William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
Evolução do manto terrestre: perspectivas geoquímicas
1.
2. Conferência
Mantle degassing and formation of
the atmosphere
Manuel Moreira
Laboratoire de Géochimie et Cosmochimie, Institut de Physique du Globe de Paris.
24 de Setembro, 17h00, sala 6.2.56
GeoFCUL. Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Cidade Universitária.
3. Mantle degassing and formation of the atmosphere
Manuel Moreira*
Laboratoire de Géochimie et Cosmochimie, Institut de Physique du Globe de Paris.
The origin of the atmospheres of the Earth and the other terrestrial planets is a relatively old issue that is now in way to be addressed thanks to
better analytical precision in mass spectrometry and also to new observation in astronomy of young solar systems. The origin of the Earth
atmosphere has been attributed either to a residue of a primordial atmosphere that escaped to space from the early Earth, to a degassing of the
inner Earth during geological times, or to a late veneer of volatile-rich material such as comets. In this talk we will show how the comparison
between the rare gas compositions of deep mantle derived material, of the atmosphere and of some meteorite classes can constrain the
different scenarios of the atmosphere origin.
Rare gases are excellent tools to study the atmosphere history because of their chemical inertness and the fact they belong to radioactive
systems such as K-Ar, giving time information. Rare gas analyses in Mid Oceanic Ridge Basalts (MORB) and Oceanic Island Basalts (OIB) give
important constraints on the volatile budget in the mantle as well as its structure and also on the evolution of the mantle/atmosphere system.
From helium, neon, argon and xenon isotopic compositions, it appears that the mantle is divided in two major reservoirs. One is the MORB
source, which is relatively degassed, whereas the second one - the OIB source - appears to be less degassed and suggests that the source of
4. oceanic island is a deep reservoir, relatively pristine for the volatile compositions. Moreover, rare gases give more precise constraints about the
timing of the mantle degassing. They suggest that the atmosphere was massively degassed during the first hundred million years, probably
because the shallow Earth was melted the magma ocean phase. Then a continuous degassing occurred, linked to the plate tectonic and is still
observed at mid oceanic ridges.
Moreira, M. (2008) Mantle degassing and formation of the atmosphere, in Mateus, A. (Coord.), O interior da
Terra: da crusta ao núcleo.Departamento de Geologia da FCUL, Lisboa, pp. 3-4. Acessível em
http://geologia.fc.ul.pt/documents/140.pdf, consultado em [data da consulta].
* e-mail: moreira@ipgp.jussieu.fr; http://www.ipgp.jussieu.fr/
5. Tectónica de placas
António Ribeiro*
Professor Catedrático do GeoFCUL.
.
O avanço do conhecimento geocientífico nos últimos cinquenta anos foi em boa medida
marcado pela formulação da Teoria da Tectónica de Placas, cujo refinamento ainda prossegue
hoje. De facto, a Terra é um sistema em constante mutação que deve ser compreendido no seu
todo. Assim, a evolução dos oceanos permite explicar a dos continentes: antes de nascer, um
oceano traduz-se pela formação de um rift intracontinental (como na África oriental); na fase de
juventude, gera-se um oceano estreito entre dois continentes (como o mar Vermelho); na fase
adulta, o oceano alastra até larguras consideráveis (como o Atlântico); na fase de maturidade, o
oceano é bordejado por zonas de subducção (como no Pacífico), gerando-se uma cadeia de tipo
andino, e, se a velocidade de convergência nestas últimas superar a de divergência na crista, o
oceano começa a fechar; na fase de velhice, o oceano está quase fechado (como no
Mediterrâneo oriental); uma vez consumado o fecho do oceano, dá-se a colisão de continentes,
gerando uma cadeia de montanhas de tipo Alpino. Concluído um ciclo, denominado Ciclo de
Wilson, outro pode iniciar-se, embora obedecendo a uma localização espacial geralmente
repetitiva, mas eventualmente distinta. Esta sucessão de ciclos estende-se no passado até 2500 Ma;
antes disso, deve ter ocorrido uma tectónica por convecção com células de menor dimensão, mais
rápidas e mais instáveis.
