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Crítica: George Berkeley                                                          Página 1 de 6



   criticanarede.com · ISSN 1749-8457
   http://criticanarede.com/html/berkeley.html

 9 de Março de 2011 · História da filosofia



 George Berkeley
 Michael Ayers
 Tradução de Jaimir Conte


 George Berkeley (1685-1753) estudou no Trinity College,
 de Dublin, onde foi eleito Junior Fellow em 1707 e ao qual
 permaneceu ligado até ser nomeado Deão de Derry em
 1724. Em 1734 foi nomeado Bispo de Cloyne. As suas
 principais obras filosóficas foram Ensaio para uma Nova
 Teoria da Visão (1709), Tratado sobre os Princípios do
 Conhecimento Humano (1710) e Três Diálogos entre
 Hylas e Filonous (1713), mas Alciphron (1732), Siris (1744) e várias pequenas obras são de
 interesse filosófico. Exerceu forte influência sobre Hume, Reid e Kant.
         O “imaterialismo” de Berkeley é um sistema metafísico contrário à “filosofia
 moderna” de Descartes, Locke e outros mecanicistas, cuja explicação da matéria como
 substância independente Berkeley considerava instituir um rival de Deus. Os seus
 argumentos têm amplas implicações para a epistemologia. Hume descreve-os como “as
 melhores lições de ceticismo [...] seja entre os filósofos antigos, seja modernos,” mas a tese
 do próprio Berkeley é que os seus argumentos fecham ao ceticismo a porta que os
 “materialistas” deixaram aberta.
         O objetivo central de Berkeley não é como popularmente se supõe colocar em dúvida
 a existência física dos objetos. O seu sistema é estruturado em torno do princípio de que os
 espíritos são os únicos seres independentes, ativos, ou, no sentido filosófico, “substâncias.”
 As coisas sensíveis ou corpos existem, mas como seres inertes dependentes de uma mente
 que os percepciona (Princípios I, 7, 89, etc.). O seu argumento reinterpreta radicalmente a
 noção tradicional de substância. De acordo com o lado lógico da doutrina aristotélica, a
 substância, independente, e o acidente, dependente, existem em diferentes níveis
 ontológicos, na verdade, em sentidos categoricamente diferentes de “existe.” Como
 sujeitos elementares da predicação, as substâncias são também os substratos da mudança:
 são princípios de atividade, e a mudança é entendida em termos das suas naturezas ou
 essências. Apesar de uma noção diferente de explicação causal, a teoria mecanicista da
 substância tem um perfil claramente semelhante. O argumento de Berkeley,
 conseqüentemente, tem dois aspectos, correspondendo à independência lógico-ontológica
 dos espíritos e à sua atividade. O primeiro envolve uma teoria radical da percepção, o
 segundo, uma igualmente radical filosofia da física.



