1. C.E. Prof.ª MARIA LUIZA RODRIGUES DE SOUSA
Anexo I, Povoado Cassimiro, Bom Jardim – MA.
3° Ano, !ª Aula do 3º Período – Não presencial, 2020
Pré-Modernismo
no Brasil
Prof. José Arnaldo da Silva
Licenciado em Letras
LínguaPortuguesa
Líteratura
2. Psicologia de um vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme – este operário das ruínas –
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
Augusto dos Anjos
3. Pré-Modernismo no Brasil
• O Pré-Modernismo foi um período de intensa movimentação literária que
marcou a transição entre o Simbolismo e o Modernismo. Caracteriza-se pelas
produções desde 1902 (início século XX) até a Semana de Arte Moderna, em
1922.
• Para muitos estudiosos, esse período não deve ser considerado uma escola
literária, uma vez que apresenta inúmeras produções artísticas e literárias
distintas.
• O Pré-Modernismo reúne características das escolas literárias do século XIX,
como o Simbolismo, o Realismo e o Parnasianismo, ficando conhecido como
um período sincrético, já que tinha a flexibilidade de transitar entre vários
estilos e escolas, e não ficar preso a um único pensamento.
• Em sua obra “História Concisa da Literatura Brasileira”, o crítico literário Alfredo
Bosi afirma que é possível chamar pré-modernista tudo o que, nas primeiras
décadas do século XX, problematiza a realidade social e cultural.
4. Características
• A denúncia e a investigação sobre a realidade da população
brasileira da época;
• A capacidade de aproximar as obras literárias da população,
por mostrar a sua realidade;
• Personagens como o caipira da roça, o sertanejo, o caboclo,
passaram a fazer parte das histórias que são contadas;
• Aconteceu uma ruptura com a maneira formal e rebuscada de
escrita do Arcadismo, com textos claros e objetivos;
• O sincretismo estético foi uma marca do período, que
conseguia utilizar características de outras escolas;
• Aconteceu a valorização da cultura popular brasileira, com o
regionalismo implantado nas obras.
5. Contexto histórico do Pré-Modernismo no Brasil
• No início do século XX, o Brasil vivia uma intensa
transformação política com a consolidação do regime
republicano. A esperança de um Brasil moderno – com
condições sociais mais justas, de igualdade perante à
lei e a participação política popular – foi frustrada.
Surgiram vários conflitos sociais, de contestação e
reprovação das novas políticas republicanas, como a
Guerra de Canudos, a Revolta da Vacina, a Revolta da
Chibata e a Greve dos operários em São Paulo.
11. Principais autores do Pré-Modernismo no Brasil
• Na poesia, o principal representante do Pré-Modernismo no Brasil é
Augusto dos Anjos, com Eu e outros poemas (1912), poemas que
desafiam classificações rígidas e inserem em nosso contexto cultural
algumas características universalmente modernas.
• Na prosa, destacam-se quatro escritores: Euclides da Cunha, com Os
sertões (1902); Graça Aranha, com Canaã (1902); Lima Barreto, com
Triste fim de Policarpo Quaresma (1915); e Monteiro Lobato, com
Urupês (1918), que se debruçaram sobre a realidade do país,
produzindo obras críticas e questionadoras.
• Com abordagens e estilos próprios, específicos, tal poeta e prosadores
se aproximam por anunciarem a grande temática que ocupará nossa
primeira geração modernista: a redescoberta dos valores brasileiros,
expressa por um nacionalismo que muitas vezes retoma a vertente
regionalista da literatura brasileira de modo crítico, polêmico,
problematizador.
12. Augusto dos Anjos (1884-1914)
• Nascido na Paraíba, Augusto dos Anjos é um
dos principais poetas da literatura brasileira.
Sua poesia tem a peculiaridade de
apresentar traços típicos do simbolismo e do
cientificismo naturalista, inovação que faz
com que seja situado como um poeta pré-
modernista.
• Escreveu uma única obra, o livro de poemas
Eu, publicado em 1912. Os poemas que
constituem esse livro têm como
característica principal o uso de uma
linguagem tida como antilírica, marcada por
expressões como “escarro”, “verme”, “larva”
etc.
