1. OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
1. Conceito
Vimos, anteriormente, que obrigação é o poder jurídico pelo qual uma pessoa (sujeito ativo), com base na
lei ou no contrato (causa), pode exigir de outra, ou de um grupo de pessoas (sujeito passivo), o cumprimento de
uma prestação possível, lícita, determinável e possuindo expressão econômica (objeto). Partindo desse conceito
genérico de obrigação, podemos dizer que a obrigação tributária é o vínculo jurídico pelo qual o Estado, com base
exclusivamente na legislação tributária, pode exigir do particular uma prestação tributária positiva ou negativa.
2. Elementos
Os elementos da obrigação tributária são os seguintes: a) sujeito ativo, é a pessoa jurídica de direito público ou
privado competente para exigir tributos, como será melhor explicado mais adiante; b) sujeito passivo é a pessoa
física ou jurídica obrigada por lei ao cumprimento da prestação tributária, denominada contribuinte ou responsável
(CTN, art. 121); c) causa, a lei, em razão do princípio da legalidade tributária, pelo que a vontade jurídica dos
indivíduos é inapta para criá-la; d) objeto, o cumprimento de uma prestação positiva ou negativa determinada por lei.
3. Espécies
O Código Tributário Nacional, em seu art. 113, classifica a obrigação tributária em principal e acessória.
3.1. Obrigação tributária principal
Obrigação tributária principal é aquela que surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o
pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente (CTN, art.
113, § 1º). Esse dispositivo merece algumas considerações.
Primeiro, quando diz que a obrigação tributária surge com a ocorrência do fato gerador, não está negando a
natureza legal da obrigação tributária porque somente a lei, em sentido estrito, pode definir uma dada situação como
hipótese de incidência do tributo (CTN, art. 97, III). Assim, deve-se interpretar a afirmação constante da parte inicial
do mencionado dispositivo legal no sentido
Segundo, a obrigação tributária principal consiste em uma obrigação de natureza patrimonial, que é a de dar
coisa incerta porque antes da ocorrência do fato gerador o objeto da prestação tributária não está especificamente
individualizado, sendo apenas indicado pelo seu gênero, prestação pecunária, e esta não é determinada, mas
determinável. Disso resulta que a obrigação tributária prevista abstramente na lei e concretizada com a ocorrência do
fato gerador tem a natureza de obrigação ilíquida, porque somente o lançamento fará com que evolva para obrigação
líquida.
Terceiro, o § 1º do art. 113 do CTN, ao fazer essa mesma afirmação de que a obrigação tributária nasce com a
ocorrência do fato gerador, consagra a-natureza declaratória do lançamento, que visa a declarar uma situação pre-
existente, qual seja, aquela existente no momento da ocorrência do fato gerador.
Quarto, o dispositivo em tela reza ainda que a obrigação tributária principal tem por objeto o pagamento de
tributo ou penalidade pecuniária. O legislador incluiu o pagamento de penalidade pecuniária como objeto da
obrigação tributária principal pela simples razão de consistir, tal qual o pagamento de tributo, em uma obrigação de
dar, tendo igualmente natureza patrimonial. Paulo de Barros Carvalho critica o legislador por colocar o pagamento da
pecuniária como objeto da obrigação tributária principal porque estaria negando a cláusula do art. 3º do CTN, quando
afirma que o tributo não constitui a sanção do ato ilícito, embora o tributo e a penalidade correspondam a uma
prestação de natureza patrimonial.
Quinto, a cláusula final do § 1º do art. 113 prescreve que a obrigação principal extingue-se com o crédito dela
decorrente.
Para que se possa melhor entender essa cláusula do referido dispositivo legal, torna-se necessário que se
explique as diversas fases da obrigação tributária: a lei, o fato gerador e o lançamento. A lei contempla a obrigação
tributária de forma abstrata, definindo de uma hipótese de incidência, ao prescrever, por exemplo, que o imposto de
transmissão incide na alienação de um bem imóvel. Tal obrigação só se concretizará quando efetivamente ocorrer o
fato gerador, ou seja materializar-se a situação prevista na lei, alienação do bem imóvel, transformando a obrigação
tributária de abstrata e concreta. Nessas duas fases a obrigação tributária ainda tem natureza ilíquida porque o fisco
não sabe que ocorreu o fato gerador, quem é o sujeito passivo, etc. Há a necessidade, portanto de o lançamento, que é
o conjunto de medidas adotadas pela autoridade administrativa para verificar a ocorrência do fato gerador,
determinar a matéria tributável, calcular o montante de tributo devido e identificar o sujeito passivo. O lançamento
formaliza e individualiza a obrigação tributária, transformando-a em uma obrigação líquida, constituindo o crédito
tributário. Todavia, o crédito tributário só se tornará exigível depois que o sujeito passivo for regularmente notificado
2. para a ciência do lançamento e deixar transcorrer o prazo legal sem impugná-lo. Em resumo, a obrigação tributária
surge de forma abstrata com a lei, concretiza-,se com o fato gerador e individualiza-se com o lançamento.
Como se pode observar, a obrigação tributária e o crédito tributário nascem em momentos distintos, fato
gerador e lançamento. Se o contribuinte paga o tributo ou ocorre uma das causas referidas no art. 156 do CTN, o
crédito tributário ficará extinto, provocando igualmente o fenecimento da obrigação tributária. Assim, não existe
crédito tributário sem obrigação tributária procedente. Mas pode existir obrigação tributária sem crédito tributário,
como no caso em que o fisco decaia do direito de constituir o crédito pelo lançamento (CTN. art. 173).
3.2. Obrigação tributária acessória
A obrigação tributária acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto o cumprimento de
prestações, positivas ou negativas, nelas previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos (CTN,
art. 113, § 2º).
Enquanto a obrigação tributária principal só pode decorrer de lei, a obrigação tributária acessória pode ser
estabelecida por qualquer das normas que integram a legislação tributária (CTN, art. 96). A obrigação tributária
acessória visa a atender aos interesses do fisco no tocante às fiscalização e arrecadação dos tributos e corresponde a
qualquer exigência feita pela legislação tributária que não seja o pagamento do tributo. Assim, a mencionada
obrigação pode consubstanciar uma obrigação de fazer (declaração de bens, exibição de livros, prestação de
informações, etc ... ) ou obrigação de não-fazer (não destruir documentos e livros obrigatórios pelo prazo exigido por
lei, tolerar exame em livros e documentos, não impedir a fiscalização, etc.).
Paulo de Barros Carvalho designa as obrigações tributárias acessórias como deveres instrumentais ou formais:
"Deveres, com o intuito de mostrar, de pronto, que não têm essência obrigacional, isto é, seu objeto carece
de patrimonialidade. E instrumentais ou.formais, porque, tomados em conjunto, é um instrumento de que
dispõe o Estado-Administração para o acompanhamento e consecução dos designos tributários."
O § 3º do art. 113 do CTN reza que a não observância da obrigação acessória faz com que a mesma se
converta em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária. O legislador quer significar nessa regra que a
obrigação tributária acessória, que originariamente não tem essência econômica, ao ser descumprida pelo
contribuinte, fazendo incidir a penalidade pecuniária, passa a ter valor econômico, e nesse sentido se deve entender a
sua conversão em obrigação principal.
FATO GERADOR
1. Denominação
Preliminarmente, é de se acentuar que o Código Tributário Nacional adotou a denominação fato gerador para
caracterizar a situação de fato ou situação jurídica que, ocorrendo, determine a incidência do tributo. A vantagem de
tal qualificação reside no fato de deixar claro que o momento em que ocorre o fato gerador é aquele mesmo em que
se concretiza a obrigação tributária.
Todavia, Geraldo Ataliba adotou a locução hipótese de incidência para significar a descrição genérica e
abstrata da situação feita pela lei, reservando a expressão fato imponível para o fato efetivamente ocorrido. O CTN
emprega uma única vez, no art. 104, II, a expressão hipótese de incidência.
2. Conceito
O CTN, como define em separado a obrigação tributária principal (art. 113, § 1º) e a obrigação tributária
acessória (art. 113, § 2º), adota a mesma técnica, definindo o fato gerador da obrigação principal no art. 114 e o fato
gerador da obrigação acessória no art. 115.
2.1. Fato gerador da obrigação tributária principal
Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua
ocorrência. Assim, a lei refere-se de forma genérica e abstrata a uma situação como hipótese de incidência do
tributo, correspondendo à obriagação tributária abstrata. Quando a situação descrita na lei materializar-se, ocorrerá a
incidência do tributo. A hipótese de incidência só pode ser definida em lei formal, do restrito (CTN, art. 97, III),
porque o legislador exige lei para esgotar todos os elementos da obrigação tributária para não deixar espaço algum
que possa ser preenchido pela administração, visando assim a uma melhor proteção do contribuinte. Por outro lado,
a simples ocorrência da situação definida em lei basta por si mesma para concretizar a obrigação tributária.
3. A situação prevista na lei tributária como hipótese de incidência pode corresponder a um fato, ao conjunto de fatos
ou a uma situação jurídica, como deixa claro o art. 116 do CTN. Assim, um único fato, a saída da mercadoria de
estabelecimento comercial, industrial ou produtor configura a hipótese de incidência do ICMS. Por outro lado, a
hipótese de incidência do imposto de renda corresponde a um conjunto de fatos, qual seja, a série de rendas auferidas
pelo contribuinte durante o ano-base. A hipótese de incidência pode referir-se também a uma situação jurídica. como
a transmissão da propriedade em relação do IPTU.
2.2. Fato gerador da obrigação tributária acessória
Fato gerador da obrigação acessória, consoante o art. 115 do CTN, é qualquer situação que, na forma da
legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal (pagamento de
tributo e de penalidade), como apresentação de declaração de bens, exibição de livros obrigatórios, não destruição de
documentos e livros obrigatórios pelo prazo prescrito na lei. etc.
Atente-se que enquanto a hipótese de incidência da obrigação tributária principal só pode ser definida em lei (CTN,
art. 97 III). A hipótese de incidência da obrigação tributária acessória pode decorrer de lei, decreto ou norma
complementar porque o art. 115 do CTN emprega a expressão legislação tributária, cujo concerto nos é dado pelo art.
96 do CTN.
3. Classificação
O fato gerador pode ser instantâneo ou complexivo conforme a clássica lição de Amilcar de Araújo Falcão:
"Instantâneos são os fatos geradores que ocorrem num momento dado de tempo e que, cada vez que
surgem, dão lugar a uma relação obrigacional tributária autônoma. Complexivos ou periódicos são os fatos
geradores cujo ciclo de formação se completa dentro de um determinado período de tempo e que consistem
num conjunto de fatos, circunstâncias ou acontecimentos globalmente considerados."
Exemplificando, podemos dizer que fato gerador instantâneo é a saída da mercadoria do estabelecimento do
contribuinte; em relação ao ICMS, é a entrada da mercadoria estrangeira no território nacional; quanto ao imposto de
importação, é a transmissão da propriedade de um bem imóvel, no que concerne ao imposto de transmissão; fato
gerador complexivo, periódico ou de formação sucessiva, e para o imposto de renda, no regime de declaração, a
renda, correspondente a um "fluxo de riqueza que vem ter às mãos do seu destinatário e que importa um aumento do
seu patrimônio, durante um período de tempo determinado".
