SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 15
Descargar para leer sin conexión
Universidade Presbiteriana Mackenzie


UM ESTUDO DA ANÁLISE HABERMASIANA SOBRE A DIALÉTICA DO
ESCLARECIMENTO, A PARTIR DO CONCEITO HEGELIANO DE MODERNIDADE
Daniel Valente Pedroso de Siqueira (IC) e Roger Fernandes Campato (Orientador)
Apoio: PIBIC Mackenzie/MackPesquisa


Resumo

O presente artigo tenciona demonstrar os preâmbulos da pesquisa empreendida acerca do estudo do
conceito de modernidade em Hegel, tencionando viabilizar uma compreensão sobre as nuances,
manifestações e interações dos aspectos da subjetividade na modernidade. Tal discussão parte da
perspectiva discutida pela teoria da ação comunicativa habermasiana, apresentada em O discurso
filosófico da modernidade (2002), correlacionando-a a teoria social adorniana, almejando possibilitar
uma compreensão acerca da constituição da razão moderna a partir do conceito hegeliano de
subjetividade. Deste modo, a presente investigação procura compreender a capacidade reflexiva e
crítica da razão humana na contemporaneidade, tão discutidas por Habermas e Adorno. Para tanto, a
retomada da filosofia hegeliana mostra-se necessária para a identificação do “problema da
modernidade”, que se constitui por uma razão que almeja dominar, mas que, no entanto, é dominada.
A razão expressa no idealismo é uma razão do pensar individual, fragmentado, que não corresponde,
para a filosofia hegeliana, ao verdadeiro pensar. É deste modo que a análise do conceito de
subjetividade procura identificar a situação vigente na modernidade, pois é uma razão que se
caracteriza por centralizar sua experiência no sujeito cognoscente, abstraindo-se de todos os objetos
possíveis do mundo e se voltando a si como único objeto – o que culmina na transmutação da
subjetividade em uma objetividade. Uma possibilidade que se apresenta para romper com tal
situação, remonta ao processo dialético, enaltecido por Hegel e potencializado por Adorno.

Palavras-chaves: subjetividade, modernidade, dominação.


Abstract

This current paper aims to demonstrate the preambles of the research undertaken on Hegel’s concept
of modernity, intending to enable an understanding of the nuances, expressions and interactions of
the subjectivity aspects in modernity. This discussion gets its point from the perspective discussed by
Habermas’ communicative action theory, presented in his Philosophical discourse of modernity
(2002), correlating it to Adorno’s social theory – aiming to able an understanding of the modern reason
constitution from the Hegelian subjectivity concept. Thus, this research aims to understand the
capacity of reflection and critique of human reason in the contemporary world, as discussed by
Habermas and Adorno. To do so, although the resumption of Hegelian philosophy demonstrate the
necessity to indentify the “problem in modernity”, which aims to dominate but, however, it’s dominated.
The main reason is stated in idealism as such individual thinking, also fragmented, which does not
correspond to Hegel’s philosophy of the real thinking. So, it’s how the analysis of subjectivity concept
demands to indentify the current situation in modernity, it’s characterized by centralizing its experience
in the knowledge subject, abstracting it from all the possible objects around: it turns the knowledge
subject as the only one object – it’s possible it culminates in the transmutation of subjectivity into
objectivity. One possible way that appears to break that situation dates back to the dialectical process,
which on is enhanced by Hegel and potentiated by Adorno.

Key-words: subjectivity, modernity, domination.



                                                                                                        1
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011


INTRODUÇÃO

O presente relatório final tem o objetivo de apresentar a investigação empreendida que se
propôs a examinar as particularidades da capacidade reflexiva e crítica da razão humana na
contemporaneidade,    assim    como     possibilitar    um    entendimento       acerca     da    crise
experienciada na modernidade, caracterizada por uma “racionalidade instrumental”
(HORKHEIMER, 1976) que procura conhecer para dominar, mas que é incapaz de viabilizar
a emancipação humana.

Este estudo parte da discussão proposta por Habermas, em O discurso filosófico da
modernidade (2002), recorrendo ao conceito de modernidade em Hegel, assim como a uma
análise da dialética contida na teoria social adorniana a fim de compreender tal
problemática. Assim, considerando que “a disputa entre as teorias sociais de Adorno e
Habermas constitui uma excelente oportunidade para apreender a perspectiva dialética na
teoria crítica da sociedade” (MAAR, 2002), pois “a controvérsia entre ambos é sobre a
dialética” (ibidem), o presente artigo faz menção aos estudos empreendidos sobre a
investigação que tenciona compreender as particularidades da argumentação desenvolvida
por Habermas, bem como a discussão ulterior promovida sobre a validade da teoria da ação
comunicativa habermasiana frente à concepção da teoria social adorniana.

A questão que permeia o presente trabalho se refere à “subjetividade subjugadora e, ao
mesmo tempo, [que é] subjugada, como vontade de dominação industrial” (HABERMAS,
2002, p. 7-8), que, no entanto, se caracteriza por ser “uma subjetividade limitada”
(HABERMAS, 2002, p. 62).

A fim de possibilitar uma compreensão desta problemática, optou-se por retomar a filosofia
hegeliana, pois, como Habermas afirma:

                      Antes de tudo, Hegel descobre o princípio dos novos tempos: a subjetividade.
                      Valendo-se desse princípio explica simultaneamente a superioridade do mundo
                      moderno e sua tendência à crise: ele faz a experiência de si mesmo como o mundo
                      do progresso e ao mesmo tempo de espírito alienado. Por isso, a primeira tentativa
                      de levar a modernidade ao nível do conceito é originalmente uma crítica da
                      modernidade (HABERMAS, 2002, p. 25).




Na apresentação da edição brasileira da Fenomenologia do Espírito, Vaz esclarece que:

                      [...] o que Hegel pretende mostrar aqui [Fenomenologia do Espírito] é que, na
                      experiência do saber de um objeto que lhe é exterior, a consciência se suprime
                      como simples consciência de um objeto, passa para a consciência-de-si como para
                      a sua verdade mais profunda: a verdade da certeza de si mesmo (VAZ, 2007, p. 18),




                                                                                                      2
Universidade Presbiteriana Mackenzie


Tal postulação corrobora a análise empreendida por Habermas e, deste modo, parece ser
impraticável não considerar a relevância de seu questionamento, mais ainda quando este
suscita que:

                              Coloca-se então a questão de saber se o princípio da subjetividade e a estrutura de
                              consciência de si que lhe é imanente são suficientes como fonte de orientações
                              normativas, se bastam para “fundar” não apenas a ciência, a moral e a arte, de um
                              modo geral, mas ainda estabilizar uma formação histórica que se desligou de todos
                              os compromissos históricos. Agora a questão é saber se da subjetividade e da
                              consciência de si podem obter-se critérios próprios ao mundo moderno e que, ao
                              mesmo tempo, sirvam para se orientar nele; mas isso significa também que possam
                              ser aptos para a crítica de uma modernidade em conflito consigo mesma. Como é
                              possível construir, partindo do espírito da modernidade, uma forma ideal interna que
                              não se limite a imitar as múltiplas manifestações históricas da modernidade nem
                              lhes seja exterior? (HABERMAS, 2002, p. 30).




Hegel insinua que:

                              [...] cada significação se perfaz na outra, e só assim [e que] o conteúdo é um
                              conteúdo espiritual; enquanto a determinidade é também o seu oposto, é
                              consumada a unidade no ser-outro: o espiritual. Foi assim que antes se unificaram
                              para nós ou em si as significações opostas, e se suprasumiram [até] mesmo as
                              formas abstratas do mesmo e do não-mesmo; da identidade e da não-identidade
                              (HEGEL, 2007, p. 524, grifos do próprio autor).




É por isso que Habermas acusa Hegel de “executar esse programa” que “se enreda em um
dilema” (HABERMAS, 2002, p. 32), pois, “uma vez efetuada a dialética do esclarecimento, o
impulso para a crítica do tempo presente se esgotará, impulso que, entretanto, a colocou em
movimento” (ibidem)1.

É importante compreender que Habermas identifica, na filosofia hegeliana, uma análise mais
completa do conceito de modernidade – sobrepondo-a a teoria da modernidade esboçada
por Kant em suas três críticas2. De acordo com Habermas, foi Hegel quem impulsionou “a
teoria da modernidade, que estava apenas delineada no conceito kantiano de razão, e a
desenvolve em uma crítica das divisões de uma modernidade em conflito consigo própria”
1
   Todavia, esta é uma questão que demandaria mais “espaço”; deste modo, opta-se por centrar a discussão contida neste
relatório final à problemática da subjetividade existente na modernidade – considerando a filosofia hegeliana, a análise
empreendida por Habermas, bem como a teoria social adorniana –, a qual se encontra em conformidade com aquilo que foi
elaborado no projeto de pesquisa.
2
   De acordo com Bannwart Junior: “A preocupação de Habermas [...] é saber se a teoria da modernidade assim delineada pela
filosofia kantiana ‘deve realmente ficar de pé ou vir abaixo com as exigências fundacionistas da teoria do conhecimento’”
(BANNWAR JUNIOR, 2005). Assim, Habermas procura manter de Kant tão-somente o delineamento da teoria da modernidade
pautada numa razão complexa (procedural e formal). Ainda segundo Bannwart Junior, Habermas procede deste modo “porém
desfazendo-se de um modelo de filosofia fundacionista em moldes da teoria do conhecimento de forma que lhe seja facultado
abrir mão dos papéis de indicador de lugar e de juiz sem que a filosofia perca a sua estatura de guardiã da racionalidade”
(ibidem).



                                                                                                                        3
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011


(HABERMAS, 1989, p. 21). Sendo assim, a importância de Hegel para Habermas refere-se
ao encaminhamento que Hegel transpõe para uma nova perspectiva de atuação da filosofia,
visto que para Hegel o conceito de filosofia somente será apreendido concomitantemente
com o conceito de modernidade3. Este o motivo da retomada da filosofia hegeliana para a
compreensão da análise habermasiana, considerando que a crítica de Habermas dirige-se
às formas que constituem a racionalidade moderna. Portanto, ao retomar a filosofia
hegeliana é possível vislumbrar o racionalismo como o princípio básico da sociedade
ocidental moderna, pois “trata-se aqui de descobrir as artimanhas de uma subjetividade
limitada, que se fecha a um discernimento melhor e objetivamente disponível há muito
tempo” (HABERMAS, 2002, p. 62).

Considerando o alerta de Habermas para o fato de que “em face de uma modernização que
se move por si própria e se autonomiza em sua evolução, o observador social tem razões de
sobra para se despedir do horizonte conceitual do racionalismo ocidental em que surgiu a
modernidade” (HABERMAS, 2002, p. 6), o presente relatório recorre, também, às análises
empreendidas por Adorno, a fim de possibilitar uma compreensão acerca do modo como se
manifesta a subjetividade na modernidade, pois “a tarefa mais importante [...] da pesquisa
social empírica atual seria investigar em que medida afinal os homens são e pensam tal
como são feitos pelos mecanismos [da indústria cultural]” (ADORNO, 2007, p. 256).



REFERENCIAL TEÓRICO

Hegel afirma que “o único pensamento que consigo traz é o simples pensamento da razão,
de que a razão governa o mundo, de que portanto também a história universal transcorreu
de um modo racional” (HEGEL, 1995, p. 31).

De acordo com a leitura de Hyppolite:

                               Apreender as transformações do espírito do mundo, adaptar o pensamento ao devir
                               espiritual, tal é em primeiro lugar o objetivo de Hegel; e não é verdade que, na sua
                               época, ele assistia a transformações da mesma ordem? A sua dialéctica, antes de
                               ser lógica, é um esforço do pensamento para apreender o devir histórico e
                               reconciliar o tempo e o conceito (HYPPOLITE, 1995, p. 29).