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 Espíritos e idéias
 Os espíritos berkelianos, como as substâncias aristotélicas, “existem em primeiro lugar e
 em sentido primeiro” (Siris, 263), enquanto o esse das coisas sensíveis é percipi
 (Princípios, 14). A noção de substância é derivada da teoria da predicação supostamente
 “infundada e ininteligível,” e o “na” de “os acidentes (ou qualidades) existem na
 substância,” é reinterpretado como o “na” de “a cor que na minha mente vejo que
 existe” (ibid, I, 49). Os espíritos são substâncias que “suportam” qualidades sensíveis ou
 idéias ao percepcioná-las (ibid. I. 7, 135). Falar de substância material “suportando”
 qualidades é uma metáfora vazia (ibid. I, 17). Esta identificação das “qualidades sensíveis”
 com as “idéias” torna-se compreensível se reconhecermos que, embora Berkeley
 freqüentemente use “idéia” alternadamente com “sensação” (ibid. I, 4), não quer com isso
 dizer um estado ou modificação da mente, mas algo mais parecido com a tradicional
 abordagem de Descartes da idéia de Sol como “o próprio Sol, tal como existe no
 entendimento,” i.e., como dele temos experiência ou como é concebido. Dado que (alega
 Berkeley), as qualidades sensíveis são idéias neste sentido, e “que é uma contradição
 manifesta que uma idéia exista numa coisa incapaz de percepção,” segue-se que “não
 existe qualquer outra substância além do espírito” (ibid, I, 7).
       Berkeley está negando, como autocontraditório e absurdo, que por detrás dos
 corpos, tal como aparecem aos sentidos, exista os corpos tal como são em si, substâncias
 “impensantes” independentes: mais precisamente, Berkeley considerou que isso não
 negava a existência dos corpos, antes os tornava mais imediatamente acessíveis a nós. O
 ponto mais importante do argumento é a sua rejeição da noção de uma qualidade que não
 seja uma idéia, i.e., que seja não relativa. Não pode haver qualidades “reais” e
 independentes que são semelhantes a idéias, visto que “uma idéia não pode ser
 semelhante seja ao que for a não ser a outra idéia” (ibid, I, 8). Além disso, a nossa crença
 de que podemos conceber corpos como existentes absolutos, independentemente da
 percepção, é uma ilusão engendrada pela possibilidade de imaginar algo sem imaginar
 alguém que a percepcione: esquecemos que a estamos imaginando como nós mesmos a
 percepcionaríamos (ibid. I, 22; Diálogos, 1200). No entanto, estes argumentos gerais
 dependem do suporte de uma ampla investida contra a doutrina de acordo com a qual as
 “qualidades mecânicas “primárias” qualificam as coisas tal como são em si, enquanto as
 qualidades “secundárias,” como as cores e os cheiros, existem (pelo menos como “simples
 poderes”) apenas “na mente” como um produto das qualidades primárias de partes
 diminutas (cf. Locke, Ensaio, 2.8.7-17).




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 Qualidades primárias e secundárias, visão e tato, e abstração
 Um dos argumentos de Berkeley contra a distinção entre qualidades primárias e
 secundárias é que é impossível formar uma idéia de um corpo extenso, em movimento,
 sem lhe atribuir alguma cor ou outra qualidade dependente da mente: o que é inseparável
 daquilo que é dependente da mente tem de ser ele mesmo dependente da mente
 (Princípios I, 10). No entanto, este argumento parece fraco no caso das qualidades
 percepcionadas simultaneamente pela visão e pelo tato, pois o que é perceptível por um ou
 outro     sentido   apenas    tem   de       ser   separável   do   outro.   Mais   fundamental,
 conseqüentemente, é a negação por parte de Berkeley de que existam essas idéias de dois
 sentidos. Na Nova Teoria da Visão, Berkeley tira esta conclusão a partir de uma brilhante
 discussão de uma série de problemas em ótica, incluindo o “problema de Molineux.”
 Molineux e Locke argumentaram que um homem que nasceu cego e que passou a ver seria
 incapaz de distinguir a distância e a profundidade pela visão, pois “nunca descobriu pela
 Experiência que o que afeta o seu tato de um dado modo tem de afetar a sua visão de um
 dado modo” (Locke, Ensaio 2.9.8). Berkeley argumenta que as únicas conexões entre
 objetos da visão e do tato são essas correlações contingentes. Os primeiros são sinais dos
 segundos, mas em si são numérica e qualitativamente distintos (Nova Teoria da Visão 47-
 157).
         Uma série adicional de argumentos destina-se a mostrar que determinado tamanho,
 forma e movimento são relativos aos sentidos. Por detrás destes argumentos está a idéia
 de que a extensão “externa,” considerada o objeto comum (digamos) da visão a olho nu e
 da visão através do microscópio, deve ser concebida como infinitamente divisível e, assim,
 ter um número infinito de partes, como se não tivesse qualquer tamanho ou forma
 determinada (Princípios, I, 11, 47; Diálogos I, 184-193). Berkeley sustenta que, em
 contraste com este absurdo, qualquer extensão percepcionada é determinada, composta
 de um número infinito de minima sensibilia (Nova Teoria da Visão 80-5).
         Berkeley atribui muitos erros a uma fonte comum: a suposição de que aquilo que
 pode ser separado pela linguagem pode também ser abstraído em pensamento e separado
 na realidade. A existência de coisas sensíveis é falsamente considerada separável de serem
 percepcionadas, as qualidades primárias consideradas separáveis das secundárias, e a
 extensão considerada separável tanto da vista como do tato. A Introdução dos Princípios
 é, assim, dedicada a um ataque à teoria das idéias abstratas de Locke. Embora Locke seja
 mal interpretado, a própria abordagem de Berkeley do pensamento abstrato (na realidade,
 muito semelhante à de Locke), é uma importante expressão da visão nominalista segundo
 a qual ao raciocinarmos temos particulares em mente, concentrando-nos naqueles seus
 aspectos marcados pela linguagem que empregamos.




