ARA0225 DIREITO PENAL - TEORIA DO CRIME Data- ___ ___ ______ Período- 2023...
Nova lei do estupro altera sujeitos ativo e passivo
1. Jus Navigandi - Doutrina - A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeitos a... Página 1 de 5
A nova lei do estupro.
O homem e a mulher como sujeitos ativo e passivo
e o abrandamento punitivo
Texto extraído do Jus Navigandi
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13359
José Ricardo Chagas
Criminalista. Doutorando em Ciências Sociais e Jurídicas pela Universidad del Museo Social Argentino.
Especialista em Ciências Criminais pela Uniahna. Especialista em Polícia Comunitária pela Universidade do
Sul de Santa Catarina. Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Santa Cruz.
Introdução
O vil delito de estupro, que sempre representou a principal expressão de violência
contra as mulheres, uma vez que era um crime de homens contra mulheres, acaba de
ganhar nova roupagem. A lei nº. 12.015 de 7 de agosto de 2009 revoga o art. 214 do CP e
altera o art. 213 do mesmo diploma. Assim, ainda que buscando fundamentação jurídica
para esta alteração, o fato é que o homem passa a ser sujeito passivo do crime de estupro,
bem como a mulher ganha status de sujeito ativo do mesmo delito. Ainda, demonstrando
tecnicismo limitado, consegue o legislador criar uma lei mais benéfica ao autor do delito
em comento.
Da legislação [01]
Eis a alteração em tela:
Estupro
Art. 213 Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou
grave ameaça:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Nova redação:
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter
conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato
libidinoso:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Atentado Violento ao Pudor
Art. 214 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a
praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da
http://jus2.uol.com.br/doutrina/imprimir.asp?id=13359 19/9/2009
2. Jus Navigandi - Doutrina - A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeitos a... Página 2 de 5
conjunção carnal:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Art. 213 O homem como sujeito passivo
Durante muito tempo ouvimos a aberração jurídica de que "fulano" havia sido
estuprado. Essa ignorância e impossibilidade jurídica deixou de existir. Com o advento da
novel lei, o abuso sexual copular contra o homem adquire tipificação de estupro. Dessa
forma, qualquer pessoa ("alguém"), e não apenas a mulher, é sujeito passivo do crime de
estupro, tipificado no art. 213 do CP.
No artigo de lei alterado, o legislador detinha o crime de estupro à vítima mulher.
Ainda, trazia como elementar do crime a conjunção carnal, ato apenas possível com a
cópula vaginal. Corroborando com este entendimento basta a leitura simples do então
revogado art. 214, onde se distinguia do art. 213, principalmente, na elementar "ato diverso
da conjunção carnal". Ou seja, a conjunção carnal sempre fora um atributo jurídico relativo
a mulher.
Destarte, o novo art. 213 contempla a conjunção carnal como sendo uma das
elementares do crime de estupro, porém, não mais atribui apenas à mulher essa condição
passiva, tornando o homem sujeito passivo deste delito. Ou seja, a conjunção carnal não
mais está intrinsecamente atrelada à cópula vaginal. Assim, a conjunção carnal deve ser
então entendida como sendo o ato sexual de cópula tanto vaginal como anal, contra o
sujeito passivo homem ou mulher.
A mulher como sujeito ativo
Segundo lição do festejado professor Damásio de Jesus, "somente o homem pode ser
sujeito ativo do crime de estupro, porque só ele pode manter com a mulher conjunção
carnal, que é o coito normal." [02] Também, Celso Delmanto: "Sujeito ativo: Somente o
homem." [03] Esse era o entendimento majoritário e mais aceitável da doutrina e
jurisprudência pátria. De certo que novo entendimento doutrinário está por ser
sedimentado.
O novo artigo de lei uniu parte do texto do revogado art. 214 com o antigo art. 213,
lhe dando o legislador nova tipificação. Assim, o legislador não alterou a conduta de
manter conjunção carnal como uma das elementares do crime, mas acrescentou ao rol de
condutas típicas do crime de estupro, praticar ou permitir que com ele ("alguém"– sujeito
passivo) se pratique outro ato libidinoso.
Assim, como no crime de atentado violento ao pudor o sujeito ativo e passivo podia
ser personificado tanto por homem como por mulher, não destarte, o novo art 213 também
o é.
Corroborando com o nosso entendimento:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/imprimir.asp?id=13359 19/9/2009
3. Jus Navigandi - Doutrina - A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeitos a... Página 3 de 5
"O tipo penal do art. 214 é constranger alguém. Sendo impessoal o
tempo verbal do enunciado típico, pode o sujeito ativo ser, indiferentemente,
qualquer pessoa, ou seja, homem ou mulher. (TJSP – AC – Rel. Correa Dias –
RT 619/277)
"No atentado violento ao pudor a tutela jurídica objetiva tão somente o
pudor da vítima, que também poderá ser o homem, e não apenas a
mulher." (TJSP – EI – Rel. Xavier Homrich – RT 346/348).
Revogação do Art. 214 e a Novatio legis in mellius
A Novatio legis in mellius é uma terminologia empregada quando há a publicação de
uma nova lei que revoga outra anteriormente em vigência, beneficiando de alguma forma o
condenado. Eis o que literalmente alcançou o legislador, concedeu a milhares de
condenados o direito a revisão criminal e consequentemente a diminuição de suas
sentenças. Vejamos.