A Tectónica de Placas é, pois, uma Teoria à escala do globo e constitui o núcleo precursor do
estudo da Terra como Sistema Dinâmico e Aberto. Com efeito, as investigações realizadas nas
últimas décadas permitem concluir que a geração de crateras de impacto configura um processo
geológico fundamental. Subsistem, no entanto, dúvidas quanto ao papel das chamadas plumas
mantélicas, geradoras de hot spots, tema de discussões intensas no presente momento. Por outro
lado, um dos postulados do paradigma da Tectónica de Placas o da rigidez do interior das placas
tornou-se um paradoxo: a observação de deformação sísmica ou assísmica no interior dos
continentes mostrou que, de facto, as placas continentais poderiam admitir deformações internas
importantes; nos anos 90, com o desenvolvimento da geodesia de satélite, torna-se evidente que o
mesmo pode acontecer com os oceanos (ainda que no limite de detecção, com a precisão do que
hoje dispomos). A versão da Tectónica de Placas “macias” invoca modificações significativas das
6. propriedades mecânicas das rochas por acção convectiva de fluidos reactivos, explicando, de
acordo com os seus proponentes, com maior rigor o próprio mecanismo motor da Tectónica de
Placas e, portanto, da deriva dos continentes. Com efeito, a uma escala de milhões de anos, a
superfície da Terra comporta-se como um fluido comum, com os “continentes sólidos” derivando
“por arraste” pelos fundos oceânicos que os rodeiam.
O conceito de deriva dos continentes tem ainda uma outra implicação na reconstituição do
passado, explicação do presente e … antevisão do futuro da Terra. Numa Terra esférica, a “dança”
dos continentes obriga necessariamente à sua junção em determinados períodos da história num
único supercontinente, rodeado por um oceano contínuo; é o chamado ciclo dos supercontinentes
com duração aproximada de 300-350 Ma. Este ciclo refere-se ao conjunto dos oceanos à escala
global, enquanto o de Wilson alude à evolução de um oceano individual, obviamente em mais curto
intervalo de tempo. Levanta-se, pois, o problema dos cenários possíveis para o próximo
supercontinente futuro, dentro de cerca de 250 Ma. Há várias previsões para a evolução em
direcção a esse supercontinente; a que preferimos é a de que o Atlântico fechará, o que explicaria o
início da subducção nas margens SW da Ibéria e de Marrocos.
A evolução futura da Terra no contexto da Tectónica de Placas obrigará a uma
desaceleração no movimento das placas, que alongará os ciclos de supercontinentes, por
decaimento progressivo do seu mecanismo motor. Dentro de alguns milhares de mihões de anos, a
água dos oceanos será fixada em volumes crescentes no manto superior e a litosfera tornar-se-á
cada vez mais rígida e imóvel, alterando também radicalmente a evolução da atmosfera e
hidrosfera.
Ribeiro, A. (2008) Tectónica de placas, in Mateus, A. (Coord.), O interior da terra: da crusta ao núcleo.
D e p a r t a m e n t o d e G e o l o g i a F C U L, L i s b o a , p p. 5 - 6 . A c e s s í v e l e m
http://geologia.fc.ul.pt/documents/140.pdf, consultado em [data da consulta].
* e-mail: aribeiro@fc.ul.pt
7. A evolução do manto: uma perspectiva
geoquímica
João Mata* & Línia Martins**
Professor Auxiliar com Agregação e Professora Auxiliar do GeoFCUL.
.
O manto constitui actualmente cerca de 67% da massa e 82% do volume da Terra.
Prolongando-se até aos 2900 km de profundidade, não está na sua quase totalidade acessível à
observação directa o que leva a que, para o seu conhecimento, nos tenhamos que socorrer da
Geofísica. No entanto, os métodos geofísicos só permitem caracterizar propriedades actuais do
planeta. Ora a Terra tem uma história longa de 4,55 Ga o que confere à Geoquímica Isotópica um
papel que, neste contexto, extravasa largamente o da caracterização do maior dos reservatórios
terrestres, permitindo inferências sobre a evolução composicional mantélica ao longo de toda a sua
história.
A Terra teria, no culminar do processo de acreção que levou à sua formação, uma
composição quase homogénea, similar, para a maioria dos elementos, à dos meteoritos condríticos.
A enorme quantidade de energia térmica que a caracterizava, aliada à gravidade, levou à estrutura
diferenciada que hoje conhecemos, podendo o manto actual ser considerado o resíduo do
conjunto de processos que originaram o núcleo, a crosta, a atmosfera e a hidrosfera.
