Agências Executivas: Uma Nova Realidade Institucional
1. BDA – Boletim de Direito Administrativo – Outubro/99666
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I) No momento político presente, a palavra
de ordem é “Reforma Administrativa”. O Estado
Brasileiro, diante da sensível dificuldade em
operacionalizar suas instituições em prol da co-
letividade, busca reestruturar seus quadros a fim
de tornar seu aparato mais eficiente, otimizado e
competitivo. Torna-se propício tanto o ressurgi-
mento de mecanismos conhecidos como a emer-
gência de novos institutos relacionados à atua-
ção governamental. Neste contexto inserem-se
as chamadas Agências Executivas.
Preliminarmente à análise de seu significa-
do, estrutura organizacional, competência, é mis-
ter traçar brevemente os elementos que, soma-
dos, contribuíram para sua gênese.
II) O movimento liberal do século XVIII cul-
minou com a consolidação do chamado Estado
Mínimo, no qual a ingerência deste no âmbito da
sociedade era circunscrita aos limites rigidamente
determinados pelas liberdades individuais. O pe-
ríodo do pós-guerra, por sua vez, consagrou o
Estado do Bem-Estar Social, no qual o organis-
mo estatal se fazia presente em quase todos os
setores, intervindo no plano econômico como
agente regulador, como prestador direto de ser-
viços públicos, como produtor de insumos e como
incentivador do desenvolvimento. Outrossim, o
crescimento desmensurado da estrutura estatal
e ampliação demasiada do âmbito de sua atua-
ção acabou por torná-la ineficiente na realização
de seus fins, deixando de solucionar as necessi-
dades que justificam sua existência.
Inicia-se, assim, movimento inverso no sen-
tido de reestruturar o engessado e inoperante
aparelho estatal. Primeiramente, fazendo uso de
técnicas conhecidas, quais sejam descentralizar
e desconcentrar a prestação de serviços públicos.
Em segundo lugar, partindo para angariar a parti-
cipação dos particulares, buscando a conjunção
da necessidade de atender aos interesses da
coletividade com os imperativos de atratividade
e lucro que norteiam aqueles em sua atuação.
Assim, figuras já conhecidas passam a ser cada
vez mais utilizadas. São elas, respectivamente:
concessão, permissão, autorização, ao lado das
quais se colocam novas formas de participação
dos particulares na prestação de serviços públi-
cos, dentre as quais se inserem a terceirização e
a franquia.
Outrossim, deve-se ressaltar o caráter estra-
tégico destes serviços que passam a ser presta-
dos por particulares em colaboração com a Ad-
ministração, vez que envolvem o atendimento de
necessidades vitais da coletividade. Assim sen-
do, não se pode sujeitá-los ao exclusivo alvedrio
de particulares subordinados aos imperativos da
economia capitalista. O Estado, deste modo, não
pode abrir mão de sua função reguladora. Neste
momento, surgem as chamadas Agências Exe-
cutivas.
III) Nesse aspecto, a Lei nº 9.648/98, dentre
as várias modificações que introduziu na atual
Lei de Licitações e Contratos Administrativos,
acrescentou ao seu art. 24 um parágrafo único
que eleva para 20% (vinte por cento) o percentual
de dispensa para compras, obras e serviços dos
órgãos da Administração indireta, estendendo
esse benefício às sociedades de economia mis-
ta e empresa pública, bem como e tão-somente
às autarquias e fundações qualificadas como
“Agências Executivas” na forma da lei, sem, en-
tretanto, definir seu conteúdo.
Com efeito, dispõe o parágrafo único do art.
24 introduzido na Lei nº 8.666/93:
Ana Cristina Fecuri
Silene Pinheiro Cruz Minitti
Advogadas em São Paulo, membros do Corpo Jurídico da Editora NDJ
AGÊNCIAS EXECUTIVAS:
UMA NOVA REALIDADE INSTITUCIONAL
2. DOUTRINA, PARECERES E ATUALIDADES 667
“Art. 24. É dispensável a licitação:
................................................................
Parágrafo único.Os percentuais referidos
nos incs. I e II deste artigo, serão 20% (vinte
por cento) para compras, obras e serviços
contratados por sociedade de economia
mista e empresa pública, bem assim por
autarquia e fundação qualificadas, na forma
da lei, como Agências Executivas” (grifos
nossos).
E para chegar ao conteúdo de “Agência Exe-
cutiva” mister se faz tecer rápidas considerações
sobre os órgãos dirigentes da Administração Fe-
deral Brasileira. Senão, vejamos.