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 Conhecimento do espírito, a atividade do espírito e as leis da física
 Berkeley reserva o termo “idéia” para objetos da “percepção,” i.e., sentidos e imaginação.
 O   espírito   é   conhecido     (em     si)   “imediatamente,   ou   intuitivamente,”   “pela
 reflexão” (Diálogos III 23 ss.). Apesar da palavra “reflexão,” o seu modelo para esta
 autoconsciência imediata não foi o “sentido interior” de Locke, mas antes o cartesiano
 “intelecto puro,” um termo que Berkeley usa ocasionalmente (ibid. I; De motu, 53; Siris,
 303). Por seu meio alcançamos uma “noção” de espírito que podemos empregar em nosso
 pensamento sobre Deus e outros espíritos finitos (Princípios, I, 135-40). Nenhuma idéia
 poderia representar o espírito porque as idéias são evidentemente passivas (não
 percepcionamos o poder), enquanto o espírito é uma substância ativa. É devido à
 consciência de nossa própria volição que temos noção da ação causal. É, portanto, uma
 contradição que uma coisa sensível ou impensante seja uma verdadeira causa (ibid. I, 271).
 Berkeley está aqui adaptando a doutrina cartesiana, desenvolvida por Malebranche,
 segundo a qual a matéria é objeto passivo da vontade de Deus.
       Estes materiais fornecem um argumento a favor da existência de Deus e uma
 concepção das leis físicas como estritamente contingentes. Dado que todas as idéias
 requerem uma causa, e as idéias dos sentidos não são causadas por nós, tem de haver
 algum outro espírito que as produz em nós. Uma vez que ocorrem numa “cadeia ou série”
 de admirável conexão, são, evidentemente, obra de um sábio e benevolente espírito
 governante cuja vontade constitui a Lei da Natureza (ibid. I, 30-2). A tarefa dos cientistas
 não é, portanto, penetrar as essências desconhecidas das coisas, cujo conhecimento
 tornaria o mundo inteligível. Não existem essências por detrás das nossas generalizações
 contingentes. A ciência progride simplesmente através do estabelecimento de analogias
 entre os fenômenos, analogias estas que cabe aos termos teóricos, como “gravidade” e
 “atração,” assinalar (ibid. I, 101-9).

 Coisas reais, idéias divinas e ceticismo
 “As idéias impressas nos sentidos pelo autor da natureza são denominadas coisas reais.”
 Com esta interpretação da linguagem corrente, Berkeley antecipa-se à crítica de que,
 juntamente com os objetos independentes da mente, ele teria suprimido a distinção entre
 realidade e ilusão ou ficção. As idéias dos sentidos, involuntárias, distintas e regularmente
 conectadas, são as que contam para a ação (ibid. I, 30-6). Uma objeção proveniente da
 vivacidade dos sonhos é respondida com o princípio do reducionismo de Berkeley: o
 realista necessariamente concede tudo o que é preciso, uma vez que também tem de
 “distinguir coisas de quimeras [...] por meio de alguma diferença perceptível” (Diálogos
 III, 235). A objeção de que as “coisas reais” berkelianas deixam de existir quando não são
 percepcionadas leva, nos Princípios, à sugestão de que Deus as percepciona




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 continuamente (I, 45). Nos Diálogos, além disso, argumenta-se que o caráter involuntário
 das idéias dos sentidos implica que elas (“ou seus arquétipos”) têm uma existência distinta
 das nossas mentes: a independência causal implica independência ontológica. Visto que
 elas (ou coisas como elas) são idéias, têm de existir noutra mente, a mente que as exibe
 para nós (II, 211-16). Podemos concluir que “existem durante os intervalos que medeiam
 entre a minha percepção delas” (ibid. III, 230 ss).
         Os críticos têm-se queixado de que com esta concepção de uma ordem da natureza
 dependente, arquetípica, distante dos perceptores finitos, assim como na sua abordagem
 da nossa inferência a favor da existência de outras mentes, Berkeley não deixa menos
 espaço que o realista para o ceticismo. Contudo, Berkeley nunca argumenta simplesmente
 que o “materialismo” deixa espaço à dúvida, mas antes que postula algo contraditório,
 indeterminado, ou, em qualquer caso, ininteligível. São estas desvantagens da matéria,
 nenhuma das quais (defende Berkeley) afeta o espírito e as suas idéias, que, na sua
 concepção, encorajam o ceticismo (ibid. III, 231-4).