A individualização do núcleo deu-se por um processo de separação gravítica que fez
acumular no centro do planeta elementos densos como o Fe e o Ni, que constituem cerca de 90%
182 182
da composição do núcleo. O sistema isotópico Hf- W, envolvendo elementos de comportamento
geoquímico contrastante (Hf litófilo; W siderófilo) e caracterizando-se por um período de semi-vida
extremamente curto (9 Ma), permite concluir que a formação do núcleo, que empobreceu o manto
em elementos siderófilos, foi extremamente precoce e rápida, estando concluída cerca de 35 Ma
após a formação do Sistema Solar.
129 129
Outro sistema isotópico ( I - Xe) caracterizado por um curto período de semi-vida (17 Ma)
129
permite considerar, dado as rochas magmáticas se caracterizarem por excesso de Xe
8. relativamente à atmosfera, que a principal fase de desgasificação do manto terá ocorrido antes da
129
“extinção” do I , i.e. nos primeiros 85 a 170 Ma da história do nosso planeta.
Se a formação do núcleo e da atmosfera empobreceram o manto em elementos siderófilos
e atmófilos, respectivamente, a formação da crosta continental tem levado à progressiva depleção
em elementos que, sendo litófilos, se comportam como incompatíveis durante os processos de
magmatogénese associados às zonas de subducção. Ainda que a crosta continental tenha uma
idade média de cerca de 2,1 Ga, zircões detríticos ocorrentes em metaquartzitos da Austrália foram
datados de cerca de 4,3 Ga o que indica a existência precoce de domínios crostais, em
142
consonância com os excessos mensuráveis de Nd em algumas rochas crostais. Tais zircões
18
caracterizam-se, por outro lado, por valores de O que apontam para a sua proveniência de rochas
graníticas originadas a partir de materiais previamente expostos à interacção com águas
meteóricas o que, indicando a existência de água à superfície do nosso planeta em período ante-
4,3 Ga, não está em desacordo com a existência de atmosfera desde os primórdios da história da
Terra.
O processo de extracção crostal, que ainda hoje se continua, é o responsável pelo carácter
empobrecido em elementos incompatíveis das porções de manto mais usualmente amostradas
pela actividade magmática. Tal é particularmente bem evidente nas assinaturas isotópicas de Sr e
Nd que caracterizam muitas das rochas magmáticas oceânicas (e.g. e >0) e que apontam, noNd
geral, para uma depleção, integrada no tempo, de Rb e Nd relativamente ao Sr e Sm,
respectivamente.
Note-se que a persistência, no manto, de domínios de características primitivas é sugerida
4 3
pelas assinaturas em gases raros, nomeadamente por valores relativamente baixos de He/ He e,
também, por assinaturas isotópicas de Ne similares às que têm sido descritas para Islândia ou, para
um exemplo mais próximo ainda que menos gritante, para a Ilha Terceira (Açores). Por outro lado,
certas províncias oceânicas de natureza basáltica (s.l.) são caracterizadas por razões isotópicas de Sr
e Nd indicadoras de fontes mais enriquecidas que os valores primordiais. Tal diversidade é explicável
assumindo que as transferências de massa responsáveis pela evolução do manto se fazem quer
pela extracção de magmas, quer pela adição de materiais crostais que ao longo das zonas de
subducção são reciclados para o manto, depois de terem interagido com a hidrosfera e a
atmosfera. É o que acontece com os basaltos oceânicos hidrotermalmente alterados e com os
9. 3
e com os sedimentos que são actualmente reciclados a taxas próximas de 21 km /ano e de 1.6
3
km /ano, respectivamente.
Os dados geoquímicos (elementares e isotópicos) permitem identificar, através das rochas
magmáticas, evidências para a presença nas suas fontes mantélicas de materiais reciclados de
natureza diversa (e.g. em Cabo Verde). Por outro lado, a partir dos isótopos de Pb pode mesmo
determinar-se a idade aproximada do evento de reciclagem. Usualmente os valores obtidos são,
como por exemplo no caso dos Açores, Madeira e Cabo Verde, superiores a 1 Ga. Dados de
tomografia sísmica têm permitido traçar a trajectória dos materiais subductados até zonas profundas
do manto, por vezes mesmo até à fronteira manto-núcleo, de onde são posteriormente carreados
até à superfície por plumas mantélicas.
