federal de       12. Sodi-Pallares D, Bisteni A, Hermann GR. Some
               Pernambuco; 1969.                                              views on the significance of qR and QR type
            4. Sodi-Pallares D, Medrano GA, Bisteni A, Ponce de               complexs in right precordial leads in the absence
               Leon Y. Electrocardiografía clínica. Análisis deductivo.       of myocardial infarction. Am Heart J 1952;43:716-
               Instituto Nacional de Cardiología de México; 1968.             34.
            5. Cabrera E. Teoria y practica de la electrocardiografía.    13. Zuckerman R, Cisneros F, Novelo S.
               México: La Prensa Médica Mexicana; 1958.                       Electrocardiograma em cardiopatias congênitas.
            6. Bayés de Luna A. Electrocardiografía clínica.                  Arch Inst Cardiol. México 1951;21:3-32.
               Barcelona: Doyma; 1992.                                    14. Deccache W. ECG para o clínico. Rio de Janeiro:
            7. Andréa EM, Atié J, Maciel W. Eletrocardiograma na              Revinter; 2004.
               criança e no feto. In: Goldwasser, GP.                     15. Penaloza D, Tranchesi J, Marsico P, et al. Vectorial
               Eletrocardiograma orientado para o clínico. 2a ed. Rio         analysis of the electrocardiogram in right
               de Janeiro: Revinter; 2002.                                    ventricular hypertrophy. in congenital heart
            8. Tranchesi J. Eletrocardiograma normal e                        disease with pure or associated pulmonary
               patológico: Noções de Vetocardiografia. São Paulo:             stenosis. II Congress of SIBIC. Acapulco – México;
               Roca; 2001.                                                    1954.

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Ecg nos rn e na 1° infância

  • 1. Revista da SOCERJ - Out/Nov/Dez 2004 257 Artigo de Revisão 4 Elementos Significativos do Eletrocardiograma nos Recém- Natos e na Primeira Infância: suas utilidades clínicas Dirson de Castro Abreu1, José Feldman2, Waldemar Deccache3, Gerson P. Goldwasser4 Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Medicina Souza Marques e Universidade Gama Filho Palavras-chave: Fisiologia da circulação fetal, entre oxigênio e gás carbônico ocorre na placenta. Hemodinâmica nas cardiopatias congênitas, O sangue chega ao átrio direito através das duas Eletrocardiograma no recém-nato veias cavas e seguem fluxos preferenciais. A veia cava inferior recebe sangue arterializado das veias umbelicais. Este fluxo sanguíneo alcança o Resumo átrio direito e, através do foramen ovale, passa ao átrio esquerdo onde se mistura com o sangue Durante a vida fetal, o ventrículo direito trabalha venoso proveniente dos pulmões. A veia cava contra uma alta resistência, pois impulsiona o fluxo superior recebe o sangue da cabeça e das sanguíneo para regiões de alta pressão, como o extremidades superiores. Este fluxo sanguíneo tronco, os membros e, principalmente, os pulmões insaturado alcança o átrio direito e segue para a ainda não expandidos. A normalização fisiológica artéria pulmonar. A maior parte deste fluxo é das pressões, na pequena circulação e no ventrículo dirigida para a aorta, via ductus arteriosus e, em direito, ocorre progressivamente ao longo dos dois menor parte para os pulmões pelos ramos primeiros anos de vida. Portanto, o recém-nato principais da artéria pulmonar, porém sem ser apresenta fisiologicamente o padrão hemodinâmico oxigenado1. e eletrocardiográfico de sobrecarga ventricular direita. Os autores apresentam uma revisão sumária Durante a vida fetal o trabalho do ventrículo direito da circulação e da fisiologia fetal, dos padrões está aumentado, em razão de bombear contra uma hemodinâmicos observados em cardiopatias alta resistência, pois impulsiona o sangue para o congênitas, e a análise sistematizada do tronco e para as extremidades inferiores através do eletrocardiograma normal do recém-nato. ductus arteriosus, e para os pulmões ainda colabados. O ventrículo esquerdo impulsiona o sangue para Além disso, destacam os elementos no as extremidades superiores e para a cabeça, e apenas