1. O ESTÁGIO NAS ESCOLAS - ARTICULAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA
Fernanda May
Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS
Campus Erechim /RS
E-mail: Fmay2010@hotmail.com
Eixo de Diálogo: PAULO FREIRE e o Ensino Superior
Resumo: Partir da realidade para construir conhecimento é um pressuposto que vem acompanhado da
necessidade de conhecer, refletir e repensar o objeto sobre o qual desejamos produzir esse conhecimento,
ainda mais se tivermos a intenção de transformar esses saberes construídos em ações práticas. O objetivo
do presente trabalho é pensar e repensar alguns aspectos da escola que possam contribuir, para também,
pensar e repensar a prática docente, ou seja, de que forma a apreensão da realidade escolar possibilita ao
professor modificar sua práticas pedagógicas. Essa é uma preocupação que me coloco enquanto estudante
do curso de Licenciatura em Ciências Sociais, principalmente a partir da cadeira de Estágio I. Qual é a
importância de conhecer o espaço escolar e que contribuições isso pode trazer para minha futura prática
como professora. Busco colocar algumas questões a respeito da função da educação e da escola, bem
como problematizar a prática docente, a partir dos pressupostos da educação popular.
Palavras-Chave: Escola; Estágio; Formação Docente; Educação Popular;
Introdução
O objetivo primeiro é reconhecer a importância das cadeiras de Estágio dentro da sua nova
formatação, que corresponde a três etapas diferentes. A primeira de reconhecimento e diagnóstico da
escola, a segunda de observação do professor em sala de aula e, por fim, a regência. Enfatizando
principalmente a primeira fase, que corresponde ao diagnóstico da escola. Porque é importante conhecer o
espaço escolar? Quais são as possíveis contribuições que esse processo pode trazer para a prática
docente?
Imaginamos a escola como espaço privilegiado da produção e apreensão do conhecimento. No
entanto, deixamos de observar alguns elementos do espaço escolar que contém significados para além da
relação ensino/aprendizagem, restrita a sala de aula e a figura do professor. O espaço escolar e seus
diferentes segmentos compõem um espaço de relações, que são importantes para o desenvolvimento e
2. aprendizagem dos estudantes. A escola deve ser considerada um espaço de relações, de convívio, de
socialização, de disputas, onde se encontram os mais diferentes sujeitos, de idéias, ideologias e sonhos.
Bem como, considerar que a escola não se faz apenas com os professores e alunos em suas salas
de aula, mas se constrói na participação e colaboração da comunidade e das famílias. Na construção do
Projeto Político Pedagógico. Na manutenção e organização dos espaços escolares. Na oferta de recursos
tecnológicos mediadores da aprendizagem. Na organização de projetos e atividades coletivas, que
promovam a interação entre a escola e outros espaços.
Nesse sentido se torna relevante ressaltar a importância do estudante de licenciatura conhecer a
escola nos seus diferentes aspectos, antes de iniciar seus trabalhos enquanto docente. Procurar descobrir
na escola pontos positivos e possíveis problemas que poderá encontrar no desenvolvimento do seu
trabalho. A seguir, apresento a nova lei de Estágios a partir da LDB e as possibilidades a partir dessa nova
reestruturação. Em seguida analiso a importância de conhecer a escola e as contribuições para a prática
docente, vinculando a uma nova forma de conceber a escola e seus espaços a partir de alguns
pressupostos da educação popular.
Articulação entre teórica e prática em três etapas diferentes
O estágio curricular obrigatório nos cursos de licenciatura tem por finalidade o contato entre o
licenciando e a escola. A princípio, esse contato era realizado ao final dos cursos, onde considerava-se que
o aluno, já com uma bagagem teórica consolidada a partir do curso, estava preparado para atuar em sala
de aula. Este ia para a escola buscando colocar em prática aquilo que aprendeu. Esse processo muitas
vezes acabava colocando em cheque a escolha pela licenciatura. Muitos descobriam que não estavam
preparados para enfrentar a sala de aula, outros acabavam concluindo seus estágios, sem dar muita
importância para o trabalho que desenvolviam, somente para obter o diploma. Esse contato se dava sem
maiores aproximações com as outras dimensões da vida escolar, fazendo aparecer sentimentos de
incerteza e inquietação.
