Este documento discute a necessidade de implementar sistemas de gestão ambiental nas entidades públicas devido aos benefícios econômicos e de imagem. Grandes empresas privadas já adotam tais sistemas, reduzindo custos e riscos de danos ambientais. Entretanto, poucas instituições públicas possuem políticas ambientais efetivas, apesar de seu potencial poluidor.
Gestão ambiental no setor público: uma questão de relevância
1. 165
A gestão ambiental no setor público:
OPINIÃO OPINION
uma questão de relevância social e econômica
Environmental management in the public sector:
a question of social and economic relevancy
Martha Macedo de Lima Barata 1
Débora Cynamon Kligerman 2
Carlos Minayo-Gomez 3
Abstract Discussing the need to implement an Resumo Este texto apresenta uma discussão a
environmental management system in civil ser- respeito da necessidade de implantar um sistema
vice entities, this paper offers a brief description de gestão ambiental nos órgãos da administra-
of some management practices used by compa- ção pública. Efetua-se breve descrição de práti-
nies in various sectors that are endeavoring to cas gerenciais de empresas de setores variados
establish the best possible relationships between que assumem o compromisso de estabelecer a
business activities, environmental issues and hu- melhor relação possível entre atividade empre-
man needs, today and in the future. Some eco- sarial, meio ambiente e necessidades humanas
nomic arguments are presented, including the presentes e futuras. Expõem-se alguns argumen-
benefits obtained by private sector companies tos de caráter econômico, referentes aos benefí-
adopting eco-efficiency criteria that are in them- cios obtidos por iniciativas privadas que adota-
selves sufficient to justify the implementation of ram critérios de ecoeficiência que, em si, seriam
an effective environmental management policy suficientes para justificar a implantação de uma
in government institutions. The relevance is also política efetiva de gestão ambiental nas institui-
stressed of drawing up the Civil Service Environ- ções públicas. Destaca-se a relevância da criação
ment Agenda (A3P), striving to introduce a new da Agenda Ambiental na Administração Públi-
cultural approach that will mobilize civil ser- ca (A3P), que pretende instaurar uma nova cul-
vants in order to optimize resources, combating tura institucional, visando à mobilização dos
waste and encouraging better work environments. servidores para a otimização dos recursos, para
For this Agenda to be effective, civil servants and o combate ao desperdício e para a busca de uma
1
Diretoria do Instituto managers must obviously be fully engaged. melhor qualidade do ambiente de trabalho. Evi-
Oswaldo Cruz, Comissão Key words Environmental management, Civil dencia-se que para o êxito e efetivação da agen-
Interna de Gestão Ambiental
service, Eco-efficiency da será decisivo o grau de engajamento do pró-
do IOC- CIGAmb,
Fundação Oswaldo Cruz. Av. prio servidor e de seus dirigentes.
Brasil 4365 Pavilhão Palavras-chave Gestão ambiental, Administra-
Gomes de Faria 203,
ção pública, Ecoeficiência
Manguinhos. 21045-900
Rio de Janeiro RJ.
barata@ioc.fiocruz.br
2
Fiocruz. Escola Nacional
de Saúde Pública.
3
Fiocruz. Escola Nacional
de Saúde Pública
2. 166
Barata, M. M. L. et al.