Sobre a importância da distinção entre fato gerador instantâneo e complexivo, reportamo-nos ao que
escrevemos em comentário ao art. 105 do CTN no tocante à aplicação da legislação tributária (Capítulo XII).
4. Importância
A importância do fato gerador para o estudo do Direito Tributário pode ser facilmente constatada através do
conhecimento dos efeitos por ele produzidos", lembrando que empregando a expressão fato gerador e não hipótese
de incidência, estamos nos referindo à situação in concrete, ou seja, efetivamente ocorrida e não prevista abstrata-
mente na lei. Os efeitos do fato gerador são os seguintes:
a) fixa o momento em que se materializa a obrigação tributária principal prevista abstratamente na lei
(CTN, art. 113, § 1º),
b) identifica o sujeito passivo da obrigação tributária porque, enquanto a situação prevista em lei não
ocorre, o sujeito passivo indeterminado em razão da generalidade da norma jurídica;
c) fixa os concertos de incidência, não-incidência e isenção; incidência é a concreção da situação
prevista abstratamente na lei; não-incidência é a não materialização da situação prevista na lei, isenção é a
ocorrência do fato gerador, mas com a dispensa legal do pagamento do tributo;
d) determina o regime Jurídico da obrigação tributária, e, assim, a lei a ser aplicada será aquela que
estiver vigorando no momento da ocorrência do fato gerador, ainda que no momento do lançamento esteja
revogada ou modificada (CTN, art. 144), e salvo disposição de lei em contrário, quando o valor tributário
esteja expresso em moeda estrangeira, como ocorre, por exemplo, com os impostos aduaneiros, no
lançamento far-se-á sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia da ocorrência do fato gerador da
obrigação (CTN, art. 143);
e) distingue os tributos in genere porque é o exame do fato gerador que determine a sua natureza
jurídica específica (CTN, art. 42);
f) diferencia os impostos in specie em razão também do exame do fato gerador, permitindo que a
Constituição discrimine os impostos de competência privativa em relação a cada ente político;
g) classifica os impostos em diretos e indiretos, porque o fato gerador do imposto direto é uma situação
com certa permanência, como a existência, a propriedade e a profissão, enquanto o fato gerador do imposto
indireto corresponde a atos ou situações acidentais, como o consumo;
4. h) estabelece os princípios de atuação da discriminação constitucional de rendas no Brasil. define a
competência impositiva e determina os casos de invasão de competência e de bitributação.
i) permite a distinção entre tributo vinculado e não vinculado, porque o fato gerador do tributo
vinculado corresponde a uma ação estatal específica relativa ao contribuinte, enquanto o tributo não
vinculado refere-se a uma situação inteiramente estranha a atividade estatal;
j) serve de índice, de medida, da capacidade contributiva do indivíduo porque a lei tributária quando
define uma dada situação como hipótese de incidência do tributo parte da premissa de que essa situação
revela uma determinada capacidade contributiva;
k) permitir a definição da base de cálculo do tributo, porque essa sendo a sua expressão econômica
deve guardar uma certa identidade com o fato gerador.
5. Elementos
Os elementos do fato gerador são os seguintes:
a) objetivo, correspondente a situação descrita em lei para, ocorrendo, fazer com que a obrigação tributária,
prevista abstratamente na lei, se concretize. Tal situação pode constar apenas de um fato (fato gerador
instantâneo ou simples) ou de um conjunto de vários fatos (fato gerador complexo, complexivo ou
periódico);
b) subjetivo, referente aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária;
c) espacial, pelo qual a lei aplicável seria aquela vigente no lugar onde ocorrer o fato gerador (CTN, art.
102);
d) temporal, pelo qual se determina o momento em que a obrigação tributária se concretizou, e, em
consequência, a lei que a disciplinará será a vigente naquele momento determinado (CTN, art. 144);
e) valorativo, que constitui a expressão econômica do fato gerador referente à base de cálculo, valor
numérico do fato gerador, que permite saber a alíquota aplicável e a quantia a ser paga.
6. Negócios jurídicos condicionais: momento da ocorrência do fato gerador
Os atos ou negócios jurídicos praticados ou efetuados pelo contribuinte podem ser condicionais, isto é,
subordinados a uma condição, suspensiva ou resolutória.
Como se sabe, condição, nos termos do art. 114 do Código Civil, é a cláusula que subordina o efeito do ato
jurídico a um evento futuro e incerto. A condição é suspensiva quando a eficácia do ato fica pendente do seu
implemento (Código Civil, art. 118), e resolutiva quando ocorrendo o evento futuro e incerto, o ato jurídico cessa de
ter eficácia (Código Civil, art. 119). Assim, o fato subordinado a uma condição suspensiva só produzirá efeitos
jurídicos no momento em que ocorrer a condição. Só neste momento é que se terá adquirido o direito pretendido,
enquanto o ato subordinado a uma condição resolutória produz efeitos desde o momento de sua prática, cessando sua
eficácia. no entanto, com o implemento da condição. Exemplificando, podemos dizer que a condição é suspensiva
quando A promete vender seu apartamento a B, se este casar com C, ficando a eficácia do ato (compra e venda)
suspensa até que se efetive o casamento de B com C (evento futuro e incerto). A resolutória a condição quando A dá
em comodato seu imóvel a favor de B, enquanto este estiver residindo no Rio de Janeiro, caso em que o ato
(comodato) produz efeitos desde o momento de sua celebração, mas cessará a sua eficácia quando B deixar de residir
no Rio de Janeiro (implemento da condição).
O CTN trata dos atos ou negócios jurídicos condicionais em seu art. 117, que está vinculado, por expressa
referenda, ao inciso II do art. 116, pois somente a situação jurídica pode estar sujeita à condição. Desta forma, e
salvo disposição de lei em contrário, sendo a condição suspensiva, os atos ou negócios Jurídicos reputam-se perfeitos
e acabados com o implemento da condição, sendo a condição resolutória desde o momento da prática do ato ou da
celebração do negócio. Em consequência, no caso de ato subordinado à condição suspensiva, o fato gerador
considera-se ocorrido no instante em que houver o implemento do evento futuro e incerto, e na hipótese do ato
subordinado à condição resolutória, o fato gerador considera-se existente no momento da prática do ato.
Por último, cabe uma observação quanto ao fato do art. 117 do CTN referir-se a atos ou negócios jurídicos.
Caio Mário da Silva Pereira, com a autoridade e precisão de sempre, leciona que a expressão ato jurídico, em sentido
lato, compreende as ações humanas,
“tanto aquelas que são meramente obedientes à ordem constituída, determinantes de consequências
jurídicas ex lege, independentemente de serem ou não queridas outras declarações de vontade, polarizadas
no sentido de uma finalidade, hábeis a produzir efeitos jurídicos queridos. A esta segunda categoria,
constituída de uma declaração de vontade dirigida no sentido da obtenção de um resultado, é que a doutrina
tradicional denominava ato jurídico (stricto sensu), e a moderna denomina negócio jurídico".
5. O referido jurista observa ainda que o art. 81 do Código Civil compreende as duas noções: ato Jurídico e
negócio jurídico. Isso porque o ato jurídico, tal como entendido e estruturado na sistemática do Código Civil de
1916 (art. 81),
"também conceitualmente se funda na declaração de vontade, uma vez que, analisado em seus elementos,
acusa a existência de uma emissão volitiva, em conformidade com a ordem legal, e tendente à produção de
efeitos Jurídicos. Entretanto, como dito anteriormente, o 'ato jurídico' e o 'negócio jurídico, se distinguem.
Aquele é a declaração de vontade, em que o agente persegue o efeito Jurídico (Rechiesgeschaft): no ato
jurídico stricto sensu ocorre manifestação volitiva também., mas os efeitos Jurídicos são gerados
independentemente de serem perseguidos diretamente pelo agente... Os 'negócios jurídicos' são, portanto,
declarações de vontade destinadas à produção de efeitos Jurídicos queridos pelo agente; os 'atos jurídicos'
em sentido estrito são manifestações de vontade, obedientes à lei, porém geradoras de efeitos que nascem
da própria lei.
7 . Tributação de atos nulos, anuláveis, imorais e ilícitos
Não podemos encerrar a parte referente ao fato gerador sem tratar do problema da tributação ou não de atos
nulos, anuláveis, ilícitos, criminosos e imorais.
O Código Civil, em seu art. 82, reza que a validade do ato jurídico requer agente capaz, objeto licito e forma
prescrita ou não defesa na lei. Por outro lado, o art. 145 do Código Civil considera nulo o ato jurídico quando: a)
praticado por pessoa absolutamente incapaz; b) não revestir a forma prescrita em lei; c) for preterida alguma
solenidade que a lei considera essencial para a sua validade; d) a lei taxativamente o declarar nulo ou lhe negar
efeito. Declarada a nulidade do ato, os efeitos de tal declaração retroagirão de modo a alcançar o ato, que será
considerado como se nunca tivesse sido praticado, passando-se uma borracha nos efeitos que tenha produzido.
Anulável é o ato que se reveste dos elementos essenciais exigidos para a sua forma, mas apresenta um vício
que diz respeito à proteção de interesses individuais, correspondentes à prática por agente relativamente incapaz ou
por conter vício resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude (Código Civil, art. 147). A decisão que anula o
ato produzirá efeitos somente a partir de sua prolação, não afetando os efeitos jurídicos por ele ocasionados
anteriormente.
Tendo em vista que interessa ao Direito Tributário apenas os efeitos econômicos produzidos pelos atos, o
inciso 1, em sua parte inicial, do art. 118 do Código Tributário Nacional prescreve que a definição legal do fato
gerador é interpretada com a abstração da validade dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis
ou terceiros. Assim, pouco importa para o Direito Tributário, na interpretação da definição legal do fato gerador se o
ato é nulo ou anulável para o Direito Privado, pois se o mesmo produziu efeitos econômicos, a obrigação tributária se
concretiza e o tributo será devido. Ademais, ocorrendo a incidência tributária e pago o tributo, o mesmo não será
devolvido ao contribuinte se o ato vier a ser considerado nulo ou for anulado, em razão da produção dos citados
efeitos econômicos. Todavia, como muito bem observa Ricardo Lobo Torres, "declarada a invalidade do negócio
Jurídico pelo Judiciário, e desde que não tenha tido eficácia econômica, a Fazenda estará obrigada a restituir o
tributo".
