Este documento apresenta uma análise histórico-filosófica dos sete pecados capitais. O autor discute a origem dos sete pecados capitais na tradição cristã e grega, e como eles foram definidos ao longo dos séculos. Ele também aborda as sete virtudes capitais que se contrapõem aos pecados, e analisa cada pecado capital ilustrando-os com exemplos históricos e obras de arte.
6. “Minha gratidão à Divindade, aos familiares
ram para a elaboração deste livro, à minha querida esposa Soraya Aguiar, pela existência tão doce,
e à Bia, pelos maravilhosos momentos de alegria
proporcionados e por sempre me lembrar que não
importa necessariamente o que as pessoas e coisas
são, mas o que elas nos fazem ser e sentir. Dedico a
todos que se interessem pelo tema.”
José Anastácio de Sousa Aguiar
7.
8. Nota à Segunda Edição
Prefácio
Apresentação
Comprar, Rezar, Viver e Morrer
............21
Os 7 Pecados Capitais – gênese..........................................
...................
....................................
................................................................
...................42
......47
As 7 Virtudes Capitais.........................................................52
........................60
............................................................................65
.......67
..............................
.............................77
............................................
Narciso e a Vaidade ...........................................................88
........................92
...................................
A Inveja e o Cão .................................................................97
Caim e Saul ........................................................................99
Pitágoras, o teorema e a Inveja .........................................
...............107
.....................................111
...................................................................
A Ira de Deus ...................................................................115
9. ...........................................118
A Paciência como contraponto à Ira .................................120
............................123
............................................................125
A Preguiça e os outros pecados capitais ...........................126
....................................
A Diligência como contraponto à Preguiça ......................
......................
A Avareza e o sapo...........................................................
A Avareza, o dinheiro e a sociedade moderna..................140
........................142
A Generosidade como contraponto à Avareza..................145
.............................
A Gula e o porco ..............................................................149
A Gula e o prazer .............................................................152
.............................154
.........................157
...........................
...........................................................161
...............................................164
.........................167
.........................171
...................................................
............177
Maiêutica Socrática e o 8º Pecado Capital .......................181
Como odiar e como amar .................................................186
A Moral comum e os grandes Mestres ..............................188
................................................................19
10. Certamente esta nota à segunda edição bem que poderia
chamar-se de nota de agradecimento, porque é disso que se
trata. Pouco mais de quatro meses após o lançamento desta
obra que ocorreu em 11 de maio de 2012, a primeira edição
está praticamente esgotada e as livrarias nas quais deixei os
exemplares já solicitam mais livros.
Pois bem, aproveitei para revisar e ampliar o livro, mas
gostaria de lançar mão da oportunidade de reimprimi-lo fazendo justos agradecimentos.
Primeiramente, à Divindade, pelo dom de ainda estar
aqui e poder contribuir com o aprofundamento do estudo das
questões ligadas ao comportamento humano e propiciar, a
quem se interesse pelo tema, mais um meio de buscar a autocompreensão, facilitando, quem sabe, um melhor entendimento das quatro grandes questões do ser humano: de onde
É dever de justiça lembrar do sempre amigo Eliseu de
Oliveira Machado, que prontamente aceitou o convite para
escrever o prefácio e carinhosamente nos proporcionou o seu
belo texto. Agradeço também à amiga escritora e incentivadoA seguir seguem pessoas que conheci desde o lançamento do livro, as quais agradeço pelo incentivo e carinho:
11.
12. Atire a primeira pedra aquele que nunca se viu avaliando a própria conduta, ou a de outrem, à luz do que poderia
ser considerado pecado.
Decididamente, o tema pecado está de tal forma impregpensar e agir há muito transcendeu as fronteiras da religião,
econômicas.