Tal pressuposto condiz com o fato de Hegel enaltecer a importância (e, concomitantemente,
a força) da razão – tema tão discutido por Habermas e Adorno – ao apresentar a razão
como algo que

3
  É preciso compreender que a atribuição do conceito de modernidade não é uma definição hegeliana. Tal nomeação é
proposta por Habermas em sua leitura sobre o conceito de história de Hegel. Tal noção refere-se ao fato de que “o conceito de
modernização refere-se a um conjunto de processos cumulativos e de reforço mútuo” (HABERMAS, 2002, p. 5)



                                                                                                                           4
Universidade Presbiteriana Mackenzie


                       [...] não precisa, como a acção finita, das condições de um material externo, de
                       meios dados, dos quais recebe o sustento e os objectos da sua actividade; alimenta-
                       se de si mesma e é para si própria um material que ela elabora. Assim como é
                       somente o seu próprio pressuposto, o seu fim, o fim último absoluto, assim também
                       é ela própria a actuação e a produção, a partir do interior do fenômeno, não só do
                       universo natural, mas também do espiritual – na história universal (HEGEL, 1995, p.
                       31-32).




A modernidade se caracteriza pelo surgimento da subjetividade, ao menos enquanto meio
da liberdade e da reflexão; é o princípio da subjetividade que determina as configurações da
cultura moderna – por isso Hegel considera como sendo tarefa da filosofia no mundo
moderno esta apreensão da idéia que cabe a si própria. Tal necessidade se torna
compreensível quando se considera o fato de que Hegel procura “dar razão da sua própria
existência mostrando que o ato de filosofar não é um ato gratuito mas é a exigência da
transcrição no conceito do tempo histórico daquele mundo de cultura que colocou a razão
no centro do seu universo simbólico” (VAZ, 2007, p. 24). Isto procura possibilitar uma
existência universal ou, então, uma existência regida pela Razão que – advinda do
surgimento de uma subjetividade moderna – para se reconhecer como consciência-de-si
precisa cumprir a tarefa de pensar o seu tempo de experiência, o que resultaria segundo
Hegel na sociedade se reconhecer como uma civilização da Razão. Vaz sugere tal postura,
ao delinear que “o que aparece agora no horizonte do caminho para a ciência são as
estruturas da intersubjetividade ou é o próprio mundo humano como lugar privilegiado das
experiências mais significativas que assinalam o itinerário da Fenomenologia” (VAZ, 2007,
p. 22).

Hegel parece recorrer a tal noção de razão para não adentrar na inapreensibilidade do
conceito do tempo da experiência. Tal reconhecimento pode ser identificado quando Hegel
discorre sobre o fato de que:

                       No conceito que se sabe como conceito, os momentos se apresentam, pois,
                       anteriormente ao todo implementado, cujo vir-a-ser é o movimento desses
                       momentos. Na consciência, ao contrário, é anterior a esses momentos o todo, mas o
                       todo não-conceituado. O tempo é o conceito mesmo, que é-aí, e que se faz presente
                       à consciência como intuição vazia. Por esse motivo, o espírito se manifesta
                       necessariamente no tempo; e manifesta-se no tempo enquanto não apreende seu
                       conceito puro; quer dizer, enquanto não elimina o tempo. O tempo é o puro Si
                       exterior intuído [mas] não compreendido pelo Si: é o conceito apenas intuído.
                       Enquanto compreende a si mesmo, o conceito suprassume sua forma-de-tempo,
                       conceitua o intuir, e é o intuir concebido e conceituante (HEGEL, 2007, p. 538, grifos
                       do próprio autor).




                                                                                                           5
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011




O problema a ser enfrentado com tal postura incorre no fato de que, como Adorno
demonstra, “desde que se passou a buscar o fundamento de todo conhecimento na suposta
imediatidade daquilo que é dado subjetivamente, procurou-se, de maneira por assim dizer
fiel ao ídolo da pura atualidade, expulsar do pensamento a sua dimensão histórica”
(ADORNO, 2007, p. 53). E por este motivo, para evitar esta determinação, que é preciso
compreender que:

                       A dialética é a consciência consequente da não-identidade. Ela não assume
                       antecipadamente um ponto de vista. O pensamento é impelido até ela a partir de sua
                       própria inevitável insuficiência, de sua culpa pelo que pensa. Se objetarmos à
                       dialética, tal como se fez repetidamente desde os críticos aristotélicos de Hegel, que
                       ela reduz indiscriminadamente tudo o que cai em seu moinho à forma meramente
                       lógica da contradição, deixando de lado a plena multiplicidade do não-contraditório,
                       do simplesmente diverso, então deslocamos a culpa da coisa para o método
                       (ADORNO, 2009, p. 13).




As afinidades investigativas da filosofia hegeliana sugerem a aproximação suscitada por
Habermas com os questionamentos empreendidos por sua análise, visto que a estrutura
fundamental da época de Hegel é caracterizada pela cisão. Repa considera tal possibilidade
ao afirmar que: “A par de uma teoria da cisão como princípio de formação da cultura
moderna, Hegel é levado a analisar os pressupostos históricos da cisão” (REPA, 2000, p.
122). Tais conflitos são identificáveis quando se compreende o alerta hegeliano de que:

                       Agora parece haver necessidade do contrário: o sentido está tão enraizado no que é
                       terreno, que se faz mister uma força igual para erguê-lo dali. O espírito se mostra tão
                       pobre que parece aspirar, para seu reconforto, ao mísero sentimento do divino em
                       geral – como um viajante no deserto anseia por uma gota d’água. Pela
                       insignificância daquilo com que o espírito se satisfaz, pode-se medir a grandeza do
                       que perdeu (HEGEL, 2007, p. 29).




A preocupação de Hegel com o modo como a consciência se porta na modernidade é
justificável, pois “em vez de penetrar no conteúdo imanente da coisa, o entendimento lança
uma vista geral sobre o todo, e vem pairar sobre um ser-aí singular do qual fala; quer dizer,
não o enxerga de modo nenhum” (HEGEL, 2007, p. 58). É deste modo que “a relação
interna entre modernidade e racionalidade [...] que hoje é posta em questão” (HABERMAS,
2002, p. 8), encontra urgência, pois, ao que parece, a questão sobre o esclarecimento
encontra-se paralisada, visto que “são apenas as suas consequências que continuam em
curso” (MAAR, 2000).



                                                                                                            6
Universidade Presbiteriana Mackenzie


É compreensível a preocupação de Hegel quanto à subjetividade centrar-se tão-somente
como um princípio de dominação, que recorreria a uma estrutura de auto-relação (sujeito-
objeto) – o que, deste modo, impulsionaria o sujeito a se tornar objeto de si mesmo. Assim:

                       Uma dificuldade a evitar é a mistura do modo especulativo e do modo raciocinante
                       quando o que se diz do sujeito, ora tem a significação de seu conceito, ora tem
                       apenas a significação de seu predicado ou acidente. Um procedimento estorva o
                       outro, e só conseguirá plasticidade aquela exposição filosófica que excluir
                       rigorosamente a maneira como habitualmente são relacionadas as partes de uma
                       proposição (HEGEL, 2007, p. 64-65).




MÉTODO

A análise histórica levada a efeito por Habermas possibilita a investigação do conceito de
modernidade. Para tanto, como o próprio Habermas aponta “primeiramente é preciso que o
objeto da crítica seja determinado com tal precisão que nele possamos reconhecer a razão
centrada no sujeito enquanto princípio de modernidade” (HABERMAS, 2002, p. 147).

O presente relatório final se caracteriza por uma investigação qualitativa bibliográfica, que
possibilitou uma compreensão e uma discussão das questões que impulsionaram o estudo
empreendido, o qual é apresentado neste artigo. Assim, por exemplo, ao analisar a sutileza
da argumentação hegeliana, é possível vislumbrar que Hegel procura demonstrar que o agir
da subjetividade “bem pode supor que só age para-si, ou por egoísmo; [no entanto] ela é
melhor do que imagina: seu agir é ao mesmo tempo um agir universal em si-essente”
(HEGEL, 2007, p. 274, grifos do próprio autor). É por isso que:

                       Quando age por egoísmo, não sabe simplesmente o que faz. Quando assegura que
                       todos os homens agem por egoísmo, apenas afirma que todos os homens não
                       possuem nenhuma consciência do que seja o agir. Quando a individualidade age
                       para si, então isso é justamente o surgimento para a efetividade do que era apenas
                       em-si-essente. Portanto, o fim do ser-para-si, que se supõe oposto ao Em-si; suas
                       espertezas vazias e também suas explicações sutis, que sabe detectar o egoísmo
                       em toda a parte, igualmente desvaneceram – como o fim do Em-si e sua retórica
                       (HEGEL, 2007, p. 274-275, grifos do próprio autor).




Todavia, de acordo com Habermas, Hegel, ao buscar “implodir” a filosofia da subjetividade
nas diferentes formas em que se apresenta ao longo da tradição filosófica (principalmente a
alemã, com Kant e Fichte) não parece proceder de modo inteiramente imanente. Habermas
sugere que Hegel encontra-se demasiadamente circunscrito ao ideal Iluminista e, por isso,
concebe a idéia de um Absoluto – o que justificaria um estatuto de poder de unificação à
razão. Mas, mesmo com tal crítica, não deixa de tornar praticável o reconhecimento de que


                                                                                                       7
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011


“Hegel foi o primeiro a tomar como problema filosófico o processo pelo qual a modernidade
se desliga das sugestões normativas do passado que lhe são estranhas” (HABERMAS,
2002, p. 24).

Vaz corrobora o postulado habermasiano, ao afirmar que:

                      Com a Fenomenologia do Espírito, Hegel pretende situar-se para além dos termos
                      da aporia kantiana, designando-a como momento abstrato de um processo histórico-
                      dialético desencadeado pela própria situação de um sujeito que é fenômeno para si
                      mesmo ou portador de uma ciência que aparece a si mesma no próprio ato em que
                      faz face ao aparecimento de um objeto no horizonte do seu saber. Em outras
                      palavras, Hegel intenta mostrar que a fundamentação absoluta do saber é resultado
                      de uma gênese ou de uma história cujas vicissitudes são assinaladas, no plano da
                      aparição ou do fenômeno ao qual tem acesso o olhar do Filósofo (o para-nós na
                      terminologia hegeliana) pelas oposições sucessivas e dialeticamente articuladas
                      entre a certeza do sujeito e a verdade do objeto (VAZ, 2007, p. 14, grifos do próprio
                      autor).




A crítica de Habermas a Hegel refere-se a este pressupor o que deveria mostrar, isto é, a
demonstração de uma razão capaz de unificar as oposições. Na visão de Habermas, tal
intento se caracteriza como algo condizente às experiências históricas vivenciadas por
Hegel e não a argumentos filosóficos. No entanto, apesar da polêmica suscitada por
Habermas, este não ignora que:

                      Hegel não é o primeiro filósofo que pertence aos tempos modernos, mas o primeiro
                      para o qual a modernidade se tornou um problema. Em sua teoria, torna-se visível
                      pela primeira vez a constelação conceitual entre modernidade, consciência do tempo
                      e racionalidade. Por fim, o próprio Hegel desfaz essa constelação, visto que a
                      racionalidade dilatada em espírito absoluto neutraliza as condições sob as quais a
                      modernidade toma consciência de si mesma (HABERMAS, 2002, p. 62-63).




RESULTADOS E DISCUSSÃO

Atualmente, se encontra séria dificuldade para identificar um possível movimento de
reversão dos efeitos, ou impactos, gerados pela concepção unidimensional e autoritária da
racionalidade moderna. Alguns autores (Lyotard, 1988) argumentam que a transmissão do
conhecimento, na era atual, facilitada pelos mecanismos tecnológicos – que propiciam a
transmissão de dados de forma “virtual e instantânea” –, não requer mais um sujeito
preparado, ou mesmo que tenha o “espírito cultivado” para prover a transmissão e o
recebimento destas informações; tal descrição parece sugerir, e, consequentemente,
corroborar o fato de que um rompimento com este modelo de racionalidade se encontra



                                                                                                           8
Universidade Presbiteriana Mackenzie


atravancado. É este o alerta já identificável na filosofia hegeliana, pois “para Hegel, o
específico da razão é compreender que o elemento não pode viver fora do todo. O
entendimento é indispensável para o progresso do conhecimento humano, pois do contrário
permaneceríamos numa totalidade vazia” (Oliveira, 2001, p. 10). Isto torna compreensível o
problema enfrentado na modernidade, visto que

                      Nos tempos modernos [...] o indivíduo encontra a forma abstrata pronta. O esforço
                      para apreendê-la e fazê-la sua é mais o jorrar-para-fora, não-imediatizado, do
                      interior, e o produzir abreviado do universal, em vez de ser um brotar do universal a
                      partir do concreto e variedade do ser-aí. Por isso o trabalho atualmente não consiste
                      tanto em purificar o indivíduo do modo sensível imediato, e em fazer dele uma
                      substância pensada e pensante; consiste antes no oposto: mediante o suprassumir
                      dos pensamentos determinados e fixos, efetivar e espiritualizar o universal (HEGEL,
                      2007, p. 45).