O autor do crime de estupro quando o praticava em concurso material ou formal, ou
até mesmo em sede de continuidade delitiva com o crime de atentado violento ao pudor,
tinha sua pena aumentada significativamente, o que era festejado pela sociedade, tendo em
vista a gravidade do delito. Um exemplo prático, tomando-se por base o concurso material
e as penas bases dos delitos em tela, temos seis anos para o estupro e seis anos para o
atentado violento ao pudor, perfazendo-se uma pena de reclusão de doze anos para o autor.
Com o advento da lei em comento, desaparece o segundo artigo, atentado violento ao
pudor, uma vez que este fora juntado ao artigo 213, estupro. Ou seja, o autor será
condenado apenas à pena de seis anos.
Assim se manifestavam, acerca dos delitos em tela, os tribunais superiores: que
apesar de possuírem a mesma natureza, estupro e atentado violento ao pudor eram crimes
de espécies distintas.
"STJ. HC 102362 . PENAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO E ATENTADO
VIOLENTO AO PUDOR. PROGRESSÃO DE REGIME. REITERAÇÃO DE PEDIDO.
WRIT PREJUDICADO. ALEGADA CONTINUIDADE DELITIVA. INOCORRÊNCIA.
CONCURSO MATERIAL. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA.
INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE EXAME COMPARATIVO DE DNA.
INOCORRÊNCIA. DISCRICIONARIEDADE REGRADA DO MAGISTRADO.
PROVAS SUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO. I (...). II - Se, além da conjunção
carnal, é praticado outro ato de libidinagem que não se ajusta aos classificados de
praeludia coiti, é de se reconhecer o concurso material entre os delitos de estupro e de
atentado violento ao pudor. A continuidade delitiva exige crimes da mesma espécie e
homogeneidade de execução. III - (...). Habeas corpus parcialmente conhecido e, nesta
parte, denegado."
" STF. HC 91370 . DIREITO PENAL. CRIMES DE ESTUPRO E ATENTADO
VIOLENTO AO PUDOR. MESMA VÍTIMA. CONCURSO MATERIAL (E NÃO
CRIME CONTINUADO). 1. O Direito Penal brasileiro encampou a teoria da ficção
jurídica para justificar a natureza do crime continuado (art. 71 , do Código Penal ). Por
http://jus2.uol.com.br/doutrina/imprimir.asp?id=13359 19/9/2009
4. Jus Navigandi - Doutrina - A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeitos a... Página 4 de 5
força de uma ficção criada por lei, justificada em virtude de razões de política criminal, a
norma legal permite a atenuação da pena criminal, ao considerar que as várias ações
praticadas pelo sujeito ativo são reunidas e consideradas fictamente como delito único. 2.
"Não há falar em continuidade delitiva dos crimes de estupro e atentado violento ao
pudor" (HC nº 70.427/RJ , Ministro Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 24-9-1993), ainda que
"perpetrados contra a mesma vítima" (HC nº 688.77/RJ , Relator Ministro Ilmar Galvão, 1ª
Turma, DJ 21-2-1992). 3. A hipótese dos autos demonstra que, em relação às duas vítimas,
os crimes de atentado violento ao pudor não foram perpetrados como "prelúdio do coito"
ou meio para a consumação do crime de estupro, havendo completa autonomia entre as
condutas praticadas. 4. Tal solução não ofende as diretrizes da política criminal voltadas ao
cumprimento dos objetivos expressos na Constituição da República, acentuando a própria
circunstância da hediondez das condutas havidas pelo paciente por ocasião dos fatos
referidos na ação penal a que respondeu, que vitimaram duas mulheres. 5. Ordem de
habeas corpus denegada."
Dessa forma, todo preso, condenado por continuidade delitiva ou concurso de crimes,
autores dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor, terão suas sentenças revisadas
a menor, o que acarretará a liberdade a centenas de condenados. É um caso típico de
retroatividade da lei penal em razão de novatio legis in mellius. Ainda, aos casos futuros,
não há mais que se falar em concurso formal ou material de crimes, mas tão só num crime
único, vez que a conjunção carnal e atos libidinosos geograficamente fazem parte do
mesmo tipo penal.
Conclusão
Lamentavelmente o legislador mais uma vez, numa patente falta de tecnicismo
jurídico, cria num malabarismo, benevolências aos apenados nos crimes de estupro e
atentado violento ao pudor. Resta abalada a segurança jurídica com procedimentos dessa
natureza.
Notas
1. Presidência da República – Casa Civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm
2. JESUS, Damásio de. Direito Penal, 13a ed., Vol. 3, pág. 95.
3. DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado, 3a ed., pág. 349.
Sobre o autor
José Ricardo Chagas
E-mail: Entre em contato
Sobre o texto:
Texto inserido no Jus Navigandi nº2241 (20.8.2009)
http://jus2.uol.com.br/doutrina/imprimir.asp?id=13359 19/9/2009
5. Jus Navigandi - Doutrina - A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeitos a... Página 5 de 5
Elaborado em 08.2009.
Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico
eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
CHAGAS, José Ricardo. A nova lei do estupro. O homem e a mulher como sujeitos ativo e passivo
e o abrandamento punitivo. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2241, 20 ago. 2009. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13359>. Acesso em: 19 set. 2009.
http://jus2.uol.com.br/doutrina/imprimir.asp?id=13359 19/9/2009