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                              A gestão ambiental no setor público:




                                                                                                                                          OPINIÃO OPINION
                              uma questão de relevância social e econômica

                              Environmental management in the public sector:
                              a question of social and economic relevancy




Martha Macedo de Lima Barata 1
Débora Cynamon Kligerman 2
Carlos Minayo-Gomez 3




                              Abstract Discussing the need to implement an           Resumo Este texto apresenta uma discussão a
                              environmental management system in civil ser-          respeito da necessidade de implantar um sistema
                              vice entities, this paper offers a brief description   de gestão ambiental nos órgãos da administra-
                              of some management practices used by compa-            ção pública. Efetua-se breve descrição de práti-
                              nies in various sectors that are endeavoring to        cas gerenciais de empresas de setores variados
                              establish the best possible relationships between      que assumem o compromisso de estabelecer a
                              business activities, environmental issues and hu-      melhor relação possível entre atividade empre-
                              man needs, today and in the future. Some eco-          sarial, meio ambiente e necessidades humanas
                              nomic arguments are presented, including the           presentes e futuras. Expõem-se alguns argumen-
                              benefits obtained by private sector companies          tos de caráter econômico, referentes aos benefí-
                              adopting eco-efficiency criteria that are in them-     cios obtidos por iniciativas privadas que adota-
                              selves sufficient to justify the implementation of     ram critérios de ecoeficiência que, em si, seriam
                              an effective environmental management policy           suficientes para justificar a implantação de uma
                              in government institutions. The relevance is also      política efetiva de gestão ambiental nas institui-
                              stressed of drawing up the Civil Service Environ-      ções públicas. Destaca-se a relevância da criação
                              ment Agenda (A3P), striving to introduce a new         da Agenda Ambiental na Administração Públi-
                              cultural approach that will mobilize civil ser-        ca (A3P), que pretende instaurar uma nova cul-
                              vants in order to optimize resources, combating        tura institucional, visando à mobilização dos
                              waste and encouraging better work environments.        servidores para a otimização dos recursos, para
                              For this Agenda to be effective, civil servants and    o combate ao desperdício e para a busca de uma
1
  Diretoria do Instituto      managers must obviously be fully engaged.              melhor qualidade do ambiente de trabalho. Evi-
Oswaldo Cruz, Comissão        Key words Environmental management, Civil              dencia-se que para o êxito e efetivação da agen-
Interna de Gestão Ambiental
                              service, Eco-efficiency                                da será decisivo o grau de engajamento do pró-
do IOC- CIGAmb,
Fundação Oswaldo Cruz. Av.                                                           prio servidor e de seus dirigentes.
Brasil 4365 Pavilhão                                                                 Palavras-chave Gestão ambiental, Administra-
Gomes de Faria 203,
                                                                                     ção pública, Ecoeficiência
Manguinhos. 21045-900
Rio de Janeiro RJ.
barata@ioc.fiocruz.br
2
  Fiocruz. Escola Nacional
de Saúde Pública.
3
  Fiocruz. Escola Nacional
de Saúde Pública
166
Barata, M. M. L. et al.




                          Introdução                                             atuar em conformidade com os procedimentos e
                                                                                 padrões legais. Entretanto, a ocorrência de aci-
                          Ao longo da década de 90 do século 20, foram           dentes ambientais – como o incidente na Allied
                          implementados nas empresas instrumentos de             Quemical Corporation, em Hopewell, Virgínia
                          gestão ambiental para o controle e a prevenção         (EUA), em 1975; a explosão química da Hoffman-
                          de danos ambientais, a fim de responder com            La Roche, em Seveso (Itália), em 1976; o vaza-
                          maior eficiência às atuais demandas do merca-          mento de gases tóxicos numa fábrica de pestici-
                          do. Diversos instrumentos, desenvolvidos para          da da Union Carbide em Bhopal (Índia), em 1984;
                          melhorar seu desempenho ambiental, redunda-            a explosão de reator nuclear em Chernobyl, na
                          ram numa série de vantagens econômicas: redu-          então União Soviética, em 1986; o vazamento de
                          ção de custos, aumento de competitividade, aber-       petróleo, em 1990, do navio petroleiro Exxon
                          tura de novos mercados e diminuição das chan-          Valdez e o caso emblemático Love Canal, no es-
                                                                                                                           ,
                          ces de serem surpreendidas por algum tipo de           tado de Nova York, um símbolo de contamina-
                          ônus imprevisível e indesejável.                       ção do solo por resíduos sólidos enterrados -
                              Tais argumentos de caráter econômico, por          obrigou as empresas a arcarem com elevados
                          si só, já seriam suficientes para fundamentar a        gastos em indenizações, recuperação dos ambi-
                          necessidade de que os órgãos da administração          entes danificados e ações para mitigação e/ou
                          pública – e, mais ainda, os do setor de saúde -        controle dos danos. Além disso, a imagem das
                          assumissem o compromisso de velar pela con-            empresas causadoras do dano foi afetada nega-
                          servação dos recursos naturais e a qualidade do        tivamente. Frente a esse quadro, empresas com
                          meio ambiente. No entanto, instituições públi-         maior potencial poluidor passaram a desenvol-
                          cas que atuam no campo da pesquisa e da pres-          ver e implementar instrumentos de gestão ambi-
                          tação de serviços biomédicos ainda carecem de          ental corporativa para a melhoria do fluxo de
                          uma política efetiva de gestão ambiental. Mesmo        informação, interno e externo, além de propiciar
                          executando serviços essenciais à sociedade, apre-      a redução de risco de incidentes e acidentes.
                          sentam potencial poluidor capaz de causar da-              O setor químico foi o pioneiro na elaboração
                          nos à saúde de seus trabalhadores e à população        de diretrizes para a gestão ambiental corporati-
                          localizada em seu entorno, além de contaminar          va. A Canadian Chemical Producers Association
                          o solo, a atmosfera, os rios e os lençóis freáticos.   (CCPA) lançou, em 1984, um documento deno-
                                                                                 minado Statement of Responsible Care and Gui-
                                                                                 ding Principles, contendo princípios específicos
                          Antecedentes históricos                                para a gestão responsável do processo de produ-
                          da gestão ambiental corporativa                        ção em todo o ciclo de vida do produto, dando
                                                                                 ênfase à proteção da saúde humana e do meio
                          A constatação, ao final da década de 60 do sécu-       ambiente e à segurança industrial e do produto.