Introdução atuar em conformidade com os procedimentos e
padrões legais. Entretanto, a ocorrência de aci-
Ao longo da década de 90 do século 20, foram dentes ambientais – como o incidente na Allied
implementados nas empresas instrumentos de Quemical Corporation, em Hopewell, Virgínia
gestão ambiental para o controle e a prevenção (EUA), em 1975; a explosão química da Hoffman-
de danos ambientais, a fim de responder com La Roche, em Seveso (Itália), em 1976; o vaza-
maior eficiência às atuais demandas do merca- mento de gases tóxicos numa fábrica de pestici-
do. Diversos instrumentos, desenvolvidos para da da Union Carbide em Bhopal (Índia), em 1984;
melhorar seu desempenho ambiental, redunda- a explosão de reator nuclear em Chernobyl, na
ram numa série de vantagens econômicas: redu- então União Soviética, em 1986; o vazamento de
ção de custos, aumento de competitividade, aber- petróleo, em 1990, do navio petroleiro Exxon
tura de novos mercados e diminuição das chan- Valdez e o caso emblemático Love Canal, no es-
,
ces de serem surpreendidas por algum tipo de tado de Nova York, um símbolo de contamina-
ônus imprevisível e indesejável. ção do solo por resíduos sólidos enterrados -
Tais argumentos de caráter econômico, por obrigou as empresas a arcarem com elevados
si só, já seriam suficientes para fundamentar a gastos em indenizações, recuperação dos ambi-
necessidade de que os órgãos da administração entes danificados e ações para mitigação e/ou
pública – e, mais ainda, os do setor de saúde - controle dos danos. Além disso, a imagem das
assumissem o compromisso de velar pela con- empresas causadoras do dano foi afetada nega-
servação dos recursos naturais e a qualidade do tivamente. Frente a esse quadro, empresas com
meio ambiente. No entanto, instituições públi- maior potencial poluidor passaram a desenvol-
cas que atuam no campo da pesquisa e da pres- ver e implementar instrumentos de gestão ambi-
tação de serviços biomédicos ainda carecem de ental corporativa para a melhoria do fluxo de
uma política efetiva de gestão ambiental. Mesmo informação, interno e externo, além de propiciar
executando serviços essenciais à sociedade, apre- a redução de risco de incidentes e acidentes.
sentam potencial poluidor capaz de causar da- O setor químico foi o pioneiro na elaboração
nos à saúde de seus trabalhadores e à população de diretrizes para a gestão ambiental corporati-
localizada em seu entorno, além de contaminar va. A Canadian Chemical Producers Association
o solo, a atmosfera, os rios e os lençóis freáticos. (CCPA) lançou, em 1984, um documento deno-
minado Statement of Responsible Care and Gui-
ding Principles, contendo princípios específicos
Antecedentes históricos para a gestão responsável do processo de produ-
da gestão ambiental corporativa ção em todo o ciclo de vida do produto, dando
ênfase à proteção da saúde humana e do meio
A constatação, ao final da década de 60 do sécu- ambiente e à segurança industrial e do produto.
lo passado, de que a capacidade assimilativa dos O documento, além de detalhar as iniciativas que
ecossistemas e de regeneração dos recursos na- as empresas precisam tomar para atender aos
turais ocorria a taxas incompatíveis com o des- princípios do Responsible Care, destaca a necessi-
gaste imposto à natureza, contribuiu para rea- dade de comprometimento de todos os envolvi-
tivar o questionamento clássico, em particular dos na produção, na distribuição e no recebi-
o malthusiano, acerca da compatibilidade no mento dos produtos das respectivas empresas,
longo prazo entre o crescimento e a demogra- assim como da troca permanente de informa-
fia, nos limites do patrimônio cultural fixo1. Em ções com a comunidade vizinha. A adoção desses
1971, o Clube de Roma, por meio de modelos princípios em vários outros países, como EUA,
econométricos, previu o esgotamento dos re- Inglaterra e Brasil, contribuiu para resgatar uma
cursos renováveis e não renováveis em face do imagem mais positiva da indústria química pe-
modelo de crescimento, do padrão tecnológico rante a opinião pública. Este tipo de ação coor-
e da estrutura da demanda. Seus resultados re- denada, envolvendo grande número de empre-
ativaram o debate acadêmico e político-institu- sas de um segmento industrial, seria, sob a ótica
cional, conduzindo à aspiração ao desenvolvi- da gestão ambiental, um importante exemplo de
mento sustentável. estratégia cooperativa que, devido ao seu caráter
Nos primórdios, os setores produtivos limi- pioneiro e a sua abrangência, viriam a ser segui-
tavam-se, em alguns casos, a adotar as medidas dos, nos EUA, por diversos outros setores, em
necessárias para evitar a paralisação de suas ati- especial, pela indústria do petróleo.
vidades ou o recebimento de multas, por não Em face da crescente importância dada à pro-
3. 167
Ciência & Saúde Coletiva, 12(1):165-170, 2007
teção ambiental e com o objetivo de harmonizar pação ambiental e têm-se desenvolvido tecnolo-
globalmente os procedimentos de gestão ambi- gias menos poluentes. No Brasil, até essa data, o
ental empresarial, sem privilegiar determinados número de certificações era de 570, o que repre-
setores ou países, foram criados, em 1994, no senta 88,37% do total das concedidas na América
âmbito da International Standard Organization Latina. A média anual vem se mantendo em tor-
(ISO), grupos de trabalho para o desenvolvimen- no de 200, ao longo deste milênio, um número
to de normas, contendo diretrizes aplicáveis aos ainda relativamente pequeno, considerando o
diferentes setores produtivos e regiões que possi- total de empresas em atividade no país, mas re-
bilitem uma gestão e um produto com “qualida- velador de uma mudança significativa quando
de ambiental”. Em 1996, foram aprovadas e pu- comparado com a situação anterior a 2001, em
blicadas as normas ISO 14001 e ISO 14004. que as empresas certificadas eram apenas 120.
