Justiça mantém bloqueio dos salários dos servidores da saúde em greve
1. Medida Cautelar Incidental em Declaratória n. 2012.076305-1/0002.00, da Capital
Requerente: Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Serviços de
Saúde Públicos e Privados de Florianópolis
Procuradores: Drs. João dos Passos Martins Neto (Procurador do Estado) e outro
Requerido: Estado de Santa Catarina
Relator: Des. Gaspar Rubick
DESPACHO
O Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Serviços de
Saúde Público e Privados de Florianópolis ajuizou, com fulcro no art. 796 e seguintes
do Código de Processo Civil, medida cautelar incidental nos autos da ação
declaratória em epígrafe, objetivando que o Estado de Santa Catarina se abstenha de
efetuar o bloqueio da remuneração relativa ao mês de novembro dos servidores
públicos estaduais da saúde, bem como que os respectivos contracheques sejam
novamente disponibilizados no sítio eletrônico www.sea.sc.gov.br. Para tanto,
sustenta que o desconto salarial é indevido em razão de a greve em curso estar
motivada por situação excepcional, a teor do art. 7º da Lei n. 7.783/1989, pois o
requerido pretende, com a diminuição das horas-plantão, aumentar a jornada de
trabalho de 30 para 42 horas semanais; que, em alguns hospitais, os cartões pontos e
as escalas de trabalho foram retidos pelas chefias, o que impediu o registro de horas
trabalhadas; e que os valores pagos a título de hora-plantão são implementados na
folha de pagamento do mês subsequente, conforme art. 19 da Lei Complementar n.
323/2006, o que implicará desconto relativo a horas efetivamente trabalhadas,
porquanto o valor a ser pago na folha de novembro diz respeito a horas-plantão do
mês de outubro, quando ainda não havia sido deflagrado o movimento de greve.
Adiantando-se a qualquer determinação deste Relator, o Estado de
Santa Catarina peticionou nos autos, requerendo o indeferimento da medida cautelar
pleiteada, ao argumento de que o corte nos salários é uma obrigação, pois não pode
a Administração Pública remunerar servidores que não prestaram serviços. Disse,
ainda, que o Sindicato requerente implementou sistema de rodízio de trabalho, que
não pode ser considerado para efeitos da verificação do trabalho efetivamente
realizado; que é nulo o controle de ponto alternativo instituído pelos grevistas; e que o
pagamento das horas-plantão relativas ao mês de outubro não é devido em sua
totalidade, em razão de a greve ter sido deflagrada em 23.10.2012.
É a síntese do essencial.
A pretensão do Sindicato requerente é acolhida, mas apenas em parte e
tão somente no que diz respeito ao pagamento das horas-plantão trabalhadas no mês
de outubro, sendo certo que as demais questões terão sua análise postergada para
oportuna apreciação, pois não se pode olvidar que a concessão de qualquer medida
inaudita altera pars, é excepcional, a teor dos arts. 797 e 798 do Código de Processo
Civil.
Na espécie, a pretensão do Sindicato requerente é obstar o corte de
2. pagamento dos vencimentos do mês de novembro, ao argumento de que a greve é
legal e que tal medida causaria ofensa ao próprio direito de greve, previsto no art. 37,
VII, da Constituição Federal e na Lei n. 7.783/1989. Pretende, de forma sucessiva,
que ao menos o pagamento das horas-plantão não seja retido, porque como tal é feito
no mês subsequente à prestação do serviço e na folha do mês de novembro seria
paga a verba concernente às horas-plantão trabalhadas no mês de outubro, ocasião
em que a prestação dos serviços de saúde não havia sido plenamente atingida pelo
movimento paredista, o qual foi deflagrado em 23.10.2012.
Com efeito, pois o art. 19, § 1º, da Lei Complementar n. 323/2006, do
Estado de Santa Catarina, está assim redigido:
Art. 19. A gratificação de hora-plantão prevista na Lei Complementar nº 1.137,
de 14 de setembro de 1992, poderá ser concedida aos servidores do Quadro de
Pessoal da Secretaria de Estado da Saúde, mediante critérios, limites e condições
fixados em decreto do Chefe do Poder Executivo.
§ 1º A realização de hora-plantão somente será admitida por imperiosa
necessidade de serviço e fechamento de escalas ou turnos de trabalho, previamente
elaboradas, desde que devidamente registradas em instrumento ou equipamento de
controle individual de jornada, sob a responsabilidade direta da administração da
unidade hospitalar ou assistencial, estando sujeita à fiscalização e normatização dos
órgãos do Sistema de Gestão de Recursos Humanos e será devida na folha de
pagamento do mês imediatamente subseqüente a sua realização. (grifou-se).
Assim, embora ainda num juízo perfunctório, é incontroverso que o
pagamento relativo às horas trabalhadas no mês de outubro deve ser feito agora, no
mês de novembro, a teor da já mencionada lei. E também é incontroverso que o
movimento de greve foi deflagrado em 23.10.2012, sendo certo que, mesmo para os
servidores que aderiram à paralisação e, bem por isto, não prestaram qualquer labor,
o pagamento das horas-plantão trabalhadas até tal data não pode ser retido. Com
relação aos servidores que continuaram a trabalhar, mesmo diante do início do
movimento paredista, nenhum desconto deve ser efetuado, nem das horas-plantão
relativas ao mês de outubro, tampouco das horas ordinárias concernentes ao mês
corrente.
Aliás, o teor da Comunicação Interna acostada às fls. 50 é justamente
no sentido de não efetuar qualquer desconto dos servidores que não aderiram à
greve, razão pela qual não se evidencia qualquer lesão iminente neste aspecto, senão
vejamos: "Os servidores que aderirem ao movimento de greve terão sua remuneração
bloqueada pela Secretaria de Estado da Saúde, já no mês de novembro".
