1. Memórias de um
Sargento de Milícias
Manuel Antônio de Almeida
2. “Todo grande autor rompe com algo e introduz uma
novidade (...) o grande autor tem um papel didático: ele
reorienta o vetor das condutas de gosto. A grande obra
inaugura, cria sua ascendência e reinventa a literatura.”
Ronaldo Costa Fernandes
3. Manuel Antônio de Almeida esteve perpetuamente
deslocado na sociedade, porque em verdade era antes
um desses homens que, por anacronismo da sorte, mais
pertencem ao futuro do que ao presente, que os
desconhece.
Augusto Emílio Zaluar
4. Fatores limitadores dos sucesso:
•A originalidade com relação ao romance romântico –
ausência da atmosfera lírica.
•A independência com relação à moda do
sentimentalismo.
•A linguagem coloquial, simples, direta, sem metáforas
ou refinamentos estilísticos.
5. As Características
• A ausência do maniqueísmo > falta de culpabilidade
- favorecimento de arranjos, transgressões e favores.
• A inovação do nacional > usos e costumes do povo
do RJ no começo do século XIX.
• A sociedade da época > uma classe que passa
despercebida pela estética ufanista do romantismo.
6. As Características
• Sociedade marginalizada e dividida por grupos.
• As personagens são identificados pela profissão ou
condição social.
• O heroísmo é substituído pelo humor.
7. As Características
O registro social antecipa o episódio
“O major Vidigal era o rei absoluto, o árbitro supremo
de tudo que dizia respeito a esse ramo de
administração; era o juiz que julgava e distribuía a
pena, e ao mesmo tempo o guarda que dava caça aos
criminosos; nas causas da sua imensa alçada não havia
testemunhas, nem provas, nem razões, nem processo;
ele resumia tudo em si; (...)”
8. Realismo Estético
Caracterizar a sociedade dentro de uma
verossimilhança possível – entretenimento.
X
Realismo de Escola
Suporte científico – o romance de tese – edificação dos
leitores.
9. A Dúvida
• Novela picaresca: o protagonista é o fio condutor da
narrativa - aparece em todos os capítulos.
• Memórias: Leonardo aparece em 30 dos 48
capítulos.
• Os fundamentos da novela picaresca: viagem,
servidão e narrativa autobiográfica.
• Obs: afirmar que as Memórias são um romance
picaresco é uma classificação arbitrária.
10. Leonardo
•O surgimento do anti-heroi, o malandro carioca.
•Protegido pela maioria das mulheres na narrativa.
•Não pratica nenhuma ação para se dar bem.
•Fala pouco na narrativa > falam por ele.
11. As Personagens
• A personagem tipo: características marcantes e
peculiaridades comportamentais universalizadas.
• As convenções sociais vão sendo ridicularizadas pelo
“jeitinho”.
• A caricatura das personagens masculinas:
decadência dos valores morais.
12. As Personagens
Femininas
• A ruptura com a sociedade tradicional: a mulher
rompe a relação – revela-se forte, decidida e
insensível ao sentimento do companheiro.
• Seria o uso da força uma forma de justificação do
poder do macho e um meio de ocultar a fraqueza
decorrente da perda?
13. Luisinha
“Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida,
porém que, tendo perdido as graças de menina,
ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta,
magra, pálida: andava com o queixo enterrado no
peito, trazia as pálpebras sempre baixas, e olhava a
furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo,
cortado, dava-lhe apenas até o pescoço, e como
andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa,
uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos,
como uma viseira.
14. Vidinha
"Era uma mulatinha de dezoito anos a vinte anos, de
altura regular, ombros largos, peito alteado, cintura
fina e pés pequeninos; tinha os olhos muitos pretos e
muito vivos, os lábios grossos e úmidos, os dentes
claríssimos, a fala era um pouco descansada, doce e
afinada. “
15. • A personagem secundária se incorpora à
galeria feminina da literatura.
• Vidinha rouba o posto da protagonista: não é
ridicularizada pelo autor.
• A face oculta: a proximidade com a realidade.
“A formidável namoradeira.”
16. Luisinha e Vidinha
(par simétrico)
Luisinha - plano da ordem
A mocinha burguesa - não há relação viável
fora do casamento
(herança, parentela, posição e deveres)
Vidinha - o plano da desordem
O amor sem casamento nem deveres
17. O comportamento feminino
•Fuga da tutela masculina.
• Transgride as normas de conduta.
impostas pela sociedade patriarcal.
•Ausência do ambiente doméstico para
realizar-se afetivamente.
18. Nunca mais Luisinha vira o ar da rua senão às
furtadelas, pelas frestas da rótula: então
chorava ela aquela liberdade de que gozava
outrora; aqueles passeios e aquelas palestras à
porta em noite de luar; aqueles domingos de
missa na Sé, ao lado de sua tia com o seu
rancho de crioulinhas atrás; as visitas que
recebiam, e o Leonardo de quem tinha
saudades, e tudo aquilo enfim a que não dava
nesse tempo muito apreço, mas que agora lhe
parecia tão belo e tão agradável.