                          lo passado, de que a capacidade assimilativa dos       O documento, além de detalhar as iniciativas que
                          ecossistemas e de regeneração dos recursos na-         as empresas precisam tomar para atender aos
                          turais ocorria a taxas incompatíveis com o des-        princípios do Responsible Care, destaca a necessi-
                          gaste imposto à natureza, contribuiu para rea-         dade de comprometimento de todos os envolvi-
                          tivar o questionamento clássico, em particular         dos na produção, na distribuição e no recebi-
                          o malthusiano, acerca da compatibilidade no            mento dos produtos das respectivas empresas,
                          longo prazo entre o crescimento e a demogra-           assim como da troca permanente de informa-
                          fia, nos limites do patrimônio cultural fixo1. Em      ções com a comunidade vizinha. A adoção desses
                          1971, o Clube de Roma, por meio de modelos             princípios em vários outros países, como EUA,
                          econométricos, previu o esgotamento dos re-            Inglaterra e Brasil, contribuiu para resgatar uma
                          cursos renováveis e não renováveis em face do          imagem mais positiva da indústria química pe-
                          modelo de crescimento, do padrão tecnológico           rante a opinião pública. Este tipo de ação coor-
                          e da estrutura da demanda. Seus resultados re-         denada, envolvendo grande número de empre-
                          ativaram o debate acadêmico e político-institu-        sas de um segmento industrial, seria, sob a ótica
                          cional, conduzindo à aspiração ao desenvolvi-          da gestão ambiental, um importante exemplo de
                          mento sustentável.                                     estratégia cooperativa que, devido ao seu caráter
                               Nos primórdios, os setores produtivos limi-       pioneiro e a sua abrangência, viriam a ser segui-
                          tavam-se, em alguns casos, a adotar as medidas         dos, nos EUA, por diversos outros setores, em
                          necessárias para evitar a paralisação de suas ati-     especial, pela indústria do petróleo.
                          vidades ou o recebimento de multas, por não                Em face da crescente importância dada à pro-
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                                                                                                             Ciência & Saúde Coletiva, 12(1):165-170, 2007
teção ambiental e com o objetivo de harmonizar         pação ambiental e têm-se desenvolvido tecnolo-
globalmente os procedimentos de gestão ambi-           gias menos poluentes. No Brasil, até essa data, o
ental empresarial, sem privilegiar determinados        número de certificações era de 570, o que repre-
setores ou países, foram criados, em 1994, no          senta 88,37% do total das concedidas na América
âmbito da International Standard Organization          Latina. A média anual vem se mantendo em tor-
(ISO), grupos de trabalho para o desenvolvimen-        no de 200, ao longo deste milênio, um número
to de normas, contendo diretrizes aplicáveis aos       ainda relativamente pequeno, considerando o
diferentes setores produtivos e regiões que possi-     total de empresas em atividade no país, mas re-
bilitem uma gestão e um produto com “qualida-          velador de uma mudança significativa quando
de ambiental”. Em 1996, foram aprovadas e pu-          comparado com a situação anterior a 2001, em
blicadas as normas ISO 14001 e ISO 14004.              que as empresas certificadas eram apenas 120.
    Na norma ISO 14001 - revisada e publicada              Observa-se que entre as empresas certifica-
nova versão, em 2000 - encontram-se especifica-        das apenas duas são do setor público, quatro se
dos os requisitos gerenciais para estabelecer um       dedicam à preparação farmacêutica e à atenção
Sistema de Gestão Ambiental (SGA) e obter a            médico-hospitalar e dez atuam na área de saúde
certificação, nos mais diversos tipos de organi-       e de serviços3. Esses dados são reveladores do
zações - respeitadas suas especificidades setori-      pouco empenho de empresas do setor público -
ais, geográficas, culturais e econômicas. Nela,
                                            .          sobretudo as que oferecem assistência médico-
estão sistematizados os procedimentos necessá-         hospitalar – em entrar num nível de gestão am-
rios para a definição dos princípios norteadores       biental pautada por parâmetros garantidos e
da política ambiental da empresa. Além de indi-        comparáveis internacionalmente. Uma explica-
car - com base na política definida - a forma          ção cabível desse desinteresse estaria na falta de
como serão planejadas e implementadas as ações,        evidência sobre as efetivas vantagens econômi-
fixam-se os prazos e os recursos necessários para      cas que a certificação proporcionaria às empre-
sua operacionalização, assim como os meios             sas de diferentes setores, tamanhos e localiza-
para verificar a eficiência e eficácia do planeja-     ções, considerando os custos do processo e dos
mento previsto e das ações implementadas, o que        procedimentos necessários para a aplicação da
permite realizar - sempre que necessário - a cor-      norma. Conseqüentemente, as empresas públi-
reção de rumos para o atendimento aos princí-          cas só solicitariam a certificação quando impeli-
pios contidos na política. A norma também esta-        das por exigências do mercado ou de determina-
belece que a alta direção da organização deverá        dos atores sociais4.
submeter-se periodicamente a revisões numa                 O SGA, no entanto, contribui para a ecoefici-
busca contínua de aperfeiçoar seu desempenho           ência das empresas, enquanto prática de produ-
ambiental.                                             zir sempre bens e serviços mais úteis, concomi-
    A certificação da empresa, pela norma ISO          tantemente à redução contínua do consumo de
14001, assegura a todas as partes interessadas (cli-   recursos e da poluição5, 6, o que traduz a preocu-
entes, fornecedores, acionistas, força de trabalho,    pação em estabelecer a melhor relação possível
comunidade, governo e organizações não gover-          entre atividade empresarial, meio ambiente e ne-
namentais, dentre outras) que as práticas gerenci-     cessidades humanas presentes e futuras. Sob essa
ais para a manutenção e melhoria do seu desem-         ótica, empresas de todos os tamanhos estariam
penho ambiental se ajustam ao estabelecido na          aprimorando suas cadeias produtivas, incorpo-
norma, independente do setor e/ou local onde a         rando ações que conduzem à melhoria do de-
empresa esteja atuando. Em outras palavras, este       sempenho ambiental. Alguns desses avanços con-
instrumento propicia a transparência e a unidade       sistem na redução da obsolescência e da perda
no fluxo de informações para o público interno e       da manutenção, reparo e operação (MRO) de
externo das empresas sobre os procedimentos de         materiais, através de práticas de gestão de esto-
gestão ambiental aplicados por elas.                   ques; decréscimo substancial de custos com so-
    A relevância deste instrumento pode ser cons-      bras e perdas de materiais; aumento de receitas
tatada pela quantidade e diversidade de empre-         com a conversão de resíduos e desperdícios em
sas certificadas no mundo2. Até 2003, foram con-       subprodutos; redução do uso e do desperdício
cedidas 36.765 certificações, das quais apenas 645     de solventes, pinturas e outras substâncias quí-
(1,7%) correspondem a empresas situadas na             micas, por meio de parcerias ou terceirização de
América do Sul. A maior parte delas pertence a         serviços e reutilização de materiais, pela adoção
países de Europa (18.243) e Ásia (13.410), em          de programas de retorno do produto. Atreladas
cujas sociedades há um maior grau de preocu-           ao sistema de gestão ambiental, inovações ope-
168
Barata, M. M. L. et al.