Nesta obra, José Anastácio de Sousa Aguiar aborda os
sete pecados capitais, “ditos como fundamentais, os quais
se encontrariam no centro da natureza humana e dos quais
se originariam todos os outros pecados”, a partir de profuntempo, consegue emprestar ao texto uma leveza e uma clareza que conquistam o leitor, despertando ou aguçando a in-
bem como seus respectivos contrapontos, estão reunidas e
-
pecado equiparável ou talvez até pior que estes.
tivismo cultural na apreciação de tema tão abrangente e, ao
13. mesmo tempo, tão sujeito a interpretações. Neste tom, provoA abordagem clara de nuanças variadas permite a quem lê a
ampliação da visão do tema, observando desde a atualidade
antiguidade de algumas práticas de culturas
Sem ceder às tentações das respostas prontas, o autor
des nomes que fundaram as bases da cultura ocidental, apresentando um amplo espectro de compreensões. Sem restringir
o espaço para que o leitor costure a sua própria linha de pensamento, convida-o a percorrer caminhos como os sugeridos
por Sócrates: “Conhece-te a ti mesmo”; e Jesus: “Ama o teu
próximo como a ti mesmo”, balizadores fundamentais para
quem deseja estudar sobre Virtude, Saber, Verdade, conhecimento de si mesmo e evoluir.
forme reconhece o autor, “não tem a pretensão de esgotar o assun-
Ao ler um texto tão elucidativo quanto agradável, conAgradecendo ao autor a generosidade de compartilhar o fruto
de mais este trabalho, lembro um trecho de um poema de
pode não ser o bastante. Dê o melhor de você assim mesmo.
Nunca foi entre você e os outros”.
Eliseu Oliveira Machado
14. “Na Natureza, não há efeito sem causa; compreende a causa e só terás que fazer a experiência.”
quanto aquela cuja resposta é óbvia.”
Mário Quintana
Poucas são as questões que têm tanta abrangência e re-
No que se refere à questão econômica, o pecado está
presente, ou pelo menos, os pequenos pecados socialmente
aceitos e tolerados. Ora, toda a base da economia de mercafoi cabalmente demonstrado por Adam Smith1, considerado o
moderna. Sua principal obra foi “Investigação sobre a Natureza e as Causas da
co e da prosperidade das nações, quais sejam: não-intervenção do Estado na
dos, dentre outros.
15. pai da economia moderna, que asseverava que a riqueza das
Entretanto, no cômputo geral, haveria a promoção do bem-estar da sociedade.
É pela necessidade de comprar que a máquina capitalista funciona, e, por certo, somos diariamente incentivados a
adquirir muito mais do que necessitamos. Em outras palavras,
coisas que geralmente estão além das necessidades básicas,
vivemos imersos não nos pecados capitais, mas nos pecados
do capital.
Ora, nada mais estimulador da arte de pecar do que a
competição, motor primordial de uma economia de mercado.
nos e grandes pecados são cometidos, em outras palavras, os
-
como necessários, pois uma vez suprimidos, seria desmontado grande parte do atual sistema.
culação com o pecado, até porque a primeira aparição huEva e depois Adão que a humanidade encontra-se afastada
do Jardim do Éden. Até mesmo aqueles que não interpretam a
16. pecado original pode ser vista como a também muito conhecida “Queda dos Anjos”2, que da mesma forma teria afastado
minismo, Jean-Jacques Rousseau , o homem no estado da natureza nasce feliz e deseja apenas aquilo que o rodeia, limitado às suas necessidades básicas. Em sua obra o “Contrato
Social”, ele propõe que o homem, para viver em sociedade
cial”, no qual ele abdica de alguns direitos que teria no estado
da natureza, e recebe em troca a proteção do Estado contra
do pecado de outrem, o homem aceita viver em sociedade.
sico, como, não menos importante, o psicológico. E nada mais
aconselhável para desequilibrar um organismo do que questões
relativas à culpa, ao remorso, a fobias, a traumas, a destempeNesse contexto, a noção individual e coletiva de pecado
2
“A Queda dos Anjos” é uma teoria que de uma forma ou de outra é tratada
da rebeldia inicial dos anjos contra o próprio Deus, que teria dado origem à
Original” de Adão e Eva.
cipais expoentes do Iluminismo. Sua principal obra foi “O Contrato Social”, no
qual defende que o homem no estado da natureza é naturalmente bom e livre,
do. Via a liberdade como valor supremo e a sociedade como uma necessidade.
17. pria realidade vivenciada por cada um de nós. E esta realidade
O ser humano, em um primeiro momento, tende a descobrir
primeiro as coisas que o cercam, para depois constatar a exiscoisas. Em seguida, desperta para si mesmo na busca de entender o seu lugar no todo. Dessa forma, “as coisas aparecem
rioriza-se de tal modo que não se admite que possa ter sentido
um Deus para si mesmo. O homem descobre-se a si mesmo e
em si mesmo encontra – ou talvez perca – Deus e o Mundo.”4
ca se houver uma aceitação da existência da vida após a morte,
qualquer recompensa ou punição no além. Vale lembrar que a
sociedade grega, por exemplo, acreditava que os mortos iriam
pela eternidade vagando independentemente dos seus feitos
sociedade eram aqueles advindos das leis terrenas.