Na norma ISO 14001 - revisada e publicada Observa-se que entre as empresas certifica-
nova versão, em 2000 - encontram-se especifica- das apenas duas são do setor público, quatro se
dos os requisitos gerenciais para estabelecer um dedicam à preparação farmacêutica e à atenção
Sistema de Gestão Ambiental (SGA) e obter a médico-hospitalar e dez atuam na área de saúde
certificação, nos mais diversos tipos de organi- e de serviços3. Esses dados são reveladores do
zações - respeitadas suas especificidades setori- pouco empenho de empresas do setor público -
ais, geográficas, culturais e econômicas. Nela,
. sobretudo as que oferecem assistência médico-
estão sistematizados os procedimentos necessá- hospitalar – em entrar num nível de gestão am-
rios para a definição dos princípios norteadores biental pautada por parâmetros garantidos e
da política ambiental da empresa. Além de indi- comparáveis internacionalmente. Uma explica-
car - com base na política definida - a forma ção cabível desse desinteresse estaria na falta de
como serão planejadas e implementadas as ações, evidência sobre as efetivas vantagens econômi-
fixam-se os prazos e os recursos necessários para cas que a certificação proporcionaria às empre-
sua operacionalização, assim como os meios sas de diferentes setores, tamanhos e localiza-
para verificar a eficiência e eficácia do planeja- ções, considerando os custos do processo e dos
mento previsto e das ações implementadas, o que procedimentos necessários para a aplicação da
permite realizar - sempre que necessário - a cor- norma. Conseqüentemente, as empresas públi-
reção de rumos para o atendimento aos princí- cas só solicitariam a certificação quando impeli-
pios contidos na política. A norma também esta- das por exigências do mercado ou de determina-
belece que a alta direção da organização deverá dos atores sociais4.
submeter-se periodicamente a revisões numa O SGA, no entanto, contribui para a ecoefici-
busca contínua de aperfeiçoar seu desempenho ência das empresas, enquanto prática de produ-
ambiental. zir sempre bens e serviços mais úteis, concomi-
A certificação da empresa, pela norma ISO tantemente à redução contínua do consumo de
14001, assegura a todas as partes interessadas (cli- recursos e da poluição5, 6, o que traduz a preocu-
entes, fornecedores, acionistas, força de trabalho, pação em estabelecer a melhor relação possível
comunidade, governo e organizações não gover- entre atividade empresarial, meio ambiente e ne-
namentais, dentre outras) que as práticas gerenci- cessidades humanas presentes e futuras. Sob essa
ais para a manutenção e melhoria do seu desem- ótica, empresas de todos os tamanhos estariam
penho ambiental se ajustam ao estabelecido na aprimorando suas cadeias produtivas, incorpo-
norma, independente do setor e/ou local onde a rando ações que conduzem à melhoria do de-
empresa esteja atuando. Em outras palavras, este sempenho ambiental. Alguns desses avanços con-
instrumento propicia a transparência e a unidade sistem na redução da obsolescência e da perda
no fluxo de informações para o público interno e da manutenção, reparo e operação (MRO) de
externo das empresas sobre os procedimentos de materiais, através de práticas de gestão de esto-
gestão ambiental aplicados por elas. ques; decréscimo substancial de custos com so-
A relevância deste instrumento pode ser cons- bras e perdas de materiais; aumento de receitas
tatada pela quantidade e diversidade de empre- com a conversão de resíduos e desperdícios em
sas certificadas no mundo2. Até 2003, foram con- subprodutos; redução do uso e do desperdício
cedidas 36.765 certificações, das quais apenas 645 de solventes, pinturas e outras substâncias quí-
(1,7%) correspondem a empresas situadas na micas, por meio de parcerias ou terceirização de
América do Sul. A maior parte delas pertence a serviços e reutilização de materiais, pela adoção
países de Europa (18.243) e Ásia (13.410), em de programas de retorno do produto. Atreladas
cujas sociedades há um maior grau de preocu- ao sistema de gestão ambiental, inovações ope-
4. 168
Barata, M. M. L. et al.