                          racionais e tecnológicas são incorporadas ao lon-       levantamentos dos aspectos e impactos ambien-
                          go do ciclo de vida de empresas que atuam em            tais ao longo do ciclo de vida da produção ou
                          setores variados - química, eletroeletrônica, alu-      dos serviços prestados e o estabelecimento de
                          mínio, automóveis, entre outros - com resulta-          planos de emergência.
                          dos positivos do ponto de vista econômico e                 Para a implementação da A3P, o MMA pro-
                          ambiental 7,8. Esses resultados raramente são           põe: a criação de um grupo responsável pela Agen-
                          percebidos, a não ser de forma muito pontual,           da na empresa, composto por servidores de vá-
                          pois as empresas carecem de mecanismos ade-             rias áreas da instituição; a realização do diagnós-
                          quados para sua contabilização, razão pela qual         tico da situação, identificando pontos críticos e
                          consideram onerosos os gastos incorridos com            avaliando os impactos ambientais e desperdíci-
                          a gestão e as certificação ambientais.                  os; a elaboração do planejamento integrado, en-
                                                                                  volvendo o maior número de colaboradores e
                                                                                  áreas de trabalho; a definição de projetos e ativi-
                          A gestão ambiental                                      dades, priorizando ações de maior urgência; a
                          na administração pública                                implementação das atividades programadas, re-
                                                                                  alizando treinamentos e disponibilizando recur-
                          A criação da Agenda Ambiental na Administra-            sos físicos e financeiros; a avaliação e o monito-
                          ção Pública (A3P), no final de 1999, pelo Minis-        ramento do desempenho ambiental, identifican-
                          tério do Meio Ambiente (MMA) e oficializada             do avanços e deficiências; a busca de uma melho-
                          pela Portaria Nº 510/2002, vai ao encontro dos          ria progressiva através da avaliação sistemática,
                          questionamentos expostos anteriormente sobre            do replanejamento, da introdução de novas tec-
                          o número limitado de empresas do setor público          nologias e da capacitação de funcionários.
                          certificadas pela ISO 14001. A Agenda pretende
                          instaurar um processo de construção de uma
                          nova cultura institucional na administração pú-         O retorno econômico
                          blica, visando à conscientização dos servidores         da implementação da gestão ambiental
                          para a otimização dos recursos para o combate
                          ao desperdício e para a busca de uma melhor             No Brasil, algumas metodologias, como a adota-
                          qualidade do ambiente de trabalho9. Visa a colo-        da pelo Programa de Produção Mais Limpa
                          car as empresas em sintonia com a concepção de          (PmaisL) e a desenvolvida por Barata8, vêm con-
                          ecoeficiência, incluindo critérios socioambientais      tribuindo para evidenciar os ganhos econômicos
                          nos investimentos, compras e contratações de            provenientes da gestão ambiental nas empresas.
                          serviços dos órgãos governamentais.                     Tais metodologias apresentam o estudo da viabi-
                              Em novembro de 2005, haviam aderido à A3P,          lidade econômica das ações necessárias para apri-
                          entre outras instituições: a Presidência da Repú-       morar o desempenho ambiental das empresas,
                          blica, o Ministério da Defesa, o Ministério de          contemplando a redução dos recursos naturais
                          Minas e Energia, o Ministério da Educação, o            utilizados e da degradação ambiental.
                          Ministério da Saúde (Fundação Nacional de Saú-              O PmaisL foi implantado, em 1995, pelo Cen-
                          de e Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o       tro Nacional de Tecnologias Limpas do SENAI-
                          Ministério de Desenvolvimento Social, a Secre-
                                                                    ,             RS, através de convênio estabelecido com o Pro-
                          taria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, a           grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente
                          Procuradoria-Geral da República, o Supremo              (UNEP) e a Organização das Nações Unidas para
                          Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça,       o Desenvolvimento Industrial (UNIDO). A me-
                          o Tribunal Superior Eleitoral, a Polícia Federal, o     todologia do Programa propõe que inicialmente
                          Tribunal de Contas da União, o Banco Regional           se realizem diagnósticos sobre os seguintes as-
                          de Desenvolvimento do Extremo Sul, diversas             pectos: 1) qualidade da gestão ambiental na em-
                          prefeituras municipais e o Serviço Brasileiro de        presa, avaliando sua adequação às exigências
                          Apoio às Micro e Pequenas Empresas.                     ambientais legais e de boas práticas de saúde ocu-
                              Alguns dos procedimentos propostos são              pacional; 2) equipamentos e das técnicas existen-
                          semelhantes aos da norma ISO 14001, não obs-            tes para o controle, a redução na fonte e o moni-
                          tante, sua maior ênfase está na diminuição do           toramento de emissões (gasosas, líquidas e sóli-
                          desperdício, através dos 3R´s, isto é: reduzir, reci-   das); 3) capacitação da força de trabalho, bem
                          clar e reutilizar a quantidade de resíduos gera-        como das possíveis práticas existentes aplicáveis
                          dos, sobretudo nos escritórios. Não são contem-         para a redução no uso de recursos (energia, água
                          pladas estratégias indicadas pela ISO 14001 como:       e matérias primas). Posteriormente, devem ser
169




                                                                                                           Ciência & Saúde Coletiva, 12(1):165-170, 2007
identificados os meios para solucionar as defici-    biente era praticamente inexistente. Concluiu-se
ências diagnosticadas e as oportunidades exis-       que o custo de manutenção da gestão ambiental
tentes para melhorar o desempenho ambiental          nas empresas não ultrapassa 2% de seu custo
da empresa, ponderando custos e benefícios fi-       total. Entre os benefícios diretos destacam-se: a
nanceiros decorrentes das ações oportunas da         consultoria ambiental para outras unidades e
ecoeficiência.                                       empresas e a venda de equipamentos desenvol-
     Na primeira fase do Programa, a metodolo-       vidos para preservar, proteger e recuperar o meio
gia foi aplicada em onze pequenas e médias em-       ambiente. Quanto aos benefícios indiretos, so-
presas que investiram um total de R$ 220 mil e       bressaem a redução de gastos propiciada pela
obtiveram ganhos financeiros da ordem de R$          maior eficiência no consumo de energia e água e
497 mil/ano, em face da redução na geração de        no volume de resíduos tratados.