Do exposto se concluirá que o estudo do manto implica uma abordagem multidisciplinar
para que a sua estrutura e evolução possa ser compreendida.
Mata, J. & Martins, L. (2008) A evolução do manto: uma perspectiva geoquímica, in Mateus, A.
(Coord.), O interior da terra: da crusta ao núcleo. Departamento de Geologia FCUL, Lisboa, pp.
7-9. Acessível em http://geologia.fc.ul.pt/documents/140.pdf, consultado em [data da
consulta].
* e-mail: jmata@fc.ul.pt; http://geologia.fc.ul.pt/artigo.php?id_artigo=107
** e-mail: lmartins@fc.ul.pt; http://geologia.fc.ul.pt/artigo.php?id_artigo=128
10. A influência dos processos intra-telúricos na
atmosfera, hidrosfera e biosfera
Línia Martins* & João Mata**
Professora Auxiliar do GeoFCUL e Professor Auxiliar com Agregação.
.
A Terra comporta-se como um sistema único através da interacção de seis grandes sub-
sistemas (núcleo, manto, crosta, hidrosfera, atmosfera e biosfera). Tal significa que existem relações
causa-efeito entre a actividade interna do planeta e as condições de habitabilidade que tanto
podem favorecer como devastar a Vida. Desde logo o campo magnético terrestre, por muitos
considerado como escudo protector essencial à vida no nosso planeta, é consequência das
correntes de convecção ocorridas no núcleo externo, entre os 2900 km e os 5150 km de
profundidade.
13
O fluxo de calor à superfície do nosso planeta (4,2 x 10 W) dá-nos uma ideia da enorme
quantidade de energia térmica que ainda hoje caracteriza a Terra, cerca de 4,55 Ga depois da sua
origem. Uma parte significativa (» 10%) desse calor é transferido para a superfície por acção do que
se convencionou chamar de plumas mantélicas (estruturas colunares ascendentes de material
sólido menos denso e viscoso que o material mantélico envolvente). As plumas, caracterizando-se
também por excessos de temperatura, originam-se em descontinuidades térmicas no interior do
planeta. As mais significativas ocorrem a cerca de 670km e 2890 km de profundidade, esta sendo
correspondente à fronteira manto-núcleo. Um tão profundo enraizamento de algumas das plumas
mantélicas é suportado quer por dados de tomografia sísmica, quer por dados geoquímicos
(isótopos de gases raros).
A actuação das plumas mantélicas sob as placas litosféricas em movimento é usualmente
considerada como a causa de alinhamentos de grandes edifícios vulcânicos no interior das placas.
São disto exemplo os alinhamentos de ilhas e montes submarinos que terminam no Hawaii e na
Madeira. Para além disso, algumas das plumas mantélicas, nomeadamente as designadas super-
plumas, são também causadoras de alterações consideráveis nas condições ambientais à
superfície do planeta, por vezes com consequências importantes para a vida.
11. Na verdade algumas das mais volumosas províncias magmáticas do nosso planeta são
consideradas como se tendo originado a partir da fusão adiabática de super-plumas mantélicas
3
(e.g. Decão: 1 x 106 km de rochas magmáticas).
A rápida erupção de tão grandes volumes de magmas provoca alterações significativas no
ambiente devido à descarga no sistema atmosfera/oceano de enormes quantidades de gases de
estufa como o CO e o CH , mas também de gases tóxicos como o SO2 e os halogéneos F, Cl e Br. A2 4
súbita libertação de enormes quantidades de gases de estufa induz um rápido aquecimento global
e a anoxia dos oceanos, oxigénio dissolvido inferior a 1ml por litro de água do oceano. Estas
alterações ambientais, por vezes súbitas, não permitem que a biosfera se adapte levando à
extinção de um número significativo de espécies. Note-se que em situações em que, pelo quimismo
dos magmas, o vulcanismo adquire um carácter explosivo, grandes volumes de cinzas vulcânicas
são lançados na atmosfera com a consequente formação, na estratosfera, de um filtro de poeiras e
aerossóis que, diminuindo a taxa de insolação da Terra, pode levar a um arrefecimento do planeta.
Foi o que se constatou nos três anos subsequentes à erupção andesítico-dacítica do Pinatubo (1991)
quando se verificou diminuição global da temperatura de cerca de 0,5ºC.