13. Capadolivro“Eueoutrospoemas”
Versos íntimos
Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te a lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
14. Euclides da Cunha (1866-1909)
• Euclides da Cunha foi escritor, poeta,
ensaísta, jornalista, historiador, sociólogo,
geógrafo, poeta e engenheiro. Ocupou a
cadeira 7 da Academia Brasileira de Letras
de 1903 a 1906.
• Como jornalista, foi convidado para cobrir
a Guerra de Canudos. A Guerra de
Canudos (1896 – 1897) foi um movimento
popular de cunho religioso, na Bahia, que
inspirou um dos mais importantes livros
desse período: “Os Sertões”.
15. Os Sertões (trecho)
O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo
dos mestiços neurastênicos do litoral.
A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário.
Falta-lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das
organizações atléticas.
É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete no
aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase
gingante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados. Agrava-
o a postura normalmente abatida, num manifestar de displicência que lhe dá um
caráter de humildade deprimente. A pé, quando parado, recosta-se
invariavelmente ao primeiro umbral ou parede que encontra; a cavalo, se
sofreia o animal para trocar duas palavras com um conhecido, cai logo sobre
um dos estribos, descansando sobre a espenda da sela. Caminhando, mesmo
a passo rápido, não traça trajetória retilínea e firme. Avança celeremente, num
bambolear característico, de que parecem ser o traço geométrico os meandros
das trilhas sertanejas. (...)
É o homem permanentemente fatigado.
16. Graça Aranha (1868-1931)
• Graça Aranha foi um escritor e diplomata maranhense.
Um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. É
situado como um escritor pré-modernista, pois nessa
obra expressa tendências naturalistas e simbolistas, que,
somadas, resultaram em uma literatura singular, a qual
apontava indícios do que viria a ser problematizado com
mais ênfase no século XX e início do século XXI: a
questão racial.
• Em sua obra Canaã, narra-se o enredo em torno de dois
imigrantes alemães no estado do Espírito Santo. Um
desses personagens, de nome Milkau, assume uma
postura favorável à miscigenação entre os alemães e
outros povos, ao passo que o outro personagem,
chamado Lentz, mostra-se contrário a esse processo,
que, segundo sua ótica, resultaria no enfraquecimento
da raça ariana.
17. Canaã (trecho)
– As raças civilizam-se pela fusão; é no encontro das raças
adiantadas com as raças virgens, selvagens, que está o repouso
conservador, o milagre do rejuvenescimento da civilização. O papel
dos povos superiores é o instintivo impulso do desdobramento da
cultura, transfundindo de corpo a corpo o produto dessa fusão que,
passada a treva da gestação, leva mais longe o capital acumulado nas
infinitas gerações. Foi assim que a Gália se tornou França e a
Germânia, Alemanha.
– Não acredito que da fusão com espécies radicalmente incapazes
resulte uma raça sobre que se possa desenvolver a civilização. Será
sempre uma cultura inferior, civilização de mulatos, eternos escravos
em revoltas e quedas. Enquanto não se eliminar a raça que é o
produto de tal fusão, a civilização será sempre um misterioso artifício,
todos os minutos rotos pelo sensualismo, pela bestialidade e pelo
servilismo inato do negro. O problema social para o progresso de uma
região como o Brasil está na substituição de uma raça híbrida, como a
dos mulatos, por europeus. A imigração não é simplesmente para o
futuro da região do País um caso de simples estética, é antes de tudo
uma questão complexa, que interessa o futuro humano.Capa do livro “Canaã”
18. Monteiro Lobato (1882-1948)
• Monteiro Lobato foi escritor, editor,
ensaísta e tradutor brasileiro. É
considerado um dos escritores mais
influentes do século XX e ficou muito
conhecido por suas obras infantis de
caráter educativo, como por exemplo, a
série de livros do Sítio do Picapau
Amarelo.
• Sua contribuição para o período pré-
modernista se fez em várias obras, entre
elas “Cidades Mortas”, na qual denunciou
o cotidiano das cidades cafeeiras de São
Paulo, a decadência econômica e o
comportamento das pessoas.
19. Urupês (trecho)
Quando Pedro I lança aos ecos o seu grito histórico e o país desperta estrouvinhado à crise duma mudança
de dono, o caboclo ergue-se, espia e acocora-se de novo.