97 ton/ano de resíduos perigosos, no consumo              Numa das empresas estudadas - que detin-
de matéria prima (120 ton/ano), de energia (1660     ha um passivo ambiental elevado devido à práti-
Mwh/ano) e de água (120 mil m3/ano) 10. As so-       ca de enterrar os resíduos - houve inclusive uma
luções propostas nem sempre envolveram inves-        articulação para fornecer serviços e resíduos a
timentos e, em muitos casos, representaram ape-      terceiros que passaram a ser computados como
nas mudanças no processo operacional da em-          receita direta. Essa mesma empresa empreendeu
presa e treinamento dos funcionários.                esforço técnico e financeiro para a implantação
    Em virtude dos resultados iniciais apresen-      de estação de tratamento de resíduos industriais,
tados, o Programa foi ampliado, constituindo-        evitando incorrer em gastos com medidas com-
se numa Rede de Produção Mais Limpa, com-            pensatórias que somavam, em 2000, o montante
posta por entidades de apoio à indústria e ao        de R$ 1.500.000,00, além de multas e pagamen-
comércio, instituições de ensino e pesquisa e or-    tos de custas judiciais em decorrência do descar-
ganismos de financiamento, atuantes nos esta-        te de efluentes líquidos fora dos padrões da Li-
dos da Bahia, Ceará, Mato Grosso, Minas Ge-          cença de Operação. A implantação de uma ges-
rais, Pernambuco, Santa Catarina, Rio de Janei-      tão ambiental, portanto, pode - dependendo da
ro e outros.                                         atividade e de seu potencial gerador de passivo
    Na proposta de Barata8, a gestão ambiental       ambiental - evitar inclusive custos contingentes
permeia todos os setores e atividades da empre-      expressivos.
sa. O conjunto da força de trabalho se torna res-
ponsável pelo desempenho ambiental na busca
da ecoeficiência e também na redução dos riscos      Considerações finais
financeiros provenientes de externalidades am-
bientais negativas inerentes às atividades desen-    As medidas adotadas para a redução dos impac-
volvidas. Esta metodologia baseia-se na percep-      tos ambientais (presentes e futuros) - além de
ção de que, do ponto de vista gerencial, é funda-    constituírem manifestações de responsabilidade
mental estabelecer comparações entre investimen-     social das empresas – podem redundar em re-
tos necessários para controlar a degradação          torno econômico. Para provar essa eficácia eco-
ambiental e custos potenciais da degradação pro-     nômica, cabe ao responsável pela gestão ambi-
vocada, a curto, médio e longo prazo, seja na        ental ultrapassar a lógica de mera despoluição e
recuperação ou mitigação dos impactos, seja na       investir no desenvolvimento de novos produtos
forma de indenizações ou compensações à socie-       geradores de receita; reduzir os custos de produ-
dade pelos danos causados. São efetuadas esti-       ção, utilizando menos insumos ou introduzindo
mativas de gastos com a implantação dos proce-       mudanças tecnológicas; melhorar o relaciona-
dimentos e das tecnologias condizentes para aten-    mento com clientes e demais partes interessadas
dimento aos padrões legais e normativos e dos        e diminuir custos contingentes. Os métodos pro-
possíveis custos e benefícios contingentes ou in-    postos subsidiam na definição de projetos am-
tangíveis.                                           bientais a serem mantidos, implantados ou en-
    Essa metodologia foi aplicada em três em-        cerrados e de atividades a serem priorizadas, vi-
presas localizadas no Estado do Rio de Janeiro,      sando sempre a uma maior eficiência no desem-
cujo porte, setor de atuação, faturamento e siste-   penho ambiental e econômico.
ma de custeio utilizado eram distintos, mas ti-          As empresas e instituições do setor público,
nham sido instaladas num período em que o            particularmente as que têm como missão direta
conhecimento preciso dos danos que as ativida-       promover o bem-estar da sociedade, deveriam
des produtivas podiam ocasionar ao meio am-          ser as primeiras a tomar a iniciativa de implantar
170
Barata, M. M. L. et al.




                          um sistema eficiente de gestão ambiental. Aos               dade com os requisitos ambientais legais, evitan-
                          fatores sociais associados à preservação ambi-              do potenciais custos em compensação por da-
                          ental e à saúde da população, somam-se os efei-             nos ambientais. Para que as mudanças pretendi-
                          tos da melhor utilização de recursos públicos,              das por essa Agenda na cultura institucional pos-
                          pois a ecoeficiência se fundamenta na racionali-            sam efetivar-se, é decisivo o engajamento do pró-
                          dade das decisões, na análise de custo e benefício          prio servidor e de seus dirigentes. Caso contrá-
                          das medidas a serem implementadas. Seria de                 rio, a Agenda será mais um programa governa-
                          desejar, portanto, que a A3P atue em conformi-              mental sem garantia de continuidade.




                          Colaboradores

                          MML Barata, DC Kligerman e C Minayo-Go-
                          mez participaram igualmente de todas as etapas
                          da elaboração do artigo.




                          Referências
                          1.   Maimon D. Ensaios sobre economia do meio ambien-       7.  Environmental Protection Agency. The Lean and
                               te. Rio de Janeiro: APED; 1992.                            Green Supply Chain: A Practical Guide for Materials
                          2.   International Organization for Standardization.            Managers and Supply Chain Managers to Reduce Costs
                               [acessado 2003 Dez 29]. Disponível em: http://             and Improve Environmental Performance. EUA; 2000.
                               www.iso.ch/isso/em/prods-services/otherspubs/          8. Barata MML. Aplicação de uma estrutura contábil
                               pdf/survey13thcycle.pdf                                    para apropriação dos custos ambientais e avaliação da
                          3.   Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e           sua influência no desempenho econômico das empre-
                               Qualidade Industrial. [acessado 2005 Fev 28]. Dis-         sas [tese de doutorado]. Rio de Janeiro: COPPE/
                               ponível em: http://www.inmetro.gov.br                      UFRJ; 2001.