No Fanerozóico são reconhecidos cinco eventos maiores de extinção em massa: no fim do
Ordovícico, no Devónico Superior, no fim do Pérmico, no fim do Triásico e no fim do Cretácico. Destes,
só o último (fronteira K-T ou Cretácico-Terciário) terá tido a intervenção comprovada de um agente
externo à Terra, o impacto de um asteróide na Península de Iucatão, no México, o qual originou a
cratera de Chicxulub há 65,6 Ma. No entanto, este impacto foi sincrónico com a erupção da grande
província ígnea (LIP Large Igneous Province) do Decão (68-65,5 Ma). Aceita-se actualmente que a
conjugação destes dois eventos, tendo levado à súbita modificação do clima, foi responsável pela
extinção dos Dinossáurios e de muitas outras espécies. Para os outros casos, não existindo dados que
confirmem de forma indubitável a intervenção de impactos meteoríticos, ganha relevância a sua
correlação temporal com a formação de LIPs, reforçando a ligação entre a actividade das plumas
mantélicas, o clima e a Vida. Daqueles eventos de extinção em massa o mais importante foi o
ocorrido no final do Pérmico (250 Ma), tendo levado à extinção de cerca de 95% das espécies
marinhas e de 70% das espécies de vertebrados terrestres. A sua origem tem sido relacionada com a
formação da grande província ígnea da Sibéria.
Durante o Cretácico e mais propriamente entre os 125 e os 80 Ma verificou-se um período
anormalmente longo de estabilidade da polaridade do campo magnético terrestre. Este período foi
12. também marcado por muito elevadas taxas de produção magmática associadas à actuação de
pluma(s) mantélica(s) (the Mid-Cretaceous superplume episode) o que aponta para uma relação de
causa-efeito entre os movimentos convectivos do núcleo e a formação de plumas mantélicas. Este
super evento magmático expressou-se por um significativo aumento (até 100%) da produção de
crosta oceânica que, se incluída a actividade intraplaca (e.g. Ontong-Java Plateau; 120 Ma) se
6 3
caracterizou por taxas de erupção da ordem de 25 a 35x10 km /Ma. Neste intervalo de tempo a
actividade magmática continental foi também intensa como o demonstra a geração, há cerca de
90 Ma, dos Continental Flood Basalts de Caribbean-Colombia e Madagáscar.
Esta intensa actividade ígnea é acompanhada por um proporcional aumento de
desgasificação do manto com consequências geológicas à escala global: favorecimento de um
super efeito de estufa (em parte por um excesso de CO ); aumento drástico da temperatura; forte2
deposição de argilas negras ( em resposta à anoxia dos oceanos). Geraram-se assim condições
propícias à produção de hidrocarbonetos, petróleo e gás (oceanos aquecidos e enriquecidos em
carbono, enxofre, fósforo e azoto, maioritariamente de origem magmática, apresentam-se ricos em
nutrientes para o plankton, matéria prima dos hidrocarbonetos). De facto, 50% a 60% das reservas
actuais de hidrocarbonetos formaram-se durante esses 40 Ma. É interessante notar que os resultados
da actividade das plumas mantélicas actuantes no Cretácico médio (125-80 Ma) constituem, hoje,
o suporte do tipo de civilização que desenvolvemos.
Martins, J. & Mata, J. (2008) A influência dos processos intra-telúricos na atmosfera, hidrosfera e
biosfera, in Mateus, A. (Coord.), O interior da terra: da crusta ao núcleo. Departamento de
Geologia FCUL, Lisboa, pp. 10-12. Acessível em http://geologia.fc.ul.pt/documents/140.pdf,
consultado em [data da consulta].
* e-mail: lmartins@fc.ul.pt; http://geologia.fc.ul.pt/artigo.php?id_artigo=128
** e-mail: jmata@fc.ul.pt; http://geologia.fc.ul.pt/artigo.php?id_artigo=107
13. Reconhecimento da crusta usando métodos
electromagnéticos
Fernando Monteiro Santos*
Professor Auxiliar com Agregação, DGGE e CGUL/IDL.
.