racionais e tecnológicas são incorporadas ao lon- levantamentos dos aspectos e impactos ambien-
go do ciclo de vida de empresas que atuam em tais ao longo do ciclo de vida da produção ou
setores variados - química, eletroeletrônica, alu- dos serviços prestados e o estabelecimento de
mínio, automóveis, entre outros - com resulta- planos de emergência.
dos positivos do ponto de vista econômico e Para a implementação da A3P, o MMA pro-
ambiental 7,8. Esses resultados raramente são põe: a criação de um grupo responsável pela Agen-
percebidos, a não ser de forma muito pontual, da na empresa, composto por servidores de vá-
pois as empresas carecem de mecanismos ade- rias áreas da instituição; a realização do diagnós-
quados para sua contabilização, razão pela qual tico da situação, identificando pontos críticos e
consideram onerosos os gastos incorridos com avaliando os impactos ambientais e desperdíci-
a gestão e as certificação ambientais. os; a elaboração do planejamento integrado, en-
volvendo o maior número de colaboradores e
áreas de trabalho; a definição de projetos e ativi-
A gestão ambiental dades, priorizando ações de maior urgência; a
na administração pública implementação das atividades programadas, re-
alizando treinamentos e disponibilizando recur-
A criação da Agenda Ambiental na Administra- sos físicos e financeiros; a avaliação e o monito-
ção Pública (A3P), no final de 1999, pelo Minis- ramento do desempenho ambiental, identifican-
tério do Meio Ambiente (MMA) e oficializada do avanços e deficiências; a busca de uma melho-
pela Portaria Nº 510/2002, vai ao encontro dos ria progressiva através da avaliação sistemática,
questionamentos expostos anteriormente sobre do replanejamento, da introdução de novas tec-
o número limitado de empresas do setor público nologias e da capacitação de funcionários.
certificadas pela ISO 14001. A Agenda pretende
instaurar um processo de construção de uma
nova cultura institucional na administração pú- O retorno econômico
blica, visando à conscientização dos servidores da implementação da gestão ambiental
para a otimização dos recursos para o combate
ao desperdício e para a busca de uma melhor No Brasil, algumas metodologias, como a adota-
qualidade do ambiente de trabalho9. Visa a colo- da pelo Programa de Produção Mais Limpa
car as empresas em sintonia com a concepção de (PmaisL) e a desenvolvida por Barata8, vêm con-
ecoeficiência, incluindo critérios socioambientais tribuindo para evidenciar os ganhos econômicos
nos investimentos, compras e contratações de provenientes da gestão ambiental nas empresas.
serviços dos órgãos governamentais. Tais metodologias apresentam o estudo da viabi-
Em novembro de 2005, haviam aderido à A3P, lidade econômica das ações necessárias para apri-
entre outras instituições: a Presidência da Repú- morar o desempenho ambiental das empresas,
blica, o Ministério da Defesa, o Ministério de contemplando a redução dos recursos naturais
Minas e Energia, o Ministério da Educação, o utilizados e da degradação ambiental.