                          4.   Barata MML. Gestão ambiental empresarial. II En-       9. Ministério do Meio Ambiente. [acessado 2005 Dez
                               contro Nacional da Sociedade Brasileira de Economia        07]. Disponível em: http://www.mma.gov.br
                               Ecológica: A economia ecológica e os instrumentos e    10. Centro Nacional de Tecnologias Limpas (CNTL).
                               políticas para uma sociedade sustentável. São Paulo;       Resultados do Programa. Porto Alegre: CNTL/SE-
                               1997.                                                      NAI/UNIDO/UNEP; 1998.
                          5.   Business Council for Sustainable Development. In-
                               ternalizing Environmental Costs to Promote Eco-
                               Efficiency – Draft Task Force Report. Genebra, 1993.
                          6.   Holliday C, Schimidheiny S, Watts P. Cumprindo o       Artigo apresentado em 20/01/2006
                               prometido: casos de sucesso de desenvolvimento sus-    Aprovado em 16/06/2006
                               tentável. Rio de Janeiro: Campus; 2002.                Versão final apresentada em 31/08/2006

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Gestão ambiental no setor público: uma questão de relevância

  • 1. 165 A gestão ambiental no setor público: OPINIÃO OPINION uma questão de relevância social e econômica Environmental management in the public sector: a question of social and economic relevancy Martha Macedo de Lima Barata 1 Débora Cynamon Kligerman 2 Carlos Minayo-Gomez 3 Abstract Discussing the need to implement an Resumo Este texto apresenta uma discussão a environmental management system in civil ser- respeito da necessidade de implantar um sistema vice entities, this paper offers a brief description de gestão ambiental nos órgãos da administra- of some management practices used by compa- ção pública. Efetua-se breve descrição de práti- nies in various sectors that are endeavoring to cas gerenciais de empresas de setores variados establish the best possible relationships between que assumem o compromisso de estabelecer a business activities, environmental issues and hu- melhor relação possível entre atividade empre- man needs, today and in the future. Some eco- sarial, meio ambiente e necessidades humanas nomic arguments are presented, including the presentes e futuras. Expõem-se alguns argumen- benefits obtained by private sector companies tos de caráter econômico, referentes aos benefí- adopting eco-efficiency criteria that are in them- cios obtidos por iniciativas privadas que adota- selves sufficient to justify the implementation of ram critérios de ecoeficiência que, em si, seriam an effective environmental management policy suficientes para justificar a implantação de uma in government institutions. The relevance is also política efetiva de gestão ambiental nas institui- stressed of drawing up the Civil Service Environ- ções públicas. Destaca-se a relevância da criação ment Agenda (A3P), striving to introduce a new da Agenda Ambiental na Administração Públi- cultural approach that will mobilize civil ser- ca (A3P), que pretende instaurar uma nova cul- vants in order to optimize resources, combating tura institucional, visando à mobilização dos waste and encouraging better work environments. servidores para a otimização dos recursos, para For this Agenda to be effective, civil servants and o combate ao desperdício e para a busca de uma 1 Diretoria do Instituto managers must obviously be fully engaged. melhor qualidade do ambiente de trabalho. Evi- Oswaldo Cruz, Comissão Key words Environmental management, Civil dencia-se que para o êxito e efetivação da agen- Interna de Gestão Ambiental service, Eco-efficiency da será decisivo o grau de engajamento do pró- do IOC- CIGAmb, Fundação Oswaldo Cruz. Av. prio servidor e de seus dirigentes. Brasil 4365 Pavilhão Palavras-chave Gestão ambiental, Administra- Gomes de Faria 203, ção pública, Ecoeficiência Manguinhos. 21045-900 Rio de Janeiro RJ. barata@ioc.fiocruz.br 2 Fiocruz. Escola Nacional de Saúde Pública. 3 Fiocruz. Escola Nacional de Saúde Pública
  • 2. 166 Barata, M. M. L. et al. Introdução atuar em conformidade com os procedimentos e padrões legais. Entretanto, a ocorrência de aci- Ao longo da década de 90 do século 20, foram dentes ambientais – como o incidente na Allied implementados nas empresas instrumentos de Quemical Corporation, em Hopewell, Virgínia gestão ambiental para o controle e a prevenção (EUA), em 1975; a explosão química da Hoffman- de danos ambientais, a fim de responder com La Roche, em Seveso (Itália), em 1976; o vaza- maior eficiência às atuais demandas do merca- mento de gases tóxicos numa fábrica de pestici- do. Diversos instrumentos, desenvolvidos para da da Union Carbide em Bhopal (Índia), em 1984; melhorar seu desempenho ambiental, redunda- a explosão de reator nuclear em Chernobyl, na ram numa série de vantagens econômicas: redu- então União Soviética, em 1986; o vazamento de ção de custos, aumento de competitividade, aber- petróleo, em 1990, do navio petroleiro Exxon tura de novos mercados e diminuição das chan- Valdez e o caso emblemático Love Canal, no es- , ces de serem surpreendidas por algum tipo de tado de Nova York, um símbolo de contamina- ônus imprevisível e indesejável. ção do solo por resíduos sólidos enterrados - Tais argumentos de caráter econômico, por obrigou as empresas a arcarem com elevados si só, já seriam suficientes para fundamentar a gastos em indenizações, recuperação dos ambi- necessidade de que os órgãos da administração entes danificados e ações para mitigação e/ou pública – e, mais ainda, os do setor de saúde - controle dos danos. Além disso, a imagem das assumissem o compromisso de velar pela con- empresas causadoras do dano foi afetada nega- servação dos recursos naturais e a qualidade do tivamente. Frente a esse quadro, empresas com meio ambiente. No entanto, instituições públi- maior potencial poluidor passaram a desenvol- cas que atuam no campo da pesquisa e da pres- ver e implementar instrumentos de gestão ambi- tação de serviços biomédicos ainda carecem de ental corporativa para a melhoria do fluxo de uma política efetiva de gestão ambiental. Mesmo informação, interno e externo, além de propiciar executando serviços essenciais à sociedade, apre- a redução de risco de incidentes e acidentes. sentam potencial poluidor capaz de causar da- O setor químico foi o pioneiro na elaboração nos à saúde de seus trabalhadores e à população