1. A reclamante foi demitida de forma discriminatória enquanto estava doente e incapacitada para suas funções habituais, mas apta para outras funções menos exigentes.
2. A reclamada foi condenada a pagar indenização por danos morais de R$15 mil e honorários advocatícios de 20% sobre o valor da condenação.
3. Não foi reconhecida doença ocupacional nem direito a estabilidade empregatícia.
1. PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 14ª REGIÃO
3ª VARA DO TRABALHO DE PORTO VELHO
SENTENÇA DE MÉRITO
PROCESSO nº : 0010518-40.2014.5.14.0003
RECLAMANTE: DORES SONIA SANTOS DO NASCIMENTO
RECLAMADA: UNIRON - UNIÃO DAS ESCOLAS SUPERIORES DE
RONDÔNIA LTDA.
Conclusos os autos para continuidade do
julgamento da lide, o Juiz do Trabalho AFRÂNIO VIANA GONÇALVES, Titular
da 3ª Vara do Trabalho de Porto Velho/RO, que instruiu o processo, profere a
seguinte DECISÃO:
I.
Fundamentação
A.
Mérito
1.
INSUFICIÊNCIA RENAL. DOENÇA COMUM X OCUPACIONAL.
DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. ESTABILIDADE. DANO MORAL
Como se infere dos autos, a reclamante,
contratada pela reclamada em 09/1/2008, para a função de serviços gerais,
dispensada sem justa causa em 05/9/2013, alega que em vista da natureza do
serviço desempenhado, com a necessidade de abaixar e levantar várias vezes,
carregar produtos pesados de limpeza, começou a sentir fortes dores nas
costas e em 09/7/2010 foi submetida ao procedimento médico Pieloplastia
Aberta Esquerda e diagnosticada com a doença Hidronefrose Residual do Rim
Esquerdo e Função Reduzida, em cujo laudo médico foi recomendado que
2. deveria ser readaptada para uma função que exigisse menos esforço físico,
todavia, não atendido pela reclamada, pelo que a autora teve de se submeter a
nova Pieloplastia Esquerda, devido ao déficit funcional do rim esquerdo, por
não conseguir realizar as atividades laborais normais do auxiliar de serviços
gerais, pelo que pleiteia reconhecimento de doença ocupacional, estabilidade
empregatícia, além de despedida discriminatória, por encontrar-se doente,
necessitando submeter-se a procedimento cirúrgico.
A reclamada, em sua defesa, rechaça o pedido
aduzindo que, conforme exposto na exordial, o problema diagnosticado na
reclamante é renal e, como tal, não guarda qualquer ligação com o trabalho,
tanto que a reclamante foi afastada para percepção de auxílio-doença comum,
conforme documentos anexos.
O ASO demissional apresentado pela reclamante
em audiência(ID 885376), datado em 16/9/2013, revela que quando de sua
demissão a autora encontrava-se inapta para as atividades da função, sobre
cujo documento a reclamada, também em audiência(ID 885508), impugnou-o
mas apenas por não conhecê-lo até a data da homologação da rescisão,
justificativa essa que não possui consistência, pois, a rescisão contratual foi
homologada posteriormente ao ASO, no dia 01/10/2013, como consta no
TRCT(ID 817226). Ou seja, não impugnou o seu conteúdo, o que o Juízo
reputa verdadeiro.
No laudo pericial, o expert do Juízo fez constar em
sua conclusão que a reclamante é portadora de INSUFICIÊNCIA RENAL
[CRÔNICA] À ESQUERDA (CID 10 = N18.9 N19), que foi demitida doente e na
eminência do tratamento cirúrgico NEFRECTOMIA A ESQUERDA.
Também concluiu o expert que INSUFICIÊNCIA
RENAL é doença comum na população em geral, em especial em regiões
3. tropicais, que não é doença ocupacional nem doença relacionada ao trabalho,
pois, não existe nexo causal ou concausal com o trabalho.
