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O conceito de discurso ideológico e sua análise


  Antes de se analisar qualquer aspecto de um discurso ideológico é necessário
destrinchar ambos conceitos para que se possa saber mais claramente nosso
objeto de estudo. Quando se fala de discurso, deve-se levar em conta que este se
dá entre o locutor e o interlocutor portanto passa por filtros no caminho que a
informação faz desde a fala do locutor até a interpretação do interlocutor.Para que
se compreenda melhor um discurso e que se possa identificar se há e qual é a
ideologia presente, é importante fazer uma análise aprofundada deste, levando em
conta, como defende Pêcheux 1, o contexto sócio-histórico nos quais se
enquadram as posições ideológicas que determinam o significado real das
palavras. Porém, diferentemente do discurso, que deve ser analisado em seu
contexto, "a ideologia consiste, justamente, em tomar as idéias como
independentes da realidade histórica e social, de modo a fazer com que tais idéias
expliquem aquela realidade que torna compreensíveis as idéias elaboradas" 2.
  Entendendo-se como se dá o discurso, o próximo passo é a definição de
ideologia. Genericamente, se define como ideologia o conjunto de idéias e
pensamentos de uma pessoa ou grupo em relação a um assunto. Marx analisou
as ideologias ligadas a divisão de classes, como uma forma de manipulação. Os
ideólogos ligados a classe dominante revertem a realidade em idéias e utilizam
ferramentas como os meios de comunicação e as leis para instituir sua ideologia
não de uma forma violenta, mas sim de uma forma gradual e legal. Após Marx
outros pensadores estudaram a ideologia, inclusive Lênin, que via a ideologia
como a "visão de mundo" de certa pessoa ou grupo, ou seja, os acontecimentos a
partir da filtragem dos estereótipos de cada um. O discurso ideológico porém não
pode ser considerado provido de uma pessoa específica, já que "é um fato social
justamente porque é produzida pelas relações sociais"3.                               .
  Outro ponto importante de ser ressaltado é o conceito de alienação. A pessoa


1 PECHÊUX,1975 apud ORLANDI, 2006.

2 CHAUÍ, 1984, p.05.

3 CHAUÍ, 1984, p.13.
que não se encaixa no contexto histórico e não segue nenhuma ideologia, nem
que seja sua própria, se encaixa no conceito exposto por Hegel de alienação. A
partir desse conceito podemos perceber como a alienação é um ponto importante
para a utilização de uma ideologia como manutenção do status quo: o interesse
das pessoas que estão no poder em que a grande massa questione a ideologia
por eles estabelecida é inexistente, portanto é melhor que essa grande massa seja
alienada a partir do seu deslocamento com a mesma ideologia e assim os deixe
governar. Um bom exemplo desta alienação é dado por Chomsky 4 quando
discorre sobre o contraste entre a política americana em relação ao Iraque e a
Israel. As atrocidades cometidas por Saddam Hussein, apoiado pelos EUA, e
amplamente divulgadas mostram a mesma face deste país em relação as ações
de Israel, porém a população americana alienada prefere culpar a globalização
pelos ataques de 11 de Setembro.


  O Caso Havaianas: Roda de Samba


  As sandálias Havaianas chegaram a um ponto que todo produto deseja: sua
marca substituir o próprio nome do produto. Isso se deve a mais de 40 anos de
mercado com um produto original, campanhas fortes e, claro, preço competitivo.
As sandálias foram criadas em 1962, feitas de borracha, e logo viraram sucesso.
Muitas empresas copiaram e a partir daí começou-se a focar sua comunicação na
diferenciação, através do slogan "As Legítimas". Após esta primeira fase a
qualidade do produto foi o foco da comunicação, e também teve início a ligação
das Havaianas como um produto brasileiro do povo brasileiro. Defendendo a
máxima "não deformam, não têm cheiro e não soltam as tiras”, Chico Anysio
divulgou a marca. O comediante foi um ótimo garoto-propaganda pois simbolizava
o brasileiro sofrido, nordestino, que lutou e através do seu "jeitinho" tornou-se
famoso e realizado. Portanto, ai tinha o início de uma comunicação voltada tanto
ao público de baixa-renda quanto as classes mais altas. Essa comunicação se
reforçou com a campanha protagonizada pela Tereza Collor com o mote "Todo


4 CHOMSKY, 2002, p. 35
mundo usa Havaianas". A marca que antes era caracterizada como de baixa
qualidade e destinado as classes baixas virou uma febre e até hoje segue com
sua comunicação focada em depoimentos de celebridades confirmando, em
situações cômicas, que usam Havaianas. Seguindo as teorias de Pêcheux 5 a
utilização de pessoas conhecidas para a divulgação do produto facilita a
comunicação por três aspectos:

    •   O locutor acredita que o interlocutor deseja ficar bonito e atraente como o
        artista da propaganda que aparece usando sandálias Havaianas;
    •   Como o artista é uma pessoa rica, bem-sucedida e atraente, o interlocutor
        deposita uma confiança maior;
    •   Além disso, o interlocutor vê o produto como algo de bom gosto e
        elegância.