de diretrizes para a gestão ambiental corporati- localizada em seu entorno, além de contaminar va. A Canadian Chemical Producers Association o solo, a atmosfera, os rios e os lençóis freáticos. (CCPA) lançou, em 1984, um documento deno- minado Statement of Responsible Care and Gui- ding Principles, contendo princípios específicos Antecedentes históricos para a gestão responsável do processo de produ- da gestão ambiental corporativa ção em todo o ciclo de vida do produto, dando ênfase à proteção da saúde humana e do meio A constatação, ao final da década de 60 do sécu- ambiente e à segurança industrial e do produto. lo passado, de que a capacidade assimilativa dos O documento, além de detalhar as iniciativas que ecossistemas e de regeneração dos recursos na- as empresas precisam tomar para atender aos turais ocorria a taxas incompatíveis com o des- princípios do Responsible Care, destaca a necessi- gaste imposto à natureza, contribuiu para rea- dade de comprometimento de todos os envolvi- tivar o questionamento clássico, em particular dos na produção, na distribuição e no recebi- o malthusiano, acerca da compatibilidade no mento dos produtos das respectivas empresas, longo prazo entre o crescimento e a demogra- assim como da troca permanente de informa- fia, nos limites do patrimônio cultural fixo1. Em ções com a comunidade vizinha. A adoção desses 1971, o Clube de Roma, por meio de modelos princípios em vários outros países, como EUA, econométricos, previu o esgotamento dos re- Inglaterra e Brasil, contribuiu para resgatar uma cursos renováveis e não renováveis em face do imagem mais positiva da indústria química pe- modelo de crescimento, do padrão tecnológico rante a opinião pública. Este tipo de ação coor- e da estrutura da demanda. Seus resultados re- denada, envolvendo grande número de empre- ativaram o debate acadêmico e político-institu- sas de um segmento industrial, seria, sob a ótica cional, conduzindo à aspiração ao desenvolvi- da gestão ambiental, um importante exemplo de mento sustentável. estratégia cooperativa que, devido ao seu caráter Nos primórdios, os setores produtivos limi- pioneiro e a sua abrangência, viriam a ser segui- tavam-se, em alguns casos, a adotar as medidas dos, nos EUA, por diversos outros setores, em necessárias para evitar a paralisação de suas ati- especial, pela indústria do petróleo. vidades ou o recebimento de multas, por não Em face da crescente importância dada à pro-
  • 3. 167 Ciência & Saúde Coletiva, 12(1):165-170, 2007 teção ambiental e com o objetivo de harmonizar pação ambiental e têm-se desenvolvido tecnolo- globalmente os procedimentos de gestão ambi- gias menos poluentes. No Brasil, até essa data, o ental empresarial, sem privilegiar determinados número de certificações era de 570, o que repre- setores ou países, foram criados, em 1994, no senta 88,37% do total das concedidas na América âmbito da International Standard Organization Latina. A média anual vem se mantendo em tor- (ISO), grupos de trabalho para o desenvolvimen- no de 200, ao longo deste milênio, um número to de normas, contendo diretrizes aplicáveis aos ainda relativamente pequeno, considerando o diferentes setores produtivos e regiões que possi- total de empresas em atividade no país, mas re- bilitem uma gestão e um produto com “qualida- velador de uma mudança significativa quando de ambiental”. Em 1996, foram aprovadas e pu- comparado com a situação anterior a 2001, em blicadas as normas ISO 14001 e ISO 14004. que as empresas certificadas eram apenas 120. Na norma ISO 14001 - revisada e publicada Observa-se que entre as empresas certifica- nova versão, em 2000 - encontram-se especifica- das apenas duas são do setor público, quatro se dos os requisitos gerenciais para estabelecer um dedicam à preparação farmacêutica e à atenção Sistema de Gestão Ambiental (SGA) e obter a médico-hospitalar e dez atuam na área de saúde certificação, nos mais diversos tipos de organi- e de serviços3. Esses dados são reveladores do zações - respeitadas suas especificidades setori- pouco empenho de empresas do setor público - ais, geográficas, culturais e econômicas. Nela, . sobretudo as que oferecem assistência médico- estão sistematizados os procedimentos necessá- hospitalar – em entrar num nível de gestão am- rios para a definição dos princípios norteadores biental pautada por parâmetros garantidos e da política ambiental da empresa. Além de indi- comparáveis internacionalmente. Uma explica- car - com base na política definida - a forma ção cabível desse desinteresse estaria na falta de como serão planejadas e implementadas as ações, evidência sobre as efetivas vantagens econômi- fixam-se os prazos e os recursos necessários para cas que a certificação proporcionaria às empre- sua operacionalização, assim como os meios sas de diferentes setores, tamanhos e localiza- para verificar a eficiência e eficácia do planeja- ções, considerando os custos do processo e dos mento previsto e das ações implementadas, o que procedimentos necessários para a aplicação da permite realizar - sempre que necessário - a cor- norma. Conseqüentemente, as empresas públi- reção de rumos para o atendimento aos princí- cas só solicitariam a certificação quando impeli- pios contidos na política. A norma também esta- das por exigências do mercado ou de determina- belece que a alta direção da organização deverá dos atores sociais4. submeter-se periodicamente a revisões numa O SGA, no entanto, contribui para a ecoefici- busca contínua de aperfeiçoar seu desempenho ência das empresas, enquanto prática de produ- ambiental. zir sempre bens e serviços mais úteis, concomi- A certificação da empresa, pela norma ISO tantemente à redução contínua do consumo de 14001, assegura a todas as partes interessadas (cli- recursos e da poluição5, 6, o que traduz a preocu- entes, fornecedores, acionistas, força de trabalho, pação em estabelecer a melhor relação possível comunidade, governo e organizações não gover- entre atividade empresarial, meio ambiente e ne- namentais, dentre outras) que as práticas gerenci- cessidades humanas presentes e futuras. Sob essa ais para a manutenção e melhoria do seu desem- ótica, empresas de todos os tamanhos estariam penho ambiental se ajustam ao estabelecido na aprimorando suas cadeias produtivas, incorpo- norma, independente do setor e/ou local onde a rando ações que conduzem à melhoria do de- empresa esteja atuando. Em outras palavras, este sempenho ambiental. Alguns desses avanços con- instrumento propicia a transparência e a unidade sistem na redução da obsolescência e da perda no fluxo de informações