Em resposta ao quesito nº 2 formulado pela parte
autora, qual seja, se a doença que acometeu a reclamante pode ser agravada
com o esforço físico habitual, tipo agachamento, uso de força para arrastar
objetos, etc, o expert respondeu afirmativamente, assinalando que qualquer
labuta ou esforço físico para um paciente renal crônico é penoso.
Em manifestação acerca do laudo pericial, o
advogado da reclamante, após afirmar que tal prova técnica comprova a
dispensa discriminatória de sua cliente e a incapacidade laboral, pela resposta
do expert ao quesito nº 2 por ela formulado, de que qualquer labuta ou esforço
físico para um paciente renal crônico é um ato penoso, assevera que deve a
reclamada responder pela dispensa discriminatória, bem como ser
responsabilizada pelo agravamento da doença diante da manutenção da
reclamante em atividades extremamente prejudiciais a seu quadro de saúde,
ou seja, que o expert teria sido contraditório, ao concluir pela inexistência de
doença ocupacional, ao mesmo tempo que teria admitido o agravamento da
doença pelo trabalho, por não ter a empresa readaptado a autora em outra
função que não lhe exigisse esforço físico.
Para o Juízo, não há contradição no laudo pericial,
apenas o expert enfatizou que independente de qualquer trabalho ou mesmo
de esforço físico, o paciente que padece de insuficiência renal continuará
sofrendo com a doença, pois trata-se de doença crônica, ou seja, que o
trabalho e o esforço físico tornam a situação do paciente mais sofrível ainda,
mas não ao ponto de agravá-la, é tanto que só haverá melhora para a
reclamante após submeter-se a tratamento cirúrgico(NEFRECTOMIA A
ESQUERDA), como também assinala o médico perito.
4. De modo que, o Juízo não reconhece que a
reclamante sofre de doença ocupacional, pois, não há nenhum elemento
técnico para afirmar-se que o trabalho que ela desenvolvia como serviços
gerais, agravou seu problema de insuficiência renal.
Logo, não há falar-se em estabilidade no emprego
e em indenização estabilitária, como postula a reclamante na inicial, bem como
em pagamento da multa do art. 477, § 8º da CLT, pelo motivo alegado.
No entanto, tendo a reclamada dispensado a
reclamante quando esta encontrava-se inapta para as atividades da função que
exercia (serviços gerais), como reconhecido pelo médico do trabalho da
empresa no ASO demissional, embora estivesse apta para outras funções,
como atestou o expert no laudo pericial, ao assinalar que a incapacidade da
autora é parcial e temporária, podendo ela desempenhar atividades que não
exijam esforço físico, como, aliás, a própria reconheceu isso em audiência (ID
885508), deveria então a empresa, em vez de demitir a reclamante,
encaminhá-la ao INSS, pois, era sabedora de sua incapacidade para a função.
Porém, como a reclamada assim não procedeu e
nem readaptou anteriormente a reclamante em outra função que não exigisse
esforço físico, como fora recomendado em laudo urológico (ID 817233), tem-se
que a primeira demitiu a segunda porque esta encontrava-se doente, isto é, de
forma discriminatória, o que configura ato arbitrário, sendo inclusive um dos
objetivos fundamentais da República promover o bem de todos, repelindo
qualquer forma de discriminação (CF, art. 3º, IV).
Dessa feita, em atenção ao pedido, deve a
reclamada indenizar a reclamante pelo dano moral sofrido em razão de
despedida discriminatória, diante do presumido abalo psíquico decorrente do
ato ilegal, pois, configurados os requisitos para tal obrigação reparacional,
5. previstos no art. 927 do CCB (ato ilícito, dano e o nexo de causa e efeito entre
ambos), que o Juízo arbitra em R$15 mil, levando-se em conta a condição
econômica da vítima e da lesante, a gravidade da conduta ilícita e o caráter
inibitório da medida.
2.