A necessidade para um empreendimento que tencione compreender tais conflitos
circunscreve-se ao fato de que atualmente

                      Os homens se tornaram tão radicalmente alienados uns dos outros e à natureza que
                      a única coisa que ainda sabem é: para que precisam uns dos outros e o que se
                      infligem mutuamente. Cada um é um fato, o sujeito ou o objeto de uma prática
                      qualquer, algo com quem se conta ou não se precisa mais contar (ADORNO &
                      HORKHEIMER, 2006, p. 208).




Para Adorno e Horkheimer, o problema desta “intersubjetividade mutilada” (HABERMAS,
2002, p. 483) reside na crença de

                      [...] que a verdade de uma teoria é a mesma coisa que sua fecundidade [e isso] é
                      um erro. Muitas pessoas parecem, no entanto, admitir o contrário disso. Elas acham
                      que a teoria tem tão pouca necessidade de encontrar aplicação no pensamento, que
                      ela deveria antes dispensá-lo pura e simplesmente. Elas interpretam toda
                      declaração equivocadamente no sentido de uma definitiva profissão de fé,
                      imperativo ou tabu. Elas querem submeter-se à Idéia como se fora um Deus, ou
                      atacá-la como se fora um ídolo. O que lhes falta, em face dela, é a liberdade. Mas é
                      próprio da verdade o fato de que participamos dela enquanto sujeitos ativos. Uma
                      pessoa pode ouvir frases que são em si mesmas verdadeiras, mas só perceberá sua
                      verdade na medida em que está pensando e continua a pensar, ao ouvi-las
                      (ADORNO & HORKHEIMER, 2007, p. 201).




                                                                                                         9
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011


Habermas compreende isto como o fator que transformou4 “os próprios sujeitos” em
sistemas individualizados. Isto poderia sugerir, inclusive, que a própria noção de uma
estrutura da intersubjetividade inexiste, dado que os indivíduos foram eliminados do seu
mundo da vida, pela relação de dominação da razão instrumental, ou, como Luhmann
(1998) aponta, o sistema social e o sistema pessoal caracterizam-se (e, consequentemente,
se constituem) por serem universos distintos e circundantes um do outro.

Habermas entende que “em Hegel [...] não se trataria de recuperar novamente a intuição da
totalidade ética no horizonte da auto-relação do sujeito cognoscente e agente”
(HABERMAS, 2002, p. 413), pois “um mundo reificado é, por definição, um mundo
desumanizado” (ibidem, p. 113). Tal reconhecimento é justificável, porque, antes de tudo, o
interesse de Hegel sobre a força da negação reside no poder que este estado possui, o qual
permitiria a contradição inerente ao pensamento e à realidade – deste modo, “a negação da
realidade é a chave conceitual que permite recusar a positividade esmagadora da sociedade
industrial avançada5” (NICHOLSEN & SHAPIRO, 1993, p. 11). A implicação disto se
fundamenta no fato de que “a individualidade é determinada e, enquanto tal, não é livre; a
sua liberdade surge apenas quando nega em si mesma toda a determinação e acede assim
ao universal” (HEGEL, 1995, p. 82), pois só uma razão reconciliadora, que se auto nega, é
que pode “eliminar” a positividade da modernidade.

Parece ser esta a mesma compreensão obtida por Habermas, quando declara que:

                              Somente uma razão à qual atribuíssemos um poder-chave poderia incluir ou excluir.
                              Por isso o dentro e o fora vinculam-se à dominação e à sujeição – e a superação da
                              razão detentora do poder, ao arrombamento das portas da prisão e à soltura
                              permissível em uma liberdade indeterminada. Desse modo, o outro da razão
                              permanece como a imagem especular da razão detentora do poder. Abnegação e
                              desprendimento permanecem tão acorrentadas à vontade de controlar quanto a
                              revolta do contrapoder, à violência do poder. Dos conceitos da razão, centrada no
                              sujeito e da ilustração marcante de sua topografia não poderá se livrar aquele que
                              quer abandonar, junto com o paradigma da filosofia da consciência, todos os
                              paradigmas em geral e refugiar-se na clareira da pós-modernidade (HABERMAS,
                              2002, p. 430-431).




E qual seria, então, esta chave conceitual, ou o “poder-chave” que permitiria esta ruptura?
Uma possível resolução deste entrave pode ser sugerido com a negação da própria
dialética, porque:

4
  Optou pelo verbo transitivo “transformar” para uma melhor adequação do emprego lingüístico. No entanto, faz-se notar que o
sentido deve se assemelhar mais a uma conotação negativa do que positiva, considerando o pensamento habermasiano.
Deste modo, a citação de Habermas afirma que “o funcionalismo sistêmico [...] faz os próprios sujeitos se decomporem em
sistemas” (HABERMAS, 2002, p. 489).
5
  Tradução própria da introdução à edição norte-americana dos Três estudos sobre Hegel (ADORNO, 1993).



                                                                                                                         10
Universidade Presbiteriana Mackenzie


                      [...] a força especulativa capaz de lançar pelos ares o indissolúvel é a força da
                      negação. É somente nela que sobrevive o caráter sistemático. As categorias da
                      crítica ao sistema são ao mesmo tempo aquelas que concebem o particular. O que
                      um dia ultrapassou legitimamente o particular no sistema tem seus sítios fora do
                      sistema. A visão, que interpretando colhe no fenômeno mais do que ele
                      simplesmente é, e, unicamente por meio daí, o que ele é, seculariza a metafísica. Só
                      os fragmentos enquanto forma da filosofia seriam capazes de entregar às mônadas
                      projetadas de maneira ilusória pelo idealismo o que lhes é devido. Elas seriam
                      representações no particular da totalidade irrepresentável enquanto tal (ADORNO,
                      2009, p. 32).




Hegel já havia optado por consagrar as contradições procurando “um trajeto intelectual que
as acompanhe no plano de um movimento de exteriorização e sua superação” (MAAR,
2002). Deste modo, o conhecimento dialético deve

                      [...] enquanto co-portador de uma tensão, num certo sentido, ir além de si mesmo.
                      Assim o conceito do que é dado já conteria em si o conceito do ir além de si. Nesses
                      termos a tarefa de uma teoria da dialética seria situar o conceito do que é dado de
                      tal modo que assim preencha esta função dialética (HORKHEIMER, 1976, p. 172)




CONCLUSÃO

A questão da “subjetividade subjugadora e ao mesmo tempo subjugada” (HABERMAS,
2002, p. 7-8) torna-se compreensível quando se atenta para o fato de que

                      [...] a consciência-de-si não é toda a realidade somente para si, mas também em si:
                      porque se torna essa realidade, ou antes, porque se demonstra como tal. Assim se
                      demonstra através do caminho, no curso do qual o ser-outro, como em si,
                      desvanece para a consciência: primeiro, no movimento dialético do “visar”, do
                      perceber e do entendimento. Demonstra-se depois, no movimento através da
                      independência da consciência, na dominação e escravidão; através do pensamento
                      da liberdade [do estoicismo], da libertação céptica e da luta de libertação absoluta da
                      consciência cindida em si mesma; [movimento em que] o ser-Outro desvanece para
                      a consciência enquanto é somente para ela (HEGEL, 2007, p. 173-174, grifos do
                      próprio autor).




A questão é que esta razão, circunscrita sob a égide da subjetividade que se constitui na (e
a partir da) modernidade, não consegue se exteriorizar e, deste modo, sequer se
reconhecer. Adorno reconhece este problema, quando afirma que:

                      O pensamento identificador, a igualação de todo e qualquer desigual, perpetua-se
                      no medo da sujeição à natureza. A razão irrefletida é obnubilada até a errância em




                                                                                                          11
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011


                      face de tudo aquilo que se subtrai à sua dominação. Por agora, a razão está
                      padecendo: curar-se de um tal mal é que seria propriamente razão (ADORNO, 2009,
                      p. 149).




Deste modo, como seria possível romper com tal situação? Pois “a subjetividade renegada
converte-se em objetivismo” (ADORNO, 2009, p. 67). Habermas identifica tal problema no
conceito da modernidade, pois foi por meio da reflexão que elevou a época à consciência de
si que impossibilitou a busca de “modelos exemplares” em tempos idos. É necessário
conceber um outro modo de reconciliação, considerando a realidade singular advinda das
relações capitalistas (relação de dominação). Esta nova realidade se caracterizaria por ser,
já, “algo ambíguo, que na sua multiplicidade tem ao mesmo tempo em si o ser-outro, em
oposição à categoria pura”, pois “elas a contradizem por essa multiplicidade, e a unidade
pura deve suprassumir em si tal multiplicidade, constituindo-se desse modo em unidade
negativa das diferenças” (HEGEL, 2007, p. 176, grifos do próprio autor). Isso caracteriza o
fato de que “uma modernidade sem modelos, aberta ao futuro e ávida por inovações só
pode extrair seus critérios de si mesma. Como única fonte do normativo se oferece o
princípio da subjetividade, do qual brota a própria consciência de tempo da modernidade”
(HABERMAS, 2002, p. 60). É este o conflito vislumbrado por Hegel, pois:

                      A razão [...] parte para conhecer a verdade; para encontrar como conceito o que era
                      uma coisa para o “visar” e o perceber, isto é, para ter na coisidade somente a
                      consciência de si mesma. Por isso a razão tem agora um interesse universal pelo
                      mundo, já que ela é a certeza de ter no mundo a presença, ou seja, a certeza de que
                      a presença é racional. Procura a razão seu Outro, sabendo que não possuirá nada
                      de Outro a não ser ela mesma; busca apenas sua própria infinitude (HEGEL, 2007,
                      p. 179, grifos do próprio autor).




Tal pressuposto é o que caracteriza a consciência da modernidade, pois é “essa unidade
negativa do pensar [que] é para si mesma, ou melhor, é o ser-para-si-mesmo, o princípio da
individualidade; e é, em sua realidade consciência operante” (HEGEL, 2007, p. 218, grifos
do próprio autor).

É compreensível que inserida na perspectiva da subjetividade, a modernidade tem
estruturada as suas peculiaridades características. A valorização do sujeito cognoscente,
que incita o desenvolvimento da ciência e da produção tecnológica, corrobora a estrutura do
projeto moderno com aspirações de liberdade e de emancipação. No entanto, é necessário
apontar os aspectos falhos deste desenvolvimento, quanto ao que se refere à insuficiência
da razão em se manter como poder unificador, em vista das cisões da modernidade, visto
que “o preço que os homens pagam pelo aumento de seu poder é a alienação daquilo sobre


                                                                                                      12
Universidade Presbiteriana Mackenzie


o que exercem o poder” (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 21). A fim de identificar tais
questões, a investigação empreendida procurou confluir o pensamento hegeliano, a partir da
análise estruturada por Habermas; os caminhos tomados para atender à proposta deste
trabalho partiram do conceito de modernidade elaborado por Habermas – a fim de
compreender a ênfase habermasiana de que a modernidade se caracteriza por um processo
de racionalização que conduz à desintegração do universo social tradicional. Tal análise, “se
dirige contra uma razão fundada no princípio da subjetividade”, onde “seu teor assinala que
essa razão só denuncia e mina todas as formas abertas de opressão e exploração, de
degradação e alienação, para implantar em seu lugar a dominação inatacável de sua
racionalidade” (HABERMAS, 2002, p. 80). Deste modo, o problema identificado se refere ao
fato de que “quanto mais criticamente se compreende a autonomia da subjetividade, quanto
mais ela se torna consciente de si enquanto algo por sua parte mediatizado, tanto mais
imperativa se torna a obrigação do pensamento de confrontar-se com aquilo que lhe
proporciona a firmeza que não possui em si mesmo (ADORNO, 2009, p. 41), pois:

                       Essa primeira razão, que se conhece no objeto, encontra expressão no idealismo
                       vazio que só apreende a razão como inicialmente é – e por indicar em todo o ser
                       esse Meu puro da consciência, e enunciar as coisas como sensações ou
                       representações, acredita ter mostrado esse Meu puro como realidade acabada. [Tal
                       idealismo] tem de ser ao mesmo tempo um empirismo absoluto, porque para o
                       enchimento desse Meu vazio, quer dizer, para a diferença e para a totalidade do
                       desenvolvimento e da configuração dessa diferença, sua razão necessita de um
                       “choque estranho” no qual só se encontra a multiplicidade do sentir e do representar
                       (HEGEL, 2007, p. 177-178, grifos do próprio autor).