para o público interno e da manutenção, reparo e operação (MRO) de externo das empresas sobre os procedimentos de materiais, através de práticas de gestão de esto- gestão ambiental aplicados por elas. ques; decréscimo substancial de custos com so- A relevância deste instrumento pode ser cons- bras e perdas de materiais; aumento de receitas tatada pela quantidade e diversidade de empre- com a conversão de resíduos e desperdícios em sas certificadas no mundo2. Até 2003, foram con- subprodutos; redução do uso e do desperdício cedidas 36.765 certificações, das quais apenas 645 de solventes, pinturas e outras substâncias quí- (1,7%) correspondem a empresas situadas na micas, por meio de parcerias ou terceirização de América do Sul. A maior parte delas pertence a serviços e reutilização de materiais, pela adoção países de Europa (18.243) e Ásia (13.410), em de programas de retorno do produto. Atreladas cujas sociedades há um maior grau de preocu- ao sistema de gestão ambiental, inovações ope-
  • 4. 168 Barata, M. M. L. et al. racionais e tecnológicas são incorporadas ao lon- levantamentos dos aspectos e impactos ambien- go do ciclo de vida de empresas que atuam em tais ao longo do ciclo de vida da produção ou setores variados - química, eletroeletrônica, alu- dos serviços prestados e o estabelecimento de mínio, automóveis, entre outros - com resulta- planos de emergência. dos positivos do ponto de vista econômico e Para a implementação da A3P, o MMA pro- ambiental 7,8. Esses resultados raramente são põe: a criação de um grupo responsável pela Agen- percebidos, a não ser de forma muito pontual, da na empresa, composto por servidores de vá- pois as empresas carecem de mecanismos ade- rias áreas da instituição; a realização do diagnós- quados para sua contabilização, razão pela qual tico da situação, identificando pontos críticos e consideram onerosos os gastos incorridos com avaliando os impactos ambientais e desperdíci- a gestão e as certificação ambientais. os; a elaboração do planejamento integrado, en- volvendo o maior número de colaboradores e áreas de trabalho; a definição de projetos e ativi- A gestão ambiental dades, priorizando ações de maior urgência; a na administração pública implementação das atividades programadas, re- alizando treinamentos e disponibilizando recur- A criação da Agenda Ambiental na Administra- sos físicos e financeiros; a avaliação e o monito- ção Pública (A3P), no final de 1999, pelo Minis- ramento do desempenho ambiental, identifican- tério do Meio Ambiente (MMA) e oficializada do avanços e deficiências; a busca de uma melho- pela Portaria Nº 510/2002, vai ao encontro dos ria progressiva através da avaliação sistemática, questionamentos expostos anteriormente sobre do replanejamento, da introdução de novas tec- o número limitado de empresas do setor público nologias e da capacitação de funcionários. certificadas pela ISO 14001. A Agenda pretende instaurar um processo de construção de uma nova cultura institucional na administração pú- O retorno econômico blica, visando à conscientização dos servidores da implementação da gestão ambiental para a otimização dos recursos para o combate ao desperdício e para a busca de uma melhor No Brasil, algumas metodologias, como a adota- qualidade do ambiente de trabalho9. Visa a colo- da pelo Programa de Produção Mais Limpa car as empresas em sintonia com a concepção de (PmaisL) e a desenvolvida por Barata8, vêm con- ecoeficiência, incluindo critérios socioambientais tribuindo para evidenciar os ganhos econômicos nos investimentos, compras e contratações de provenientes da gestão ambiental nas empresas. serviços dos órgãos governamentais. Tais metodologias apresentam o estudo da viabi- Em novembro de 2005, haviam aderido à A3P, lidade econômica das ações necessárias para apri- entre outras instituições: a Presidência da Repú- morar o desempenho ambiental das empresas, blica, o Ministério da Defesa, o Ministério de contemplando a redução dos recursos naturais Minas e Energia, o Ministério da Educação, o utilizados e da degradação ambiental. Ministério da Saúde (Fundação Nacional de Saú- O PmaisL foi implantado, em 1995, pelo Cen- de e Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o tro Nacional de Tecnologias Limpas do SENAI- Ministério de Desenvolvimento Social, a Secre- , RS, através de convênio estabelecido com o Pro- taria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, a grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente Procuradoria-Geral da República, o Supremo (UNEP) e a Organização das Nações Unidas para Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça, o Desenvolvimento Industrial (UNIDO). A me- o Tribunal Superior Eleitoral, a Polícia Federal, o todologia do Programa propõe que inicialmente Tribunal de Contas da União, o Banco Regional se realizem diagnósticos sobre os seguintes as- de Desenvolvimento do Extremo Sul, diversas pectos: 1) qualidade da gestão ambiental na em- prefeituras municipais e o Serviço Brasileiro de presa, avaliando sua adequação às exigências Apoio às Micro e Pequenas Empresas. ambientais legais e de boas práticas de saúde ocu- Alguns dos procedimentos propostos são pacional; 2) equipamentos e das técnicas existen- semelhantes aos da norma ISO 14001, não obs- tes para o controle, a redução na fonte e o moni- tante, sua maior ênfase está na diminuição do toramento de emissões (gasosas, líquidas e sóli- desperdício, através dos 3R´s, isto é: reduzir, reci- das); 3) capacitação da força de trabalho, bem clar e reutilizar a quantidade de resíduos gera- como das possíveis práticas existentes aplicáveis dos, sobretudo nos escritórios. Não são contem- para a redução no uso de recursos (energia, água pladas estratégias indicadas pela ISO 14001 como: e matérias primas). Posteriormente, devem ser