Por certo, algumas perguntas desde já se apresentam
-
-
18. Nesse diapasão, diante de um tema com tamanha rele-
sete pecados capitais.
te obra deve-se ao fato de acreditar que a tentativa de compreensão da ordem e da beleza do universo traz “consigo alguma
forma de participação nessa ordem e beleza”5. Em suma, que
um pouco da grandeza do universo se transmite ao homem
que o estuda.
O livro não tem a pretensão de esgotar o assunto, nem
muito menos responder a todas as perguntas antes descritas,
mas me dou por satisfeito se tiver conseguido fazer as pergunPara realizar a presente obra li vários livros que tem
como tema os sete pecados capitais e pude perceber que existe no mercado uma ampla gama de visão sobre o tema, que
vai desde a abordagem materialista histórica até o fundamentalismo religioso.
Cumpre alertar o leitor que me preocupei em colocar os
vel e evitar conclusões que subvertam o inalienável e sagrado
meu nesse sentido, desde já, peço escusas.
nem muito menos sistematizadora, é muito mais uma coleção de idéias arranjadas de forma que possa provocar
pensamentos.
19. nidade, em especial, aos clássicos.
Com efeito, entendo que, como disse André Comte-Sponville: “só possuimos o que recebemos e transformamos, o que nos tornamos, graças a outros ou contra eles.”6
expressa nas palavras de Wittgenstein: “Eu não gostaria que
as coisas que escrevo poupassem as outras pessoas de pensar.
Ao contrário, gostaria de estimulá-las a pensar pensamentos
que fossem delas mesmas”.7
Quanto à formatação do livro, procurei aliar o texto a
imagens8 que explicassem ou ilustrassem a idéia escrita e para
isso escolhi as obras clássicas. Acredito que a conjugação de
com Rubens Alves: “À medida que envelheço retornam certas
texto. Nas livrarias vou sempre primeiro à seção dos livros de
9
ber da Silva, Eliseu Oliveira Machado, Rita de Cássia Bittencourt, José Joaquim Neto Cisne, Rogério Nogueira Aguiar e
lo: Martins Fontes – 1995, p. 11.
p. 29.
9
Ibid, p. 99.
20. natureza humana e suas inquietações pelas questões que envolvem sua
destacam-se no quadro: o fogo e a escada. O fogo sempre cativou a atenção e a reverência dos humanos, o que o levou a ser introduzido em várias
a razão ou o conhecimento, aquele trazido aos homens por Prometeu.
ascensão humana em busca do divino. Observemos que nem mesmo o
da, como se o caminho a ser percorrido pela humanidade tivesse maior
não tão fácil de perceber no quadro é a semelhança que ele apresenta com
21.
22. Capítulo I
do no museu do Prado. Madri.
Na obra “Os Sete Pecados Capitais”, Jesus Cristo se encontra no centro do
painel, cercado por um largo anel dourado no qual está inscrito em latim:
“Cuidado, cuidado, Deus vê”. A esfera central tem a aparência de um olho
do olho de Deus, que tudo vê. No restante, temos a representação de cada
o inferno e a glória
23.
24. versidade revela as virtudes.”
Diderot
diferente, posto que a origem da tradição de ambos vem de
Chegou à nossa geração, após passar pelo caldeirão cultural dos séculos que nos antecederam, a noção de que as
resultariam toda bondade e maldade.
Para os antigos gregos, a virtude estava intimamente ligada à beleza10, à funcionalidade11, e também à excelência, que
era o que fazia uma pessoa executar bem seu propósito. Neste
contexto, a virtude do ouvido é ouvir bem; a virtude da faca,
-
10 “Podemos inclusive dizer que a beleza é a existência real ou a verdadeira realida-
11
de função, propósitos ou objetivo apropriados. Em geral, uma coisa era dita
boa se desempenhava o papel que lhe cabia, realizava o objetivo que lhe toOp. cit.