eletrocardiograma que auxiliam no diagnóstico de uma parte para o tronco e para as extremidades algumas das principais cardiopatias congênitas. inferiores. A placenta determina queda da resistência no território sistêmico, tornando semelhantes as pressões intracavitárias nos dois Introdução ventrículos (Figura1)1,2. Circulação fetal Na fase pré-natal, os pulmões são cheios de líquido, Durante a vida intra-uterina os pulmões não não aerados e mal perfundidos, ocorrendo a oxigenam o sangue, uma vez que a troca gasosa maturação pulmonar após o nascimento, com a 1 Médico do Instituto de Cardiologia Aloísio de Castro. Professor da Faculdade de Medicina da UFRJ e da UERJ Ex-Pesquisador do Instituto Nacional de Cardiologia – México 2 Professor da Faculdade de Medicina da UFRJ. Livre docente em Cardiologia pela UFRJ Ex-Pesquisador do Instituto Nacional de Cardiologia – México 3 Professor Pesquisador do Curso de Pós-Graduação em Cardiologia – UFRJ 4 Mestre em Cardiologia pela UFRJ. Professor da Escola de Medicina Souza Marques e da Universidade Gama Filho Santa Casa da Misericórdia – RJ – Nona Enfermaria – serviço do Prof. E.L. Pontes
  • 2. 258 Vol 17 No 4 Padrões hemodinâmicos nas cardiopatias congênitas Coube a Sodi-Pallares4 e sua escola, que teve em Enrique Cabrera o seu exponencial, utilizar a partir de 1947 a interpretação dedutiva do traçado eletrocardiográfico e, através do conhecimento do processo de ativação dos átrios e ventrículos, inferir as prováveis condições anatômicas e fisiopatológicas do coração. Analisando os potenciais epicárdicos e intracavitários através das derivações unipolares precordiais (V1 a V6) e dos membros (aVR e aVL) (Figura 2), formularam as bases de diagnóstico dos crescimentos das câmaras cardíacas e a correlação com o provável modelo hemodinâmico existente, estabelecendo os conceitos eletrocardiográficos clássicos da Escola Mexicana, de sobrecarga diastólica (aumento de fluxo) e sobrecarga sistólica ou hipertrofia ventricular (aumento da pressão)5. A sobrecarga diastólica ocorre na persistência do canal arterial, na comunicação interventricular e atresia tricúspide em relação ao VE, e na comunicação interatrial em relação ao VD. A sobrecarga sistólica ocorre na coarctação aórtica e estenose aórtica em relação ao VE e na estenose pulmonar e hipertensão pulmonar Figura 1 em relação ao VD. Anatomia da circulação fetal1 completa formação dos alvéolos e vias aéreas e aumento das estruturas pulmonares. Existem diferenças entre as estruturas histológicas dos vasos pulmonares na vida intra-uterina e nos recém-natos. No feto, as artérias e arteríolas apresentam paredes espessas e lumens estreitos, com a parede representando 20% a 50% do calibre do vaso. Depois do nascimento, ocorre a dilatação das arteríolas e aumento dos lumens arteriolares em razão da expansão dos pulmões, e as normalizações histológicas e fisiológicas destes vasos completam- se ao redor do segundo ano de vida, quando a parede representa então, apenas 5% do calibre do vaso. Após o nascimento, a queda da resistência nos vasos pulmonares, os aumentos do volume circulatório nos pulmões e da massa do ventrículo Figura 2 esquerdos, ocorrem simultaneamente. Aspectos dos potenciais epicárdicos e intracavitários na ativação elétrica do coração4 Esses eventos são fundamentais para a compreensão do eletrocardiograma no recém-nato e na primeira Atualmente, aceita-se que o padrão de sobrecarga infância. No recém-nato o ECG apresenta o padrão diastólica possa também corresponder a fases de sobrecarga ventricular direita, que representa iniciais ou moderadas de hipertrofia ventricular, nada mais que o padrão fisiológico da circulação enquanto que a sobrecarga sistólica seja o marcador durante a vida intra-uterina. Assim, as de fase avançada desta alteração (Figuras 3 e 4)6. características eletrocardiográficas nos primeiros dias de vida são distintas do período Em relação às cardiopatias, não se deve esperar um subseqüente3. padrão uniforme no ECG, uma vez que as suas