A nova lei para os Estágios estabelece uma carga horária de 400 (quatrocentas) horas, a partir do início
da segunda metade do curso. A exemplo, no curso de Licenciatura em Ciências Sociais da UFFS –
Campus Erechim estas horas estão dividas em três etapas que correspondem;
a primeira (Estágio I) ao conhecimento das peculiaridades e exigências do ambiente
escolar; a segunda (Estágio II) reflexão e planejamento das atividades; e terceiro
(Estágio III) o exercício mesmo da prática docente. (PPC Licenciatura em Ciências
Sociais UFFS, 2010, p.34-36)
3. Essa divisão permite ao estudante uma primeira aproximação com a escola com intuito de
conhecê-la e reconhecê-la. Já que, não podemos esquecer que a escola fez parte da vida de todos os
estudantes dos cursos superiores. Por isso a importância de voltar a ela e buscar perceber as suas
características, seus possíveis problemas e contradições com outros olhos. Com o olhar de quem busca
produzir conhecimento a partir dela e para atuar nela. Mantendo sempre a necessária articulação entre
teoria e prática. Sendo assim;
O estágio deixa de ser um mero exercício da atividade prática, campo de
desenvolvimento, experimentação e aplicação da técnica. Para se constituir em um
momento de reflexão teórica, de investigação e formulação de constructos, de tal modo
que a prática se alimente da teoria e esta, por sua vez, se inspire e materialize na prática.
(FREITAS, 2007, p. 3)
Enfatizando a primeira etapa do Estágio que corresponde ao conhecimento do espaço escolar
identifico alguns fatores positivos para a formação dos professores. Como já foi dito, a escola não se
constitui apenas pela relação de ensino - aprendizagem em sala de aula. É importante que o professor
conheça seus alunos, mas é tão importante quanto, que ele conheça a escola como um todo nos seus
aspectos estruturais, políticos e o contexto onde a mesma está inserida.
Conhecer os espaços escolares dá possibilidade ao professor de trabalhar esses espaços de forma
que os alunos não se sintam estranhos nos corredores, na biblioteca e outros espaços, bem como com os
diferentes grupos que compõem a escola. A escola deve ser um espaço familiar para os alunos, onde
devem sentir-se bem e estabelecer relações para além dos seus grupos de convivência. Possibilita ao
professor propor atividades que saiam da rotina dos estudantes e que os incitem a criatividade e o gosto
pelo descobrimento de coisas e espaços novos.
Para além do uso dos diferentes espaços, conhecer o ambiente escolar e seu entorno, o contexto
onde esta inserida a escola, permite ao professor vincular suas atividades a vida dos estudantes, ao lugar
onde vivem, a cidade em que moram. Fazendo assim, com que os alunos consigam fazer relações com as
suas vivências e incorporando sentido a aquilo que aprendem.
Outro aspecto importante é quanto ao conhecimento da estrutura política da escola, ou seja, quanto
ao Projeto Político Pedagógico e outros documentos importantes que regem a organização e as atividades
da escola. É no PPP que está contida a intencionalidade e os objetivos da escola. A partir daí é possível
discutir aquilo que está sendo proposto e aquilo que está sendo efetivado de fato pela escola. Propondo
possibilidades de discussão e reflexão sobre os problemas identificados e anunciando as potencialidades
4. do que vem dando certo. Construindo assim uma proposta coletiva, democrática, composta por todos os
segmentos escolares, considerando também a comunidade externa.
Pensar a Escola é pensar a Educação
Não é possível falar da escola sem falar em educação. Não como um processo único e exclusivo
da escola, mas a educação enquanto um processo que ocorre permanentemente no decorrer da vida dos
seres humanos. Tomando essa prerrogativa de processo, não deve ser a escola a sua castradora, ou seja, a
escola não deve se tornar o único espaço de aprendizagem e conhecimento, mas deve incentivar os alunos
a buscar esse conhecimento ao longo de sua vida.
Educar é sempre impregnar de sentido todos os atos da nossa vida cotidiana. É entender
e transformar o mundo e a si mesmo. É compartilhar o mundo; compartilhar mais do
que conhecimentos, idéias, compartilhar o coração [...] educar é posicionar-se, não se
omitir [...] educar é reproduzir ou transformar [...] (GADOTTI, 2007, p. 42-43)
Por isso é importante ao licenciando conhecer a proposta de educação da escola. A escola deve
pensar uma proposta condizente com o seu contexto e com o seu público. Principalmente quando falamos
da escola pública, que hoje, vem assumindo na sua complexidade diferentes extratos da sociedade e que
merecem uma atenção diferenciada para que não haja uma exclusão dentro da escola.