A observação directa dos materiais terrestres localizados a profundidades correspondentes à
crusta intermédia é, no estado actual da tecnologia, impossível. Recordemos que o furo de
investigação mais profundo (o KTB) tem cerca de 12 km de profundidade, o que representa já, uma
enorme conquista da tecnologia de perfuração. O estudo da crusta intermédia e profunda só pode
ser feito com recurso a métodos indirectos como são os métodos geofísicos baseados na
propagação das ondas sísmicas ou do campo electromagnético natural com origem na ionosfera e
em alguns dos fenómenos meteorológicos. O primeiro destes métodos que é, também, o mais
usado, permite o conhecimento das propriedades mecânicas dos materiais geológicos enquanto o
segundo dá informações sobre as propriedades eléctricas e, indirectamente, sobre algumas
propriedades petrofísicas daqueles materiais. De facto, os métodos electromagnéticos são sensíveis
á condutividade eléctrica dos materiais geológicos dependendo esta propriedade
fundamentalmente da porosidade, do conteúdo em água e da temperatura dos materiais. Esta é a
razão pela qual os métodos electromagnéticos são tão utilizados na investigação de sistemas
hidrogeológicos e geotérmicos.
As variações do campo magnético terrestre originadas na ionosfera têm frequências muito
baixas, inferiores a 1 Hz, o que permite obter informação sobre as estruturas mais profundas. De facto
a profundidade de investigação depende da frequência do campo electromagnético e da
condutividade eléctrica dos materiais geológicos.
Registando, em simultâneo, as variações das componentes horizontais do campo magnético
e do campo eléctrico e a componente vertical do campo magnético, é possível calcular-se uma
grandeza designada por tensor das impedâncias que depende do local de observação, da
frequência do campo electromagnético e das propriedades eléctricas dos materiais terrestres
localizados em profundidade no local de registo. O registo das variações do campo
electromagnético a diferentes frequências, permite estudar as propriedades eléctricas dos materiais
14. a diferentes profundidades levando, após aplicação de métodos matemáticos de inversão, à
construção de uma imagem representativa da distribuição da condutividade eléctrica em
profundidade que pode depois ser interpretada em termos das estruturas geológicas, regime
térmico ou comportamento reológico da crusta.
A figura (Almeida et al., GRL, V.32, 2005) mostra dois modelos da distribuição da
condutividade eléctrica na crusta da parte sudoeste (Portugal) da Península Ibérica. Estes modelos
foram obtidos da inversão de sondagens magneto-telúricas realizadas ao longo de dois perfis
paralelos e que cruzam as Zonas Sul Portuguesa-Ossa Morena e Centro Ibérica. É notória a
correlação entre as zonas condutoras (tons de azul) e as principais estruturas tectónicas conhecidas
bem como a excelente correlação entre as zonas resistivas e algumas formações geológicas
conhecidas.
Modelos de condutividade eléctrica na crusta (topo: perfil reportado por Almeida et al. GRL, V.32, 2005; base:
perfil reportado por Almeida et al., V.28, 2001).
* e-mail: fasantos@fc.ul.pt
15. Tomografia sísmica - Uma janela para o
interior da Terra
Graça Silveira*
ISEL- Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, CGUL/IDL.
.
“Notre Planète vibre sous l'effet des tremblements de terre et la sismologie nous enseigne cette musique de la
Terre” (Montagner, 1997).
Muitas vezes a palavra sismologia induz nas pessoas a idéia de catástrofe e destruição, quer
de bens materias, quer de vidas humanas. Contudo, devemos à sismologia muito do que hoje
sabemos sobre o interior do nosso planeta.
Sempre que ocorre um sismo dá-se a libertação de grande quantidade de energia que se
propaga na Terra sob a forma de ondas. À medida que estas atravessam o planeta, vão sendo
refractadas, reflectidas e atenuadas pelos diferentes tipos de materiais que constituem o seu interior,
de forma análoga ao que acontece a um raio de luz quando atravessa diferentes meios.
Foi a partir do estudo do comportamento das ondas sísmicas que Mohorovicic (1857-1936),
Gutenberg (1889-1960) e Lehmann (1888-1993) identificaram as principais descontinuidades do
interior da Terra, dividindo-a num conjunto de camadas concêntricas: crusta, manto, núcleo extermo
e núcleo interno.
