Este documento descreve a livraria e editora Gatafunho, localizada no Chiado em Lisboa. A Gatafunho é dirigida por Ana Paula Faria e oferece livros ilustrados para crianças em várias línguas, além de sessões de leitura com contadores de histórias. A editora publica principalmente autores estrangeiros e tem planos para lançar novas coleções com ilustradores portugueses.
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
Pág. miúdos gatafunho 220112
1. miúdos
Livros ao vivo no Chiado
Gatafunho
Texto
Rita Pimenta
Fotografia
Miguel Manso
Uma editora que
é uma livraria,
que é um espaço
de contadores
de histórias e
que há-de ser
parceira de um
grupo de teatro.
Assim o sonhou
Ana Paula
Faria, quando
decidiu “fugir”
de Bruxelas e
ficar em Lisboa.
A Gatafunho
mora no Espaço
Chiado e tem
livros ao vivo.
Equipa da livraria Ana Paula Faria, editora; Elsa
Aço, designer; Paulo César, actor e encenador
2. H
á um equívoco
recorrente
à volta da
protagonista
desta história.
Ana Paula
Faria não é a cantora Ana Faria
(a dos memoráveis Queijinhos
Frescos), por isso recebe a
Pública dizendo: “Sabe que eu
não sou a que canta, não sabe?”
A alimentar a confusão está o
facto de a “ex-cantora” se ter
dedicado recentemente à escrita
de livros para crianças, público-
alvo da editora Gatafunho. Mas
adiante, que os leitores já estão
esclarecidos.
A “loja de livros Gatafunho é
um espaço para toda a família”,
diz a colaboradora Elsa Aço.
“E para qualquer família”,
completa Ana Paula Faria:
“Temos livros sem idade e
em várias línguas: português,
francês, inglês, alemão,
italiano e até mirandês.” Com
dois euros, compra-se o mais
barato; com 22, o mais caro.
Histórias sem palavras
O número e variedade de
títulos estrangeiros talvez seja
a singularidade maior deste
espaço de venda de livros
ilustrados “ditos” para a infância.
Outra particularidade é a prática
de levar contadores de histórias
a ler diferentes versões do
mesmo título. Para ontem estava
agendada a leitura... de um
livro sem palavras: A Onda, de
Suzy Lee. A apresentação desta
obra, uma das mais vendidas da
editora, iria contar com as vozes
de Elsa Serra, Pedro Lopes e Ana
Alpande.
“Vamos tentar ter sempre a
Elsa e o Pedro como contadores
residentes, digamos assim, e
mais um convidado. A ideia é
proporcionar o maior número
de experiências a quem escuta.
Crianças e adultos.”
Como a loja é pequena,
ocupam nestas sessões uma
área adjacente, dentro do
Edifício Espaço Chiado.
“Pomos umas almofadas no
chão e criamos um ambiente
familiar e de proximidade.
Resulta muito bem”, diz a
editora e livreira.
Está prevista também uma
parceria com a Trupilariante,
Companhia de Teatro-Circo,
para que venha a representar
algumas das histórias editadas
pela Gatafunho. Fica assim
explicada a participação do
autor e encenador Paulo César
na equipa, que ocupa as suas
manhãs na loja desde o início
do ano. “É um projecto tão
atractivo e apetecível que não
se consegue resistir. E tem
umas criaturas fascinantes a
puxar por ele. Isto é muito mais
do que uma pequena livraria
num centro comercial”, diz
entusiasmado, informando que
fará “a ponte entre a livraria
e a Trupilariante”. E não tem
dúvidas: “A parceria dará
resultados muito giros.”
Como uma farmácia
Paulo César conta como,
depois de “uma visita guiada”
à livraria para se familiarizar
com as obras antes de começar
a actividade, se tornou num
verdadeiro “devorador de
livros”. Agora, já se acalmou
um pouco, mas continua a
deslumbrar-se com certos
títulos que têm à venda.
“Todos conhecemos todos
os livros que temos aqui”, diz
Elsa Aço, designer gráfica que
anteriormente trabalhou na
Bichinho de Conto.
“Funcionamos como uma
farmácia. O cliente chega e diz:
‘Preciso de um livro para um
menino de sete anos.’ Como
os meninos de sete anos não
são todos iguais, tentamos
perceber o carácter da criança
e encaminhar as pessoas para o
livro certo. Por isso, conhecer
muito bem o que há na livraria
é fundamental.”
Segundo Paulo César,
as orientações são sempre
muito bem acolhidas pelos
clientes e orgulha-se dos bons
resultados de Janeiro, “o mês
tradicionalmente pior para
vendas está a ser excelente”.
A necessidade de a
Gatafunho criar o seu próprio
ponto de venda é justificada
por Ana Paula Faria “pela
vontade de compreender o
que era estar no outro lado de
uma livraria”, mas dar maior
visibilidade às suas edições
também a moveu. “Aqui posso
mostrar melhor os meus livros,
dou-lhes uma visibilidade
que não tenho na maioria dos
outros espaços livreiros. Aí,
os pequenos editores ficam
sempre mais escondidos.”
Chorar por não editar
A editora não sobreviveria
sem a loja? “Sobreviveria
com a mesma dificuldade que
sobrevive hoje. Porque hoje só
quem tenha muita presunção
é que diz que está muito bem.