Pelo 13 de Maio, mal esvoaça o florido decreto da Princesa e o negro exausto larga num uf! o cabo da
enxada, o caboclo olha, coça a cabeça, ‘magina e deixa que do velho mundo venha quem nele pegue de novo.
A 15 de Novembro troca-se um trono vitalício pela cadeira quadrienal. O país bestifica-se ante o inopinado da
mudança. O caboclo não dá pela coisa.
Vem Floriano; estouram as granadas de Custódio; Gumercindo bate às portas de Roma; Incitátus derranca o
país. O caboclo continua de cócoras, a modorrar…
Nada o esperta. Nenhuma ferrotoada o põe de pé. Social, como individualmente, em todos os atos da vida,
Jeca, antes de agir, acocora-se.
Jeca Tatu é um piraquara do Paraíba, maravilhoso epítome de carne onde se resumem todas as
características da espécie.
Ei-lo que vem falar ao patrão. Entrou, saudou. Seu primeiro movimento após prender entre os lábios a palha
de milho, sacar o rolete de fumo e disparar a cusparada d’esguicho, é sentar-se jeitosamente sobre os
calcanhares. Só então destrava a língua e a inteligência.
– “Não vê que…
De pé ou sentado as ideias se lhe entramam, a língua emperra e não há de dizer coisa com coisa.
De noite, na choça de palha, acocora-se em frente ao fogo para “aquentá-lo”, imitado da mulher e da prole.
Para comer, negociar uma barganha, ingerir um café, tostar um cabo de foice, fazê-lo noutra posição será
desastre infalível. Há de ser de cócoras.
Nos mercados, para onde leva a quitanda domingueira, é de cócoras, como um faquir do Bramaputra, que
vigia os cachinhos de brejaúva ou o feixe de três palmitos.
Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade!
20. Lima Barreto (1881-1922)
• Lima Barreto foi escritor e jornalista. Foi
um grande crítico do ufanismo e do
positivismo em suas obras, nas quais
fazia críticas às mazelas sociais. Boa
parte de suas obras foram descobertas e
publicadas após sua morte.
• Sua principal obra foi “Triste Fim de
Policarpo Quaresma”, escrito em tom
coloquial. O livro narra a história de um
funcionário público, Policarpo Quaresma,
que em uma de suas ações reconhece o
tupi como idioma principal do Brasil em
sinal de valorização da cultura brasileira.
21. Triste fim de Policarpo Quaresma (trecho)
O que mais a impressionou no passeio foi a miséria geral, a falta de cultivo, a pobreza
das casas, o ar triste, abatido da gente pobre. Educada na cidade, ela tinha dos roceiros ideia
de que eram felizes, saudáveis e alegres. Havendo tanto barro, tanta água, por que as casas
não eram de tijolos e não tinham telhas? Era sempre aquele sapê sinistro e aquele "sopapo"
que deixava ver a trama de varas, como o esqueleto de um doente. Por que, ao redor dessas
casas, não havia culturas, uma horta, um pomar? Não seria tão fácil, trabalho de horas? E
não havia gado, nem grande nem pequeno. Era raro uma cabra, um carneiro. Por quê?
Mesmo nas fazendas, o espetáculo não era mais animador. Todas soturnas, baixas, quase
sem o pomar olente e a horta suculenta. A não ser o café e um milharal, aqui e ali, ela não
pôde ver outra lavoura, outra indústria agrícola. Não podia ser preguiça só ou indolência.
Para o seu gasto, para uso próprio, o homem tem sempre energia para trabalhar. As
populações mais acusadas de preguiça, trabalham relativamente. Na África, na Índia, na
Cochinchina, em toda parte, os casais, as famílias, as tribos, plantam um pouco, algumas
coisas para eles. Seria a terra?
Que seria? E todas essas questões desafiavam a sua curiosidade, o seu desejo de saber,
e também a sua piedade e simpatia por aqueles párias, maltrapilhos, mal alojados, talvez
com fome, sorumbáticos!...
22. Capa do livro “Os Sertões” Capa do livro “Urupês” Capa do livro “Triste fim de
Policarpo Quaresma