 Michael Ayers
 Retirado de Jonathan Dancy e Ernest Sosa (org.) A Companion to Epistemology (Oxford: Blackwell, 1997, pp. 50-53).


 Obras
 An Essay towards a New Theory of Vision (1709), A Treatise concerning the Principles of
 Human Knowledge (1710) e Three Dialogues between Hylas and Philonous (1713)
 encontram-se reunidas em Berkeley: Philosophical Works, org. M. R. Ayers (Londres:
 Dent, 1975).
         Alciphron or the Minute Philosopher (1732) e Siris: a Chain of Philosophical
 Reflections and Enquiries concerning the Virtues of Tar-water (1744) encontram-se em
 Works, orgs. A. A. Luce e T. E. Jessop (Londres: Nelson, 1948-51).

 Bibliografia
      • Dancy, J., Berkeley: An Introduction (Oxford: Blackwell, 1987).
      • Foster, J. e Robinson, H., orgs., Essays on Berkeley (Oxford: Clarendon Press, 1985).
      • Grayling, A. C., Berkeley: The Central Arguments (London: Routledge, 1986).
      • Pitcher, G., Berkeley (London: Routledge and Kegan Paul, 1977).
      • Sosa, E. org., Essays on the Philosophy of George Berkeley (Dordrecht: Reidel,
         1987).
      • Tipton, I. C., Berkeley: the Philosophy of Immaterialism (Londres: Methuen, 1974).
      • Turbayne, C. org., Berkeley: Critical and Inter-pretative Essays (Minneapolis:
         University of Minnesota Press, 1982).
      • Winkler, K. P., Berkeley: An Interpretation (Oxford: Clarendon Press, 1989).




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Michael Ayers - George Berkeley