Quando falo em exclusão dentro da escola, me refiro as diferentes condições com que os alunos
chegam à escola. Congregando diferentes classes sociais, a escola convive com diferenças de raça, de
posição social, de acesso a bens econômicos e bens culturais. Essas questões merecem total atenção
principalmente quando da atuação do professor. O professor não pode chegar a sala de aula com uma
idéia de homogeneização, ou seja, achando que seus alunos são todos iguais e que todos aprendem da
mesma forma. A trajetória social dos estudantes condiciona seu processo de aprendizagem. E assim como
nos disse Paulo Freire, “não é possível educar de forma igual, os diferentes”.
A atenção do professor deve estar voltada para essas condições buscando identificar os alunos com
maiores dificuldades e trabalhá-las da melhor forma possível, para que o aluno não seja o único
responsabilizado pelo seu insucesso escolar.
A escola tem um importante papel nesse processo. Buscando conhecer a realidade dos estudantes é
possível adequar suas atividades de forma que ninguém se sinta excluído ou diminuído. A escola deve
pensar uma educação dialógica, democrática e emancipatória, que juntamente com políticas públicas
voltadas para o atendimento dos mais necessitados, não faça com que os alunos sejam obrigados a
abandonar a escola pela necessidade do trabalho ou mesmo por se acharem incompetentes.
5. Assim a função da escola e da educação passa a ser a formação de pessoas capazes de compreender e
entender a sociedade em que vivem. Criticas e atentas aos seus direitos. Conscientes do seu papel
enquanto seres históricos que constrói a sociedade em que vivem e que também depende delas a mudança
para uma sociedade melhor.
Freire nos adverte que o oprimido precisa conscientizar-se e engajar-se na luta. “o
homem não pode participar ativamente na história, na sociedade, na transformação da
realidade se não for ajudado a tomar consciência da realidade e de sua própria
capacidade para transformar”. (GADOTTI, 2007, p.34)
Daí o importante papel da educação – como conscientização, não a “educação bancária” – na superação
da condição de opressão. (GADOTTI, 2007). Portanto, o professor tem importante papel nesse processo
de mudança, a medida que;
A professora democrática, coerente, competente, que testemunha seu gosto pela vida,
sua esperança no mundo melhor, que atesta sua capacidade de luta, seu respeito as
diferenças, sabe cada vez mais o valor que tem para a modificação da realidade. A
maneira consistente com que vive sua presença no mundo, de que sua experiência na
escola é apenas um momento, mas um momento importante que precisa ser
autenticamente vivido. (FREIRE, 1996, p.27)
Considerações Finais
O que busquei identificar no decorrer do texto é a importância de do licenciando que se prepara para ser
professor, conhecer o espaço escolar nas suas diferentes dimensões.
A partir disso, é possível considerar que o profissional que conhece seu local de trabalho tem maior
facilidade de usá-lo a seu favor. O professor que conhece a sua escola sente-se a vontade para propor
atividades e se colocar diante dos problemas que identifica. A sua atuação em sala de aula leva em conta o
espaço escolar como um todo, criando estratégias de envolver os alunos e despertar nos mesmos a
curiosidade e o interesse por aquilo que vivenciam no seu dia a dia, dando sentido e significado ao
conhecimento que constroem.
No entanto o professor deve estar comprometido com uma educação que vise à mudança. Que
colabore na construção de sujeitos autônomos. Deve buscar na escola o apoio necessário para propor uma
nova forma de educar, que não se limite a sala de aula, mas que se estenda por todos os espaços. Fazendo
da escola um local de múltiplos saberes, cada qual com a sua importância e sempre considerando o
conhecimento que os alunos já trazem consigo para contribuir na construção do novo.
6. Referências
BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Institui a duração e a carga
horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da Educação Básica
em nível superior. Resolução CNE/CP 2/2002. Diário Oficial da União, Brasília DF, 4 de mar.2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo; Paz e Terra, 1996.
FREITAS, Revalino A. de. Estágio Supervisionado: espaço privilegiado de formação na
licenciatura em Ciências Sociais. XIII Congresso Brasileiro de Sociologia. Recife (PE), 2007.
GADOTTI, Moacir. A escola e o professor. Paulo Freire e a paixão de ensinar. 1 ed. São Paulo:
Publisher Brasil, 2007.
PPC Licenciatura em Ciências Sociais UFFS (2010)