O que fazer quando você estiver passando pelo “inferno”?
Estávamos perdidos, sem água e sem comida
Estávamos todos perdidos na serra da Bocaina, na divisa entre os estados de São Paulo e Rio de Janeiro. As montanhas cercavam nosso grupo e a fome aumentava. Mas a fome ainda não era mortal.
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O inferno no qual você vive não precisa viver dentro de você by Aldo Novak
1. O “inferno” no qual você vive não precisa existir dentro de você.
2.
3. O que fazer quando você estiver passando pelo “inferno”?
Estávamos perdidos, sem água e sem comida
Estávamos todos perdidos na serra da Bocaina, na divisa entre os estados
de São Paulo e Rio de Janeiro. As montanhas cercavam nosso grupo e a
fome aumentava. Mas a fome ainda não era mortal.
A sede, por outro lado, estava deixando todos tensos. E com medo.
Lembro que, naquele dia, acordamos por volta das 3 da madrugada,
bem antes do Sol nascer, e nos encontramos com nossos dois guias,
contratados para nos levarem pelas montanhas da região.
Acho que estávamos em quinze pessoas, ou mais.
Resolvemos que não iríamos gastar muito dinheiro com guias,
portanto economizamos para aproveitarmos mais a aventura.
Por isso contratamos guias baratos.
Como ainda nem eram 4 da manhã, estava escuro, todos nós
usávamos lanternas enquanto os cavalos subiam a montanha.
Todos nós estávamos com cavalos selados e carregando cada um
dos “aventureiros” de final de semana e nossas mochilas.
Não lembro o nome do meu cavalo, mas lembro que ele era
branco – um branco “sujo”, não um branco como aqueles dos
cavalos do cinema.
Estávamos em vários cavalos como uma caravana de exploradores,
com um dos guias liderando a frente do grupo, com um mapa,
e outro cobrindo a retaguarda do grupo, ao final.
Uns quinze cavalos, talvez, caminhando pela montanha, de madrugada.
Só víamos as luzes das lanternas, os olhos brilhantes dos cavalos e as
estrelas.
Escutávamos apenas os cascos dos cavalos sobre as pedras,
ecoando pelas rochas, no silêncio da noite. E o eco fazia parecer
que éramos um exército enorme, de soldados, viajando à noite.
Me sentia o próprio Indiana Jones. Uma experiência sensorial inesquecível.
Eu estava com minha namorada, mas acho que éramos o único casal do grupo.
Havia uma bruma que caia pelas montanhas e uma escuridão que
apenas as montanhas têm. Mas, não demorou muito para eu ver que
algo estava errado. O “guia” que seguia por último, estava totalmente bêbado.
E quando digo totalmente quero dizer TO-TAL-MEN-TE.
Eu tinha uns 19 anos e estávamos todos passeando, mas na hora em
que os encontramos não achei que ele estivesse sem condições.
De repente, aconteceu.
4. Alguém gritou para o grupo parar... olhei para trás, com a lanterna, mas
apenas via os cavalos parados e tentava descobrir o que tinha acontecido.
Então, soube que nosso guia, aquele que estava totalmente bêbado,
que estava no final, tinha... Desaparecido.
Qualquer um que já tenha assistido a filmes de terror sabe que a última
pessoa de uma fila no escuro é sempre a primeira a desaparecer...
Quando as coisas estão dando errado, sempre nos lembramos de
filmes nos quais elas deram pior.
A caravana parou e o guia que vinha à frente voltou correndo com
seu cavalo. Apenas escutávamos o eco que o casco de seu cavalo
fazia pelas montanhas. Ele voltou um pouco, mas não continuou.
Parecia preocupado e, então, veio até nós e disse o que nenhum guia
pode dizer: “Vocês seguem em frente... que vou buscar ele”.
Pensando agora, vejo que não tinha sido boa idéia economizar com
guias baratos...
Embora todos nós tenhamos ficado um pouco apreensivos, assumimos
que, se o guia sóbrio nos mandou seguir em frente, era porque
não havia riscos. Mas havia.
Depois de um tempo, umas duas horas, concluímos que ele não voltaria.
Estávamos perdidos. Perdidos na Serra da Bocaina. Ali, em meio a
134 mil hectares, sem sequer uma bússola, sem mapas e sem telefones,
começamos a ficar preocupados. As horas passavam.
E assim ficamos por todo um dia.
Sem água, nossos cavalos não podiam mais nos carregar.
Descemos e diminuímos a velocidade, pois toda a carga estava nos animais.
A serra era íngreme em vários lugares e ficamos com medo de um dos
cavalos quebrar a perna. Nem saberíamos o que fazer.
Estávamos todos cansados e com fome.
Celulares ainda não existiam. GPSs eram literatura de ficção científica.
Não tínhamos plano B, não tínhamos backup de nada e os riscos eram reais.
Tínhamos tanta sede que, por volta das 4 da tarde (umas doze horas depois de
iniciarmos a aventura), encontramos algumas dezenas de chuchus na montanha.
Chuchus têm “água”, pensamos.
Não tivemos dúvidas: comemos os chuchus diretos do pé. Crus.
Se você nunca comeu um chuchu cru, sugiro que nem pense em fazer isso. Ele tem
uma gosma colante que gruda na boca e, embora mate a sede, fez com que eu ficasse
meses longe de qualquer chuchu.
A história é longa e não haverá tempo de contar tudo aqui. Mas posso dizer que ao
final do dia, umas quinze horas depois que iniciamos, andando sem parar, encontramos
o caminho e chegamos onde queríamos.
Se alguém soubesse onde estávamos, o melhor seria acamparmos e esperar. Mas
ninguém sabia, pois a decisão do passeio havia sido tomada na noite anterior.