Além disso, conforme mencionado algures, verifica-se que neste juízo
preliminar não se pode, sem oportunizar o contraditório e a ampla defesa à parte
contrária, decidir acerca da legalidade ou não do desconto relativo aos dias não
trabalhados, até mesmo porque, em regra, a greve é causa de suspensão do contrato
de trabalho, sendo lícito, em tese, o desconto dos dias não trabalhados.
Neste sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. GREVE: POSSIBILIDADE DE
DESCONTO REMUNERATÓRIO DOS DIAS DE PARALISAÇÃO. PRECEDENTE.
AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (RE 399338 AgR /
Gabinete Des. Gaspar Rubick
3. PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. em 01-02-2011).
AGRAVOS REGIMENTAIS NO AGRAVO DE INTRUMENTO.
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DIREITO DE
GREVE. MI 708/DF. DESCONTO REMUNERATÓRIO DOS DIAS DE
PARALISAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL
IMPROVIDO. I – Inexiste direito à restituição dos valores descontados decorrentes
dos dias de paralisação. Precedente. MI 708/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes. II – Não
merece reparos a parte dispositiva da decisão agravada a qual isentou o Estado do
Rio de Janeiro de restituir os descontos relativos ao período de paralisação. III –
Agravos regimentais improvidos. (AI 824949 AgR / RJ, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, j. em 23-08-2011)
EMBARGOS DECLARATÓRIOS CONVERTIDOS EM AGRAVO
REGIMENTAL. GREVE DE SERVIDOR PÚBLICO. DESCONTO PELOS DIAS NÃO
TRABALHADOS. LEGITIMIDADE. JUNTADA POSTERIOR DE TERMO DE
COMPENSAÇÃO DE JORNADA. EXAME INVIÁVEL. ENUNCIADO 279 DA
SÚMULA DO STF. DESPESAS PROCESSUAIS. SUCUMBÊNCIA INTEGRAL.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APRECIAÇÃO EQUITATIVA. ART. 20, § 4º, CPC.
A comutatividade inerente à relação laboral entre servidor e Administração Pública
justifica o emprego, com os devidos temperamentos, da ratio subjacente ao art. 7º da
Lei 7.783/89, segundo o qual, em regra, “a participação em greve suspende o
contrato de trabalho”. Não se proíbe, todavia, a adoção de soluções
autocompositivas em benefício dos servidores-grevistas, como explicitam a parte
final do artigo parcialmente transcrito e a decisão proferida pelo STF no MI 708 (item
6.4 da ementa). Todavia, revela-se inviável, nesta quadra processual, o exame de
“termo de compromisso” somente agora juntado, consoante o verbete 279 da
Súmula. Agravo regimental a que se dá parcial provimento somente para esclarecer
os ônus da sucumbência. (RE 456530 ED / SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em
23-11-2010).
Outro não é posicionamento desta Corte:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. GREVE DOS SERVIDORES
PÚBLICOS DO ESTADO DE SANTA CATA-RINA. DESCONTO DA
REMUNERAÇÃO CORRESPON-DENTE AOS DIAS NÃO TRABALHADOS.
MANDADO DE SEGURANÇA. ORDEM DENEGADA
Para o Supremo Tribunal Federal - a quem compete, "precipuamente, a guarda
da Constituição" (CR, art. 102) -, "nos termos do art. 7º da Lei no 7.783/1989, a
deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de
trabalho. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não
deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente
por atraso no pagamento aos servidores públicos civis, ou por outras situações
excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato
de trabalho (art. 7º da Lei no 7.783/1989, in fine)" (MI n. 708-0, Min. Gilmar Mendes;
MI n. 712, Min. Eros Grau, julg. em 25.10.2007).
Por não comportar dilação probatória, o mandado de segurança não permite
avaliação das "situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da
Gabinete Des. Gaspar Rubick
4. suspensão do contrato de trabalho". Igualmente não se presta para "obtenção de
sentença preventiva genérica, aplicável a todos os casos futuros da mesma espécie'
(AgRgAI nº 91.060, Min. Décio Miranda); não se lhe pode conferir caráter normativo"
(RNMS n. 2007.051523-4, Des. Newton Trisotto). (Mandado de Segurança n.
2008.013637-8, da Capital, rel. Des. Newton Trisotto, j. 10-08-2011)
APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA
CONDENATÓRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. LIMINAR
DENEGADA. GREVE DO MAGISTÉRIO ESTADUAL. DESCONTO DOS DIAS
PARADOS E APONTAMENTO NA FICHA FUNCIONAL. LEGITIMIDADE. DEVER
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação Cível n. 2009.022336-8, da Capital, rel. Des. José Volpato de
Souza, j. 28-07-2011)
Diante do exposto, com fulcro nos arts. 797 e 798 do CPC, concedo
parcialmente a medida cautelar requerida, tão somente para determinar que o
Estado de Santa Catarina efetue, na folha de pagamento do mês corrente
(novembro de 2012), o pagamento das horas-plantão efetivamente trabalhadas
do mês de outubro, considerando-se, para os servidores que aderiram ao
movimento paredista, como termo final de tal verba a data de início da paralisação
dos serviços (23.10.2012).
Determino, ainda, a citação do Estado de Santa Catarina, para,
querendo, contestar o pedido, no prazo de 5 (cinco) dias, a teor do art. 802 do CPC.
Após, sem necessidade de nova conclusão, encaminhem-se os autos à
douta Procuradoria-Geral de Justiça.
Intimem-se.
Junte-se a petição de protocolo n. 3318.
Cumpra-se com urgência.
Florianópolis, 29 de novembro de 2012.
Gaspar Rubick
RELATOR
Gabinete Des. Gaspar Rubick