  • 3. Revista da SOCERJ - Out/Nov/Dez 2004 259 Onda P (OP): no recém-nato, a onda P é alta, pontiaguda e assimétrica, relacionada com a taquicardia fisiológica. A duração média de 60ms (entre 30ms e 90ms até os 3 anos e entre 50ms e 110ms após os 3 anos) e a amplitude, geralmente, não ultrapassa a 2,5mm (0,25mV) em D2 e 2,0mm (0,20mV) em V1; pode ser normalmente difásica (positivo/negativo) em V1; SâP situa-se, habitualmente, entre –30o e +90o (entre –60o e +120o até os 6 meses e entre “60o e +90o após os 6 meses). Observar que nas crianças com cardiopatias congênitas cianóticas, a onda P congenitale, ou seja, Figura 3 P de grande voltagem e apiculada em D2, D1 e aVF, Modelo hemodinâmico na comunicação interatrial: o com predominância positiva em V1 e SâP desviado fluxo aumentado (setas mais grossas) no átrio direito e para a esquerda, sugere atresia tricúspide, ventrículo direito, justifica o ECG de sobrecarga diastólica transposição dos grandes vasos ou tetralogia de do VD3, 5 Fallot10. Onda P negativa em D1 sugere dextrocardia. Intervalo PR (iPR): o iPR varia inversamente com a freqüência cardíaca, sendo que no recém-nato, situa-se geralmente, entre 70ms e 140ms, com valor médio de 100ms. Até a freqüência de 110bpm, o valor máximo de iPR é de 120ms, e acima de 150bpm é de 110ms. Intervalo PR prolongado na cardiopatia congênita pode sugerir defeito do canal atrioventricular ou transposição corrigida dos grandes vasos, e iPR curto com onda delta sugere enfermidade de Ebstein2,10. Complexo QRS: para o ventrículo direito, a Figura 4 sobrecarga sistólica se caracteriza em V1 por onda Modelo hemodinâmico na Tetralogia de Fallot: a R ampla com onda T negativa e assimétrica, e a resistência aumentada ao ventrículo direito justifica o sobrecarga diastólica em V1 por onda r(pequena)- ECG de sobrecarga sistólica do VD3, 5 s(pequena)-R’(R linha, grande) com onda T negativa e assimétrica. Para o ventrículo esquerdo, a modificações anatômicas e hemodinâmicas são sobrecarga sistólica se caracteriza em V5 ou V6 por variáveis, como ocorre na persistência do canal onda R ampla com onda T negativa e assimétrica e arterial típico e naquele com hipertensão pulmonar a sobrecarga diastólica em V5 ou V6 por onda q-R e até mesmo nas Tetralogias de Fallot, com crista com onda T positiva, alta e pontiaguda11. supraventricular musculosa ou reduzida a uma simples membrana. No recém-nato, devido à hipertrofia ventricular direita fisiológica, observa-se nas derivações precordiais direitas, V1 e V2, a onda R pura ou mais Análise do eletrocardiograma7,8 freqüentemente R-S com R maior que S, e em V5 e V6 onda r-S ou q-r–S ou RS. Apesar das grandes Observação: a OMS classifica de recém-nata a amplitudes, geralmente, a onda R de V1 não criança de 0 a 29 dias de vida. ultrapassa a 18mm e a onda S de V6 não excede a 11mm. Em V1, a presença de onda Q (qR) sugere a Freqüência cardíaca (FC): a freqüência cardíaca sobrecarga de VD ou dilatação do átrio direito12. A habitual do recém-nato no período de vigília duração média do complexo QRS é 50ms, não oscila entre 100bpm e 180bpm. Freqüências mais ultrapassando a 80ms. SâQRS está situado à direita, lentas, menores que 80bpm, deve-se investigar entre +110o e +180o, desviando-se progressivamente uma possível doença cardíaca, por exemplo, para a esquerda após o nascimento, e aos 6 meses BAVT congênito. Taquicardia persistente, de idade, em 95% varia entre –30 o e +90 o . associada ao cansaço ao mamar, deve-se Usualmente, a partir dos 2 anos de idade e quase investigar possível miocardiopatia. Taquicardia sempre após os 6 anos, o QRS é semelhante ao ventricular bidirecional, catecolaminérgica, está adulto. No recém-nato com cardiopatia congênita, relacionada à morte súbita durante o sono9. o desvio do sâQRS para a esquerda, além de +30o,