Hegel reconhece, como sugere Habermas, que a possibilidade de uma unificação diferente
dessa que acaba por gerar mais positividade, é legítima de ser pensada em razão das
experiências de crise. A veracidade desta necessidade encontra respaldo no fato de que:

                       O percebedor não se encontra mais presente no processo da percepção. Ele não
                       mobiliza mais a passividade ativa do conhecimento, na qual os elementos
                       categoriais   se   deixam    modelar    da    maneira    adequada     pelo   “dado”
                       convencionalmente pré-formado, e este por aqueles, de tal modo que se faça justiça
                       ao objeto percebido. No campo das ciências sociais bem como no da experiência
                       individual, a intuição cega e os conceitos vazios são reunidos de maneira rígida e
                       sem mediação. Na era do vocabulário básico de trezentas palavras, a capacidade de
                       julgar e, com ela, a distinção do verdadeiro e do falso estão desaparecendo
                       (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 166).




                                                                                                        13
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011


A identidade deve, deste modo, ser pensada como negação de todas as absolutizações, em
crítica permanente às positividades (HABERMAS, 2002), contrariamente à subjetividade
subjugadora. Hegel pensa ser possível superar a oposição existente recorrendo a um sujeito
que tem consciência de si e de sua substância, que tem em si a unidade e a diferença do
finito e infinito – é por isso que o absoluto não é sujeito nem substância, mas o processo
mediador que se produz independente das condições vigentes. Para que se torne possível,
é preciso considerar que:

                      Quando    a   consciência    carente-de-pensamento   proclama   o   observar   e   o
                      experimentar como a fonte da verdade, suas palavras bem que poderiam soar como
                      se apenas se tratasse do saborear, cheirar, tocar, ouvir e ver. Porém essa
                      consciência, no afã com que recomenda o gostar, o cheirar, etc., esquece de dizer
                      que também o objeto desse sentir já está de fato determinado para ela,
                      essencialmente; e que, para ela, essa determinação do objeto vale pelo menos tanto
                      como esse sentir. Tem de admitir igualmente que, em geral, não se trata só do
                      perceber, assim, para dar um exemplo, a percepção de que este canivete está posto
                      aqui ao lado da tabaqueira não tem valor de observação. O percebido deve ter pelo
                      menos a significação de um universal, e não de um isto sensível (HEGEL, 2007, p.
                      181, grifos do próprio autor).




É importante notar que a modernidade se constitui mediante a rubrica de unilateralizações
que não necessitam da filosofia para sua fundamentação (ARAGÃO, 1992). É por isso que
“a questão [hoje] é que o esclarecimento tem que tomar consciência de si mesmo, se os
homens não devem ser completamente traídos. Não se trata da conservação do passado,
mas de resgatar a esperança passada” (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 14).



REFERÊNCIAS

ADORNO, T. W. Dialética negativa. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

ADORNO, T. W. Hegel three studies. Cambridge: The MIT Press, 1993.

ADORNO, T. W. Introdução à sociologia. São Paulo: Editora UNESP, 2007.

ADORNO, T. W. & HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar,
2006.

ARAGÃO, L. M. C. Razão comunicativa e teoria social crítica em Jürgen Habermas. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 1992.




                                                                                                         14
Universidade Presbiteriana Mackenzie


BANNWART JUNIOR, C. J. Modernidade e o novo lugar da filosofia: A idéia de reconstrução
em Habermas. In: Mediações – Revista de Ciências Sociais, Londrina, v. 10, n. 1, p. p. 185-
200, jan.-jun. 2005.

HABERMAS, J. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
1989.

HABERMAS, J. O discurso filosófico da modernidade. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

HABERMAS, J. Theodor W. Adorno: Pré-história da subjetividade e auto-afirmação
selvagem. In: FREITAG, B. & ROUANET, S. (orgs.). Habermas. São Paulo: Ática, 1990, p.
139-150.

HEGEL, G. W. F. A razão na história. Lisboa: Edições 70, 1995.

HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do espírito. Petrópolis: Vozes, 2007.

HORKHEIMER, M. Eclipse da razão. Rio de Janeiro: Labor, 1976.

HYPPOLITE, J. Introdução à filosofia da história de Hegel. Lisboa: Edições 70, 1995.

LYOTARD, J. F. O pós-moderno. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988.

LUHMANN, N. Observations on modernity. Stanford: Stanford University Press, 1998.

MAAR, W. L. A perspectiva dialética em Adorno e a controvérsia com Habermas. In:
Trans/Form/Ação, Marília, v. 25, n. 1, 2002.

MAAR, W. L. O primeiro Habermas: “Trabalho e Interação” na evolução emancipatória da
humanidade. In: Trans/Form/Ação, São Paulo, v. 23, n. 1, 2000.

NICHOLSEN, S. W. & SHAPIRO, J. J. Introduction. In: ADORNO, T. W. Hegel three studies.
Cambridge: The MIT Press, 1993, p. 9-34.

OLIVEIRA, M. A. A filosofia na crise da modernidade. São Paulo: Edições Loyola, 2001.

REPA, L. Habermas e a reconstrução do conceito hegeliano de modernidade. São Paulo.
Dissertação de mestrado/USP, 2000 (in mimeo).

VAZ, H. C. L. A significação da Fenomenologia do Espírito (Apresentação à 4ª edição
brasileira). In: HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do Espírito. Petrópolis: Editora Vozes, 2007,
p. 9-20.




Contato: thez1492@hotmail.com e roger.campato@mackenzie.br




                                                                                          15

Más contenido relacionado

La actualidad más candente

3 p teorias_sobre_criatividade
3 p teorias_sobre_criatividade3 p teorias_sobre_criatividade
3 p teorias_sobre_criatividadeJessica Silveira
 
Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.
Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.
Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.Julia Travaglini
 
Revista ex-isto - no. 1
Revista ex-isto - no. 1Revista ex-isto - no. 1
Revista ex-isto - no. 1Bruno Carrasco
 
505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade
505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade
505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividadeUFMA Universidade Federal do Maranhão
 
Marçal, j.c. existência e _verdade_ em martin heidegger
Marçal, j.c.  existência  e _verdade_ em martin heideggerMarçal, j.c.  existência  e _verdade_ em martin heidegger
Marçal, j.c. existência e _verdade_ em martin heideggerÉrika Renata
 
Discurso sobre o espirito positivo
Discurso sobre o espirito positivoDiscurso sobre o espirito positivo
Discurso sobre o espirito positivoRosyane Dutra
 
Indivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis Dumont
Indivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis DumontIndivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis Dumont
Indivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis DumontDouglas Evangelista
 
O que diria foucault e übermensch
O que diria foucault e übermenschO que diria foucault e übermensch
O que diria foucault e übermenschfapaulas
 
Pedagogia dos monstros os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras
Pedagogia dos monstros   os prazeres e os perigos da confusão de fronteirasPedagogia dos monstros   os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras
Pedagogia dos monstros os prazeres e os perigos da confusão de fronteirasAriane Mafra
 
éTica e alteridade em habermas
éTica e alteridade em habermaséTica e alteridade em habermas
éTica e alteridade em habermasmasalas
 
Adorno atualidade da filosofia 1966 [doc]
Adorno   atualidade da filosofia 1966 [doc]Adorno   atualidade da filosofia 1966 [doc]
Adorno atualidade da filosofia 1966 [doc]Aline Trigo
 

La actualidad más candente (20)

Mistica linguagem, filosofia
Mistica linguagem, filosofiaMistica linguagem, filosofia
Mistica linguagem, filosofia
 
Noção de espírito
Noção de espíritoNoção de espírito
Noção de espírito
 
Transc3
Transc3Transc3
Transc3
 
3 p teorias_sobre_criatividade
3 p teorias_sobre_criatividade3 p teorias_sobre_criatividade
3 p teorias_sobre_criatividade
 
18 n2-leonardo-cmacho-de-oliveira
18 n2-leonardo-cmacho-de-oliveira18 n2-leonardo-cmacho-de-oliveira
18 n2-leonardo-cmacho-de-oliveira
 
Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.
Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.
Campanha "Hope ensina": Uma análise dos estereótipos e ideologia envolvidas.
 
Revista ex-isto - no. 1
Revista ex-isto - no. 1Revista ex-isto - no. 1
Revista ex-isto - no. 1
 
(5) abertura da mente
(5) abertura da mente(5) abertura da mente
(5) abertura da mente
 
505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade
505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade
505. fenomenologia da literatura de auto ajuda financeira e subjetividade
 
Leandro nascimento
Leandro nascimentoLeandro nascimento
Leandro nascimento
 
Marçal, j.c. existência e _verdade_ em martin heidegger
Marçal, j.c.  existência  e _verdade_ em martin heideggerMarçal, j.c.  existência  e _verdade_ em martin heidegger
Marçal, j.c. existência e _verdade_ em martin heidegger
 
Texto 01
Texto 01Texto 01
Texto 01
 
Discurso sobre o espirito positivo
Discurso sobre o espirito positivoDiscurso sobre o espirito positivo
Discurso sobre o espirito positivo
 
Indivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis Dumont
Indivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis DumontIndivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis Dumont
Indivíduo e Sociedade: Um estudo sobre a perspectiva hierárquica de Louis Dumont
 
O que diria foucault e übermensch
O que diria foucault e übermenschO que diria foucault e übermensch
O que diria foucault e übermensch
 
11268 43314-1-pb
11268 43314-1-pb11268 43314-1-pb
11268 43314-1-pb
 
Pedagogia dos monstros os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras
Pedagogia dos monstros   os prazeres e os perigos da confusão de fronteirasPedagogia dos monstros   os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras
Pedagogia dos monstros os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras
 
éTica e alteridade em habermas
éTica e alteridade em habermaséTica e alteridade em habermas
éTica e alteridade em habermas
 
4166 11585-1-pb
4166 11585-1-pb4166 11585-1-pb
4166 11585-1-pb
 
Adorno atualidade da filosofia 1966 [doc]
Adorno   atualidade da filosofia 1966 [doc]Adorno   atualidade da filosofia 1966 [doc]
Adorno atualidade da filosofia 1966 [doc]
 

Destacado

Destacado (20)

Natureza
NaturezaNatureza
Natureza
 
Problematika verifikasi parpol
Problematika verifikasi parpolProblematika verifikasi parpol
Problematika verifikasi parpol
 
Test
TestTest
Test
 
Patronato del hospital del niño, josé renán
Patronato del hospital  del niño, josé renánPatronato del hospital  del niño, josé renán
Patronato del hospital del niño, josé renán
 
Trabajo de informatyca
Trabajo de informatycaTrabajo de informatyca
Trabajo de informatyca
 
Ef4ktur manual tecnico
Ef4ktur manual tecnicoEf4ktur manual tecnico
Ef4ktur manual tecnico
 
Felicitari
FelicitariFelicitari
Felicitari
 
Instalação de app em tablets ou smarthphones com
Instalação de app em tablets ou smarthphones comInstalação de app em tablets ou smarthphones com
Instalação de app em tablets ou smarthphones com
 
2001 1206 hpj2
2001 1206 hpj22001 1206 hpj2
2001 1206 hpj2
 
Apresentação damai clientes.pdf (1)
Apresentação damai clientes.pdf (1)Apresentação damai clientes.pdf (1)
Apresentação damai clientes.pdf (1)
 
Vila Inglesa
Vila InglesaVila Inglesa
Vila Inglesa
 
Refernce Letters
Refernce LettersRefernce Letters
Refernce Letters
 
Eenadu internet
Eenadu internetEenadu internet
Eenadu internet
 
Cabos
CabosCabos
Cabos
 
Dreams
DreamsDreams
Dreams
 
No limit
No limitNo limit
No limit
 
Deporte y tipos de deporte
Deporte y tipos de deporteDeporte y tipos de deporte
Deporte y tipos de deporte
 