A segunda parte do inciso 1 do art. 118 do CTN reza também que na interpretação da definição legal do fato
gerador é igualmente irrelevante a natureza do objeto do ato. Assim, não interessa para a autoridade tributária se o
ato é lícito ou ilícito, criminoso ou imoral, pois o que importa é ocorreu o fato gerador do tributo. A jurisprudência
anterior ao Código Tributário Nacional resistia em tributar tais atos sob o fundamento de que o Estado não deveria
tirar proveito de um ato ilegal, por ele mesmo proibido. Entretanto, após o advento do CTN, não vemos como possa
prosperar tal entendimento diante da clareza do art. 118, I, que decorre do fato de o fato gerador ser um fato
econômico com relevo no mundo jurídico servindo de medida da idade econômica do contribuinte. Ademais, o fato
de o Estado cobrar imposto de renda da pessoa que aufira rendimentos da exploração do jogo o bicho ou de uma casa
de prostituição não tem o condão de legitimar tais atividades. Isso porque o CTN, em seu art. 39, prescreve que a
prestação tributária ndo constitui sanção (legalização, validação) de ato ilícito. De outro lado, a não tributação de tais
rendimentos feriria a regra da igualdade tributária se o Estado tributasse apenas os rendimentos auferidos de
atividades licitas, quando a percepção de rendimentos nas duas atividades caracteriza a ocorrencia do fato gerador do
imposto de renda. A tributação de atividades ilicitas, morais, criminosas, etc., tem respado ainda no principio do non
olet criado por Vespasiano.
Não se deve, no entanto, esquecer, como muito bem observe Hugo de Brito Machado, que a lei não pode
definir como hipótese de incidência de tributo uma atividade ilícita, porque não é isso que o legislador quer expressar
no art. 118, I. O que ele autoriza é que se a situação prevista abstratamente na lei (v.g., a percepção de rendimentos)
materializar-se em decorrência de uma atividade ilícita, ou seja, na ocorrência do fato gerador, o tributo deve ser
cobrado.
Assim, o art. 118 do Código Tributário Nacional reconhece a autonomia do Direito Tributário em relação ao
Direito Privado, bem como consagra, embora não de forma expressa, a adoção pelo Direito Tributário da
6. denominada interpretação econômica, ao fazer prevalecer os efeitos econômicos dos atos sobre a sua validade
jurídica e sobre a natureza do seu objeto.
SUJEITO ATIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
1. Interpretação necessária do art. 119 do CTN
O art. 119 do CTN prescreve que o sujeito ativo da obrigação tributária é a pessoa Jurídica de direito público
titular da competência para exigir o seu cumprimento. Este dispositivo merece alguns comentários.
Em primeiro lugar, a definição legal de sujeito ativo funda-se na competência tributária para exigir o
cumprimento da prestação tributária e não para instituir tributos. Em segundo lugar, e como corolário natural da
observação anterior, não são somente a União, os Estados, Distrito Federal e os Municípios, entes políticos, que
podem exigir cumprimento da prestação tributária. A Constituição da República, ao disciplinar as contribuições
parafiscais em seu art. 149, confere à União a competência privativa para a instituição de contribuições corporativas,
ou seja, de interesse de categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas
áreas. Ocorre que as entidades a que se refere o dispositivo constitucional sdo pessoas jurídicas de direito privado,
como a OAB, CREA, CRECI, sindicatos, etc. Disso decorre que tais pessoas jurídicas de direito privado são também
sujeito ativos da obrigação tributária porque lhes compete exigir o cumprimento das prestações tributárias relativas às
mencionadas contribuições corporativas.
Todavia, entendemos que as referidas entidades não podem valer se das normas da Lei n.º 6.830/80 para
cobrar seus créditos por duas razões: a ) não podem inscreve-las como dívida ativa, e a inscrição é pressuposto da
divida ativa; b) a causa petendi para a aplicação das normas da referida lei é a cobrança de dívida ativa; c) o art. 12
da LEF só permite a cobrança de divida ativa, tributária ou não tributária, aos entes políticos e às suas respectivas
autarquias. Ademais, as mesmas entidades não são dotadas do poder de tributar, ou seja, não podem instituir as
contribuições parafiscais que são carregadas para seus cofres, mas apenas exigi-las.
2. Territórios e Distrito Federal
Os Territórios não gozam de poder de tributar e, em conseqüência, de competência para instituir tributos, pois
não são pessoas de direito público interno, mas meras possessões administrativas, dotadas de maior ou menor
autonomia administrativa, conforme determina a lei outorgada pela União. Os Territórios, portanto, não gozam de
autonomia política nem financeira. Daí o art. 147 da Constituição atual e o item 1 do art. 18 do Código Tributário
Nacional prescreverem que cabe à União instituir nos Territórios Federais, não divididos em Municípios, os impostos
que são atribuídos pela Constituição aos Estados e aos Municípios, com o que a administração do Território
arrecadará não só os impostos estaduais como também os municipais. Se, porém, o Território for dividido em
Municípios, caberá à União instituir somente os impostos de competência federal e estadual, eis que os Municípios
dos Territórios, por serem pessoas jurídicas de direito público, poderão instituir seus próprios impostos, conforme
reza o inciso III do art. 48 do Decreto-lei n.º 411, de 8 de janeiro de 1969, que dispõe sobre a administração dos
Territórios Federais e a organização dos seus Municípios.
Por outro lado, a CP de 1988, no mesmo art. 147, em sua parte final, reza que o Distrito Federal tem
competência tributária estadual e municipal, isto é, pode instituir os impostos mencionados nos seus arts. 155 e 156.
3. Poder de tributar de organismos internacionais
Giuliani Fonrouge esclarece que, em consequência da internações, existem alguns organismos inter-
cionalização das finanças públicas, existem alguns organismos internacionais que são dotados de poder de tributar,
sendo, portanto, sujeitos ativos da obrigação fiscal em decorrência do exercício de tal poder. Assim, por exemplo, a
ONU, que cobra imposto progressivo sobre os vencimentos de seus funcionários e a Comunidade Européia de
Carvão e do Aço (CECA), entidade supracional independete dos Estados que a constituem, dotada de autonomia
financeira, que cobra também tributo sobre a produção de carvão e aço, devido compulsoriamente pelas empresas
produtoras.
4. Efeito do desmembramento territorial de pessoa jurídica de direito público
A Constituição, em seu art. 18, §§ 3º e 4º, permite a criação de novos Estados, Municípios e Territórios. Daí o
art. 120 do CTN prescrever que, salvo disposição de lei em contrário, a pessoa jurídica de direito público que resultar
do desmernbramento territorial de outra ficará sub-rogada nos direitos desta, adotando a sua legislação tributária, até
que entre ern vigor a sua própria legislação.
Essa regra comporta as seguintes observações.
7. Primeiro, a lei que dispuser em contrário deve ter natureza de lei complementar porque somente lei com tal
status pode dispor de forma diversa do CTN.
Segundo, o dispositivo visa a dar à pessoa jurídica de direito público que assim se constituir recursos
tributados durante o período transitório de sua organização administrativa., consagrando, assim, o que já ocorria, na
prática, antes do advento do Código Tributário, como no caso de Brasília, nos termos da Lei n2 3.751, de 13-04-
1960, que dispôs sobre a organização administrativa do Distrito Federal, a partir da mudança da capital para aquela
cidade.
Terceiro, o art. 120 do CTN objetiva também resolver o problema que existiria em decorrência do principio da
anterioridade da lei fiscal, pois a pessoa jurídica de direito público que resultasse do desmembramento territorial de
outra só poderia cobrar os tributos que instituísse a partir do exercício seguinte, o que seria, sem dúvida alguma,
altamente prejudicial às suas finanças. Assim, ao dispor o art. 120 do CTN que a pessoa jurídica, de direito público,
que se constituir pelo desmembramento territorial de outra, sub-roga-se nos direitos desta, poderá aplicar a legislação
tributária sem ferir o princípio da anterioridade da lei fiscal porque não estará criando ou majorando tributo.
Quarto, se o novo ente político resultar do desmembramento territorial de mais de uma pessoa Jurídica de
direito público, deve-se aplicar a legislação tributária mais favorável ao sujeito passivo, salvo se a lei de criação do
novo ente dispuser de maneira diferente.
Quinto, aplica-se também a norma contida no art. 120 do CTN no caso de remembramento ou fusão de
Município e de elevação de Território a Estado.
SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
1. Noção geral
Vimos, anteriormente. que um dos efeitos do fato gerador é identificar a pessoa do sujeito passivo da
obrigação tributária, uma vez que tal identificação não pode ser feita antes da sua ocorrência. Isso porque enquanto a
obrigação tributária existe apenas de forma abstrata na lei, o sujeito passivo é pessoa indeterminada.
Sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa física ou jurídica obrigada, por lei, ao cumprimento da
prestação tributária, principal ou acessória, esteja ou não em relação direta e pessoal com a situação que constitua
respectivo fato gerador.
O CTN, adotando a mesma sistemática empregada na definição de obrigação tributária (art. 113, §§ 1º e 2º) e
de fato gerador (arts. 114 e 115), define em separado sujeito passivo da obrigação tributária principal (art. 121) e
sujeito passivo da obrigação tributária acessória (art. 122).
2. Sujeito passivo da obrigação tributária principal
Assim, sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa, física ou jurídica, obrigada ao pagamento de tributo
ou penalidade pecuniária (CTN, art. 121). Sujeito passivo é a expressão genérica que comporta duas espécies:
contribuinte e responsável (CTN, art. 121, parágrafo único). O sujeito passivo necessariamente deve ser definido em
lei (CTN, art. 97, III) porque o princípio da tipicidade tributária, visando à maior proteção de quem deve pagar o
tributo, impõe que a lei defina todos os elementos da obrigação tributária para que não sobre espaço algum que possa
ser preenchido pela administração.
2.1. Contribuinte
Contribuinte é a pessoa, física ou jurídica, que tenha relação, de natureza econômica, pessoal e direta com a
situação que constitua o respectivo fato gerador (CTN, art. 121, parágrafo único, I). Assim, o contribuinte é sujeito
passivo direto, sua responsabilidade é originária, e existe uma relação de identidade entre a pessoa que nos termos da
lei deve pagar o tributo e a que participou diretamente do fato gerador, dele se beneficiando economicamente. Dai
ter natureza econômica a relação entre o contribuinte e a situação que caracteriza o fato gerador porque o CTN
adotou um critério econômico: cobrar de quem auferiu vantagem econômica da ocorrência do fato gerador,
desprezando os critérios territorial e de cidadania. Não se esqueça que o fato gerador é um fato econômico com
relevo no mundo jurídico e serve de índice, de medida, da capacidade contributiva do cidadão.
Assim, normalmente a lei confere a obrigação de pagar o tributo à pessoa que tenha estado em relação
econômica com a situação que constitua o fato gerador respectiva, ou seja, a pessoa que dela auferiu uma vantagem
econômica, ou seja, o contribuinte. Daí a lição de Amilcar de Araújo Falcão:
"Assim, verificado tal pressuposto de fato, sobressai logo a sua atribuição à pessoa, cuja capacidade
econômica ele traduz. A identificação do contribuinte, portanto, incumbe ao intérprete: independe de
menção na lei."
8. Assim, o mesmo autor prossegue dizendo que basta que a lei refira-se a venda, compra, rendimento,
propriedade imóvel, para se entender que os contribuintes dos impostos que recaem sobre estas operações são o
vendedor, o comprador, o que perceba rendimentos, ou quem detenha a propriedade econômica do prédio ou do
terreno. Desta forma, constituindo o fato gerador um índice, uma medida da capacidade contributiva do cidadão,
nada mais normal que seja o contribuinte a pessoa obrigada ao pagamento do tributo.