  • 5. 169 Ciência & Saúde Coletiva, 12(1):165-170, 2007 identificados os meios para solucionar as defici- biente era praticamente inexistente. Concluiu-se ências diagnosticadas e as oportunidades exis- que o custo de manutenção da gestão ambiental tentes para melhorar o desempenho ambiental nas empresas não ultrapassa 2% de seu custo da empresa, ponderando custos e benefícios fi- total. Entre os benefícios diretos destacam-se: a nanceiros decorrentes das ações oportunas da consultoria ambiental para outras unidades e ecoeficiência. empresas e a venda de equipamentos desenvol- Na primeira fase do Programa, a metodolo- vidos para preservar, proteger e recuperar o meio gia foi aplicada em onze pequenas e médias em- ambiente. Quanto aos benefícios indiretos, so- presas que investiram um total de R$ 220 mil e bressaem a redução de gastos propiciada pela obtiveram ganhos financeiros da ordem de R$ maior eficiência no consumo de energia e água e 497 mil/ano, em face da redução na geração de no volume de resíduos tratados. 97 ton/ano de resíduos perigosos, no consumo Numa das empresas estudadas - que detin- de matéria prima (120 ton/ano), de energia (1660 ha um passivo ambiental elevado devido à práti- Mwh/ano) e de água (120 mil m3/ano) 10. As so- ca de enterrar os resíduos - houve inclusive uma luções propostas nem sempre envolveram inves- articulação para fornecer serviços e resíduos a timentos e, em muitos casos, representaram ape- terceiros que passaram a ser computados como nas mudanças no processo operacional da em- receita direta. Essa mesma empresa empreendeu presa e treinamento dos funcionários. esforço técnico e financeiro para a implantação Em virtude dos resultados iniciais apresen- de estação de tratamento de resíduos industriais, tados, o Programa foi ampliado, constituindo- evitando incorrer em gastos com medidas com- se numa Rede de Produção Mais Limpa, com- pensatórias que somavam, em 2000, o montante posta por entidades de apoio à indústria e ao de R$ 1.500.000,00, além de multas e pagamen- comércio, instituições de ensino e pesquisa e or- tos de custas judiciais em decorrência do descar- ganismos de financiamento, atuantes nos esta- te de efluentes líquidos fora dos padrões da Li- dos da Bahia, Ceará, Mato Grosso, Minas Ge- cença de Operação. A implantação de uma ges- rais, Pernambuco, Santa Catarina, Rio de Janei- tão ambiental, portanto, pode - dependendo da ro e outros. atividade e de seu potencial gerador de passivo Na proposta de Barata8, a gestão ambiental ambiental - evitar inclusive custos contingentes permeia todos os setores e atividades da empre- expressivos. sa. O conjunto da força de trabalho se torna res- ponsável pelo desempenho ambiental na busca da ecoeficiência e também na redução dos riscos Considerações finais financeiros provenientes de externalidades am- bientais negativas inerentes às atividades desen- As medidas adotadas para a redução dos impac- volvidas. Esta metodologia baseia-se na percep- tos ambientais (presentes e futuros) - além de ção de que, do ponto de vista gerencial, é funda- constituírem manifestações de responsabilidade mental estabelecer comparações entre investimen- social das empresas – podem redundar em re- tos necessários para controlar a degradação torno econômico. Para provar essa eficácia eco- ambiental e custos potenciais da degradação pro- nômica, cabe ao responsável pela gestão ambi- vocada, a curto, médio e longo prazo, seja na ental ultrapassar a lógica de mera despoluição e recuperação ou mitigação dos impactos, seja na investir no desenvolvimento de novos produtos forma de indenizações ou compensações à socie- geradores de receita; reduzir os custos de produ- dade pelos danos causados. São efetuadas esti- ção, utilizando menos insumos ou introduzindo mativas de gastos com a implantação dos proce- mudanças tecnológicas; melhorar o relaciona- dimentos e das tecnologias condizentes para aten- mento com clientes e demais partes interessadas dimento aos padrões legais e normativos e dos e diminuir custos contingentes. Os métodos pro- possíveis custos e benefícios contingentes ou in- postos subsidiam na definição de projetos am- tangíveis. bientais a serem mantidos, implantados ou en- Essa metodologia foi aplicada em três em- cerrados e de atividades a serem priorizadas, vi- presas localizadas no Estado do Rio de Janeiro, sando sempre a uma maior eficiência no desem- cujo porte, setor de atuação, faturamento e siste- penho ambiental e econômico. ma de custeio utilizado eram distintos, mas ti- As empresas e instituições do setor público, nham sido instaladas num período em que o particularmente as que têm como missão direta conhecimento preciso dos danos que as ativida- promover o bem-estar da sociedade, deveriam des produtivas podiam ocasionar ao meio am- ser as primeiras a tomar a iniciativa de implantar
  • 6. 170 Barata, M. M. L. et al. um sistema eficiente de gestão ambiental. Aos dade com os requisitos ambientais legais, evitan- fatores sociais associados à preservação ambi- do potenciais custos em compensação por da- ental e à saúde da população, somam-se os efei- nos ambientais. Para que as mudanças pretendi- tos da melhor utilização de recursos públicos, das por essa Agenda na cultura institucional pos- pois a ecoeficiência se fundamenta na racionali- sam efetivar-se, é decisivo o engajamento do pró- dade das decisões, na análise de custo e benefício prio servidor e de seus dirigentes. Caso contrá- das medidas a serem implementadas. Seria de rio, a Agenda será mais um programa governa- desejar, portanto, que a A3P atue em conformi- mental sem garantia de continuidade. Colaboradores MML Barata, DC Kligerman e C Minayo-Go- mez participaram igualmente de todas as etapas da elaboração do artigo. Referências 1. Maimon D. Ensaios sobre economia do meio ambien- 7. Environmental Protection Agency. The Lean and te. Rio de Janeiro: APED; 1992. Green Supply Chain: A Practical Guide for Materials 2. International Organization for Standardization. Managers and Supply Chain Managers to Reduce Costs [acessado 2003 Dez 29]. Disponível em: http:// and Improve Environmental Performance. EUA; 2000. www.iso.ch/isso/em/prods-services/otherspubs/ 8. Barata MML. Aplicação de uma estrutura contábil pdf/survey13thcycle.pdf para apropriação dos custos ambientais e avaliação da 3. Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e sua influência no desempenho econômico das empre- Qualidade Industrial. [acessado 2005 Fev 28]. Dis- sas [tese de doutorado]. Rio de Janeiro: COPPE/ ponível em: http://www.inmetro.gov.br UFRJ; 2001. 4. Barata MML. Gestão ambiental empresarial. II En- 9. Ministério do Meio Ambiente. [acessado 2005 Dez contro Nacional da Sociedade Brasileira de Economia 07]. Disponível em: http://www.mma.gov.br Ecológica: A economia ecológica e os instrumentos e 10. Centro Nacional de Tecnologias Limpas (CNTL). políticas para uma sociedade sustentável. São Paulo; Resultados do Programa. Porto Alegre: CNTL/SE- 1997. NAI/UNIDO/UNEP; 1998. 5. Business Council for Sustainable Development. In- ternalizing Environmental Costs to Promote Eco- Efficiency – Draft Task Force Report. Genebra, 1993. 6. Holliday C, Schimidheiny S, Watts P. Cumprindo o Artigo apresentado em 20/01/2006 prometido: casos de sucesso de desenvolvimento sus- Aprovado em 16/06/2006 tentável. Rio de Janeiro: Campus; 2002. Versão final apresentada em 31/08/2006