O eminente jurista Hely Lopes Meirelles, ao
dissertar sobre “Os Órgãos Dirigentes da Admi-
nistração Pública”, estrutura, com a sabedoria
que lhe é peculiar, a administração federal nos
seguintes termos:
“No sistema presidencialista adotado
pela nossa Constituição o Presidente da Re-
pública exerce o Poder Executivo da União
auxiliado pelos Ministros de Estado (art. 76),
cabendo àquele a direção suprema da Ad-
ministração federal (art. 84, II) e a estes a
orientação, coordenação e supervisão dos
órgãos e entes descentralizados na área de
sua competência (art. 87, parágrafo único, I),
todos secundados por órgãos de assessora-
mento e de execução, além de tribunais admi-
nistrativos, procuradorias e outros desdobra-
mentos da Administração direta e indireta da
União ...” (in Hely Lopes Meirelles, Direito
Administrativo Brasileiro, 19ª ed. atualizada,
Malheiros, 1994, p. 642).
Sabe-se, portanto, que a Administração Pú-
blica Federal é composta por um órgão de cúpu-
la – a Presidência da República –, e pelos Minis-
térios – órgãos autônomos da cúpula da Adminis-
tração Federal, localizados abaixo da Presidên-
cia da República, aos quais se integram os servi-
ços da Administração Direta e se subordinam as
entidades ou órgãos da Administração Indireta
federal, cujas atividades enquadram-se nas res-
pectivas áreas de competência.
Dentre esses entes descentralizados encon-
tram-se as chamadas autarquias ou fundações,
integrantes da Administração Pública Federal,
vinculadas ao Ministério correspondente às ati-
vidades desenvolvidas em sua área de compe-
tência, que preenchendo os requisitos descritos
na legislação pertinente, poderão ser qualifica-
das como Agências Executivas.
“Agências Executivas”porque constituídas ou
elevadas a essa categoria pelo Poder Executivo
para regular e fiscalizar, por outorga e em con-
formidade com as políticas e diretrizes do gover-
no federal, determinados serviços, sob a supervi-
são ministerial. Ostentam, dessa forma, caracte-
rísticas próprias na sua organização, direção,
operacionalidade e gestão de seus bens e ser-
viços.
Cite-se, por exemplo, a Agência Nacional de
Energia Elétrica – ANEEL, autarquia sob regime
especial, vinculada ao Ministério de Minas e Ener-
gia, instituída pelo Poder Executivo Federal por
meio da Lei nº 9.427/96 e que tem por finalidade
precípua regular e fiscalizar a produção, trans-
missão, distribuição e comercialização de ener-
gia elétrica.
Consigne-se, por derradeiro, que o parágra-
fo único do supratranscrito art. 24, ao dirigir-se
às “Agências Executivas”, o faz tão-somente para
a autarquia ou fundação federal que, querendo e
preenchendo os requisitos previstos na legisla-
ção específica, eleve-se a essa categoria, res-
tando claro que as sociedades de economia mis-
ta e empresas públicas, entidades paraestatais
que são, não precisarão ser qualificadas como
agências executivas para que sejam beneficia-
das com o percentual de 20% (vinte por cento)
para a dispensa nas compras, obras e serviços
por elas contratados.
A propósito, o Dec.nº 2.487, de 2 de fevereiro
de 1998, dispõe sobre a qualificação de autar-
quias e fundações como Agências Executivas,
estabelecendo critérios e procedimentos para a
elaboração, acompanhamento e avaliação dos
contratos de gestão e dos planos estratégicos
de reestruturação e de desenvolvimento institu-
cional das entidades qualificadas.
De um modo geral, pode-se dizer que as
autarquias e fundações que sejam integrantes
da Administração Pública Federal poderão, des-
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de que observadas as diretrizes do Plano Diretor
da Reforma do Aparelho do Estado, ser qualifi-
cadas como Agências Executivas.
Para tanto, as candidatas à qualificação de
Agência Executiva deverão celebrar contrato de
gestão com o respectivo Ministério supervisor,
além de apresentar plano estratégico de reestru-
turação e de desenvolvimento institucional, vol-
tado para a melhoria da qualidade de gestão e
para a redução de custos, já concluído ou em
andamento, requisitos legais básicos a serem
preenchidos para que sejam elevadas à catego-
ria de Agências Executivas.
As entidades que cumprirem rigorosa e
detalhadamente o disposto nessa legislação po-
derão receber a qualificação de Agências Exe-
cutivas, mediante iniciativa do Ministério super-
visor, com anuência do Ministério da Administra-
ção Federal e Reforma do Estado e formalização
por meio de decreto.
Ressalte-se que a mantença da qualidade
de “Agência Executiva” estará assegurada à En-
tidade que tenha o seu contrato de gestão su-
cessivamente renovado e o seu plano estratégi-
co tenha prosseguimento ininterrupto até a sua
conclusão.
Acrescente-se, por fim, que o Dec. nº 2.488/
98 definiu as medidas de organização administra-
tiva específicas para as autarquias e fundações
já qualificadas como Agências Executivas, desti-
nadas a ampliar a eficiência na utilização dos
recursos públicos, melhorar o desempenho e a
qualidade dos serviços prestados, assegurar
maior autonomia de gestão orçamentária, finan-
ceira, operacional e de recursos humanos e eli-
minar fatores restritivos à sua atuação institu-
cional.