Fase I
Fase IFase I
Fase I
 
La venganza del loro
La venganza del loroLa venganza del loro
La venganza del loro
 
Huwag kailanman Mangatitisod
Huwag kailanman MangatitisodHuwag kailanman Mangatitisod
Huwag kailanman Mangatitisod
 

Similar a Daniel valente

Alliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtualAlliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtualRaquel Faria
 
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtualAlliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtualCarlos Elson Cunha
 
O diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddensO diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddensJailma Gomez
 
O diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddensO diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddensJailma Gomez
 
6 idealismo dialetico hegel slide
6 idealismo dialetico hegel slide6 idealismo dialetico hegel slide
6 idealismo dialetico hegel slideErica Frau
 
Abordagem Dialética.pptx
Abordagem Dialética.pptxAbordagem Dialética.pptx
Abordagem Dialética.pptxAdeliceBraga
 
Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...
Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...
Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...Lucas Machado
 
Aula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.ppt
Aula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.pptAula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.ppt
Aula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.pptssuser47aa16
 
Filosofia em Tempos Difíceis
Filosofia em Tempos DifíceisFilosofia em Tempos Difíceis
Filosofia em Tempos DifíceisJorge Barbosa
 
4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética
4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética
4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialéticaDocência "in loco"
 
A dialetica do singular particular-universal
A dialetica do singular particular-universalA dialetica do singular particular-universal
A dialetica do singular particular-universalEDVALDO ARAUJO DE SUSA
 
Artigo Conceito de enunciado por Focault
Artigo Conceito de enunciado por  FocaultArtigo Conceito de enunciado por  Focault
Artigo Conceito de enunciado por FocaultCarlos Alberto Monteiro
 

Similar a Daniel valente (20)

Alliez, éric. deleuze, filosofia virtual
Alliez, éric. deleuze, filosofia virtualAlliez, éric. deleuze, filosofia virtual
Alliez, éric. deleuze, filosofia virtual
 
Abordagens 0606
Abordagens 0606Abordagens 0606
Abordagens 0606
 
Paradigma da Hermenêutica (1).pptx
Paradigma da Hermenêutica (1).pptxParadigma da Hermenêutica (1).pptx
Paradigma da Hermenêutica (1).pptx
 
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtualAlliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtual
 
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtualAlliez, érics. deleuze, filosofia virtual
Alliez, érics. deleuze, filosofia virtual
 
Gaio%202
Gaio%202Gaio%202
Gaio%202
 
O diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddensO diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddens
 
O diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddensO diálogo entre anthony giddens
O diálogo entre anthony giddens
 
6 idealismo dialetico hegel slide
6 idealismo dialetico hegel slide6 idealismo dialetico hegel slide
6 idealismo dialetico hegel slide
 
Abordagem Dialética.pptx
Abordagem Dialética.pptxAbordagem Dialética.pptx
Abordagem Dialética.pptx
 
25720 29773-1-pb
25720 29773-1-pb25720 29773-1-pb
25720 29773-1-pb
 
Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...
Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...
Hegel e o ceticismo: sobre as possibilidades e os limites da superação do cet...
 
Aula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.ppt
Aula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.pptAula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.ppt
Aula 4 - Introdução ao pensamento de Hegel.ppt
 
Filosofia em Tempos Difíceis
Filosofia em Tempos DifíceisFilosofia em Tempos Difíceis
Filosofia em Tempos Difíceis
 
4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética
4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética
4.arnoni papirus 2008_metodologia da mediação dialética
 
A dialetica do singular particular-universal
A dialetica do singular particular-universalA dialetica do singular particular-universal
A dialetica do singular particular-universal
 
24 68-1-pb
24 68-1-pb24 68-1-pb
24 68-1-pb
 
Artigo Conceito de enunciado por Focault
Artigo Conceito de enunciado por  FocaultArtigo Conceito de enunciado por  Focault
Artigo Conceito de enunciado por Focault
 
Metodo marxista
Metodo marxistaMetodo marxista
Metodo marxista
 
Texto 7 o materialismo histórico-dialético e a educação
Texto 7   o materialismo histórico-dialético e a educaçãoTexto 7   o materialismo histórico-dialético e a educação
Texto 7 o materialismo histórico-dialético e a educação
 

Más de Carlos Elson Cunha

Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)
Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)
Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)Carlos Elson Cunha
 
Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology mead and the reality of t...
Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology   mead and the reality of t...Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology   mead and the reality of t...
Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology mead and the reality of t...Carlos Elson Cunha
 
Alexandria sem muros monografia 2016
Alexandria sem muros   monografia 2016Alexandria sem muros   monografia 2016
Alexandria sem muros monografia 2016Carlos Elson Cunha
 
Atitude mental correta para falar em público
Atitude mental correta para falar em públicoAtitude mental correta para falar em público
Atitude mental correta para falar em públicoCarlos Elson Cunha
 
Introduções para falar em público
Introduções para falar em públicoIntroduções para falar em público
Introduções para falar em públicoCarlos Elson Cunha
 
Xadrez é fácil com o aluno eterno
Xadrez é fácil   com o aluno eternoXadrez é fácil   com o aluno eterno
Xadrez é fácil com o aluno eternoCarlos Elson Cunha
 
Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas
Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas
Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas Carlos Elson Cunha
 
Guindaste de palitos de picolé
Guindaste de palitos de picoléGuindaste de palitos de picolé
Guindaste de palitos de picoléCarlos Elson Cunha
 
Todas as árvores do largo da concórdia
Todas as árvores do largo da concórdiaTodas as árvores do largo da concórdia
Todas as árvores do largo da concórdiaCarlos Elson Cunha
 
Levantamento fotográfico v oprr bras
Levantamento fotográfico v oprr brasLevantamento fotográfico v oprr bras
Levantamento fotográfico v oprr brasCarlos Elson Cunha
 
Lançamento de livros enanparq
Lançamento de livros enanparqLançamento de livros enanparq
Lançamento de livros enanparqCarlos Elson Cunha
 
Cdhu principais programas e tipologias
Cdhu principais programas e tipologiasCdhu principais programas e tipologias
Cdhu principais programas e tipologiasCarlos Elson Cunha
 

Más de Carlos Elson Cunha (20)

Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)
Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)
Wittgenstein, ludwig. tractatus logico philosophicus (1968)
 
Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology mead and the reality of t...
Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology   mead and the reality of t...Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology   mead and the reality of t...
Westlund, olle. s(t)imulating a social psychology mead and the reality of t...
 
Alexandria sem muros monografia 2016
Alexandria sem muros   monografia 2016Alexandria sem muros   monografia 2016
Alexandria sem muros monografia 2016
 
Shopping das artes
Shopping das artesShopping das artes
Shopping das artes
 
Atitude mental correta para falar em público
Atitude mental correta para falar em públicoAtitude mental correta para falar em público
Atitude mental correta para falar em público
 
Introduções para falar em público
Introduções para falar em públicoIntroduções para falar em público
Introduções para falar em público
 
O temor de falar em público
O temor de falar em públicoO temor de falar em público
O temor de falar em público
 
Mec solo ms
Mec solo msMec solo ms
Mec solo ms
 
Xadrez é fácil com o aluno eterno
Xadrez é fácil   com o aluno eternoXadrez é fácil   com o aluno eterno
Xadrez é fácil com o aluno eterno
 
Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas
Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas
Canvas do Carlão - Exemplo do modelo Canvas
 
B n
B nB n
B n
 
Guindaste de palitos de picolé
Guindaste de palitos de picoléGuindaste de palitos de picolé
Guindaste de palitos de picolé
 
Atribuições arquiteto
Atribuições arquitetoAtribuições arquiteto
Atribuições arquiteto
 
Todas as árvores do largo da concórdia
Todas as árvores do largo da concórdiaTodas as árvores do largo da concórdia
Todas as árvores do largo da concórdia
 
R caetano pinto
R caetano pintoR caetano pinto
R caetano pinto
 
Levantamento fotográfico v oprr bras
Levantamento fotográfico v oprr brasLevantamento fotográfico v oprr bras
Levantamento fotográfico v oprr bras
 
Lançamento de livros enanparq
Lançamento de livros enanparqLançamento de livros enanparq
Lançamento de livros enanparq
 
Drenagem urbana.2007
Drenagem urbana.2007Drenagem urbana.2007
Drenagem urbana.2007
 
Domótica em bibliotecas
Domótica em bibliotecasDomótica em bibliotecas
Domótica em bibliotecas
 
Cdhu principais programas e tipologias
Cdhu principais programas e tipologiasCdhu principais programas e tipologias
Cdhu principais programas e tipologias
 