Por outro lado, o contribuinte de direito não se confunde com o contribuinte de fato, também denominado
meramente pagador de tributo. O contribuinte de fato não integra a relação jurídica tributária e, em consequência,
não tem a obrigação legal de pagar o tributo. Fá-lo, no entanto, em decorrência do fenômeno econômico da reper-
cussão, pela qual o contribuinte de direito lhe transfere a carga tributária, como já explicamos no Capitulo XI no item
relativo aos impostos indiretos.
2.2. Responsável
Por outro lado, art. 121, parágrafo único, II, do CTN define responsável como sendo a pessoa que, sem revestir
a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei. Assim, não tendo relação, de
natureza econômica, pessoal e direta com a situação que constitua o fato gerador, o responsável é sujeito passivo
indireto, sendo sua responsabilidade derivada por decorrer da lei e não da referida relação. A obrigação do
pagamento do tributo lhe é cometida pelo legislador visando a facilitar a fiscalização e arrecadação dos tributos.
Todavia, a lei não pode atribuir a responsabilidade tributária pelo pagamento de tributo a qualquer terceiro em
razão do que dispõe o art. 128, que aclara e complementa o art. 121, parágrafo único, II:
'Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade
tributária pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação,
excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento
total ou parcial da referida obrigação."
Podem ser feitos os seguintes comentários ao art. 128 do CTN.
Em primeiro lugar, o responsável é um terceiro, mas o legislador não tem liberdade para designar qualquer
terceiro como responsável tributário porque o mencionado dispositivo legal determine que esse terceiro tenha uma
vinculação de qualquer natureza com o fato gerador da respectiva obrigação. Assim, esse vínculo pode ser de
qualquer natureza, menos de natureza pessoal e direta, porque quem a tem é o contribuinte, e pode ser em relação ao
fato gerador ou com o próprio devedor, como demonstram os arts. 130 a 135 do CTN.
Em segundo lugar, a atribuição da responsabilidade tributária à terceira pessoa só pode ser por lei formal
porque o responsável é espécie de sujeito passivo e esse só pode ser determinado por lei em sentido estrito (CTN, art.
97. III).
Em terceiro lugar, a lei, ao designar o terceiro como responsável tributário, pode excluir a responsabilidade
tributária do contribuinte, através da figura da substituição tributária, ou atribui-la ao mesmo contribuinte em caráter
supletivo do cumprimento da obrigação tributária, caso de responsabilidade tributária propriamente dita, e mais
adiante examinaremos com mais profundidade estas duas figuras tributáras, substituição e responsabilidade,
enfocando-as à luz do CTN e da própria CF de 1988.
2.3. Distinção entre contribuinte e responsável
Antes de se diferenciar contribuinte e responsável, toma-se necessária, para que melhor se entenda a mencionada
distinção, uma breve exposição respeito da teoria dualista da obrigação.
A obrigação é composta de dois elementos: crédito-débito e garantia-responsabilidade. O elemento crédito-débito,
ou simplesmente débitum, corresponde ao dever de prestação, isto é, consiste no direito subjetivo do credor de
receber do devedor uma prestação determinada. Se o devedor não cumpre voluntariamente a prestação, surge o ele-
mento garantia-responsabilidade, ou meramente responsabilidade (obligatio), correspondente à sujeição do
patrimônio do devedor ao credor, vale dizer, consiste no poder que o Direito confere ao credor de obter coativamente
a satisfação de seu crédito mediante a apreensão no patrimônio do devedor de tantos bens quantos bastem para obter
a mencionada satisfação. Normalmente, esses dois elementos coexistem na obrigação, mas podem ser separados,
como leciona Paes Leães:
“A dívida é assim um vínculo pessoal; a responsabilidade, um vínculo patrimonial. O devedor obriga-se.
Seu patrimônio responde. "
Assim, pode existir débito sem responsabilidade, como no caso de obrigação natural, e responsabilidade sem
débito, como no caso da fiança. Daí Ricardo Lobo Torres estabelecer as seguintes diferenças fundamentais entre o
contribuinte e o responsável:
a) o contribuinte tem o débito (debitum, Schuld), que é o dever de prestação e a responsabilidade
(Haftung), isto é, a sujeição do seu patrimônio ao credor (obligatio), enquanto o responsável tem a
9. responsabilidade (Haftung) sem ter o débito (Schuld), pois ele paga o tributo por conta do contribuinte; b) a
posição do contribuinte surge corn a realização do fato gerador da obrigação tributária; a do responsável,
com a realização do pressuposto previsto na lei que regula a responsabilidade, que os alemães chamam de
fato gerador da responsabilidade (Haftungstatbestand)."
3. Sujeição passiva indireta
Não se pode tratar da sujeição passiva indireta sem se fazer referência à lição clássica de Rubens Gomes de
Souza, distinguindo duas modalidades de sujeição passiva indireta: transferência e substituição.
A sujeição passiva indireta por transferência se dá quando a obrigação tributária, depois de ter surgido contra
uma pessoa determinada (sujeito passivo direto), se transfere, em virtude de um fato previsto na lei e posterior à
ocorrência do fato gerador, para outra pessoa diferente (sujeito passivo indireto). Segundo o mesmo autor, são três as
modalidades de transferência: a) solidariedade (de direito); b) sucessão; c) responsabilidade. Mais adiante
examinaremos a responsabilidade tributária segundo o CTN.
4. Sujeito passivo da obrigação acessória
O sujeito passivo da obrigação acessória, nos termos do art. 122 do CTN, "é a pessoa obrigada às prestações
que constituam o seu objeto". Cabem as seguintes observações sobre o mencionado dispositivo: a) a pessoa referida
no dispositivo compreende tanto o contribuinte quanto um terceiro, ou seja, que não tenha relação direta com o fato
gerador; b) a obrigação tributária acessória corresponde a qualquer existência legal que não diga respeito ao
pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, compreendendo prestações positivas (obrigação de fazer) ou
negativas (obrigação de não-fazer); c) tal obrigação pode ser estabelecida pela legislação tributária, não se exigindo,
portanto, lei formal; d) obrigação tributária acessória é estabelecida no interesse da fiscalização ou arrecadação dos
tributos, correspondendo na realidade a verdadeiros deveres os instrumentos formais.
Podemos apontar como sujeitos passivos da obrigação tributária acessória, além do contribuinte, os
responsáveis tributários (CTN, art. 197, I a VI). Todavia, Hugo de Brito Machado chama atenção, corretamente, que
o dever de prestar informações ao fisco por quais entidades ou pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo,
ofício, função, ministério, atividade ou profissão (CTN, art. 197, VII) não consubstância obrigação tributária
acessória. Assim, segundo o mesmo autor, as pessoas referidas no mencionado dispositivo legal no seu inciso VII
não são sujeitos passivos de obrigação tributária. Daí conclui:
"Neste caso, portanto, esse dever de informar há de ser previsto em lei. Não em normas inferiores
integrantes da legislação tributária."
5. Convenções particulares
O CTN, em seu art. 123, determina que, salvo "disposições de lei em contrário, as convenções particulares,
relativas a responsabilidade pelo pagamento do tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública. para modificar a
definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes"".
Assim, podemos citar o exemplo do imposto de renda, cuja obrigação de pagar é da pessoa fisica que auferiu o
rendimento, que é, portanto, o contribuinte do imposto (CTN, art. 45). Se esta pessoa ajusta com o seu empregador
que este é que terá de pagar o imposto, não poderá, no entanto, o empregado, caso aquele não cumpra a obrigação
contratual, alegar e opor tal acordo à Fazenda Pública para escapar à sua responsabilidade tributária e modificar a
definição legal do sujeito passivo da obrigação tributária. Se o mesmo empregado for acionado pelo Fisco, não terá
outro caminho, senão pagar o imposto, embora possa, em seguida, pela via ordinária comum, haver do empregador o
que pagou baseando-se no contrato entre eles celebrado, existem duas relações jurídicas distintas. Uma, a relação
jurídica tributáriaentre o empregado, na qualidade de contribuinte e, portanto, sujeito ativo da obrigação tributária, e
o empregador não integra tal relação. Outra, uma relação de direito comum entre o empregador e o empregado, na
qual o Fisco não é parte, sendo válida essa relação entre as duas partes, mas ineficaz no que toca ao Fisco.
6. Solidariedade tributária
A solidariedade em matéria de obrigações tributárias é disciplinada pelo CTN, de forma genérica, em seus arts. 124 e
125, tratando o primeiro da solidariedade passiva e o segundo dos efeitos da solidariedade.
O Código Civil (parágrafo único do art. 896) prescreve que "há solidariedade, quando na mesma obrigação
concorrem mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito ou obrigado à dívida toda. O CTN não
define o instituto da solidariedade, tendo, portanto, adotado o conceito de solidariedade segundo o direito comum.
O art. 124 do CTN preve duas modalidades de solidariedade: de fato e de direito, ocorre solidariedade de fato
(inciso I) quando há uma pluralidade de pessoas com interesse comum na situação que constitua o fato gerador da
10. obrigação principal, como acontece, por exemplo, quando duas pessoas, em conjunto, importam uma determinada
mercadoria estrangeira, caso em que serão ambas responsáveis, como contribuintes, perante a Fazenda Pública pelo
pagamento do imposto de importação. A solidariedade de direito (inciso II) resulta de determinação expressa da lei,
pelo que uma pessoa, mesmo que não tenha um interesse comum na situação que constitua o fato gerador da
obrigação tributária, pode vir a responder solidariamente com o sujeito passivo direto pelo pagamento do tributo,
como ocorre nos casos referidos no art. 134 do CTN. Assim, a solidariedade de direito ocorre entre o contribuinte e
o responsável.
A solidariedade caracteriza-se pela faculdade que tem o credor de escolher o devedor contra o qual agird, pelo
que não se pode falar em substituição do devedor neste caso, eis que sua obrigação permanece intacta.
O Parágrafo único do art. 124 expressamente afastou a possibilidade do devedor solidário invocar a seu favor o
benefício de ordem, ou seja, pretender que o Fisco primeiro procure cobrar o tributo do sujeito passivo direto, do
contribuinte, e somente no caso deste não possuir bens, ou serem seus bens insuficientes, poder se voltar contra ele,
devedor solidario. Assim, pode o Fisco agir indistintamente contra qualquer dos devedores solidários para exigir o
pagamento do tributo. Todavia, essa regra geral do parágrafo único do art. 124 é excepcionada pelo próprio CTN no
art. 134, como será mostrado mais adiante.
Não obstante o CTN adotar o concerto de solidariedade dado pelo Código Civil, o art. 125 estabelece os efeitos da
solidariedade em matéria tributária porque a lei tributária pode dar ao mesmo institute efeitos distintos dos atribuídos
pelo Direito Privado, por força do que dispõe o art. 109 do CTN: "os princípios gerais de direito privado utilizam-se
para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, concertos e formas, mas não para a definição
dos respectivos efeitos tributários.
Salvo disposição de lei em contrário, os efeitos da solidariedade referidos no art. 125 são os a seguir comentados.
O pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais, ou seja, extingue-se a relação 'uridica
tributária entre o Fisco e todos os devedores. Assim, sendo três, por exemplo, os proprietários de um bem imóvel, o
pagamento do IPTU por qualquer um deles exonera os demais da obrigação tributária perante o Fisco. É 1ógico que
o devedor solidário que efetuar o pagamento poderá, com base na relação jurídica interna entre ele e os demais
devedores, recuperar dos co-devedores a sua quota (CC, art. 913).
A isenção ou rernissão de crédito exonera os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo,
nesse caso, a solidariedade quanto aos demais, pelo saldo.
A isenção significa dispensa por lei do pagamento do tributo devido, sendo uma forma de exclusão do crédito
tributário (CTN, art. 175). A isenção é objetiva quando concedida em função da matéria tributável e subjetiva
quando concedida em função da pessoa do contribuinte. Assim, tratando-se de isenção objetiva, alcançando a
própria situação definida pela lei como fato gerador do tributo, a sua outorga exonera de responsabilidade tributária
todos os co-devedores. Mas no caso da isenção ter sido concedida de natureza subjetiva somente a urn dos
devedores solidários, os demais co-devedores continuardo responsáveis pelo saldo do valor do tributo devido.
Exemplificando: A, B e C adquirem, a título oneroso, um bem imóvel, ocorrendo, portanto, o fato gerador do
imposto de transmissão inter vivos, sendo de R$ 900,00 o valor devido. Todavia, lei municipal concede isenção do
referido imposto a B, caso em que os demais co-devedores (A e C) responderão perante o Fisco pelo saldo do valor
do tributo, que é de R$ 600,00, porque do valor total do tributo (R$ 900, 00) deve-se abater o valor referente a B (R$
300,00) em razão da isenção subjetiva.
O mesmo efeito ocorre com a remissão, que é forma de extinção de crédito tributário (CTN, arts. 156, IV e 172),
significando perdão da dívida tributária. Assim, se concedida a todos os devedores, ficará extinto o crédito tributário,
mas se concedida somente a um ou alguns deles, os demais continuarão a responder pelo valor da obrigação que
sobejar.
A interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica os demais. Como se
sabe, a prescrição consiste na perda do direito de ação pelo decurso do prazo pela inércia do credor da obrigação.
Daí o Código Tributário Nacional, em seu art. 156, item V, prescrever que, ocorrendo a prescrição, extingue-se o
crédito tributário, sendo o instituto regrado pelo art. 174 do CTN. Todavia, a prescrição pode ocorrer também contra
o contribuinte, afetando, por exemplo, seu direito de ação de pleitear a devolução de tributo pago indevidamente
(CTN, arts. 168 e 169).
Os casos de interrupção do prazo prescricional a favor do Fisco encontram-se enumerados no art. 174 do CTN,
pelo que, ocorrendo qualquer um deles em relação a qualquer dos obrigados, tal interrupção prejudica os demais
devedores solidários. De outro lado, o parágrafo único do art. 169 refere-se à interrupção do prazo prescricional
contra o Fisco no caso de pagamento indevido.
7. Capacidade tributária
O nosso Código Tributário, seguindo a orientação moderna, reconheceu a autonomia do Direito Tributário, ao
prescrever no art. 126, que têm capacidade de assumir obrigações tributárias as pessoas que, pelo direito privado,
sejam incapazes, por si, de praticar atos jurídicos. Assim, em decorrência ensina que:
11. “Toda vez que um sujeito provido ou não de capacidade de Direito Privado, realiza concretamente e de
forma autônoma uma das circunstâncias suas de fato abtranente presumidas pela lei tributária, cumpre os
pressupostos necessários e suficientes para assumir a capacidade de ser sujeito das relações jurídicas
tributárias.”
Desta forma, o art. 126 do CTN reza que a capacidade tributária passiva independente: a) da capacidade civil
das pessoas naturais; b) de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do
serviço das atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios; c) de
estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure um unidade econômica ou profissional.
Assim, mais uma vez o nosso Código Tributário deixa claro que consagrou a orientação pela qual o que
interessa ao Direito Tributário é o aspecto econômico, a relação econômica subjacente existente na situação
tributária. Assim, se um menor, por seu representante na ou um advogado impedido de exercer a profissão, ou
ainda uma sociedade não regularmente constituída nos termos da lei mercantil (sociedade de fato ou irregular),
praticarem atos sujeitos à incid6encia de tributos, não poderão invocar a rnenoridade, a proibição do exercício da
profissão ou a existência ilegal da pessoa jurídica para escaparem ao cumprimento da obrigação tributária.
8. Domicílio tributário
No direito comparado não existe um consenso sobre a definição de domicílio fiscal, embora predomine o
entendimento de que deva prevalecer o interesse da Fazenda, objetivando uma cobrança mais rápida e simples do
tributo, bem como facilitar a fiscalização por parte das autoridades fazendárias.
O CTN disciplina a matéria em seu art. 127, partindo do entendimento de que o sujeito passivo da obrigação
tributária tem liberdade de escolher seu domicílio fiscal. Entretanto, a autoridade administrativa pode recusá-lo,
quando o domicílio fiscal escolhido pelo sujeito passivo impossibilite ou dificulte a atividade de arrecadação ou fis-
calização do tributo, com o que fica claro que a liberdade de eleição pelo sujeito passivo à relativa. Por outro lado,
Aliomar Baleeiro adverte que a recusa do domicílio fiscal eleito pelo sujeito passivo deve ser fundamentada. Assim,
podemos dizer que é relativa e não absoluta a referida liberdade que tem o sujeito passivo na eleição de seu
domicílio fiscal.
Se o sujeito passivo não elege o seu domicílio fiscal, na forma da legislação aplicável, o CTN determina a
aplicação das seguintes regras.
Tratando-se de pessoal natural, o domicílio fiscal será, em primeiro lugar, sua residência habitual, ou seja, o
lugar onde ela habite de forma permanente e não transitoriamente, sendo, em resumo, nos termos do art. 31 do
Código Civil, o local onde a pessoa se estabeleça com ânimo definitivo. Em segundo lugar, se a sua residência for
incerta ou desconhecida, considerar-se-à como sendo seu domicílio o lugar onde mantenha o centro principal de
suas atividades, que é o denominado domicílio de negócio. Em terceiro lugar, se várias forem as suas residências ou
diversos seus centros de ocupação, deve-se aplicar a reerra do art. 32 do Código Civil, caso em que qualquer uma de
suas residências ou qualquer urn de seus centros habituais de atividade serd considerado como seu domicílio fiscal.
Quanto as pessoas jurídicas de direito privado ou as firmas individuais, seu domicílio fiscal será o lugar onde
tenham sua sede, presumindo, assim, a lei, que na mesma esteja o centro principal de suas atividades. Se, no entanto,
a pessoa jurídica tiver uma pluralidade de estabelecimentos, considerar-se-á o local onde tenham sido praticados os
atos ou os fatos que deram origem à tributação, seguindo, assim, o principio do Código Civil, em seu art. 35, § 3º.
No que conceme às pessoas jurídicas de direito público, o seu domicílio fiscal será o lugar de qualquer de
suas repartições no território da entidade tributante. Não se esqueça de que as pessoas jurídicas de direito público
gozam de imunidade tributária apenas em relação a impostos, e mesmo assim somente sobre patrimônio, renda e
serviços (CF, art. 150, VI , a, e CTN, art. 92, IV, a), bem como que a imunidade não dispensa cumprimento das
obrigações tributárias acessórias (CTN, art. 9º, § 1º).
Finalmente, caso o sujeito passivo não tenha eleito o seu domicílio fiscal, na forma da legislação aplicável, ou,
embora o tendo escolhido, foi o mesmo recusado pela autoridade administrativa, ou ainda quando não couber a
aplicação de qualquer das regras acima mencionadas, correspondentes aos incisos 1 a III, do art. 127 do CTN, o
referido domícilio será o lugar onde estejam situados os bens ou onde tenham ocorrido os atos ou fatos que deram
origem à obrigação (CTN, art. 127, § 1º). Tal regra deve ser aplicada no caso do sujeito passivo residir fora do
território nacional, e visa a facilitar a arrecadação do tributo e dar mais segurança ao fisco na sua atividade
fiscalizadora (CTN, art. 127, § 2º).
LANÇAMENTO
Por não terem sido alterados os arts. 139 a 150 do CTN, que cuidam do crédito tributário e do lançamento,
prefiro comentá-los neste estudo.
12. 1. Crédito Tributário
Disposições gerais
"Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta".
Referindo-se o Título II do Livro obrigação tributária e o Título III ao crédito tributário, fez o Código a
distinção entre os dois conceitos, consagrando a estrutura dualista da relação obrigacional. Esta teoria remonta ao
direito antigo romano, que estabelecia como elementos da obrigação, além das partes, o debitum e a obligatio. O
debitum era conceituado como o objeto da prestação que era devido, podendo ser um dare, um facere, ou um non
facere. A obligatio constrange o devedor a pagar. Enquanto o debitum é um elemento não coativo, a obligatio é um
elemento coativo. Esta distinção desaparece no Direito pós-clássico - Modernamente, a teoria dualista
reaparece, em primeiro lugar, no Direito germânico, que fez a distinção entre shut (debitum), e haftung (obligatio).
A aceitação da estrutura dualista da relação obrigacional no Direito germânico deveu-se a pesquisa sobre a obligatio
romana efetuada por Brinz, que negou à obligatio o caráter de dever jurídico, salientando que ela não consistia no
dever de realizar uma prestação, mas na responsabilidade em que incorria o sujeito passivo pelo inadimplemento
deste dever, que seria o debitum (shun). Conclui, por conseguinte, a existência dos dois elementos: o debitum (shuld)
e a obligatio (haftung), que além de surgirem em momentos diversos são substancialrnente diferentes. Enquanto o
debitum (shuld) surge desde a formação do vínculo obrigacional, a obligatio (haftung) surge no caso de não ser
realizada a prestação. Enquanto o debitum (shun) é um elemento não coativo - sendo o devedor livre para realizar ou
não a prestação - a obligatio (haftung) é um elemento coativo, pois caso não seja realizada a prestação pelo devedor,
surge para ele a responsabilidade decorrente do inadimplemento. Conclui Brinz que ao lado da obligatio rei (a coisa
empenhada responde pelo débito) existe a obligatio personae (primeiramente o corpo do devedor respondia pela
dívida, tendo mais tarde a responsabilidade se deslocado para seu patrimônio), englobadas num único conceito:
relação pela qual uma coisa ou uma pessoa é destinada a servir de satisfação ao credor por uma prestação. Assim o
elemento responsabilidade (obligatio, haftung) não é eventual nem subordinado ao debitum (shuld), mas, pelo
contrário, este subordinado àquele. Inúmeros autores seguiram os estudos pioneiros de Brinz. Perozzi, partindo da
observação de que o direito das obrigações se confunde com o direito subjetivo (ambos nada mais são do que a
faculdade concedida pelo direito objetivo a alguém de exigir de outrem certo comportamento), procura explicar
porque, tradicionalmente, aquele sempre foi considerado como um ramo deste, ou por que sempre se distinguiram as
obrigações dos demais deveres Jurídicos, concluindo que a resposta se encontra na evolução histórica porque passou
a obligatio no Direito romano. Salientando que o conceito de obrigação surgiu antes da Constituição do Estado
Romano, fez ver que ela decorria sempre de um débito, ficando o ofensor sujeiito (obligatio) ao ofendido. A
vingança foi, mais tarde, substituída por um acordo (pactum) entre ofensor e ofendido, passando-se a admitir que a
obligatio derivava de um contrato. Neste contrato, era oferecido à vítima, pelo ofensor, a garantia de um terceiro,
que seria responsabilizado em caso de não ser o pacto cumprido. O debitum era do ofensor, a obligatio, do terceiro.