Ministério da Saúde (Fundação Nacional de Saú- O PmaisL foi implantado, em 1995, pelo Cen-
de e Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o tro Nacional de Tecnologias Limpas do SENAI-
Ministério de Desenvolvimento Social, a Secre-
, RS, através de convênio estabelecido com o Pro-
taria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, a grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente
Procuradoria-Geral da República, o Supremo (UNEP) e a Organização das Nações Unidas para
Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça, o Desenvolvimento Industrial (UNIDO). A me-
o Tribunal Superior Eleitoral, a Polícia Federal, o todologia do Programa propõe que inicialmente
Tribunal de Contas da União, o Banco Regional se realizem diagnósticos sobre os seguintes as-
de Desenvolvimento do Extremo Sul, diversas pectos: 1) qualidade da gestão ambiental na em-
prefeituras municipais e o Serviço Brasileiro de presa, avaliando sua adequação às exigências
Apoio às Micro e Pequenas Empresas. ambientais legais e de boas práticas de saúde ocu-
Alguns dos procedimentos propostos são pacional; 2) equipamentos e das técnicas existen-
semelhantes aos da norma ISO 14001, não obs- tes para o controle, a redução na fonte e o moni-
tante, sua maior ênfase está na diminuição do toramento de emissões (gasosas, líquidas e sóli-
desperdício, através dos 3R´s, isto é: reduzir, reci- das); 3) capacitação da força de trabalho, bem
clar e reutilizar a quantidade de resíduos gera- como das possíveis práticas existentes aplicáveis
dos, sobretudo nos escritórios. Não são contem- para a redução no uso de recursos (energia, água
pladas estratégias indicadas pela ISO 14001 como: e matérias primas). Posteriormente, devem ser
5. 169
Ciência & Saúde Coletiva, 12(1):165-170, 2007
identificados os meios para solucionar as defici- biente era praticamente inexistente. Concluiu-se
ências diagnosticadas e as oportunidades exis- que o custo de manutenção da gestão ambiental
tentes para melhorar o desempenho ambiental nas empresas não ultrapassa 2% de seu custo
da empresa, ponderando custos e benefícios fi- total. Entre os benefícios diretos destacam-se: a
nanceiros decorrentes das ações oportunas da consultoria ambiental para outras unidades e
ecoeficiência. empresas e a venda de equipamentos desenvol-
Na primeira fase do Programa, a metodolo- vidos para preservar, proteger e recuperar o meio
gia foi aplicada em onze pequenas e médias em- ambiente. Quanto aos benefícios indiretos, so-
presas que investiram um total de R$ 220 mil e bressaem a redução de gastos propiciada pela
obtiveram ganhos financeiros da ordem de R$ maior eficiência no consumo de energia e água e
497 mil/ano, em face da redução na geração de no volume de resíduos tratados.
97 ton/ano de resíduos perigosos, no consumo Numa das empresas estudadas - que detin-
de matéria prima (120 ton/ano), de energia (1660 ha um passivo ambiental elevado devido à práti-
Mwh/ano) e de água (120 mil m3/ano) 10. As so- ca de enterrar os resíduos - houve inclusive uma
luções propostas nem sempre envolveram inves- articulação para fornecer serviços e resíduos a
timentos e, em muitos casos, representaram ape- terceiros que passaram a ser computados como
nas mudanças no processo operacional da em- receita direta. Essa mesma empresa empreendeu
presa e treinamento dos funcionários. esforço técnico e financeiro para a implantação
Em virtude dos resultados iniciais apresen- de estação de tratamento de resíduos industriais,
tados, o Programa foi ampliado, constituindo- evitando incorrer em gastos com medidas com-
se numa Rede de Produção Mais Limpa, com- pensatórias que somavam, em 2000, o montante
posta por entidades de apoio à indústria e ao de R$ 1.500.000,00, além de multas e pagamen-
comércio, instituições de ensino e pesquisa e or- tos de custas judiciais em decorrência do descar-
ganismos de financiamento, atuantes nos esta- te de efluentes líquidos fora dos padrões da Li-
dos da Bahia, Ceará, Mato Grosso, Minas Ge- cença de Operação. A implantação de uma ges-
rais, Pernambuco, Santa Catarina, Rio de Janei- tão ambiental, portanto, pode - dependendo da
ro e outros. atividade e de seu potencial gerador de passivo
Na proposta de Barata8, a gestão ambiental ambiental - evitar inclusive custos contingentes
permeia todos os setores e atividades da empre- expressivos.