Daniel valente

  • 1. Universidade Presbiteriana Mackenzie UM ESTUDO DA ANÁLISE HABERMASIANA SOBRE A DIALÉTICA DO ESCLARECIMENTO, A PARTIR DO CONCEITO HEGELIANO DE MODERNIDADE Daniel Valente Pedroso de Siqueira (IC) e Roger Fernandes Campato (Orientador) Apoio: PIBIC Mackenzie/MackPesquisa Resumo O presente artigo tenciona demonstrar os preâmbulos da pesquisa empreendida acerca do estudo do conceito de modernidade em Hegel, tencionando viabilizar uma compreensão sobre as nuances, manifestações e interações dos aspectos da subjetividade na modernidade. Tal discussão parte da perspectiva discutida pela teoria da ação comunicativa habermasiana, apresentada em O discurso filosófico da modernidade (2002), correlacionando-a a teoria social adorniana, almejando possibilitar uma compreensão acerca da constituição da razão moderna a partir do conceito hegeliano de subjetividade. Deste modo, a presente investigação procura compreender a capacidade reflexiva e crítica da razão humana na contemporaneidade, tão discutidas por Habermas e Adorno. Para tanto, a retomada da filosofia hegeliana mostra-se necessária para a identificação do “problema da modernidade”, que se constitui por uma razão que almeja dominar, mas que, no entanto, é dominada. A razão expressa no idealismo é uma razão do pensar individual, fragmentado, que não corresponde, para a filosofia hegeliana, ao verdadeiro pensar. É deste modo que a análise do conceito de subjetividade procura identificar a situação vigente na modernidade, pois é uma razão que se caracteriza por centralizar sua experiência no sujeito cognoscente, abstraindo-se de todos os objetos possíveis do mundo e se voltando a si como único objeto – o que culmina na transmutação da subjetividade em uma objetividade. Uma possibilidade que se apresenta para romper com tal situação, remonta ao processo dialético, enaltecido por Hegel e potencializado por Adorno. Palavras-chaves: subjetividade, modernidade, dominação. Abstract This current paper aims to demonstrate the preambles of the research undertaken on Hegel’s concept of modernity, intending to enable an understanding of the nuances, expressions and interactions of the subjectivity aspects in modernity. This discussion gets its point from the perspective discussed by Habermas’ communicative action theory, presented in his Philosophical discourse of modernity (2002), correlating it to Adorno’s social theory – aiming to able an understanding of the modern reason constitution from the Hegelian subjectivity concept. Thus, this research aims to understand the capacity of reflection and critique of human reason in the contemporary world, as discussed by Habermas and Adorno. To do so, although the resumption of Hegelian philosophy demonstrate the necessity to indentify the “problem in modernity”, which aims to dominate but, however, it’s dominated. The main reason is stated in idealism as such individual thinking, also fragmented, which does not correspond to Hegel’s philosophy of the real thinking. So, it’s how the analysis of subjectivity concept demands to indentify the current situation in modernity, it’s characterized by centralizing its experience in the knowledge subject, abstracting it from all the possible objects around: it turns the knowledge subject as the only one object – it’s possible it culminates in the transmutation of subjectivity into objectivity. One possible way that appears to break that situation dates back to the dialectical process, which on is enhanced by Hegel and potentiated by Adorno. Key-words: subjectivity, modernity, domination. 1
  • 2. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 INTRODUÇÃO O presente relatório final tem o objetivo de apresentar a investigação empreendida que se propôs a examinar as particularidades da capacidade reflexiva e crítica da razão humana na contemporaneidade, assim como possibilitar um entendimento acerca da crise experienciada na modernidade, caracterizada por uma “racionalidade instrumental” (HORKHEIMER, 1976) que procura conhecer para dominar, mas que é incapaz de viabilizar a emancipação humana. Este estudo parte da discussão proposta por Habermas, em O discurso filosófico da modernidade (2002), recorrendo ao conceito de modernidade em Hegel, assim como a uma análise da dialética contida na teoria social adorniana a fim de compreender tal problemática. Assim, considerando que “a disputa entre as teorias sociais de Adorno e Habermas constitui uma excelente oportunidade para apreender a perspectiva dialética na teoria crítica da sociedade” (MAAR, 2002), pois “a controvérsia entre ambos é sobre a dialética” (ibidem), o presente artigo faz menção aos estudos empreendidos sobre a investigação que tenciona compreender as particularidades da argumentação desenvolvida por Habermas, bem como a discussão ulterior promovida sobre a validade da teoria da ação comunicativa habermasiana frente à concepção da teoria social adorniana. A questão que permeia o presente trabalho se refere à “subjetividade subjugadora e, ao mesmo tempo, [que é] subjugada, como vontade de dominação industrial” (HABERMAS, 2002, p. 7-8), que, no entanto, se caracteriza por ser “uma subjetividade limitada” (HABERMAS, 2002, p. 62). A fim de possibilitar uma compreensão desta problemática, optou-se por retomar a filosofia hegeliana, pois, como Habermas afirma: Antes de tudo, Hegel descobre o princípio dos novos tempos: a subjetividade. Valendo-se desse princípio explica simultaneamente a superioridade do mundo moderno e sua tendência à crise: ele faz a experiência de si mesmo como o mundo do progresso e ao mesmo tempo de espírito alienado. Por isso, a primeira tentativa de levar a modernidade ao nível do conceito é originalmente uma crítica da modernidade (HABERMAS, 2002, p. 25). Na apresentação da edição brasileira da Fenomenologia do Espírito, Vaz esclarece que: [...] o que Hegel pretende mostrar aqui [Fenomenologia do Espírito] é que, na experiência do saber de um objeto que lhe é exterior, a consciência se suprime como simples consciência de um objeto, passa para a consciência-de-si como para a sua verdade mais profunda: a verdade da certeza de si mesmo (VAZ, 2007, p. 18), 2
  • 3. Universidade Presbiteriana Mackenzie Tal postulação corrobora a análise empreendida por Habermas e, deste modo, parece ser impraticável não considerar a relevância de seu questionamento, mais ainda quando este suscita que: Coloca-se então a questão de saber se o princípio da subjetividade e a estrutura de consciência de si que lhe é imanente são suficientes como fonte de orientações normativas, se bastam para “fundar” não apenas a ciência, a moral e a arte, de um modo geral, mas ainda estabilizar uma formação histórica que se desligou de todos os compromissos históricos. Agora a questão é saber se da subjetividade e da consciência de si podem obter-se critérios próprios ao mundo moderno e que, ao mesmo tempo, sirvam para se orientar nele; mas isso significa também que possam ser aptos para a crítica de uma modernidade em conflito consigo mesma. Como é possível construir, partindo do espírito da modernidade, uma forma ideal interna que não se limite a imitar as múltiplas manifestações históricas da modernidade nem lhes seja exterior? (HABERMAS, 2002, p. 30). Hegel insinua que: [...] cada significação se perfaz na outra, e só assim [e que] o conteúdo é um conteúdo espiritual; enquanto a determinidade é também o seu oposto, é consumada a unidade no ser-outro: o espiritual. Foi assim que antes se unificaram para nós ou em si as significações opostas, e se suprasumiram [até] mesmo as formas abstratas do mesmo e do não-mesmo; da identidade e da não-identidade (HEGEL, 2007, p. 524, grifos do próprio autor). É por isso que Habermas acusa Hegel de “executar esse programa” que “se enreda em um dilema” (HABERMAS, 2002, p. 32), pois, “uma vez efetuada a dialética do esclarecimento, o impulso para a crítica do tempo presente se esgotará, impulso que, entretanto, a colocou em movimento” (ibidem)1. É importante compreender que Habermas identifica, na filosofia hegeliana, uma análise mais completa do conceito de modernidade – sobrepondo-a a teoria da modernidade esboçada por Kant em suas três críticas2. De acordo com Habermas, foi Hegel quem impulsionou “a teoria da modernidade, que estava apenas delineada no conceito kantiano de razão, e a desenvolve em uma crítica das divisões de uma modernidade em conflito consigo própria” 1 Todavia, esta é uma questão que demandaria mais “espaço”; deste modo, opta-se por centrar a discussão contida neste relatório final à problemática da subjetividade existente na modernidade – considerando a filosofia hegeliana, a análise empreendida por Habermas, bem como a teoria social adorniana –, a qual se encontra em conformidade com aquilo que foi elaborado no projeto de pesquisa. 2 De acordo com Bannwart Junior: “A preocupação de Habermas [...] é saber se a teoria da modernidade assim delineada pela filosofia kantiana ‘deve realmente ficar de pé ou vir abaixo com as exigências fundacionistas da teoria do conhecimento’” (BANNWAR JUNIOR, 2005). Assim, Habermas procura manter de Kant tão-somente o delineamento da teoria da modernidade pautada numa razão complexa (procedural e formal). Ainda segundo Bannwart Junior, Habermas procede deste modo “porém desfazendo-se de um modelo de filosofia fundacionista em moldes da teoria do conhecimento de forma que lhe seja facultado abrir mão dos papéis de indicador de lugar e de juiz sem que a filosofia perca a sua estatura de guardiã da racionalidade” (ibidem). 3
  • 4. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 (HABERMAS, 1989, p. 21). Sendo assim, a importância de Hegel para Habermas refere-se ao encaminhamento que Hegel transpõe para uma nova perspectiva de atuação da filosofia, visto que para Hegel o conceito de filosofia somente será apreendido concomitantemente com o conceito de modernidade3. Este o motivo da retomada da filosofia hegeliana para a compreensão da análise habermasiana, considerando que a crítica de Habermas dirige-se às formas que constituem a racionalidade moderna. Portanto, ao retomar a filosofia hegeliana é possível vislumbrar o racionalismo como o princípio básico da sociedade ocidental moderna, pois “trata-se aqui de descobrir as artimanhas de uma subjetividade limitada, que se fecha a um discernimento melhor e objetivamente disponível há muito tempo” (HABERMAS, 2002, p. 62). Considerando o alerta de Habermas para o fato de que “em face de uma modernização que se move por si própria e se autonomiza em sua evolução, o observador social tem razões de sobra para se despedir do horizonte conceitual do racionalismo ocidental em que surgiu a modernidade” (HABERMAS, 2002, p. 6), o presente relatório recorre, também, às análises empreendidas por Adorno, a fim de possibilitar uma compreensão acerca do modo como se manifesta a subjetividade na modernidade, pois “a tarefa mais importante [...] da pesquisa social empírica atual seria investigar em que medida afinal os homens são e pensam tal como são feitos pelos mecanismos [da indústria cultural]” (ADORNO, 2007, p. 256). REFERENCIAL TEÓRICO Hegel afirma que “o único pensamento que consigo traz é o simples pensamento da razão, de que a razão governa o mundo, de que portanto também a história universal transcorreu de um modo racional” (HEGEL, 1995, p. 31). De acordo com a leitura de Hyppolite: Apreender as transformações do espírito do mundo, adaptar o pensamento ao devir espiritual, tal é em primeiro lugar o objetivo de Hegel; e não é verdade que, na sua época, ele assistia a transformações da mesma ordem? A sua dialéctica, antes de ser lógica, é um esforço do pensamento para apreender o devir histórico e reconciliar o tempo e o conceito (HYPPOLITE, 1995, p. 29). Tal pressuposto condiz com o fato de Hegel enaltecer a importância (e, concomitantemente, a força) da razão – tema tão discutido por Habermas e Adorno – ao apresentar a razão como algo que 3 É preciso compreender que a atribuição do conceito de modernidade não é uma definição hegeliana. Tal nomeação é proposta por Habermas em sua leitura sobre o conceito de história de Hegel. Tal noção refere-se ao fato de que “o conceito de modernização refere-se a um conjunto de processos cumulativos e de reforço mútuo” (HABERMAS, 2002, p. 5) 4
  • 5. Universidade Presbiteriana Mackenzie [...] não precisa, como a acção finita, das condições de um material externo, de meios dados, dos quais recebe o sustento e os objectos da sua actividade; alimenta- se de si mesma e é para si própria um material que ela elabora. Assim como é somente o seu próprio pressuposto, o seu fim, o fim último absoluto, assim também é ela própria a actuação e a produção, a partir do interior do fenômeno, não só do universo natural, mas também do espiritual – na história universal (HEGEL, 1995, p. 31-32). A modernidade se caracteriza pelo surgimento da subjetividade, ao menos enquanto meio da liberdade e da reflexão; é o princípio da subjetividade que determina as configurações da cultura moderna – por isso Hegel considera como sendo tarefa da filosofia no mundo moderno esta apreensão da idéia que cabe a si própria. Tal necessidade se torna compreensível quando se considera o fato de que Hegel procura “dar razão da sua própria existência mostrando que o ato de filosofar não é um ato gratuito mas é a exigência da transcrição no conceito do tempo histórico daquele mundo de cultura que colocou a razão no centro do seu universo simbólico” (VAZ, 2007, p. 24). Isto procura possibilitar uma existência universal ou, então, uma existência regida pela Razão que – advinda do surgimento de uma subjetividade moderna – para se reconhecer como consciência-de-si precisa cumprir a tarefa de pensar o seu tempo de experiência, o que resultaria segundo Hegel na sociedade se reconhecer como uma civilização da Razão. Vaz sugere tal postura, ao delinear que “o que aparece agora no horizonte do caminho para a ciência são as estruturas da intersubjetividade ou é o próprio mundo humano como lugar privilegiado das experiências mais significativas que assinalam o itinerário da Fenomenologia” (VAZ, 2007, p. 22). Hegel parece recorrer a tal noção de razão para não adentrar na inapreensibilidade do conceito do tempo da experiência. Tal reconhecimento pode ser identificado quando Hegel discorre sobre o fato de que: No conceito que se sabe como conceito, os momentos se apresentam, pois, anteriormente ao todo implementado, cujo vir-a-ser é o movimento desses momentos. Na consciência, ao contrário, é anterior a esses momentos o todo, mas o todo não-conceituado. O tempo é o conceito mesmo, que é-aí, e que se faz presente à consciência como intuição vazia. Por esse motivo, o espírito se manifesta necessariamente no tempo; e manifesta-se no tempo enquanto não apreende seu conceito puro; quer dizer, enquanto não elimina o tempo. O tempo é o puro Si exterior intuído [mas] não compreendido pelo Si: é o conceito apenas intuído. Enquanto compreende a si mesmo, o conceito suprassume sua forma-de-tempo, conceitua o intuir, e é o intuir concebido e conceituante (HEGEL, 2007, p. 538, grifos do próprio autor). 5