25. José Anastácio de Sousa Aguiar
texto da Grécia Antiga, não era necessariamente oposição à
-
24
26. monástico cristão no deserto do Egito, era, originalmente, uma lista
12
capitais é imprecisa, mas muitos acreditam que se deu no século IV, quando o monge Evagrius teria registrado no Egito oito pecados capitais: a gula, a libertinagem, a avareza, a
melancolia, a ira, a letargia espiritual, a vanglória e o orgulho. João Cassiano de Marselha14
levado a relação à Roma onde esta recebeu sua formulação
gura alada retira o véu da Virtude,
lha mulher, representando a fraude.
Atualmente a pintura encontra-se no
The National Gallery
12 GUINESS – Sete pecados capitais: navegando através do caos em uma época
de confusão moral – São Paulo: Shedd Publicações – 2006, p. 24.
quatorze anos de sua vida em Kellia, comunidade monástica localizada no deserto
de Nitria no Egito, onde dedicou-se primordialmente aos seus escritos. Em que pese a
das almas humanas e certos ensinamentos sobre a natureza de Deus e de Cristo.
14
dor dos trabalhos do mestre, tendo criado em Marselha um mosteiro nos moldes dos
um dos criadores da teoria do semipelagianismo, que defendia que o ser humano é
salvo pela graça de Deus, mas a salvação só se daria se houvesse a iniciativa da boa
25
27. José Anastácio de Sousa Aguiar
clássica que hoje conhecemos pelo papa Gregório Magno15,
no século VI.
“São Gregório Magno e os
pelo pintor italiano Giovanni Francesco Barbieri
como Guercino. Atualmente a obra encontra-se
no The National Gallery
A partir de então e especialmente pelo fato de que o
referido papa ter sido um grande incentivador das missões de
conversão pelo mundo afora, os sete pecados capitais não
compreendidos como perigos morais da alma em meio à vida
doutrinação da Igreja nas épocas que se seguiram.
15
conversão e de ter dado origem aos cantos gregorianos.
26
28. Duas obras tiveram o condão de impulsionar e popularizar a noção dos 7 pecados capitais: “Os Contos de Canter-
Na primeira obra, o autor descreve a trajetória de 29 viade Canterbury a partir de Southwark, nas proximidades de
dos para que contassem histórias aos demais: relatos de amor,
Inglaterra do século XIV. O autor sugere que os sete pecados
capitais estariam entrelaçados e seriam o tronco da árvore de
Mural dos Contos de Canterbury pintado por Ezra August Winter na Biblioteca do Congresso Americano, Washington, D.C.
“A Divina Comédia” é um poema narrativo rigorosamente simétrico, que narra uma odisséia pelo Inferno, Puretapa da viagem. Dante, o personagem principal da estória, é
e no céu por Beatriz, musa em várias de suas obras.
27
29. José Anastácio de Sousa Aguiar
A lista dos sete pecados capitais, por certo, não abrange
todos os pecados que podemos enumerar, mas ela apresenta os pecados capitais, ditos como fundamentais, os quais se
encontrariam no centro da natureza humana e dos quais se
originariam todos os outros pecados.
Vale a lembrança de que a perspectiva cristã considera o
impulso do amor como estando exatamente no centro de todas
sário ter em conta que todo pecado se fundamenta em algum
desejo natutral, e o homem, ao seguir qualquer desejo natural,
28
30. tende à semelhança divina, pois todo bem naturalmente desejado possui uma certa semelhança com a bondade divina”.16
mar que há um acordo comum sobre as categorias gerais dos
“A Divina Comédia de Dante”, de Dome1465 localizada no domo da igreja de Santa Maria Del Fiore – Catedral de Florença
– Itália. Dante com sua obra “A Divina Copurgatório, inferno e dos pecados capitais.
sete pecados capitais, que são: soberba, inveja, ira, preguiça,
de Aquino: “precisamente isto é o que constitui o caráter de
capital, pois a cabeça tem o poder de governar aquilo que está
Cabe-lhe também o caráter de mãe, pois mãe é aquela que
17
-
são, obviamente, pecados da carne e, portanto, “quentes”.
16
-
17 Ibid., p. 86.
29
31. José Anastácio de Sousa Aguiar
dispõe para a gente é no meio da travessia.”