  As sandálias eram descoladas, simples, bonitas, e acabou virando sinônimo de
um estilo brasileiro. Esse estilo que é muito explorado nas atuais peças de
comunicação, explorando as cores vivas, as cores, o movimento e o jeito do
brasileiro.

        No dia 06/04 foi pro ar na televisão um comercial de 30’ realizado pela
AlmapBBDO para a Havaianas, protagonizado pelo ator Marcos Palmeira e o
grupo Samba na Veia. O vídeo se inicia com um samba e a apresentação do ator
como percursionista com as Havaianas. Logo após, uma mulher interrompe a
música fazendo um discurso onde culpa as pessoas por estarem se distraindo em
meio a uma crise mundial, acusando-os de alienação. Paira um pequeno silêncio
entre os presentes até que o ator exclama "tristeza", e daí a roda de samba volta a
tocar imendando com um famoso samba e a mulher saí, enfurecida. O principal
fator ideológico impregado nesse comercial é o nacionalismo. Ele está presente no
local, através da representação de um bar carioca tradicional, ensolarado, com o
clima descontraído entre amigos. As pessoas são de raças variadas,
representando a miscigenação do povo brasileiro, vestidas com roupas leves, com

5 PECHÊUX, Análise automática do discurso, 1990.
estampas tropicais. Mas o principal fator nacionalista presente na propaganda é o
samba. O samba, apesar das origens africanas, é um ritmo característico do
brasileiro, que mostra toda sua felicidade, sua criatividade e seu jeito diferente de
encarar as coisas. Juntando-se todos estes fatores pode-se ver claramente o
apelo nacionalista que a propaganda prega, com o objetivo de ligar todas essas
características nacionais as Havaianas, ou seja, considerando-as também uma
característica do povo brasileiro, para tanto até incluem as sandálias como
instrumento de percussão do samba.
  A caracterização da mulher também é bastante peculiar visto que é a única que
está vestida de forma mas sombria e seca na propaganda. Seu cabelo está
amarrado, ela usa óculos, roupas pretas, a bolsa tiracolo longa, o conjunto a rotula
rapidamente, lembrando muito o figurino da ex-candidata a presidência Heloísa
Helena. Também é uma das poucas pessoas que aparecem no comercial que não
tem características exclusivamente brasileiras.
  O grande ponto a ser analisado nessa propaganda é a ambiguidade passada
em relação ao famoso "jeitinho brasileiro". Ela defende um momento de
descontração em meio a todo o caos e bombardeio de informações causado pela
crise, mostra que uma das coisas boas do brasileiro é saber esquecer os
problemas e se divertir. Não é a toa que o clímax do comercial é quando o ator e o
grupo de samba recomeçam a cantar, a partir de um comentário sobre o sermão
feito pela mulher, e puxam o samba “Tristeza", de Niltinho e Haroldo Lobo. A
propaganda foi bem recebida, como uma das poucas campanhas que tratam o
assunto de uma forma descontraída, diferente de outras campanhas que citam o
mau momento da economia mundial e mostram o que a empresa está fazendo
para sair deste buraco.

      Porém, ao mesmo tempo, esse "jeitinho brasileiro" pode ser tratado de uma
forma pejorativa, muitas vezes atrelado a malandragem e, neste caso, a
alienação. A propaganda abre margem para a interpretação de que os brasileiros
devem ignorar a crise e relaxar, como se a crise não fosse da nossa alçada e se
não agíssemos ela se resolveria sozinha. Neste caso, ao tentar exaltar o
nacionalismo, o comercial pode ser considerado como motivo de degradação ao
povo, mesmo que seu objetivo tenha sido mostrar o brasileiro como um povo que
não se deixa abater.


Link do comercial:


http://www.youtube.com/watch?v=DvbLtey2dYI&feature=player_embedded




Referências Bibliográficas:


CHAUÍ, Marilena de Souza. O Que É Ideologia. São Paulo: Abril
Cultural/Brasiliense, 1984.


CHOMSKY, Noam. 11 de Setembro. Bertrand Brasil, 2002.



GARCIA, Jahr Nelson. O que é propaganda ideológica.


ORLANDI, E. P. Análise de Discurso. In: ORLANDI, E. P.; LAGAZZI-
RODRIGUES, S. (org.). Introdução às ciências da Linguagem: Discurso e
textualidade. Campinas: Pontes, 2006, p. 13-28.