  • 1. Crítica: George Berkeley Página 1 de 6 criticanarede.com · ISSN 1749-8457 http://criticanarede.com/html/berkeley.html 9 de Março de 2011 · História da filosofia George Berkeley Michael Ayers Tradução de Jaimir Conte George Berkeley (1685-1753) estudou no Trinity College, de Dublin, onde foi eleito Junior Fellow em 1707 e ao qual permaneceu ligado até ser nomeado Deão de Derry em 1724. Em 1734 foi nomeado Bispo de Cloyne. As suas principais obras filosóficas foram Ensaio para uma Nova Teoria da Visão (1709), Tratado sobre os Princípios do Conhecimento Humano (1710) e Três Diálogos entre Hylas e Filonous (1713), mas Alciphron (1732), Siris (1744) e várias pequenas obras são de interesse filosófico. Exerceu forte influência sobre Hume, Reid e Kant. O “imaterialismo” de Berkeley é um sistema metafísico contrário à “filosofia moderna” de Descartes, Locke e outros mecanicistas, cuja explicação da matéria como substância independente Berkeley considerava instituir um rival de Deus. Os seus argumentos têm amplas implicações para a epistemologia. Hume descreve-os como “as melhores lições de ceticismo [...] seja entre os filósofos antigos, seja modernos,” mas a tese do próprio Berkeley é que os seus argumentos fecham ao ceticismo a porta que os “materialistas” deixaram aberta. O objetivo central de Berkeley não é como popularmente se supõe colocar em dúvida a existência física dos objetos. O seu sistema é estruturado em torno do princípio de que os espíritos são os únicos seres independentes, ativos, ou, no sentido filosófico, “substâncias.” As coisas sensíveis ou corpos existem, mas como seres inertes dependentes de uma mente que os percepciona (Princípios I, 7, 89, etc.). O seu argumento reinterpreta radicalmente a noção tradicional de substância. De acordo com o lado lógico da doutrina aristotélica, a substância, independente, e o acidente, dependente, existem em diferentes níveis ontológicos, na verdade, em sentidos categoricamente diferentes de “existe.” Como sujeitos elementares da predicação, as substâncias são também os substratos da mudança: são princípios de atividade, e a mudança é entendida em termos das suas naturezas ou essências. Apesar de uma noção diferente de explicação causal, a teoria mecanicista da substância tem um perfil claramente semelhante. O argumento de Berkeley, conseqüentemente, tem dois aspectos, correspondendo à independência lógico-ontológica dos espíritos e à sua atividade. O primeiro envolve uma teoria radical da percepção, o segundo, uma igualmente radical filosofia da física. http://criticanarede.com/html/berkeley.html 09/03/2011
  • 2. Crítica: George Berkeley Página 2 de 6 Espíritos e idéias Os espíritos berkelianos, como as substâncias aristotélicas, “existem em primeiro lugar e em sentido primeiro” (Siris, 263), enquanto o esse das coisas sensíveis é percipi (Princípios, 14). A noção de substância é derivada da teoria da predicação supostamente “infundada e ininteligível,” e o “na” de “os acidentes (ou qualidades) existem na substância,” é reinterpretado como o “na” de “a cor que na minha mente vejo que existe” (ibid, I, 49). Os espíritos são substâncias que “suportam” qualidades sensíveis ou idéias ao percepcioná-las (ibid. I. 7, 135). Falar de substância material “suportando” qualidades é uma metáfora vazia (ibid. I, 17). Esta identificação das “qualidades sensíveis” com as “idéias” torna-se compreensível se reconhecermos que, embora Berkeley freqüentemente use “idéia” alternadamente com “sensação” (ibid. I, 4), não quer com isso dizer um estado ou modificação da mente, mas algo mais parecido com a tradicional abordagem de Descartes da idéia de Sol como “o próprio Sol, tal como existe no entendimento,” i.e., como dele temos experiência ou como é concebido. Dado que (alega Berkeley), as qualidades sensíveis são idéias neste sentido, e “que é uma contradição manifesta que uma idéia exista numa coisa incapaz de percepção,” segue-se que “não existe qualquer outra substância além do espírito” (ibid, I, 7). Berkeley está negando, como autocontraditório e absurdo, que por detrás dos corpos, tal como aparecem aos sentidos, exista os corpos tal como são em si, substâncias “impensantes” independentes: mais precisamente, Berkeley considerou que isso não negava a existência dos corpos, antes os tornava mais imediatamente acessíveis a nós. O ponto mais importante do argumento é a sua rejeição da noção de uma qualidade que não seja uma idéia, i.e., que seja não relativa. Não pode haver qualidades “reais” e independentes que são semelhantes a idéias, visto que “uma idéia não pode ser semelhante seja ao que for a não ser a outra idéia” (ibid, I, 8). Além disso, a nossa crença de que podemos conceber corpos como existentes absolutos, independentemente da percepção, é uma ilusão engendrada pela possibilidade de imaginar algo sem imaginar alguém que a percepcione: esquecemos que a estamos imaginando como nós mesmos a percepcionaríamos (ibid. I, 22; Diálogos, 1200). No entanto, estes argumentos gerais dependem do suporte de uma ampla investida contra a doutrina de acordo com a qual as “qualidades mecânicas “primárias” qualificam as coisas tal como são em si, enquanto as qualidades “secundárias,” como as cores e os cheiros, existem (pelo menos como “simples poderes”) apenas “na mente” como um produto das qualidades primárias de partes diminutas (cf. Locke, Ensaio, 2.8.7-17). http://criticanarede.com/html/berkeley.html 09/03/2011