Aos poucos os dois elementos reuniram-se na pessoa do ofensor, que passou a ser o garante de si mesmo. Com a
criação do Estado Romano, sendo a obligatio considerada uma situação anormal, uma vez que o ofensor estava sujei-
to à vingança da v'tima, não mais se admitiu a criação de outros débitos que não os já existentes, uma vez que
decorressem obligationes. O mesmo não sucedeu com os contratos, pois só mais tarde, com o principado, é que
deixam de ser criados. Deixa de existir um conceito genérico de obligatio, existindo conceitos especifícos das várias
obligationes gerados pelos delitos e contratos existentes. Quando surgiu o conceito genérico de obrigação,
conservou-se a distinção entre obligatio e os demais deveres jurídicos.
A Von Tuh distingue crédito e pretensão, sendo esta o direito de reclamar a prestação. O crédito existe com o
surgimento da dívida, mas para que haja a pretensão é precisa que a mesma dívida possa ser reclamada. Mas o
direito à execução não constitui pretensão, mas uma faculdade, derivada do crédito, que o autoriza a intervir no
patrimônio do devedor. Enquanto a pretensão se dirige contra a pessoa do devedor, de quem o credor reclama a
prestação, a ação executiva não se dirige, na maioria dos casos, contra o próprio devedor, mas contra o seu
patrimônio. Temos, assim, num primeiro plano, que o objeto do crédito é evidentemente o devedor; mas considerada
a coisa a fundo - prossegue Von Tuhr - se o crédito se traduz em uma condenação por falta de pagamento, se vê que
o verdadeiro objeto, sobre que versa, é seu patrimônio. A situação jurídica do patrimônio exposto à ação executiva
do credor pode ser expressa, com bastante exatidão, pela palavra responsabilidade. O crédito encerra, por
conseguinte, um dever para o devedor e uma responsabilidade para o seu patrimônio.
Amira, apos pesquisa nas fonte germânicas, demonstra que os conceitcos de dívida (debitum, shuld) e de
responsabilidade (obligatio, haftung) são distintos , sendo shuld uma relação de dever e haftung uma relação de
sujeitação de uma coisa ou um patrimônio em garantia de um débito. Na relação de dever (debitum, shuld) há quem
deve; na de responsabilidade (obligatio, hatftung), quem responde.
Na Itália, a teoria dualista foi desenvolvida por Pacchioni, Rocco, Carnelutti, Gangi e, ainda, no plano do
Direito Tributário, por Rotondi. Temos, então, o debitum (shuld) que consiste na obrigação que tem o devedor de
13. realizar a prestação, e a obligatio (haftung), que corresponde à responsabilidade, ou seja, ao poder que tem o credor
sobre o patrimônio do devedor para realizar o seu crédito.
No Brasil, Orlando Gomes acolhe a necessidade da distinções concluindo que sem a obligatio (haftung) a
relação obrigacional não se aperfeiçoa, sendo então necessário destacá-la do debitum (shuld) para que se possa
definição do então necessário conceito dos direitos de crédito com maior precisão, o conteúdo dos direitos do crédito.
Ruggiero admite a teoria apenas como posição especulativa o como meio didático para melhor se penetrar na
estrutura íntima da obrigação, uma vez que na moderna obrigação debitum (shuld) e obligalio (haftung) aparecem
constantemente unidos.
A teoria é combatida pelos portugueses Manuel A. Domingues de Andrade e João Matos Antunes Varella, que
adotam a tese tradicional da estrutura monista da relação obrigacional. O primeiro salienta que a noção geral de
responsabilidade é um quid exterior ao conceito e à estrutura interna da relação obrigacional. O elemento
responsabilidade refletirá, assim, quanto às obrigações, o momento sanção ou garantia. Mas - frisa em seguida - "em
todas as relações jurídicas a sanção ou garantia é um elemento exterior, que não faz parte do respectivo conceito e
estrutura interna". A responsabilidade será, assim, uma figura de Direito Processual, pois se trata aí dos meios de dar
realização judicial ao direito material do credor. O segundo afirma que os defensores da tese dualista desiocarain o
eixo da obrigação para o seu elemento real ou patrimonial, confundindo a direção principal da relação creditória com
a sua sanção, que é um momento subsidiário dela, culminando por eliminar o traço fundamental de distância entre os
direitos de crédito e os direitos reais.
Não é esta a oportunidade de considerarmos o acerto ou não da tese dualista. Certa ou errada, necessária ou
não ao perfeito entendimento da relação obrigacional, o fato é que o Código Tributário Nacional consagra a teoria
apesar de não utilizar a necessária precisão terminológica. Utiliza o termo obrigação no sentido de debitum (o shuld
germânico), e o termo crédito no sentido de obligatio ( o haftung germânico). Houve, por assim dizer uma inversão
da terminologia romana, não estando, no entanto, aí, a falta de precisão terminológica acima referida. O que parece
importante salientar é que, utilizando as expressões obrigação tributária e crédito tributário, para significar,
respectivamente, relação de dever (elemento não coativo da relação obrigacional) e relação de poder (elemento
coativo), poderia o texto levar à conclusão de que da ocorrência do fato imponível fato gerador) nasce um dever
(debitum, shuld) e mera expectativa do direito de crédito. Teríamos então do lado passivo um dever de prestar e do
lado ativo uma expectativa do credor: a de receber a prestação. Haveria então um débito do lado passivo sem o
correspondente crédito do lado ativo, onde haveria apenas um estado de confiança jurídica, para usarmos uma
expressão de Pacchioni. MasS não é assim. Não há débito sem crédito nem crédito sem débito. Observa com multa
facilidade L. G. Paes de Barros Ledes que a relação crédito débito, tal como duas faces de uma mesma moeda, é uma
realidade incindível, não podendo haver um sem o outro. Surgindo o débito, surge inexoravelmente o crédito
tributário. Se da ocorrência do fato imponível (fato gerador) surge o débito do lado passivo, surgirá imediatamente o
crédito do lado ativo. É esse exatamente o sentido deste artigo. O que o Código Tributário Nacional distingue é a
relação de débito (debitum, shuld), que denomina obrigação tributária principal, da relação de responsabilidade
(obligatio, haftung), que denomina crédito tributário.
Art. 140. As circunstâncias que modificam o crédito tributário, sua extensão ou seus efeitos, ou as
garantias ou os privilégios a ele atribuídos, ou que excluem sua exigibilidade não afetam a obrigação
tributária que lhe deu origem.
Confirma este artigo a autonomia de crédito em relação à obrigação tributária, que permanece inalterada ainda
que possam ocorrer modificações no crédito. Havendo a exclusão da exigibilidade do crédito, teremos a existência
da obrigação (debitum, shuld, relação de débito), sem correspondente crédlio (obligatio, haftung, relação de
responsabilidade). Excluída, no entanto, a relação de responsabilidade (obligatio, haftung, crédito tributário), perde
o sujeito ativo o poder de agredir o patrimônio do sujeito passivo para forçar a prestação, isto porque extinguiu-se o
elemento coativo da relação obrigacional. Subsistindo, entretanto, a obrigação (debitum, shuld, relação de débito),
não poderia o sujeito passivo repetir caso tenha efetuado o pagamento. Se, no entanto, for extinta a obrigação
(debitum, shuld, relação de débito), por qualquer que seja a razão, extingue-se, lnexoravelmente, o crédito (obligatio,
haftung, relação de responsabilidade) dela decorrente.
Art. 14 1. O crédito tributário regularmente constituído somente se modifica ou extingue, ou tem sua
exigibilidade suspensa ou excluída, nos casos previstos nesta lei, fora dos quais não podem ser dispensadas,
sob pena de responsabilidade funcional na forma da lei, a sua efetivação ou as respectivas garantias.
Uma vez formada a relação de responsabilidade, isto é, regularmente constituição o crédito tributário
(obligatio, haftung) não podem as autoridades fazendárias suspender a sua exigibilidade ou excluí-la. Como veremos
a atividade de constituição do crédito tributário é plenamente vinculada, e não pode a autoridade desfazer, por
atividade discricionária, aquilo que só pode ser feito por atividade vinculada. Uma vez constituído o segundo
elemento da estrutura obrigacional, exatamente o elemento coativo (obligatio haftung, crédito tributário, relação de
14. responsabilidade), através de uma atividade vinculada da administração, não pode o sujeito ativo ser privado do seu
poder de coação em consequência de uma atividade discricionária de funcionários do fisco. Não pode, por
conseguinte, a autoridade administrativa abster-se de exigir do sujeito passivo a satisfação do crédito sob pena de ser
de ser responsabilizado funcionalmente. Como a obrigação tributária decorre da lei, não pode ser exigido mais nem
menos do que o fixado em seus termos, nem em época diferente da prevista.
2. Constituição do Crédito Tributário
Lançamento
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento,
assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação
correspondente, determinar a maioria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar sujeito passivo e,
sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de
responsabilidade funcional.
O presente artigo nos fornece uma definição legal de lançamento e resolve o problema da sua natureza. Pela
combinação do caput do artigo com o seu parágrafo único temos que o lançamento é um procedimento adminis-
trativo, decorrente de atividade vinculada da autoridade fazendária, tendente ficar a ocorrência do fato gerador da
obrigação correspondente, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor
a aplicação da penalidade cabível.
Rubens Gomes de Souza o definiu como o ato ou série de atos de administração vinculada e obrigatória, que
tem como fim a constatação e a valorização qualitativa e quantitativa das situações que a lei elege como pressupostos
da incidência, tendo como consequência a criação da obrigação tributária em sentido formal. Para Peres de Ayala
que, corn fundamento na Ley General Ttibutária espanhola, distingue o procedimento de gestão (procedimento de
gestión tributária) do lançamento (liquidación), este nada mais é do que um ato administrativo, em virtude do qual se
determine a quantia da dívida tributária e a torna exigível. Assim, enquanto no Direito espanhol o procedimento
culmina com o lançamento, a doutrina consagrada pelo Direito Positivo brasileiro é de que o lançamento é um
procedimento. A. D. Giannini, apesar de definir o lançamento como ato ou série de atos, refere-se logo adiante a
procedimento (il procedimento normale di accertamento)". Ernst Blumenstein refere-se a procedimento apenas para
caracterizar o lançamento misto.