No nosso mercado, é evidente
que todas as editoras passam
por muitos problemas”, diz, e
lembra que “o livro não é um
bem essencial
e que a cultura
não é apoiada”.
De caminho,
elogia os
bibliotecários,
os educadores
de infância e
os professores
do 1.º ciclo:
“Se eles não
trabalhassem
tão bem os
livros com os
miúdos, nem
sequer o livro
infantil se venderia bem
em Portugal.”
Escolhe os livros de
autores estrangeiros na
Feira do Livro Infantil
de Bolonha — “o mais
importante encontro
de editores nesta área”
— e também através de
pesquisa nos catálogos
das editoras em cuja
qualidade confia. Quando
não consegue realizar
algum contrato de edição
que gostaria mesmo de
realizar, chora. “É verdade,
choro mesmo. Como uma
criança a quem roubaram
um brinquedo. Mas, já que
não posso editar todos os
livros do mundo, ao menos
posso vendê-los”, conclui,
numa gargalhada genuína.
“Por isso temos tantos
livros estrangeiros. Eu gosto
muito de livros ilustrados
e, sem desprimor para os
ilustradores portugueses,
quando vemos o que é que se
faz lá fora… Encontro tanta
coisa espantosa, que fico
rendida.”
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3. miúdos
Mas nem sempre há
dinheiro para “contratos,
adiantamentos”. Mesmo se
consegue poupar na tradução e
na revisão. “Fazemos em casa.
Eu traduzo e o Carlos [Araújo]
revê ou então o contrário.”
O ex-editor da Leya (entre
outras editoras para as quais
trabalhou) Carlos Araújo ocupa-
se agora “da vertente para
adulto da Gatafunho, a Livre
(designação que joga com as
palavras ‘livre’, livro em francês,
e ‘livre’, relativo a liberdade)”.
Na livraria do Espaço Chiado,
“há um cantinho para livros
para adultos”.
Apoio desigual
A protagonista da história
da Gatafunho tem 52 anos e
deixou para trás uma carreira
na Organização das Nações
Unidas, onde trabalhou
durante 15 anos. “Decidi que
não queria ir para Bruxelas,
que ficaria em Portugal e
realizaria este sonho.”
O “vírus dos livros”, como
designa a paixão de editar,
apanhou-o lá longe no tempo,
nas Edições 70. De vez em
quando, arrepende-se desta
escolha. “Não pensei que
fosse um sonho tão dorido.
Às vezes, sinto alguma
amargura, ao pensar que em
Bruxelas estaria a ganhar uma
‘data de dinheiro’.” Depois,
com naturalidade, ri-se de si
própria e diz: “Com os diabos,
não foi a melhor altura para
arriscar realizar este sonho!”
Começou o projecto há sete
anos e, embora o negócio não
corra às mil maravilhas, diz não
estar arruinada. “A loja está no
início e a editora está a tentar
sobreviver.”
Depois de uma experiência
infeliz com uma distribuidora,
passou a fazer distribuição
directa em todas as livrarias:
Fnac, Bertrand, Bulhosa e
outras. Porque, diz, quando
começa algo, é para levar por
diante. E conclui: “Dificilmente
me verão ficar pelo caminho.”
Para este ano, a editora
vai apostar em colecções
de autores portugueses e
quer dar a conhecer dois
ilustradores que considera
talentosos: Marta Jacinto e
André Caetano. “A Marta
Quando a Mãe
Grita... Texto e
ilustração: Jutta
Bauer; tradução:
Ana Marques. (O
maior sucesso
comercial da
Gatafunho)
Marie na Sombra
do Leão Texto:
Jerry Piasecki;
prefácio: Kofi
Annan; tradução:
H. Brito. (Livro
sobre crianças-
soldado, com
pouca procura em
Portugal)
O Incrível Senhor
Zooty! Texto e
ilustração: Emma
Chichester Clark;
tradução: H.
Brito. (Apesar de
a ilustradora ter
sido premiada, as
vendas deste título
são fracas)
vive no Algarve e o André em
Montemor-o-Novo. Como não
estão nos grandes centros,
isso reflecte-se na ausência de
apoios. Há ilustradores muito
apoiados, mas há outros
com trabalho muito válido
que não chegam sequer a ser
conhecidos.” Considera muito
injusto esse apoio desigual
por parte das instituições
portuguesas.
Colecção inovadora
Os textos das novas edições
da Gatafunho serão de Lurdes
Breda. “A colecção ilustrada
por Marta Jacinto vai ser
bastante inovadora”, acredita
Ana Paula Faria. Uma obra
em que se trabalha os sons de
forma bem-humorada e que se
destina a crianças no final do
pré-escolar e no 1.º ciclo, “para
os que ainda não aprenderam
a ler e para os que têm alguma
dificuldade”.
Em títulos estrangeiros, vai
editar Jimmy Liao (o grande
projecto para 2012), mais um
trabalho de Jutta Bauer (o
livro mais vendido da editora,
Quando a Mãe Grita..., é desta
autora) e outra obra sem
palavras (O Livro Vermelho,
de Barbara Lehman). Planos a
levar por diante.
rpimenta@publico.pt
Edifício Espaço Chiado Rua Nova da Trindade, n.º5,
Loja 2. De segunda a sábado, das 10h às 20h