A tomografia sísmica é um dos métodos, em sismologia, mais poderosos para cartografar a
estrutura interna da Terra. Os primeiros modelos tomográficos obtidos no final dos anos 70, deram
uma das maiores provas de que a Terra é um sistema dinâmico. A tomografia sísmica utiliza o tempo
de percurso das ondas de volume, a velocidade de fase das ondas superficiais, ou os modos
normais de vibração da Terra. O objectivo é obter uma distribuição das perturbações da velocidade
das ondas sísmicas e da anisotropia em função da profundidade. O tratamento físico e matemático
dos tempos de chegada e/ou das formas de onda, registados nas estações sísmicas instaladas
sobre o globo terrestre, permite a elaboração de modelos de velocidade das ondas sísmicas em
16. função da profundidade. Estes resultados podem, por sua vez, ser relacionados com parâmetros
físicos dos materiais, tais como a temperatura, a anisotropia de velocidade e a densidade.
Poster publicado pelo consórcio IRIS que, entre outras coisas, arquiva e disponibiliza dados das redes globais. É
possível obter este poster em http://www.iris.edu/hq/publications/posters.
Graças à tomografia sísmica foi possível identificar ou confirmar, entre outros:
v A extensão em profundidade das dorsais; v A boa correlação entre a tectónica de
superfície e os primeiros 100-200 km, isto é, com a litosfera; v A presença de material proveniente
da subducção das placas litosféricas a profundidades da ordem de 2000 km; v A existência de
17. Interpretação do modelo tomográfico de Grand (2002) recorrendo à mecânica de fluidos. In Davaille, A.,
Stutzmann, E., Silveira, G., Besse, J. and Courtillot. V., "Convective patterns under the Indo-Atlantic box", Earth and Planetary
Science Letters 239 (2005) 233-252.
18. duas zonas extensas, aproximadamente antipodais, caracterizadas por velocidades sísmicas
anormalmente baixas, uma sob o Pacífico Sul e outra sob o Atlântico Sul e África, no manto inferior e v
A presença de heterogeneidades e de anisotropia na fronteira manto-núcleo.
Tomografia anisotrópica do oceano Atlântico. As perturbações na velocidade são representadas em relação a
um modelo de referência da Terra através de uma escala de cores. A direção da anisotropia é representada por uma
barra a verde. G.M. Silveira and Eleonore Stutzmann, "Anisotropic Tomography of the Atlantic Ocean", Phys. Earth Planet.
Inter. 132 (2002) 237.
A tomografia sísmica é fortemente constrangida pela geometria fonte receptor. Se por um
lado é possível optimizar a densidade das redes sísmicas, ocupando também os fundos oceânicos,
ainda que com dificuldades técnicas e finaceiras óbvias, pouco podemos fazer relativamente às
fontes. Os sismos ocorrem “sempre” nos mesmos sítios, ou quase.
Recentemente alguns sismologistas mostraram ser possível obter velocidades de fase para o
cálculo de modelos tomográficos usando o ruído sísmico. O ruído sísmico, gerado em geral pelas
tempestades oceânicas, surge em toda a banda de períodos, mas assume valores máximos entre 7
19. e 14s. Dado que os oceanos têm uma dimensão finita, as vagas que resultam das tempestades,
apesar de se atenuarem progressivamente, podem atravessá-los várias vezes. A interacção entre
ondas provenientes de direcções opostas geram ondas estacionárias que se convertem em ondas
superficiais (ondas de Rayleigh), equivalentes às geradas por telesismos, e que se propagam na
crusta terrestre até às estações sísmicas. A análise destas ondas entre pares de estações sísmicas
permite calcular as curvas de dispersão da velocidade de fase. Deste modo, a cobertura de uma
dada região apenas está condicionada à geometria da rede sísmica.
Albarède and van der Hilst, Phil. Trans. R. Soc. Lond. A, 2002.
Silveira, G. (2008) Tomografia Sísmica - Uma Janela para o Interior da Terra, in Mateus, A. (Coord.), O
interior da terra: da crusta ao núcleo. Departamento de Geologia FCUL, Lisboa, pp. 15-19.
Acessível em http://geologia.fc.ul.pt/documents/140.pdf, consultado em [data da consulta].
* e-mail: mdsilveira@fc.ul.pt
20. Metamorfismo
João Mata*
Professor Auxiliar com Agregação do GeoFCUL. Investigador do CeGUL.
.