19. Tendo-se casado com José Manuel para seguir
a vontade de D. Maria, votava a seu marido
uma enorme indiferença, que é talvez o pior de
todos os ódios. Pois a vida de Luisinha, depois
de casada, representava com fidelidade a vida
do maior número das moças que então se
casavam: era por isso que as Vidinhas não
eram raras.
20. Leonardo e Luisinha
(O Casamento)
•Uma forma de legitimar os valores burgueses.
•Conferir o final desejado pelos leitores.
•Submeter Leonardo à lei e à tradição.
Obs: somente Luisinha consuma o casamento
21. “Desde o dia em que Leonardo fizera a sua declaração
amorosa, uma mudança notável se começou a operar
em Luisinha, cada hora se tornava mais sensível à
diferença tanto de físico como do seu moral. Seus
contornos começavam a redondar-se; seus braços, até
ali finos e sempre caídos, engrossavam-se e tornavam-se
mais ágeis;
22. suas faces magras e pálidas, enchiam-se e tomavam
essa cor que só sabe ter o rosto da mulher em certa
época da vida; a cabeça, que trazia habitualmente
baixa, erguia-se agora graciosamente; os olhos, até ali
amortecidos, começavam a despedir lampejos
brilhantes; falava, movia-se, agitava-se.”
23. O Antirromantismo de Luisinha:
“Estavam presentes algumas pessoas da vizinhança, e
uma delas disse baixinho à outra, vendo o pranto de
Luizinha: __ Não são lágrimas de viúva... __ E não eram,
nós já o dissemos: o mundo faz disso as mais das vezes
um crime. E os antecedentes? Porventura ante seu
coração fora José Manuel marido de Luizinha? Nunca o
fora senão ante as conveniências; para as
conveniências aquelas lágrimas bastavam.”
24. “(...)chegamos por nossas investigações à
conclusão de que o verdadeiro amor, ou são todos
ou é um só, e neste caso não é o primeiro, é o
último. O último é que é o verdadeiro, porque é o
único que não muda. As leitoras que não
concordarem com esta doutrina convençam-me do
contrário, se são disso capazes.”
25. “(...) as ‘Memórias de um sargento de milícias’ criam um
universo que parece liberto do erro e do pecado. Um
universo sem culpabilidade e mesmo sem repressão, a
não ser a repressão que pesa o tempo todo por meio do
Vidigal e cujo desfecho já vimos. (...) A esta curiosidade
corresponde uma visão muito tolerante, quase amena.
As pessoas fazem coisas que poderiam ser qualificadas
como reprováveis, mas também fazem outras dignas de
louvor, que as compensam. E como todos têm defeitos,
ninguém merece censura.”
(Antônio Cândido – Dialética da Malandragem)
26. “(...) a malandragem é uma variante do ‘jeitinho’ (...),
constituindo-se como uma outra forma de navegação
social. O malandro, portanto, seria um agente
profissional do ‘jeitinho’ e da arte de sobreviver nas
situações mais difíceis: aquelas nas quais ele está
claramente fora ou longe da lei.”
O que é o Brasil?, Roberto DaMatta
27. O Malandro – Chico Buarque
O malandro na dureza
Senta à mesa do café
Bebe um gole de cachaça
Acha graça e dá no pé
O garçom no prejuízo
Sem sorriso sem freguês
De passagem pela caixa
Dá uma baixa no português
O galego acha estranho
Que o seu ganho tá um horror
Pega o lápis soma os canos
Passa os danos pro distribuidor
28. Mas o frete vê que ao todo
Há engodo nos papéis
E pra cima do alambique
Dá um trambique de cem mil réis
O usineiro nessa luta
Grita ponte que partiu
Não é idiota trunca a nota
Lesa o Banco do Brasil
Nosso banco tá cotado
No mercado exterior
Então taxa a cachaça
A um preço assustador
29. Mas os ianques com seus tanques
Têm bem mais o que fazer
E proíbem os soldados
Aliados de beber
A cachaça tá parada
Rejeitada no barril
O alambique tem chilique
Contra o Banco do Brasil
O usineiro faz barulho
Com orgulho de produtor
Mas a sua raiva cega
Descarrega no carregador
30. Este chega pro galego
Nega arrego cobra mais
A cachaça tá de graça
Mas o frete como é que faz?
O galego tá apertado
Pro seu lado não tá bom
Então deixa congelada
A mesada do garçom
O garçom vê um malandro
Sai gritando pega ladrão!
E o malandro autuado
É julgado e condenado culpado
Pela situação
Notas del editor
Os caminhos da mulher na época: tornar-se prostituta ou submeter-se aos mandos do marido (casamento).