  • 4. 260 Vol 17 No 4 deve sugerir defeito do canal atrioventricular, atresia maiores que 600ms são fortemente indutores de tricúspide ou ventrículo único. taquicardias ou fibrilação ventriculares, que podem levar à morte súbita durante o sono – síndrome do A grande amplitude das ondas R nas derivações QT longo. precordiais pode ser atribuída à pouca espessura da parede torácica, com os eletródios mais próximos Vetocardiograma (VCG): a alça vetorial do recém- do coração. Pode-se encontrar o somatório das ondas nato situa-se no quadrante inferior direito com S de V1 + R de V5, maior que 65mm, sem evidências rotação horária até o primeiro mês de vida. Após de crescimento do VE. Com a normalização da este período, entre a 6a e a 8a semanas, o VCG resistência vascular pulmonar, o ECG evolui para apresenta rotação anti-horária e a alça começa a se as características apresentadas no adulto. projetar da direita para a esquerda. Aos 2 anos o VCG é qualitativamente semelhante ao adulto Onda T (OT): nas primeiras 48 horas de vida, a onda (Figura 5)15. T é positiva em V1 e V2, tornando-se progressivamente negativa em V1 até V4, denominada de repolarização ou padrão infantil, Comentários finais podendo permanecer negativa até a adolescência. Onda T positiva após a primeira semana de vida e Apesar dos novos métodos complementares, o até os 6 ou 7 anos de idade indicaria sobrecarga do eletrocardiograma permanece como método de ventrículo direito. Em V5-V6, é positiva após a primeira escolha na abordagem cardiológica. No primeira semana de vida. recém-nato e na primeira infância, traz subsídios que permitem a dedução de um modelo Ondas T negativas em D1, aVL e V6 ou imagem de hemodinâmico, conduzindo ao diagnóstico de cor pulmonale agudo com bloqueio de ramo direito várias cardiopatias congênitas. e isquemia do ventrículo direito podem identificar anomalia de artéria coronária (origem e As características do ECG no recém nato e na criança distribuição)13. mais freqüentemente observadas, são: 1. freqüência cardíaca mais rápida; 2. intervalo PR mais curto; Intervalo QT (iQT): varia em relação à FC, devendo 3. onda P mais apiculada; ser corrigido para a freqüência observada, isto é, 4. complexo QRS com padrão de sobrecarga iQTC (corrigido) – índice de Bazett14. Intervalo QTC ventricular direita; normal é menor ou igual a 440ms; valores superiores 5. presença de onda T negativa nas derivações a 480ms devem ser avaliados cuidadosamente e precordiais direitas. Figura 5 VCG normal – evolução do recém-nato ao adulto3, 5
  • 5. Revista da SOCERJ - Out/Nov/Dez 2004 261 Figura 6 ECG em criança de 8 meses com coração normal Observar: FC=100bpm, iPR=120ms, QRS com Rs em V1 e qR em V6 e onda T negativa de V1 a V3 (repolarização infantil) (Goldwasser GP) 7, 11 Referências bibliográficas 1. Montenegro CA, Rezende Filho J. Medicina fetal. Atlas 9. Cruz FES, Maia IG. Eletrofisiologia clínica das comentado. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan; 1998. arritmias cardíacas. Rio de Janeiro: Revinter; 1995. 2. Cassel DE, Ziegler RF. Electrocardiography infants 10. Burch GE, De Pasquale NP. Electrocardiography in and children. A Symposium sponsored by the the diagnosis of congenital heart diseases. American College of Chest Physicians. New York: Philadelphia: Lea & Febiger;1967. Grune & Stratton; 1996. 11. Goldwasser, GP. Eletrocardiograma orientado para o 3. Cabrera E. Curso de vectocardiografía y clínico. 2a ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2002. electrocardiografía. Recife: Universidade Federal de 12. Sodi-Pallares D, Bisteni A, Hermann GR. Some Pernambuco; 1969. views on the significance of qR and QR type 4. Sodi-Pallares D, Medrano GA, Bisteni A, Ponce de complexs in right precordial leads in the absence Leon Y. Electrocardiografía clínica. Análisis deductivo. of myocardial infarction. Am Heart J 1952;43:716- Instituto Nacional de Cardiología de México; 1968. 34. 5. Cabrera E. Teoria y practica de la electrocardiografía. 13. Zuckerman R, Cisneros F, Novelo S. México: La Prensa Médica Mexicana; 1958. Electrocardiograma em cardiopatias congênitas. 6. Bayés de Luna A. Electrocardiografía clínica. Arch Inst Cardiol. México 1951;21:3-32. Barcelona: Doyma; 1992. 14. Deccache W. ECG para o clínico. Rio de Janeiro: 7. Andréa EM, Atié J, Maciel W. Eletrocardiograma na Revinter; 2004. criança e no feto. In: Goldwasser, GP. 15. Penaloza D, Tranchesi J, Marsico P, et al. Vectorial Eletrocardiograma orientado para o clínico. 2a ed. Rio analysis of the electrocardiogram in right de Janeiro: Revinter; 2002. ventricular hypertrophy. in congenital heart 8. Tranchesi J. Eletrocardiograma normal e disease with pure or associated pulmonary patológico: Noções de Vetocardiografia. São Paulo: stenosis. II Congress of SIBIC. Acapulco – México; Roca; 2001. 1954.