PÊCHEUX, M. Análise automática do discurso. In: GADET, F. (Org.). Por uma
análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux.
Tradução de: Towards na automatic discourse analysis. Campinas: Editora da
UNICAMP, 1990.

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Análise do discurso ideológico nas propagandas da Havaianas

  • 1. O conceito de discurso ideológico e sua análise Antes de se analisar qualquer aspecto de um discurso ideológico é necessário destrinchar ambos conceitos para que se possa saber mais claramente nosso objeto de estudo. Quando se fala de discurso, deve-se levar em conta que este se dá entre o locutor e o interlocutor portanto passa por filtros no caminho que a informação faz desde a fala do locutor até a interpretação do interlocutor.Para que se compreenda melhor um discurso e que se possa identificar se há e qual é a ideologia presente, é importante fazer uma análise aprofundada deste, levando em conta, como defende Pêcheux 1, o contexto sócio-histórico nos quais se enquadram as posições ideológicas que determinam o significado real das palavras. Porém, diferentemente do discurso, que deve ser analisado em seu contexto, "a ideologia consiste, justamente, em tomar as idéias como independentes da realidade histórica e social, de modo a fazer com que tais idéias expliquem aquela realidade que torna compreensíveis as idéias elaboradas" 2. Entendendo-se como se dá o discurso, o próximo passo é a definição de ideologia. Genericamente, se define como ideologia o conjunto de idéias e pensamentos de uma pessoa ou grupo em relação a um assunto. Marx analisou as ideologias ligadas a divisão de classes, como uma forma de manipulação. Os ideólogos ligados a classe dominante revertem a realidade em idéias e utilizam ferramentas como os meios de comunicação e as leis para instituir sua ideologia não de uma forma violenta, mas sim de uma forma gradual e legal. Após Marx outros pensadores estudaram a ideologia, inclusive Lênin, que via a ideologia como a "visão de mundo" de certa pessoa ou grupo, ou seja, os acontecimentos a partir da filtragem dos estereótipos de cada um. O discurso ideológico porém não pode ser considerado provido de uma pessoa específica, já que "é um fato social justamente porque é produzida pelas relações sociais"3. . Outro ponto importante de ser ressaltado é o conceito de alienação. A pessoa 1 PECHÊUX,1975 apud ORLANDI, 2006. 2 CHAUÍ, 1984, p.05. 3 CHAUÍ, 1984, p.13.
  • 2. que não se encaixa no contexto histórico e não segue nenhuma ideologia, nem que seja sua própria, se encaixa no conceito exposto por Hegel de alienação. A partir desse conceito podemos perceber como a alienação é um ponto importante para a utilização de uma ideologia como manutenção do status quo: o interesse das pessoas que estão no poder em que a grande massa questione a ideologia por eles estabelecida é inexistente, portanto é melhor que essa grande massa seja alienada a partir do seu deslocamento com a mesma ideologia e assim os deixe governar. Um bom exemplo desta alienação é dado por Chomsky 4 quando discorre sobre o contraste entre a política americana em relação ao Iraque e a Israel. As atrocidades cometidas por Saddam Hussein, apoiado pelos EUA, e amplamente divulgadas mostram a mesma face deste país em relação as ações de Israel, porém a população americana alienada prefere culpar a globalização pelos ataques de 11 de Setembro. O Caso Havaianas: Roda de Samba As sandálias Havaianas chegaram a um ponto que todo produto deseja: sua marca substituir o próprio nome do produto. Isso se deve a mais de 40 anos de mercado com um produto original, campanhas fortes e, claro, preço competitivo. As sandálias foram criadas em 1962, feitas de borracha, e logo viraram sucesso. Muitas empresas copiaram e a partir daí começou-se a focar sua comunicação na diferenciação, através do slogan "As Legítimas". Após esta primeira fase a qualidade do produto foi o foco da comunicação, e também teve início a ligação das Havaianas como um produto brasileiro do povo brasileiro. Defendendo a máxima "não deformam, não têm cheiro e não soltam as tiras”, Chico Anysio divulgou a marca. O comediante foi um ótimo garoto-propaganda pois simbolizava o brasileiro sofrido, nordestino, que lutou e através do seu "jeitinho" tornou-se famoso e realizado. Portanto, ai tinha o início de uma comunicação voltada tanto ao público de baixa-renda quanto as classes mais altas. Essa comunicação se reforçou com a campanha protagonizada pela Tereza Collor com o mote "Todo 4 CHOMSKY, 2002, p. 35