HORAS EXTRAS. INTRAJORNADA
A reclamante, na inicial, postula pagamento de 1,5
horas extras semanais, alegando que foi contratada como auxiliar de serviços
gerais, com jornada diária de 6 horas (06:00 às 12:00) e com intervalo de 15
minutos, sendo que 3 vezes na semana extrapolava 20 à 30 minutos a sexta
hora, sem que lhe fosse concedido o mínimo de intervalo para refeição.
A reclamada defende-se, argumentando que a
reclamante jamais prestou horas extras e sempre teve o intervalo de 15
minutos a que faria jus, pois, laborava apenas meio período, conforme exposto
na própria exordial e comprovado através dos controles de frequência que
anexou com a contestação, os quais a autora não impugnou ao se manifestar
em audiência, dizendo que os cartões de ponto confirmam o pedido da inicial
de horas extras.
Analisando os respectivos controles de ponto,
observa o Juízo que a reclamante trabalhava 6 horas diárias, em média, a
partir do horário de entrada, que sempre variava em minutos, como ocorria com
o horário de saída, razão pela qual não há falar-se em pagamento de horas
extras e de intervalo intrajornada mais reflexos.
3.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS
6. No que se refere à indenização por danos
materiais pela contratação de advogado, com fundamento nos arts 389, 395 e
404 do CCB, como este Juízo tem se pronunciado ao apreciar pedidos
idênticos, faz jus a reclamante ao pagamento, nos termos da lei civil, aplicada
subsidiariamente ao Direito do Trabalho, em forma de ressarcimento pelas
despesas contraídas com a contratação de advogado, no percentual de 20%
do valor da condenação, conforme pedido e contrato de honorários
advocatícios anexado com a inicial(ID 774488).
4.
JUSTIÇA GRATUITA
Defere-se à reclamante os benefícios da justiça
gratuita, em atenção aos termos do pedido declinado na inicial, posto que
presumida sua condição de hipossuficiência, não tendo a reclamada
desconstituído essa presunção produzindo prova em contrário, pois dela esse
encargo.
II.
Dispositivo
Assim posto, e por tudo o mais que dos autos
consta, com observância aos princípios constitucionais que regem o processo,
este Juízo não reconhece a existência de doença ocupacional, bem como o
direito à estabilidade no emprego e o suposto labor em horas elastecidas,
porém, reconhece a dispensa discriminatória do emprego e o consequente
dano moral e, por consequência, julga PROCEDENTE, em parte, o pedido
formulado na presente reclamatória trabalhista ajuizada por DORES SONIA
SANTOS DO NASCIMENTO e condena a reclamada UNIRON - UNIÃO DAS
ESCOLAS SUPERIORES DE RONDONIA LTDA., a pagar à reclamante as
7. seguintes verbas, no prazo de 05 (cinco) dias após o trânsito em julgado da
sentença, independentemente de intimação:
a) indenização por danos morais (15 mil) e
ressarcimento de despesas com a contratação de advogado(R$3 mil).
Improcede o mais. Tudo conforme fundamentação
precedente que integra este dispositivo para todos os efeitos.
Juros e correção monetária na forma da lei, exceto
quanto a indenização por danos morais, que deverá incidir a partir desta data.
Quanto aos honorários da perícia médica,
considerando que a sucumbência no objeto do parecer conclusivo da perícia
ficou a cargo da reclamante, oficie-se ao e. TRT 14ª Região requisitando o
depósito do valor dos honorários que o Juízo ora arbitra em R$1.000,00, para
posterior levantamento pelo médico perito HEINZ ROLAND JAKOBI, CRM/RO
579.
Custas pela reclamada, no importe de R$360,00,
calculadas sobre o valor atribuído à condenação nesta data(R$18 mil), as quais
deverão ser recolhidas no prazo de oito dias, sob pena de execução.
INTIMEM-SE as partes da presente decisão, eis
que proferida em data posterior àquela designada em audiência, em face do
acúmulo de serviço.
Nada mais.
Porto Velho, 21 de julho de 2014.
AFRÂNIO VIANA GONÇALVES
Juiz do Trabalho