sa. O conjunto da força de trabalho se torna res-
ponsável pelo desempenho ambiental na busca
da ecoeficiência e também na redução dos riscos Considerações finais
financeiros provenientes de externalidades am-
bientais negativas inerentes às atividades desen- As medidas adotadas para a redução dos impac-
volvidas. Esta metodologia baseia-se na percep- tos ambientais (presentes e futuros) - além de
ção de que, do ponto de vista gerencial, é funda- constituírem manifestações de responsabilidade
mental estabelecer comparações entre investimen- social das empresas – podem redundar em re-
tos necessários para controlar a degradação torno econômico. Para provar essa eficácia eco-
ambiental e custos potenciais da degradação pro- nômica, cabe ao responsável pela gestão ambi-
vocada, a curto, médio e longo prazo, seja na ental ultrapassar a lógica de mera despoluição e
recuperação ou mitigação dos impactos, seja na investir no desenvolvimento de novos produtos
forma de indenizações ou compensações à socie- geradores de receita; reduzir os custos de produ-
dade pelos danos causados. São efetuadas esti- ção, utilizando menos insumos ou introduzindo
mativas de gastos com a implantação dos proce- mudanças tecnológicas; melhorar o relaciona-
dimentos e das tecnologias condizentes para aten- mento com clientes e demais partes interessadas
dimento aos padrões legais e normativos e dos e diminuir custos contingentes. Os métodos pro-
possíveis custos e benefícios contingentes ou in- postos subsidiam na definição de projetos am-
tangíveis. bientais a serem mantidos, implantados ou en-
Essa metodologia foi aplicada em três em- cerrados e de atividades a serem priorizadas, vi-
presas localizadas no Estado do Rio de Janeiro, sando sempre a uma maior eficiência no desem-
cujo porte, setor de atuação, faturamento e siste- penho ambiental e econômico.
ma de custeio utilizado eram distintos, mas ti- As empresas e instituições do setor público,
nham sido instaladas num período em que o particularmente as que têm como missão direta
conhecimento preciso dos danos que as ativida- promover o bem-estar da sociedade, deveriam
des produtivas podiam ocasionar ao meio am- ser as primeiras a tomar a iniciativa de implantar
6. 170
Barata, M. M. L. et al.
um sistema eficiente de gestão ambiental. Aos dade com os requisitos ambientais legais, evitan-
fatores sociais associados à preservação ambi- do potenciais custos em compensação por da-
ental e à saúde da população, somam-se os efei- nos ambientais. Para que as mudanças pretendi-
tos da melhor utilização de recursos públicos, das por essa Agenda na cultura institucional pos-
pois a ecoeficiência se fundamenta na racionali- sam efetivar-se, é decisivo o engajamento do pró-
dade das decisões, na análise de custo e benefício prio servidor e de seus dirigentes. Caso contrá-
das medidas a serem implementadas. Seria de rio, a Agenda será mais um programa governa-
desejar, portanto, que a A3P atue em conformi- mental sem garantia de continuidade.
Colaboradores
MML Barata, DC Kligerman e C Minayo-Go-
mez participaram igualmente de todas as etapas
da elaboração do artigo.
Referências
1. Maimon D. Ensaios sobre economia do meio ambien- 7. Environmental Protection Agency. The Lean and
te. Rio de Janeiro: APED; 1992. Green Supply Chain: A Practical Guide for Materials
2. International Organization for Standardization. Managers and Supply Chain Managers to Reduce Costs
[acessado 2003 Dez 29]. Disponível em: http:// and Improve Environmental Performance. EUA; 2000.
www.iso.ch/isso/em/prods-services/otherspubs/ 8. Barata MML. Aplicação de uma estrutura contábil
pdf/survey13thcycle.pdf para apropriação dos custos ambientais e avaliação da
3. Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e sua influência no desempenho econômico das empre-
Qualidade Industrial. [acessado 2005 Fev 28]. Dis- sas [tese de doutorado]. Rio de Janeiro: COPPE/
ponível em: http://www.inmetro.gov.br UFRJ; 2001.
4. Barata MML. Gestão ambiental empresarial. II En- 9. Ministério do Meio Ambiente. [acessado 2005 Dez
contro Nacional da Sociedade Brasileira de Economia 07]. Disponível em: http://www.mma.gov.br
Ecológica: A economia ecológica e os instrumentos e 10. Centro Nacional de Tecnologias Limpas (CNTL).
políticas para uma sociedade sustentável. São Paulo; Resultados do Programa. Porto Alegre: CNTL/SE-
1997. NAI/UNIDO/UNEP; 1998.
5. Business Council for Sustainable Development. In-
ternalizing Environmental Costs to Promote Eco-
Efficiency – Draft Task Force Report. Genebra, 1993.
6. Holliday C, Schimidheiny S, Watts P. Cumprindo o Artigo apresentado em 20/01/2006
prometido: casos de sucesso de desenvolvimento sus- Aprovado em 16/06/2006
tentável. Rio de Janeiro: Campus; 2002. Versão final apresentada em 31/08/2006