À exceção do Direito espanhol, onde o procedimento administrativo culmina com o ato do lançamento, a
doutrina de um modo geral define o lançamento como ato ou série de atos. Sendo série de atos administrativos,
pode-se admitir que o lançamento ou será um procedimento ou um ato complexo, isto dá aquele que para atualizar-se
necessita da manifestação de mais de um órgão da administração. Hely Lopes Meirelles chama a atenção para que
fato se confunda procedimento com ato complexo, afirmando que neste se integram a vontade de vários órgãos para a
obtenção de um mesmo ato, enquanto naquele são praticados vários atos, intermediários e autônomos, para obtenção
de um ato final e Principal. Ora, com exceção do lançamento misto, o que ocorre não são atos autônomos, mas
simples manifestações de órgãos administrativos objetivando um ato final, sendo que no lançamento por
homologação existe um ato simples. Assim, parece-nos a mais correta a posição doutrinária de Blumenstein.
O presente artigo resolver igualmente, a questão da natureza jurídica do lançamento. Muito se discutiu na
doutrina se esta natureza era declaratória ou constitutiva da relação obrigacional, sem que os partidários de uma cor-
rente conseguissem convencer os da outra. O Código, adotando a estrutura dualista, resolveu o problema,
considerando o lançamento um ato declaratório da obrigação tributária (debitum, shuld, relação de débito) e
constitutivo do crédito tributário (obligation, haftung, relação de responsabilidade), já tendo o Tribunal Federal de
Recursos se manifestado em tal sentido, salientando o Min. Jarbas Nobre, relator do feito, que o lançamento é um
procedimento admiministrativo através do qual o crédito tributário é Constituído.
Realmente, é só após o lançamento que surge a possibilidade de agressão patrimônio do sujeito passivo pelo
sujeito ativo. É só após o lançamento que credor poderá tomar do patrimônio do devedor' (sujeito Passivo) os
bens suficientes para o pagamento. Enquanto a ocorrência do fato imponível, previsto na hipótese de incidência da
lei, faz nascer um vínculo pessoal entre os sujeitos e passivo da relação obrigacional, o lançamento, constituindo o
crédito tributário (obligatio, haftung, relação de responsabilidade), faz nascer um vínculo patrimonial. Com o
nascimento do vínculo pessoal na data da ocorrência do fato imponível (fato gerador), ao efetuar o lançamento, deve
a administração aplicar a lei vigente naquela época, isto é, na data do surgimento da relação de débito (debitum,
shuld, obrigação tributária). Rubens Gomes de Sousa, ainda no seu Compêndio, quando adotava a teoria da natureza
puramente declaratória do lançamento, salientava serem três as fontes da obrigação tributária: a lei (surgimento da
obrigação em abstrato, fase da soberania), o fato gerador (surgimento da obrigação em concreto, fase do direito
objetivo) e o lançamento (individualização da obrigação, fase do direito subjetivo). Pelo sistema do Código, o
15. lançamento, ao constituir a relação de responsabilidade (obligado haftung, crédito tributário), identifica o sujeito
passivo, individualizando a relação obrigacional, verificando quais os que se enquadram nas condições previstas pela
hipótese de incidência da lei, e faz surgir o vínculo patrimonial entre os sujeitos ativo e passivo.
Toda esta atividade de administração é plenamente vinculada. É o que diz expressamente o parágrafo único
deste artigo. É sabido que a administração pública, no exercício de suas funções, age através de atividades discri-
cionárias e atividades vinculadas. Victor Nunes Leal apóia-se em Rui Barbosa e Castro Nunes para conceituar esta
última. A atividade será discricionária quando utilizada para o exercício de um poder merarnente político e será
vinculada quando a competência da administração estiver estritamente determinada na lei, que estabelece os motivos
e o modo de agir. O presente artigo, no seu parágrafo único, utiliza-se da expressão atividade administrativa para
qualificá-la como vinculada. Foi feliz o legislador no emprego da expressão. Realmente os atos são veículos para o
exercício de uma atividade administrativa, e, se bem que a expressão ato vinculado possa ser aceita como
tecnicamente correta, o seu emprego leva-nos imediatamente à utilização da expressão ato discricionário,
tecnicamente falha e há muito criticada pelo emitente Victor Nunes Leal . Assim, a expressão atividade é mais feliz e
mais genérica, uma vez que se acomoda com mais precisão à idéia de procedimento, referida no caput do artigo.
A atividade do lançamento é, assim, conforme determina o parágrafo único deste artigo, vinculada e
obrigatória. É vinculada aos termos previstos na lei tributária. Sendo a obrigação tributária decorrente da lei, não
podendo haver tributo sem previsão legal, e sabendo-se que a ocorrência do fato imponível prevista na hipótese de
incidência da lei faz nascer o vínculo pessoal entre o sujeito ativo e o sujeito passivo, o lançamento que gera o
vinculo patrimonial, constituindo o crédito tributário (obligatio, haftung, relação de responsabilidade), não pode
deixar de estar vinculado ao determinado pela lei vigente na data do nascimento do vínculo pessoal (ocorrência do
fato imponível previsto na hipótese de incidência da lei). Esta atividade é obrigatória. Uma vez verificado pela
administração o nascimento do vínculo pessoal entre o sujeito ativo e o sujeito passivo (nascimento da obrigação
tributária, debitum, shuld relação de débito), a administração estará obrigada a efetuar o lançamento. A hipótese de
incidência da atividade administrativa será assim a ocorrência o fato previsto na hipótese de incidência da lei
tributária.
Art. 43. Salvo disposição de lei em contrário, quando o valor tributário esteja expresso em moeda estrangeira,
no lançamento far-se-á sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia da ocorrência do ato gerador da
obrigação.
Nos casos do amparo sobre comércio exterior e sobre operações financeiras (operações de câmbio e
empréstimos contraídos no exterior) poderá ocorrer - e corre comumente - estar a base imponível expressa em moeda
estrangeira, assim, ao efetuar o lançamento, deve a autoridade administrativa proceder conversão para moeda
nacional do valor da base imponível (base de cálculo) a câmbio do dia em que ocorreu o fato imponível (fato
gerador previsto na hipótese de incidência da norma, enfim, a conversão deve ser feita a câmbio do dia em que se
formou o vínculo pessoal entre o sujeito atiovo e passivo, isto é, do dia ein que nasceu a obrigação tributária
(debitum, shuld, relação de débito).
O artigo emprega a expressão valor tributário para significar base de cálculo ou base imponível. Cumpre
também notar que a lei a que se refere o artigo lei de sujeito ativo da obrigação, e não lei federal, mas tanto os
impostos sobre operações financeiras como sobre comércio exterior estão colocados, por disposto constitucional (art.
21, I, II e VI, da EC n.º 1, de 17.10.1969, na esfera de competência da União.
Art. 44. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então
vigente, ainda que
modificada ou revogada.
§ 1º aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente a ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha
instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de ivestigação das
autoridades administrativas, ou outorgado a crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste ramo, uso para o
efeito de atribuir responsabilidade tributária a
§ 2º. O disposto neste artigo não se aplica aos impostos lançados por períodos certos de tempo, desde que a
respecta a lei fixe expressamente a data em que o fato gerador se considera ocorrido.
Com a ocorrência do fato imponível (faro gerador) previsto na hipótese de incidência da lei nasce, como já
verificamos, o vínculo pessoal entre o sujeito ativo e o sujeito passivo da obrigação. Surge, então, a rejeição de dé-
bito (debitum, shuld, obrigação tributária), e o lançamento, que constitui a relação de responsabilidade (obligatio,
haftung, crédito tributário) deve reportar-se à lei vigente na data em que nasceu o vínculo pessoal, em que surgiu a
obrigação tributária, a relação de débito (ocorrência do fato imponível previsto na hipótese de incidência), uma vez
que, sendo a relação obrigacional uma relação entre pessoas, rege-se pela lei vigente na época em que surge o
vínculo entre elas. Em relação ao vínculo pessoal, à relação de débito (debitum, shuld, obrigação tributária), o
lançamento tem efeito meramente declaratório e deve, por esta razão, reportar-se à data da ocorrência do fato
gerador, ainda que a lei vigente naquela época seja posteriormente modificada ou revogada.
Ruy Barbosa Nogueira salienta com muita propriedade que "grande parte da teoria do direito formal tributário
gravita em torno do lançamento". Sendo o lançamento um procedimento administrativo - conforme definição do art.
142 -, as regras que determinam os critérios de apuração ou processos de fiscalização, as garantias ou privilégios do
16. crédito possuem natureza formal e, assim sendo, têm aplicação imediata. São regras adjetivas, processuais e, como
tais, podem ser aplicadas às situações em curso. Tais regras simplesmence regulam o comportamento das
autoridades administrativas na apuração da dívida. Se, no entanto, uma regra nova vier a atribuir responsabilidade
pelo crédito de determinado sujeito passivo, posteriormente à ocorrência do fato gerador, tal regra não poderá ser
considerada pela autoridade administrativa, por ocasão do lançamento. O § 2º tem redação defeituosa. A ressalva
que faz não é ao disposto no caput do artigo, mas tão-somente ao disposto no § 1º. Estão assim ressalvados desta
aplicação imediata os impostos de fato gerador contínuo, desde que a lei fixe a data em que considera ocorrido o
referido faro imponível.
Art. 45. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude de:
I - impugnação do sujeito passivo;
II - recurso de ofício;
III - iniciativa de ofício da autoridade administrativa nos casos previstos no art. 149.
O lançamento é em princípio imutável. Em 1950, Rubens Gomes de Sousa distinguia as situações em que o
lançamento poderia ou não ser revisto para afirmar a possibilidade de revisão, modificação ou substituição por outros
com fundamento em erro incorrido na verificação de dados ou elementos de fato em que se tenha baseado, e para
afirmar a impossibilidade de revisão por erro na valoração jurídica dos dados ou elementos de fato em que se
baseara.
Este artigo estabelece assim a regra geral da imutabilidade do lançamento, desde que tenha ocorrido a
notificação regular do sujeito passivo. A notificação será feita pessoalmente, ou por comunicação escrita, desde que
o referido sujelto passivo tenha domicílio fiscal certo, eleito ou determinado por lei. O artigo enumera, no entanto, os
casos em que o lançamento pode ser revisto. Essa enumeração não é exemplificativa, mas taxativa. E evidente que o
lançamento poderá, em qualquer circunstância, ser alterado por decisão do Poder Judiciário, desde que se verifique
que a administração constituiu o tributário (obligatio, haftung, relação de responsabilidade base em fato não previsto
na hipótese de incidência da norma, não tenha havido impugnação pelo sujeito passivo na esfera admitir ainda que
não tenha havido recurso de ofício e, ainda, que não se esteja diante dos casos enumerados no art. 149. O presente
artigo consubstancia uma regra de processo administrativo, que não vincula o Poder Judiciário.
Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em consequência da decisão administrativa ou Judicial, nos
critérios Jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada,
em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente sua introdução.