  • 3. Crítica: George Berkeley Página 3 de 6 Qualidades primárias e secundárias, visão e tato, e abstração Um dos argumentos de Berkeley contra a distinção entre qualidades primárias e secundárias é que é impossível formar uma idéia de um corpo extenso, em movimento, sem lhe atribuir alguma cor ou outra qualidade dependente da mente: o que é inseparável daquilo que é dependente da mente tem de ser ele mesmo dependente da mente (Princípios I, 10). No entanto, este argumento parece fraco no caso das qualidades percepcionadas simultaneamente pela visão e pelo tato, pois o que é perceptível por um ou outro sentido apenas tem de ser separável do outro. Mais fundamental, conseqüentemente, é a negação por parte de Berkeley de que existam essas idéias de dois sentidos. Na Nova Teoria da Visão, Berkeley tira esta conclusão a partir de uma brilhante discussão de uma série de problemas em ótica, incluindo o “problema de Molineux.” Molineux e Locke argumentaram que um homem que nasceu cego e que passou a ver seria incapaz de distinguir a distância e a profundidade pela visão, pois “nunca descobriu pela Experiência que o que afeta o seu tato de um dado modo tem de afetar a sua visão de um dado modo” (Locke, Ensaio 2.9.8). Berkeley argumenta que as únicas conexões entre objetos da visão e do tato são essas correlações contingentes. Os primeiros são sinais dos segundos, mas em si são numérica e qualitativamente distintos (Nova Teoria da Visão 47- 157). Uma série adicional de argumentos destina-se a mostrar que determinado tamanho, forma e movimento são relativos aos sentidos. Por detrás destes argumentos está a idéia de que a extensão “externa,” considerada o objeto comum (digamos) da visão a olho nu e da visão através do microscópio, deve ser concebida como infinitamente divisível e, assim, ter um número infinito de partes, como se não tivesse qualquer tamanho ou forma determinada (Princípios, I, 11, 47; Diálogos I, 184-193). Berkeley sustenta que, em contraste com este absurdo, qualquer extensão percepcionada é determinada, composta de um número infinito de minima sensibilia (Nova Teoria da Visão 80-5). Berkeley atribui muitos erros a uma fonte comum: a suposição de que aquilo que pode ser separado pela linguagem pode também ser abstraído em pensamento e separado na realidade. A existência de coisas sensíveis é falsamente considerada separável de serem percepcionadas, as qualidades primárias consideradas separáveis das secundárias, e a extensão considerada separável tanto da vista como do tato. A Introdução dos Princípios é, assim, dedicada a um ataque à teoria das idéias abstratas de Locke. Embora Locke seja mal interpretado, a própria abordagem de Berkeley do pensamento abstrato (na realidade, muito semelhante à de Locke), é uma importante expressão da visão nominalista segundo a qual ao raciocinarmos temos particulares em mente, concentrando-nos naqueles seus aspectos marcados pela linguagem que empregamos. http://criticanarede.com/html/berkeley.html 09/03/2011
  • 4. Crítica: George Berkeley Página 4 de 6 Conhecimento do espírito, a atividade do espírito e as leis da física Berkeley reserva o termo “idéia” para objetos da “percepção,” i.e., sentidos e imaginação. O espírito é conhecido (em si) “imediatamente, ou intuitivamente,” “pela reflexão” (Diálogos III 23 ss.). Apesar da palavra “reflexão,” o seu modelo para esta autoconsciência imediata não foi o “sentido interior” de Locke, mas antes o cartesiano “intelecto puro,” um termo que Berkeley usa ocasionalmente (ibid. I; De motu, 53; Siris, 303). Por seu meio alcançamos uma “noção” de espírito que podemos empregar em nosso pensamento sobre Deus e outros espíritos finitos (Princípios, I, 135-40). Nenhuma idéia poderia representar o espírito porque as idéias são evidentemente passivas (não percepcionamos o poder), enquanto o espírito é uma substância ativa. É devido à consciência de nossa própria volição que temos noção da ação causal. É, portanto, uma contradição que uma coisa sensível ou impensante seja uma verdadeira causa (ibid. I, 271). Berkeley está aqui