  • 6. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 O problema a ser enfrentado com tal postura incorre no fato de que, como Adorno demonstra, “desde que se passou a buscar o fundamento de todo conhecimento na suposta imediatidade daquilo que é dado subjetivamente, procurou-se, de maneira por assim dizer fiel ao ídolo da pura atualidade, expulsar do pensamento a sua dimensão histórica” (ADORNO, 2007, p. 53). E por este motivo, para evitar esta determinação, que é preciso compreender que: A dialética é a consciência consequente da não-identidade. Ela não assume antecipadamente um ponto de vista. O pensamento é impelido até ela a partir de sua própria inevitável insuficiência, de sua culpa pelo que pensa. Se objetarmos à dialética, tal como se fez repetidamente desde os críticos aristotélicos de Hegel, que ela reduz indiscriminadamente tudo o que cai em seu moinho à forma meramente lógica da contradição, deixando de lado a plena multiplicidade do não-contraditório, do simplesmente diverso, então deslocamos a culpa da coisa para o método (ADORNO, 2009, p. 13). As afinidades investigativas da filosofia hegeliana sugerem a aproximação suscitada por Habermas com os questionamentos empreendidos por sua análise, visto que a estrutura fundamental da época de Hegel é caracterizada pela cisão. Repa considera tal possibilidade ao afirmar que: “A par de uma teoria da cisão como princípio de formação da cultura moderna, Hegel é levado a analisar os pressupostos históricos da cisão” (REPA, 2000, p. 122). Tais conflitos são identificáveis quando se compreende o alerta hegeliano de que: Agora parece haver necessidade do contrário: o sentido está tão enraizado no que é terreno, que se faz mister uma força igual para erguê-lo dali. O espírito se mostra tão pobre que parece aspirar, para seu reconforto, ao mísero sentimento do divino em geral – como um viajante no deserto anseia por uma gota d’água. Pela insignificância daquilo com que o espírito se satisfaz, pode-se medir a grandeza do que perdeu (HEGEL, 2007, p. 29). A preocupação de Hegel com o modo como a consciência se porta na modernidade é justificável, pois “em vez de penetrar no conteúdo imanente da coisa, o entendimento lança uma vista geral sobre o todo, e vem pairar sobre um ser-aí singular do qual fala; quer dizer, não o enxerga de modo nenhum” (HEGEL, 2007, p. 58). É deste modo que “a relação interna entre modernidade e racionalidade [...] que hoje é posta em questão” (HABERMAS, 2002, p. 8), encontra urgência, pois, ao que parece, a questão sobre o esclarecimento encontra-se paralisada, visto que “são apenas as suas consequências que continuam em curso” (MAAR, 2000). 6
  • 7. Universidade Presbiteriana Mackenzie É compreensível a preocupação de Hegel quanto à subjetividade centrar-se tão-somente como um princípio de dominação, que recorreria a uma estrutura de auto-relação (sujeito- objeto) – o que, deste modo, impulsionaria o sujeito a se tornar objeto de si mesmo. Assim: Uma dificuldade a evitar é a mistura do modo especulativo e do modo raciocinante quando o que se diz do sujeito, ora tem a significação de seu conceito, ora tem apenas a significação de seu predicado ou acidente. Um procedimento estorva o outro, e só conseguirá plasticidade aquela exposição filosófica que excluir rigorosamente a maneira como habitualmente são relacionadas as partes de uma proposição (HEGEL, 2007, p. 64-65). MÉTODO A análise histórica levada a efeito por Habermas possibilita a investigação do conceito de modernidade. Para tanto, como o próprio Habermas aponta “primeiramente é preciso que o objeto da crítica seja determinado com tal precisão que nele possamos reconhecer a razão centrada no sujeito enquanto princípio de modernidade” (HABERMAS, 2002, p. 147). O presente relatório final se caracteriza por uma investigação qualitativa bibliográfica, que possibilitou uma compreensão e uma discussão das questões que impulsionaram o estudo empreendido, o qual é apresentado neste artigo. Assim, por exemplo, ao analisar a sutileza da argumentação hegeliana, é possível vislumbrar que Hegel procura demonstrar que o agir da subjetividade “bem pode supor que só age para-si, ou por egoísmo; [no entanto] ela é melhor do que imagina: seu agir é ao mesmo tempo um agir universal em si-essente” (HEGEL, 2007, p. 274, grifos do próprio autor). É por isso que: Quando age por egoísmo, não sabe simplesmente o que faz. Quando assegura que todos os homens agem por egoísmo, apenas afirma que todos os homens não possuem nenhuma consciência do que seja o agir. Quando a individualidade age para si, então isso é justamente o surgimento para a efetividade do que era apenas em-si-essente. Portanto, o fim do ser-para-si, que se supõe oposto ao Em-si; suas espertezas vazias e também suas explicações sutis, que sabe detectar o egoísmo em toda a parte, igualmente desvaneceram – como o fim do Em-si e sua retórica (HEGEL, 2007, p. 274-275, grifos do próprio autor). Todavia, de acordo com Habermas, Hegel, ao buscar “implodir” a filosofia da subjetividade nas diferentes formas em que se apresenta ao longo da tradição filosófica (principalmente a alemã, com Kant e Fichte) não parece proceder de modo inteiramente imanente. Habermas sugere que Hegel encontra-se demasiadamente circunscrito ao ideal Iluminista e, por isso, concebe a idéia de um Absoluto – o que justificaria um estatuto de poder de unificação à razão. Mas, mesmo com tal crítica, não deixa de tornar praticável o reconhecimento de que 7
  • 8. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 “Hegel foi o primeiro a tomar como problema filosófico o processo pelo qual a modernidade se desliga das sugestões normativas do passado que lhe são estranhas” (HABERMAS, 2002, p. 24). Vaz corrobora o postulado habermasiano, ao afirmar que: Com a Fenomenologia do Espírito, Hegel pretende situar-se para além dos termos da aporia kantiana, designando-a como momento abstrato de um processo histórico- dialético desencadeado pela própria situação de um sujeito que é fenômeno para si mesmo ou portador de uma ciência que aparece a si mesma no próprio ato em que faz face ao aparecimento de um objeto no horizonte do seu saber. Em outras palavras, Hegel intenta mostrar que a fundamentação absoluta do saber é resultado de uma gênese ou de uma história cujas vicissitudes são assinaladas, no plano da aparição ou do fenômeno ao qual tem acesso o olhar do Filósofo (o para-nós na terminologia hegeliana) pelas oposições sucessivas e dialeticamente articuladas entre a certeza do sujeito e a verdade do objeto (VAZ, 2007, p. 14, grifos do próprio autor). A crítica de Habermas a Hegel refere-se a este pressupor o que deveria mostrar, isto é, a demonstração de uma razão capaz de unificar as oposições. Na visão de Habermas, tal intento se caracteriza como algo condizente às experiências históricas vivenciadas por Hegel e não a argumentos filosóficos. No entanto, apesar da polêmica suscitada por Habermas, este não ignora que: Hegel não é o primeiro filósofo que pertence aos tempos modernos, mas o primeiro para o qual a modernidade se tornou um problema. Em sua teoria, torna-se visível pela primeira vez a constelação conceitual entre modernidade, consciência do tempo e racionalidade. Por fim, o próprio Hegel desfaz essa constelação, visto que a racionalidade dilatada em espírito absoluto neutraliza as condições sob as quais a modernidade toma consciência de si mesma (HABERMAS, 2002, p. 62-63). RESULTADOS E DISCUSSÃO Atualmente, se encontra séria dificuldade para identificar um possível movimento de reversão dos efeitos, ou impactos, gerados pela concepção unidimensional e autoritária da racionalidade moderna. Alguns autores (Lyotard, 1988) argumentam que a transmissão do conhecimento, na era atual, facilitada pelos mecanismos tecnológicos – que propiciam a transmissão de dados de forma “virtual e instantânea” –, não requer mais um sujeito preparado, ou mesmo que tenha o “espírito cultivado” para prover a transmissão e o recebimento destas informações; tal descrição parece sugerir, e, consequentemente, corroborar o fato de que um rompimento com este modelo de racionalidade se encontra 8
  • 9. Universidade Presbiteriana Mackenzie atravancado. É este o alerta já identificável na filosofia hegeliana, pois “para Hegel, o específico da razão é compreender que o elemento não pode viver fora do todo. O entendimento é indispensável para o progresso do conhecimento humano, pois do contrário permaneceríamos numa totalidade vazia” (Oliveira, 2001, p. 10). Isto torna compreensível o problema enfrentado na modernidade, visto que Nos tempos modernos [...] o indivíduo encontra a forma abstrata pronta. O esforço para apreendê-la e fazê-la sua é mais o jorrar-para-fora, não-imediatizado, do interior, e o produzir abreviado do universal, em vez de ser um brotar do universal a partir do concreto e variedade do ser-aí. Por isso o trabalho atualmente não consiste tanto em purificar o indivíduo do modo sensível imediato, e em fazer dele uma substância pensada e pensante; consiste antes no oposto: mediante o suprassumir dos pensamentos determinados e fixos, efetivar e espiritualizar o universal (HEGEL, 2007, p. 45). A necessidade para um empreendimento que tencione compreender tais conflitos circunscreve-se ao fato de que atualmente Os homens se tornaram tão radicalmente alienados uns dos outros e à natureza que a única coisa que ainda sabem é: para que precisam uns dos outros e o que se infligem mutuamente. Cada um é um fato, o sujeito ou o objeto de uma prática qualquer, algo com quem se conta ou não se precisa mais contar (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 208). Para Adorno e Horkheimer, o problema desta “intersubjetividade mutilada” (HABERMAS, 2002, p. 483) reside na crença de [...] que a verdade de uma teoria é a mesma coisa que sua fecundidade [e isso] é um erro. Muitas pessoas parecem, no entanto, admitir o contrário disso. Elas acham que a teoria tem tão pouca necessidade de encontrar aplicação no pensamento, que ela deveria antes dispensá-lo pura e simplesmente. Elas interpretam toda declaração equivocadamente no sentido de uma definitiva profissão de fé, imperativo ou tabu. Elas querem submeter-se à Idéia como se fora um Deus, ou atacá-la como se fora um ídolo. O que lhes falta, em face dela, é a liberdade. Mas é próprio da verdade o fato de que participamos dela enquanto sujeitos ativos. Uma pessoa pode ouvir frases que são em si mesmas verdadeiras, mas só perceberá sua verdade na medida em que está pensando e continua a pensar, ao ouvi-las (ADORNO & HORKHEIMER, 2007, p. 201). 9
  • 10. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 Habermas compreende isto como o fator que transformou4 “os próprios sujeitos” em sistemas individualizados. Isto poderia sugerir, inclusive, que a própria noção de uma estrutura da intersubjetividade inexiste, dado que os indivíduos foram eliminados do seu mundo da vida, pela relação de dominação da razão instrumental, ou, como Luhmann (1998) aponta, o sistema social e o sistema pessoal caracterizam-se (e, consequentemente, se constituem) por serem universos distintos e circundantes um do outro. Habermas entende que “em Hegel [...] não se trataria de recuperar novamente a intuição da totalidade ética no horizonte da auto-relação do sujeito cognoscente e agente” (HABERMAS, 2002, p. 413), pois “um mundo reificado é, por definição, um mundo desumanizado” (ibidem, p. 113). Tal reconhecimento é justificável, porque, antes de tudo, o interesse de Hegel sobre a força da negação reside no poder que este estado possui, o qual permitiria a contradição inerente ao pensamento e à realidade – deste modo, “a negação da realidade é a chave conceitual que permite recusar a positividade esmagadora da sociedade industrial avançada5” (NICHOLSEN & SHAPIRO, 1993, p. 11). A implicação disto se fundamenta no fato de que “a individualidade é determinada e, enquanto tal, não é livre; a sua liberdade surge apenas quando nega em si mesma toda a determinação e acede assim ao universal” (HEGEL, 1995, p. 82), pois só uma razão reconciliadora, que se auto nega, é que pode “eliminar” a positividade da modernidade. Parece ser esta a mesma compreensão obtida por Habermas, quando declara que: Somente uma razão à qual atribuíssemos um poder-chave poderia incluir ou excluir. Por isso o dentro e o fora vinculam-se à dominação e à sujeição – e a superação da razão detentora do poder, ao arrombamento das portas da prisão e à soltura permissível em uma liberdade indeterminada. Desse modo, o outro da razão permanece como a imagem especular da razão detentora do poder. Abnegação e desprendimento permanecem tão acorrentadas à vontade de controlar quanto a revolta do contrapoder, à violência do poder. Dos conceitos da razão, centrada no sujeito e da ilustração marcante de sua topografia não poderá se livrar aquele que quer abandonar, junto com o paradigma da filosofia da consciência, todos os paradigmas em geral e refugiar-se na clareira da pós-modernidade (HABERMAS, 2002, p. 430-431). E qual seria, então, esta chave conceitual, ou o “poder-chave” que permitiria esta ruptura? Uma possível resolução deste entrave pode ser sugerido com a negação da própria dialética, porque: 4 Optou pelo verbo transitivo “transformar” para uma melhor adequação do emprego lingüístico. No entanto, faz-se notar que o sentido deve se assemelhar mais a uma conotação negativa do que positiva, considerando o pensamento habermasiano. Deste modo, a citação de Habermas afirma que “o funcionalismo sistêmico [...] faz os próprios sujeitos se decomporem em sistemas” (HABERMAS, 2002, p. 489). 5 Tradução própria da introdução à edição norte-americana dos Três estudos sobre Hegel (ADORNO, 1993). 10