A Terra é uma máquina térmica em que as correntes de convecção constituem um dos
mecanismos de dissipação de calor. A convecção mantélica induz, em última análise, a tectónica
de placas que, conferindo dinamismo à litosfera, cria condições para que os diferentes tipos de
rochas crostais sejam sujeitas a condições distintas das que tinham presidido à sua formação. Tal leva
a que, sob certas condições, se gerem as rochas metamórficas.
Através do estudo das associações minerais que constituem estas rochas, é possível o decifrar
da variação das condições de P e T sofridas, enquanto que as suas texturas preservam informação
sobre os processos de deformação a que estiveram sujeitas. Considerando que muitos dos
processos orogénicos são caracterizados por especificidades no que respeita às condições de P, T,
deformação e, também, às relações temporais e espaciais entre estes três parâmetros, o estudo do
metamorfismo é imprescindível para a reconstrução dos efeitos, a nível intracrostal, dos processos de
tectónica global, permitindo inferências sobre as transferências de calor e massa entre o manto e a
crosta.
Ao estudar-se uma qualquer cadeia orogénica antiga (e.g. o sector ibérico da cadeia varisca)
não é possível, por razões óbvias, determinar directamente um conjunto de parâmetros (e.g. fluxo de
calor; taxa de soerguimento) que permitiriam compreender a sua origem e evolução, pelo que o
estudo das rochas metamórficas assume, neste contexto, um papel preponderante. No entanto, a
variação do padrão de metamorfismo ao longo da história da Terra permite, também, evidenciar
alterações à escala global no fluxo calórico do nosso planeta.
Na verdade, um produto comum dos processos orogénicos fanerozóicos são rochas
metamórficas das fácies dos xistos azuis e eclogítica. Estas formam-se em condições de baixo
gradiente geotérmico (< 15º C/km) normalmente associadas às zonas de subducção. No entanto, a
formação de rochas eclogíticas e de xistos azuis foi extremamente rara no Arcaico (> 2.5 Ga) o que
pode ser considerado como o resultado dos mais elevados fluxos de calor que então
caracterizavam o planeta.
21. Na verdade, um produto comum dos processos orogénicos fanerozóicos são rochas
metamórficas das fácies dos xistos azuis e eclogítica. Estas formam-se em condições de baixo
gradiente geotérmico (< 15º C/km) normalmente associadas às zonas de subducção. No entanto, a
formação de rochas eclogíticas e de xistos azuis foi extremamente rara no Arcaico (> 2.5 Ga) o que
pode ser considerado como o resultado dos mais elevados fluxos de calor que então
caracterizavam o planeta.
O metamorfismo é normalmente encarado como uma consequência. No entanto este
processo é também causa de eventos com repercussões à escala global. Vejamos alguns
exemplos:
v o metamorfismo hidrotermal ocorrido ao longo das cristas médias promove a hidratação
da crosta oceânica. Esta desidrata ao ser subductada, libertando a água que desencadeia o
magmatismo orogénico, mecanismo este responsável, desde o final do Arcaico, pela geração de
crosta continental; v O metamorfismo oceânico, que concorre para a tamponização da
composição da água do mar, promove também um conjunto de alterações químicas na crosta
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oceânica que, ao ser reciclada (21km /ano) nas zonas de subducção, transporta para o manto o
resultado dessa interacção com a hidrosfera. Por outro lado, granulitos infracrostais ao serem
delaminados e incorporados no manto, transferem para este reservatório assinaturas geoquímicas
parcialmente impostas por eventos metamórficos de alto grau. O resultado de tais processos de
reciclagem crostal é espelhado pela variabilidade composicional dos magmas mantélicos; v Tem
vindo a discutir-se o efeito das reacções metamórficas de descarbonatação nos teores em CO da2
atmosfera e, inversamente, a possível indução de reacções de carbonatação, similares às que
ocorrem nos processos metamórficos, como meio de sequestrar CO .2
Razões não faltam, pois, para considerar as rochas metamórficas como um objecto de
estudo imprescindível à compreensão global do planeta Terra.
Mata, J. (2008) Metamorfismo, in Mateus, A. (Coord.), O interior da terra: da crusta ao núcleo.
D e p a r t a m e n t o d e G e o l o g i a F C U L, L i s b o a, p p. 2 0 - 2 . A c e s s í v e l e m
http://geologia.fc.ul.pt/documents/140.pdf, consultado em [data da consulta].
* e-mail: jmata@fc.ul.pt; http://geologia.fc.ul.pt/artigo.php?id_artigo=107