adaptando a doutrina cartesiana, desenvolvida por Malebranche, segundo a qual a matéria é objeto passivo da vontade de Deus. Estes materiais fornecem um argumento a favor da existência de Deus e uma concepção das leis físicas como estritamente contingentes. Dado que todas as idéias requerem uma causa, e as idéias dos sentidos não são causadas por nós, tem de haver algum outro espírito que as produz em nós. Uma vez que ocorrem numa “cadeia ou série” de admirável conexão, são, evidentemente, obra de um sábio e benevolente espírito governante cuja vontade constitui a Lei da Natureza (ibid. I, 30-2). A tarefa dos cientistas não é, portanto, penetrar as essências desconhecidas das coisas, cujo conhecimento tornaria o mundo inteligível. Não existem essências por detrás das nossas generalizações contingentes. A ciência progride simplesmente através do estabelecimento de analogias entre os fenômenos, analogias estas que cabe aos termos teóricos, como “gravidade” e “atração,” assinalar (ibid. I, 101-9). Coisas reais, idéias divinas e ceticismo “As idéias impressas nos sentidos pelo autor da natureza são denominadas coisas reais.” Com esta interpretação da linguagem corrente, Berkeley antecipa-se à crítica de que, juntamente com os objetos independentes da mente, ele teria suprimido a distinção entre realidade e ilusão ou ficção. As idéias dos sentidos, involuntárias, distintas e regularmente conectadas, são as que contam para a ação (ibid. I, 30-6). Uma objeção proveniente da vivacidade dos sonhos é respondida com o princípio do reducionismo de Berkeley: o realista necessariamente concede tudo o que é preciso, uma vez que também tem de “distinguir coisas de quimeras [...] por meio de alguma diferença perceptível” (Diálogos III, 235). A objeção de que as “coisas reais” berkelianas deixam de existir quando não são percepcionadas leva, nos Princípios, à sugestão de que Deus as percepciona http://criticanarede.com/html/berkeley.html 09/03/2011
  • 5. Crítica: George Berkeley Página 5 de 6 continuamente (I, 45). Nos Diálogos, além disso, argumenta-se que o caráter involuntário das idéias dos sentidos implica que elas (“ou seus arquétipos”) têm uma existência distinta das nossas mentes: a independência causal implica independência ontológica. Visto que elas (ou coisas como elas) são idéias, têm de existir noutra mente, a mente que as exibe para nós (II, 211-16). Podemos concluir que “existem durante os intervalos que medeiam entre a minha percepção delas” (ibid. III, 230 ss). Os críticos têm-se queixado de que com esta concepção de uma ordem da natureza dependente, arquetípica, distante dos perceptores finitos, assim como na sua abordagem da nossa inferência a favor da existência de outras mentes, Berkeley não deixa menos espaço que o realista para o ceticismo. Contudo, Berkeley nunca argumenta simplesmente que o “materialismo” deixa espaço à dúvida, mas antes que postula algo contraditório, indeterminado, ou, em qualquer caso, ininteligível. São estas desvantagens da matéria, nenhuma das quais (defende Berkeley) afeta o espírito e as suas idéias, que, na sua concepção, encorajam o ceticismo (ibid. III, 231-4). Michael Ayers Retirado de Jonathan Dancy e Ernest Sosa (org.) A Companion to Epistemology (Oxford: Blackwell, 1997, pp. 50-53). Obras An Essay towards a New Theory of Vision (1709), A Treatise concerning the Principles of Human Knowledge (1710) e Three Dialogues between Hylas and Philonous (1713) encontram-se reunidas em Berkeley: Philosophical Works, org. M. R. Ayers (Londres: Dent, 1975). Alciphron or the Minute Philosopher (1732) e Siris: a Chain of Philosophical Reflections and Enquiries concerning the Virtues of Tar-water (1744) encontram-se em Works, orgs. A. A. Luce e T. E. Jessop (Londres: Nelson, 1948-51). Bibliografia • Dancy, J., Berkeley: An Introduction (Oxford: Blackwell, 1987). • Foster, J. e Robinson, H., orgs., Essays on Berkeley (Oxford: Clarendon Press, 1985). • Grayling, A. C., Berkeley: The Central Arguments (London: Routledge, 1986). • Pitcher, G., Berkeley (London: Routledge and Kegan Paul, 1977). • Sosa, E. org., Essays on the Philosophy of George Berkeley (Dordrecht: Reidel, 1987). • Tipton, I. C., Berkeley: the Philosophy of Immaterialism (Londres: Methuen, 1974). • Turbayne, C. org., Berkeley: Critical and Inter-pretative Essays (Minneapolis: University of Minnesota Press, 1982). • Winkler, K. P., Berkeley: An Interpretation (Oxford: Clarendon Press, 1989). http://criticanarede.com/html/berkeley.html 09/03/2011
  • 6. Crítica: George Berkeley Página 6 de 6 Copyright © 1997–2010 criticanarede.com · ISSN 1749-8457 Não reproduza sem citar a fonte · Termos de utilização: http://criticanarede.com/termos.html http://criticanarede.com/html/berkeley.html 09/03/2011