  • 3. mundo usa Havaianas". A marca que antes era caracterizada como de baixa qualidade e destinado as classes baixas virou uma febre e até hoje segue com sua comunicação focada em depoimentos de celebridades confirmando, em situações cômicas, que usam Havaianas. Seguindo as teorias de Pêcheux 5 a utilização de pessoas conhecidas para a divulgação do produto facilita a comunicação por três aspectos: • O locutor acredita que o interlocutor deseja ficar bonito e atraente como o artista da propaganda que aparece usando sandálias Havaianas; • Como o artista é uma pessoa rica, bem-sucedida e atraente, o interlocutor deposita uma confiança maior; • Além disso, o interlocutor vê o produto como algo de bom gosto e elegância. As sandálias eram descoladas, simples, bonitas, e acabou virando sinônimo de um estilo brasileiro. Esse estilo que é muito explorado nas atuais peças de comunicação, explorando as cores vivas, as cores, o movimento e o jeito do brasileiro. No dia 06/04 foi pro ar na televisão um comercial de 30’ realizado pela AlmapBBDO para a Havaianas, protagonizado pelo ator Marcos Palmeira e o grupo Samba na Veia. O vídeo se inicia com um samba e a apresentação do ator como percursionista com as Havaianas. Logo após, uma mulher interrompe a música fazendo um discurso onde culpa as pessoas por estarem se distraindo em meio a uma crise mundial, acusando-os de alienação. Paira um pequeno silêncio entre os presentes até que o ator exclama "tristeza", e daí a roda de samba volta a tocar imendando com um famoso samba e a mulher saí, enfurecida. O principal fator ideológico impregado nesse comercial é o nacionalismo. Ele está presente no local, através da representação de um bar carioca tradicional, ensolarado, com o clima descontraído entre amigos. As pessoas são de raças variadas, representando a miscigenação do povo brasileiro, vestidas com roupas leves, com 5 PECHÊUX, Análise automática do discurso, 1990.
  • 4. estampas tropicais. Mas o principal fator nacionalista presente na propaganda é o samba. O samba, apesar das origens africanas, é um ritmo característico do brasileiro, que mostra toda sua felicidade, sua criatividade e seu jeito diferente de encarar as coisas. Juntando-se todos estes fatores pode-se ver claramente o apelo nacionalista que a propaganda prega, com o objetivo de ligar todas essas características nacionais as Havaianas, ou seja, considerando-as também uma característica do povo brasileiro, para tanto até incluem as sandálias como instrumento de percussão do samba. A caracterização da mulher também é bastante peculiar visto que é a única que está vestida de forma mas sombria e seca na propaganda. Seu cabelo está amarrado, ela usa óculos, roupas pretas, a bolsa tiracolo longa, o conjunto a rotula rapidamente, lembrando muito o figurino da ex-candidata a presidência Heloísa Helena. Também é uma das poucas pessoas que aparecem no comercial que não tem características exclusivamente brasileiras. O grande ponto a ser analisado nessa propaganda é a ambiguidade passada em relação ao famoso "jeitinho brasileiro". Ela defende um momento de descontração em meio a todo o caos e bombardeio de informações causado pela crise, mostra que uma das coisas boas do brasileiro é saber esquecer os problemas e se divertir. Não é a toa que o clímax do comercial é quando o ator e o grupo de samba recomeçam a cantar, a partir de um comentário sobre o sermão feito pela mulher, e puxam o samba “Tristeza", de Niltinho e Haroldo Lobo. A propaganda foi bem recebida, como uma das poucas campanhas que tratam o assunto de uma forma descontraída, diferente de outras campanhas que citam o mau momento da economia mundial e mostram o que a empresa está fazendo para sair deste buraco. Porém, ao mesmo tempo, esse "jeitinho brasileiro" pode ser tratado de uma forma pejorativa, muitas vezes atrelado a malandragem e, neste caso, a alienação. A propaganda abre margem para a interpretação de que os brasileiros devem ignorar a crise e relaxar, como se a crise não fosse da nossa alçada e se não agíssemos ela se resolveria sozinha. Neste caso, ao tentar exaltar o nacionalismo, o comercial pode ser considerado como motivo de degradação ao
  • 5. povo, mesmo que seu objetivo tenha sido mostrar o brasileiro como um povo que não se deixa abater. Link do comercial: http://www.youtube.com/watch?v=DvbLtey2dYI&feature=player_embedded Referências Bibliográficas: CHAUÍ, Marilena de Souza. O Que É Ideologia. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1984. CHOMSKY, Noam. 11 de Setembro. Bertrand Brasil, 2002. GARCIA, Jahr Nelson. O que é propaganda ideológica. ORLANDI, E. P. Análise de Discurso. In: ORLANDI, E. P.; LAGAZZI- RODRIGUES, S. (org.). Introdução às ciências da Linguagem: Discurso e textualidade. Campinas: Pontes, 2006, p. 13-28. PÊCHEUX, M. Análise automática do discurso. In: GADET, F. (Org.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Tradução de: Towards na automatic discourse analysis. Campinas: Editora da UNICAMP, 1990.