  • 11. Universidade Presbiteriana Mackenzie [...] a força especulativa capaz de lançar pelos ares o indissolúvel é a força da negação. É somente nela que sobrevive o caráter sistemático. As categorias da crítica ao sistema são ao mesmo tempo aquelas que concebem o particular. O que um dia ultrapassou legitimamente o particular no sistema tem seus sítios fora do sistema. A visão, que interpretando colhe no fenômeno mais do que ele simplesmente é, e, unicamente por meio daí, o que ele é, seculariza a metafísica. Só os fragmentos enquanto forma da filosofia seriam capazes de entregar às mônadas projetadas de maneira ilusória pelo idealismo o que lhes é devido. Elas seriam representações no particular da totalidade irrepresentável enquanto tal (ADORNO, 2009, p. 32). Hegel já havia optado por consagrar as contradições procurando “um trajeto intelectual que as acompanhe no plano de um movimento de exteriorização e sua superação” (MAAR, 2002). Deste modo, o conhecimento dialético deve [...] enquanto co-portador de uma tensão, num certo sentido, ir além de si mesmo. Assim o conceito do que é dado já conteria em si o conceito do ir além de si. Nesses termos a tarefa de uma teoria da dialética seria situar o conceito do que é dado de tal modo que assim preencha esta função dialética (HORKHEIMER, 1976, p. 172) CONCLUSÃO A questão da “subjetividade subjugadora e ao mesmo tempo subjugada” (HABERMAS, 2002, p. 7-8) torna-se compreensível quando se atenta para o fato de que [...] a consciência-de-si não é toda a realidade somente para si, mas também em si: porque se torna essa realidade, ou antes, porque se demonstra como tal. Assim se demonstra através do caminho, no curso do qual o ser-outro, como em si, desvanece para a consciência: primeiro, no movimento dialético do “visar”, do perceber e do entendimento. Demonstra-se depois, no movimento através da independência da consciência, na dominação e escravidão; através do pensamento da liberdade [do estoicismo], da libertação céptica e da luta de libertação absoluta da consciência cindida em si mesma; [movimento em que] o ser-Outro desvanece para a consciência enquanto é somente para ela (HEGEL, 2007, p. 173-174, grifos do próprio autor). A questão é que esta razão, circunscrita sob a égide da subjetividade que se constitui na (e a partir da) modernidade, não consegue se exteriorizar e, deste modo, sequer se reconhecer. Adorno reconhece este problema, quando afirma que: O pensamento identificador, a igualação de todo e qualquer desigual, perpetua-se no medo da sujeição à natureza. A razão irrefletida é obnubilada até a errância em 11
  • 12. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 face de tudo aquilo que se subtrai à sua dominação. Por agora, a razão está padecendo: curar-se de um tal mal é que seria propriamente razão (ADORNO, 2009, p. 149). Deste modo, como seria possível romper com tal situação? Pois “a subjetividade renegada converte-se em objetivismo” (ADORNO, 2009, p. 67). Habermas identifica tal problema no conceito da modernidade, pois foi por meio da reflexão que elevou a época à consciência de si que impossibilitou a busca de “modelos exemplares” em tempos idos. É necessário conceber um outro modo de reconciliação, considerando a realidade singular advinda das relações capitalistas (relação de dominação). Esta nova realidade se caracterizaria por ser, já, “algo ambíguo, que na sua multiplicidade tem ao mesmo tempo em si o ser-outro, em oposição à categoria pura”, pois “elas a contradizem por essa multiplicidade, e a unidade pura deve suprassumir em si tal multiplicidade, constituindo-se desse modo em unidade negativa das diferenças” (HEGEL, 2007, p. 176, grifos do próprio autor). Isso caracteriza o fato de que “uma modernidade sem modelos, aberta ao futuro e ávida por inovações só pode extrair seus critérios de si mesma. Como única fonte do normativo se oferece o princípio da subjetividade, do qual brota a própria consciência de tempo da modernidade” (HABERMAS, 2002, p. 60). É este o conflito vislumbrado por Hegel, pois: A razão [...] parte para conhecer a verdade; para encontrar como conceito o que era uma coisa para o “visar” e o perceber, isto é, para ter na coisidade somente a consciência de si mesma. Por isso a razão tem agora um interesse universal pelo mundo, já que ela é a certeza de ter no mundo a presença, ou seja, a certeza de que a presença é racional. Procura a razão seu Outro, sabendo que não possuirá nada de Outro a não ser ela mesma; busca apenas sua própria infinitude (HEGEL, 2007, p. 179, grifos do próprio autor). Tal pressuposto é o que caracteriza a consciência da modernidade, pois é “essa unidade negativa do pensar [que] é para si mesma, ou melhor, é o ser-para-si-mesmo, o princípio da individualidade; e é, em sua realidade consciência operante” (HEGEL, 2007, p. 218, grifos do próprio autor). É compreensível que inserida na perspectiva da subjetividade, a modernidade tem estruturada as suas peculiaridades características. A valorização do sujeito cognoscente, que incita o desenvolvimento da ciência e da produção tecnológica, corrobora a estrutura do projeto moderno com aspirações de liberdade e de emancipação. No entanto, é necessário apontar os aspectos falhos deste desenvolvimento, quanto ao que se refere à insuficiência da razão em se manter como poder unificador, em vista das cisões da modernidade, visto que “o preço que os homens pagam pelo aumento de seu poder é a alienação daquilo sobre 12
  • 13. Universidade Presbiteriana Mackenzie o que exercem o poder” (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 21). A fim de identificar tais questões, a investigação empreendida procurou confluir o pensamento hegeliano, a partir da análise estruturada por Habermas; os caminhos tomados para atender à proposta deste trabalho partiram do conceito de modernidade elaborado por Habermas – a fim de compreender a ênfase habermasiana de que a modernidade se caracteriza por um processo de racionalização que conduz à desintegração do universo social tradicional. Tal análise, “se dirige contra uma razão fundada no princípio da subjetividade”, onde “seu teor assinala que essa razão só denuncia e mina todas as formas abertas de opressão e exploração, de degradação e alienação, para implantar em seu lugar a dominação inatacável de sua racionalidade” (HABERMAS, 2002, p. 80). Deste modo, o problema identificado se refere ao fato de que “quanto mais criticamente se compreende a autonomia da subjetividade, quanto mais ela se torna consciente de si enquanto algo por sua parte mediatizado, tanto mais imperativa se torna a obrigação do pensamento de confrontar-se com aquilo que lhe proporciona a firmeza que não possui em si mesmo (ADORNO, 2009, p. 41), pois: Essa primeira razão, que se conhece no objeto, encontra expressão no idealismo vazio que só apreende a razão como inicialmente é – e por indicar em todo o ser esse Meu puro da consciência, e enunciar as coisas como sensações ou representações, acredita ter mostrado esse Meu puro como realidade acabada. [Tal idealismo] tem de ser ao mesmo tempo um empirismo absoluto, porque para o enchimento desse Meu vazio, quer dizer, para a diferença e para a totalidade do desenvolvimento e da configuração dessa diferença, sua razão necessita de um “choque estranho” no qual só se encontra a multiplicidade do sentir e do representar (HEGEL, 2007, p. 177-178, grifos do próprio autor). Hegel reconhece, como sugere Habermas, que a possibilidade de uma unificação diferente dessa que acaba por gerar mais positividade, é legítima de ser pensada em razão das experiências de crise. A veracidade desta necessidade encontra respaldo no fato de que: O percebedor não se encontra mais presente no processo da percepção. Ele não mobiliza mais a passividade ativa do conhecimento, na qual os elementos categoriais se deixam modelar da maneira adequada pelo “dado” convencionalmente pré-formado, e este por aqueles, de tal modo que se faça justiça ao objeto percebido. No campo das ciências sociais bem como no da experiência individual, a intuição cega e os conceitos vazios são reunidos de maneira rígida e sem mediação. Na era do vocabulário básico de trezentas palavras, a capacidade de julgar e, com ela, a distinção do verdadeiro e do falso estão desaparecendo (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 166). 13
  • 14. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 A identidade deve, deste modo, ser pensada como negação de todas as absolutizações, em crítica permanente às positividades (HABERMAS, 2002), contrariamente à subjetividade subjugadora. Hegel pensa ser possível superar a oposição existente recorrendo a um sujeito que tem consciência de si e de sua substância, que tem em si a unidade e a diferença do finito e infinito – é por isso que o absoluto não é sujeito nem substância, mas o processo mediador que se produz independente das condições vigentes. Para que se torne possível, é preciso considerar que: Quando a consciência carente-de-pensamento proclama o observar e o experimentar como a fonte da verdade, suas palavras bem que poderiam soar como se apenas se tratasse do saborear, cheirar, tocar, ouvir e ver. Porém essa consciência, no afã com que recomenda o gostar, o cheirar, etc., esquece de dizer que também o objeto desse sentir já está de fato determinado para ela, essencialmente; e que, para ela, essa determinação do objeto vale pelo menos tanto como esse sentir. Tem de admitir igualmente que, em geral, não se trata só do perceber, assim, para dar um exemplo, a percepção de que este canivete está posto aqui ao lado da tabaqueira não tem valor de observação. O percebido deve ter pelo menos a significação de um universal, e não de um isto sensível (HEGEL, 2007, p. 181, grifos do próprio autor). É importante notar que a modernidade se constitui mediante a rubrica de unilateralizações que não necessitam da filosofia para sua fundamentação (ARAGÃO, 1992). É por isso que “a questão [hoje] é que o esclarecimento tem que tomar consciência de si mesmo, se os homens não devem ser completamente traídos. Não se trata da conservação do passado, mas de resgatar a esperança passada” (ADORNO & HORKHEIMER, 2006, p. 14). REFERÊNCIAS ADORNO, T. W. Dialética negativa. Rio de Janeiro: Zahar, 2009. ADORNO, T. W. Hegel three studies. Cambridge: The MIT Press, 1993. ADORNO, T. W. Introdução à sociologia. São Paulo: Editora UNESP, 2007. ADORNO, T. W. & HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 2006. ARAGÃO, L. M. C. Razão comunicativa e teoria social crítica em Jürgen Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1992. 14
  • 15. Universidade Presbiteriana Mackenzie BANNWART JUNIOR, C. J. Modernidade e o novo lugar da filosofia: A idéia de reconstrução em Habermas. In: Mediações – Revista de Ciências Sociais, Londrina, v. 10, n. 1, p. p. 185- 200, jan.-jun. 2005. HABERMAS, J. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989. HABERMAS, J. O discurso filosófico da modernidade. São Paulo: Martins Fontes, 2002. HABERMAS, J. Theodor W. Adorno: Pré-história da subjetividade e auto-afirmação selvagem. In: FREITAG, B. & ROUANET, S. (orgs.). Habermas. São Paulo: Ática, 1990, p. 139-150. HEGEL, G. W. F. A razão na história. Lisboa: Edições 70, 1995. HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do espírito. Petrópolis: Vozes, 2007. HORKHEIMER, M. Eclipse da razão. Rio de Janeiro: Labor, 1976. HYPPOLITE, J. Introdução à filosofia da história de Hegel. Lisboa: Edições 70, 1995. LYOTARD, J. F. O pós-moderno. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988. LUHMANN, N. Observations on modernity. Stanford: Stanford University Press, 1998. MAAR, W. L. A perspectiva dialética em Adorno e a controvérsia com Habermas. In: Trans/Form/Ação, Marília, v. 25, n. 1, 2002. MAAR, W. L. O primeiro Habermas: “Trabalho e Interação” na evolução emancipatória da humanidade. In: Trans/Form/Ação, São Paulo, v. 23, n. 1, 2000. NICHOLSEN, S. W. & SHAPIRO, J. J. Introduction. In: ADORNO, T. W. Hegel three studies. Cambridge: The MIT Press, 1993, p. 9-34. OLIVEIRA, M. A. A filosofia na crise da modernidade. São Paulo: Edições Loyola, 2001. REPA, L. Habermas e a reconstrução do conceito hegeliano de modernidade. São Paulo. Dissertação de mestrado/USP, 2000 (in mimeo). VAZ, H. C. L. A significação da Fenomenologia do Espírito (Apresentação à 4ª edição brasileira). In: HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do Espírito. Petrópolis: Editora Vozes, 2007, p. 9-20. Contato: thez1492@hotmail.com e roger.campato@mackenzie.br 15