Confirma este artigo o princípio geral da imutabilidade do lançamento. Se houver mudança na valoração
jurídica dos dados ou elementos de fato que informam a autoridade administrativa no exercício da atividade do
lançamento, tal mudança só poderá ser considerada quanto a fatos geradores ocorridos apds a introdução desta
modificação. Assim, se a administração mudar uma determinada orientação em virtude de decisão Judicial, tal
modificação só se aplicará a lançamentos futuros, não podendo de forma alguma introduzir modificações, sejam elas
benéficas ou não ao contribuinte, em lançamentos completos, perfeitos e acabados, uma vez que nestes já está
completa toda a estrutura da relação obrigacional com a constituição tanto do debitum, (shuld, obrigação tributária,
relação de débito) quanto da obligatio (haftung, crédito tributário, relação de responsabilidade).
Modalidades de Lançamento
Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou
outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato,
indispensáveis sua efetivação.
§ 1º. A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir
tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o
lançamento.
§ 2º. Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade
administrativa a que competir a revisão daquela.
São três as espécies de lançamento. O lançamento direto, o lançamento misto e o impropriamente chamado
autolançamento. O Código ocupa-se do primeiro no art. 149 e do último no art. 150, denominando-os, respectiva-
mente, lançamento de ofício e lançamento por homologação, denominação esta muito mais feliz do que
autolançamento, como veremos. No presente artigo, trata do lançamento misto. Esta classificação baseia-se no
aspecto subjetivo do lançamento, considerando as pessoas que nela cooperarem. No lançamento misto, regulado pelo
presente artigo, ocorre, para constituição do crédito triburário (obligatio, haftung, relação de responsabilidade), uma
cooperação entre o sujeito passivo e o sujeito ativo constituindo as informações prestadas por aquele, o que
impropriamente se denomina obrigação acessória (art. 113 e parágrafos). De todas as formas de lançamento, é
17. aquela que apresenta maior elaboração técnica, que apresenta uma forma externa perfeitamente determinável, para
usarmos uma expressão de Blumenstein, é a única que pode ser qualificada como procedimento. Ruy Barbosa
Nogueira destaca três fases em que, de um modo geral, se estrutura a elaboração desta modalidade de lançamento: a
declaração, as apreciações e a fixação do lançamento. O principal dever do sujeito passivo consiste na entrega da
declaração, cujo conteúdo esclarece se o crédito tributário é por ele reconhecido e em que quantia. A finalidade da
declaração é informativa, como está especificado no caput do artigo. Feita a declaração, o sujeico ativo inicia a fase
de apreciação, é a durabilidade no tempo e complexidade dependerão de cada caso, podendo, inclusive, demandar em
perícias ou outras providências no estabelecimento do contribuinte ou nos estabelecimentos de crédito com os quais
trabalha. Superadas estas duas fases o sujeito ativo procederá a fixação do lançamento e notificará o sujeito passivo.
Para a superação de todas estas fases torna necessário a prática de uma série de atos configurando um verdadeiro
procedimento, o que destaca esta modalidade de lançamento das demais, que se assemelham entre si, por não
consticuírem procedimento, mas atos administrativos.
Após a notificação a declaração do sujeito passivo não poderá ser retirada. É o que preleciona o § 1º. Isto significa
que, uma vez notificado do lançamento, não poderá pretender o sujeito passivo a sua modificação por parte da
administração fazendária. Qualquer requerimento neste sentido será fatalmente indeferido. O procedimento
administrativo está encerrado e a Fazenda não poderá modificá-lo, em decorrência do princípio geral da
imutabilidade do lançamento. Assim, uma vez feita a notificação ao contribuinte, não poderá a administração de
ofício, ou a requerimento deste, alterar o procedimento é definitivamente encerrado. Mas é óbvio que mesmo após
completado o procedimento, mesmo após receber a notificação, o sujeito passivo pode pretender a anulação judicial
do crédito tributário, em consequência de erro de fato, devidamente comprovado. O crédito tributário (obligatio,
haftung, relação de responsabilidade) decorre da obrigação principal (debitum, shuld, relação de débito), conforme
preceitua o art. 139. A obrigação tributária (debitum, shuld, relação de débito) nasce com a ocorrência do fato
imponível previsto na hipótese de incidência, a qual tem como medida do seu aspecto material a base imponível
(base de cálculo). Ora, se houve erro de fato na valoração material de base imponível, significa que o fato gerador
(fato imponível) não ocorreu de conformidade com a previsão da hipótese de incidência, e, assim sendo, se o
lançamento foi feito com base no
fica que o crédito (obligatio, haftung, relação de responsabilidade) por ele constituído não decorreu da obrigação
(debitum, shuld, relação de débito) e deve consequentemente ser alterado pelo Poder Judiciário para que seja feita a
adequaçào prevista no art. 139. Como o dimensionamento valorativo do aspecto material da hipótese de incidência é
dado pela base imponível (base de cálculo), qualquer erro na sua avaliação faz com que não haja adequação entre o
fato ocorrido e a previsão da hipótese de incidência, e desta forma viola-se o art. 139, caso o lançamento seja
efetivado com base no erro. Ainda que o sujeito passivo tenha sido notificado, cumpre ao Poder Judiciário
restabelecer a perfeita adequação prevista pelo art. 139.
O § 2º determina a retificação de ofício, pela administração, dos erros contidos na declaração do sujeito passivo,
facilmente apuráveis pela sua própria verificação. Torna-se, no entanto, necessário que tais erros sejam realmente
verificáveis pela simples leitura da declaração, erros de cálculo, por exemplo de rendimentos constantes de
declaração da fonte pagadora etc. A simples disparidade de rendimentos em dois exercícios consecutivos não
autoriza a retificação de ofício. Nestes casos, havendo dúvidas por parte da administração, deve ela prosseguir com a
fase de apreciação tomando as provid6encias que se fizerem necessarias.
Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos,
serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrárá aquele valor ou preço, sempre
que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos
pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação
contraditória, administrativa ou judicial.
A boa-fé deve ser sempre presumida como princípio geral. No entanto, a administração poderá ter razões para não
aceitar as declarações do sujeito passivo, ou do terceiro legalmente obrigado. Sempre que isto ocorrer, isto sempre
que a administração tiver razões para não presumir a boa-fé da declaração, dos documentos fornecidos ou dos
esclarecimentos dados posteriormente pelo sujeito passivo, poderá arbitrar o valor da base de cálculo, do tributo,
mediante processo regular. Processo regular significa processo previsto na lei administrativa tributária. Esta, no
entanto, não está consticucionalmente obrigada a prever o princípio do contraditório na esfera administrativa. Esta
obrigação decorre deste artigo, o qual vincula apenas a União, pois não estamos aqui diante de uma norma geral de
direito tributário consoante conceito estabelecido no § 1º do art. 18 da Ernenda Constitucional n. 1. Não sendo norma
geral de direito tributário, como aliás nenhum artigo do presente Título, não é veiculada por lei complementar.
Trata-se, por conseguinte, de regra ordinária, que obriga apenas a União. De qualquer forma, o ato administrativo
deve ser motivado, não podendo o sujeito ativo exercer o arbítrio puro. Se houver, no entanto, aplicação de
penalidades, será obrigatório o recurso ao procedimento contraditório, porquanto o § 15 do art. 153 da emenda n. 1
confere um direito a todos os cidadãos contra qualquer manifestação de poder de punir . Este direito é inalterável,
inerente a todo aquele considerado pelo Direito como pessoa. O artigo ressalva, em caso de contestação, a avaliação
18. contraditária, administrativa ou judicial. No tocante à avaliação contraditória judicial, o artigo, ao estabelecê-la, é
inócuo, uma vez que o recurso ao Judiciário está constitucionalmente garantido pelo § 4º do art. 153 . No que
concerne à avaliação contraditória administrativa, o present e artigo, longe de ser inócuo, está estabelecendo um
princípio para o procedimento.
Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
I - quando a lei assim o determine;
II - quando a declaração não seja prestada, por quem dá direito, no prazo e na forma da legislação
tributária;
III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior,
deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária , a pedido do esclarecimento formulado pela
autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela
autoridade;
IV - quando se comprove falsidade, erro ou quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária
como sendo de declaração obrigatória;
V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da
atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dá
lugar a aplicação de penalidade pecuniária;
VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro;
VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não aprovado por ocasião do lançamento anterior;
IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que
o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade essencial.
Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda
Pública.
O presente artigo enumera os casos de lançamento direto ou de ofício. A numeração é taxativa e não
exemplificativa. Assim sendo, apenas nos casos aqui previstos poderá a administração efetuar este tipo de
lançamento. Os casos arrolados sugerem três tipos de lançamento de ofício. O inciso I refere-se aos casos em que,
pela própria natureza do tributo, a técnica mais indicada seja a do lançamento direto, que poderá também ocorrer
quando o contribuinte deixa de cumprir seus deveres acessórios impropriamente chamados obrigações - e nestes
casos este tipo de lançamento substituirá o lançamento misto ou o lançamento por homologação. Os impostos, sobre
a propriedade predial e territorial urbana de competência municipal, estão entre aqueles em que pela própria natureza
o lançamento mais adequado é o direto ou de ofício. Rubens Gomes de Sousa enumera três modalidades de
lançamento direto: a) lançamento direto por investigação real; b) lançamento direto por presunção; c) lançamento
indiciário.
O primeiro é aquele em que o sujeito ativo procura determinar efetivamente a caracterírstica e o valor da
matéria tributável. O segundo, quando, em virtude da dificuldade de investigação real,, a lei presume urn determina-
do valor para a matéria tributo. Finalmente, o terceiro, quando a lei define certos indícios, isto é, certas
circunstâncias de fato, como correspondendo a uma determinada importância de imposto a pagar.
Estão previstos, na relação deste artigo, os casos de omissão do sujeito passivo ou de terceiro nos itens II
(omissão da declaração ou sua apresentação fora de prazo e na forma errônea), III (omissão de pedido de
esclarecimento acerca da declaração apresentada), IV omissão de elemento que de seria constar na declaração), V
(omissão do contribuinte no exercício da atividade preparatória para o lançamento por homologação) e VI (omissão
que dá lugar a pena pecunária). O lançamento direto ocorrido nos casos dos itens II, III e IV substitui o lançamento
misto, no item V, o lançamento por homologação, no item VI, poderá substituir ambas as modalidades.
Estão igualmente previstos na relação deste artigo casos de falsidade ou erro nos itens IV (falsidade ou erro de
elemento da declaração), V (inexatidão no exercício da atividade do contribuinte, preparatória para o lançamento por
homologação), VI (ação que dê lugar a aplicação de pena pecuniária) e VII (dolo, fraude ou simulação).
No item V, como se refere ao lançamento direto substituto do lançamento por homologação, está prevista a
possibilidade de verificação posteriori. O fisco aceita o pagamento antecipado e o contribuinte fica sujeito a
verificação posterior.
O item VIII prevê o lançamento de ofício sempre que o fisco venha a apreciar fato desconhecido por ocasião
de lançamento anterior. Supondo um lançamento anterior, é um caso de revisão deste mesmo lançamento, sujeito à
condição de possibilidade de tal revisão especificada no parágrafo único.
O item IX também prevê a revisdo do lançamento anterior, pela sua complementação, através de um
lançamento direto, sempre que se comprove falta funcional ou fraude por parte da autoridade que o efetuou, ou ainda
omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade essencial.