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Hino à Morte Poeta : António Feijó Trabalho realizado por Rui Cardoso 1ºB
Tenho às vezes sentido o chocar dos teus ossos E o vento da tua asa os meus lábios roçar; Mas da tua presença o rasto de destroços Nunca de susto fez meu coração parar.
Nunca, espanto ou receio, ao meu ânimo trouxe Esse aspecto de horror com que tudo apavoras, Nas tuas mãos erguendo a inexorável Fouce E a ampulheta em que vais pulverizando as horas.
Sei que andas, como sombra, a seguir os meus                                                                    [passos, Tão próxima de mim que te respiro o alento, — Prestes como uma noiva a estreitar-me em teus                                                                    [braços, E a arrastar-me contigo ao teu leito sangrento...
Que importa? Do teu seio a noite que amedronta, Para mim não é mais que o refluxo da Vida, Noite da noite, donde esplêndida desponta A aurora espiritual da Terra Prometida
A Alma volta à Luz; sai desse hiato de sombra, Como o insecto da larva. A Morte que me aterra, Essa que tanta vez o meu ânimo assombra, Não és tu, com a paz do teu oásis te terra!
Quantas vezes, na angústia, o sofrimento invoca O teu suave dormir sob a leiva de flores!... A Morte, que sem dó me tortura e sufoca, É outra, — essa que em nós cava sulcos de dores
Morte que, sem piedade,  uma a uma arrebata, Como um tufão que passa, as nossas afeições, E, deixando-nos sós, lentamente nos mata, Abrindo-lhes a cova em nossos corações
Parêntesis de sombra entre o poente e a alvorada, Morrer é ter vivido, é renascer... O horror Da Morte, o horror que gera a consciência do Nada,  Quem vive é que lhe sente o aflitivo travo
Sangue do nosso sangue, almas que estremecemos, Seres que um grande afecto à nossa vida enlaça, — Somos nós que a sua morte implacável sofremos, É em nós, é em nós que a sua morte se passa!
Mas se nessa tortura, exausto o pensamento, Para ti, face a face, ergo os olhos contrito, Passa diante de mim, como um deslumbramento Constelando o teu manto, a visão do Infinito.
É pela tua mão, feito um rasgão na treva, Que a Alma se liberta, e de esplendor vestida — Borboleta celeste, ébria de Deus, — se eleva Para a luz imortal, Luz do Amor, Luz da Vida

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Hino à Morte

  • 1. Hino à Morte Poeta : António Feijó Trabalho realizado por Rui Cardoso 1ºB
  • 2. Tenho às vezes sentido o chocar dos teus ossos E o vento da tua asa os meus lábios roçar; Mas da tua presença o rasto de destroços Nunca de susto fez meu coração parar.
  • 3. Nunca, espanto ou receio, ao meu ânimo trouxe Esse aspecto de horror com que tudo apavoras, Nas tuas mãos erguendo a inexorável Fouce E a ampulheta em que vais pulverizando as horas.
  • 4. Sei que andas, como sombra, a seguir os meus                                                                    [passos, Tão próxima de mim que te respiro o alento, — Prestes como uma noiva a estreitar-me em teus                                                                    [braços, E a arrastar-me contigo ao teu leito sangrento...
  • 5. Que importa? Do teu seio a noite que amedronta, Para mim não é mais que o refluxo da Vida, Noite da noite, donde esplêndida desponta A aurora espiritual da Terra Prometida
  • 6. A Alma volta à Luz; sai desse hiato de sombra, Como o insecto da larva. A Morte que me aterra, Essa que tanta vez o meu ânimo assombra, Não és tu, com a paz do teu oásis te terra!
  • 7. Quantas vezes, na angústia, o sofrimento invoca O teu suave dormir sob a leiva de flores!... A Morte, que sem dó me tortura e sufoca, É outra, — essa que em nós cava sulcos de dores
  • 8. Morte que, sem piedade, uma a uma arrebata, Como um tufão que passa, as nossas afeições, E, deixando-nos sós, lentamente nos mata, Abrindo-lhes a cova em nossos corações
  • 9. Parêntesis de sombra entre o poente e a alvorada, Morrer é ter vivido, é renascer... O horror Da Morte, o horror que gera a consciência do Nada, Quem vive é que lhe sente o aflitivo travo
  • 10. Sangue do nosso sangue, almas que estremecemos, Seres que um grande afecto à nossa vida enlaça, — Somos nós que a sua morte implacável sofremos, É em nós, é em nós que a sua morte se passa!
  • 11. Mas se nessa tortura, exausto o pensamento, Para ti, face a face, ergo os olhos contrito, Passa diante de mim, como um deslumbramento Constelando o teu manto, a visão do Infinito.
  • 12. É pela tua mão, feito um rasgão na treva, Que a Alma se liberta, e de esplendor vestida — Borboleta celeste, ébria de Deus, — se eleva Para a luz imortal, Luz do Amor, Luz da Vida