Guimarães Rosa – Grande Sertão: veredas
No que se refere à cristandade, a idéia de pecado, em especial o pecado original, está intimamente ligada aos conceitos de salvação e fé18. A aceitação da necessidade de salvação
passa pelo pressuposto lógico do cometimento de pecado. E a
solução que historicamente nos é oferecida é a redenção, ou
melhor dizendo, a fé na redenção.
e na necessidade de salvar-se, posto que em não se conside-
esperar qualquer recompensa ou punição no além.
que pese, hodiernamente não haver grandes contendas sobre
o tema, no passado esta questão suscitou debates acalorados.
18 Em que pese o tema fé não ser objeto do presente livro, trago ao leitor interessante
bino espanhol do século XII. Seus escritos cobrem uma vasta área da teologia e da
ser totalmente desinteressada, ou seja, não esperar nenhuma recompensa e, acrescentemos nenhum castigo por suas ações; o Deus maimonidiano não é um bichopor si sós, sua recompensa. Maimônides percebeu muito bem que essa sublime
modelo basilar seria o patriarca Abraão. Assim, ele admitia como aceitável para o
32. Na Igreja cristã primitiva discutiu-se sobre o tópico e
duas correntes de pensamento se enfrentaram: o monergismo
e o sinergismo.
O monergismo asseverava que o homem não tinha qualquer participação em sua salvação, sendo salvo ou condenado exclusivamente pela decisão soberana de Deus.
o responsável pela salvação, mas o homem tinha algum grau
de participação.19
: “Nos séculos IV e V da Era Cristã, dois teólogos, Agostinho, o africano, e
lento duelo mental sobre o como da redenção: Pelágio defen20
redenção pelo poder da graça divina; Deus salva o homem,
o homem só se pode perder por si mesmo, mas não se pode
salvar por si mesmo.”21
da Igreja e todas as outras teorias foram rechaçadas e conde-
19 Alguns pensadores cristãos de diversas épocas desenvolveram diferentes formas de sinergismo, como o pelagianismo, que nega a existência do pecado
original, e em assim sendo pelas boas obras o homem poderia salvar-se, e o
vação, ao se predispor para tal.
20
como o precursor brasileiro do espiritualismo universalista. Escreveu cerca de
to que propõe a unidade da ciência e religião e a universalidade do homem e
as forças da natureza.
21
Pai-nosso – São Paulo – Editora Martin Claret – 5ª Edição – 2011, p. 19.
33. José Anastácio de Sousa Aguiar
Cumpre destacar que segundo Averróis 22 as posturas
da Igreja oficial – qualquer que seja ela – eram meios para
atingimento de determinado fim, posto que o ilustre filósofo cordobês afirmava que “as crenças populares, como
a antropomorfização de Deus e dos anjos, as representagia de todas as religiões, são meios práticos necessários
para levar o homem comum à prática da virtude”.
Após a exposição desses conceitos teóricos, passo a
apresentar uma pequena resenha de como duas das mais analma no post-mortem e a salvação.
22
e interpretações às obras de Aristóteles. Em suas obras procura harmonizar
razão e fé. Concebe o universo como uma totalidade, sempre em movimento
e transformação, na qual todos os seres formam uma escala de graus de potencialidade e atualidade, desde o ato puro - Deus, que é o motor necessário, pois
matéria prima. Em razão das suas idéias, Averróis foi acusado e condenado por
34. “Vivestes como se fôsseis viver para sempre, nunca vos ocorreu que sois frágeis,
não notais quanto tempo já passou; vós
o perdeis, como se ele fosse farto e abundante, ao passo que aquele mesmo dia
que é dado ao serviço de outro homem
tais, vos aterrorizais de tudo, mas desejais tudo como se fôsseis imortais. Ouvirá
refugiarei no ócio, aos sessenta estarei li-
envergonhas de reservar para ti apenas
as sobras da vida e destinar à meditação
somente a idade que já não serve mais
quando já é hora de deixar de fazê-lo.
Que negligência tão louca a dos mortais,
deste ponto, ao qual poucos chegaram,
querer começar a viver!”
Sêneca
O conceito de vida após a morte era algo plenamente aceito pela sociedade do Antigo Egito, e em razão disso grande era a
35. José Anastácio de Sousa Aguiar
Inicialmente entendia-se que somente os faraós tinham o
privilégio de ter uma vida após a morte, entretanto houve com
o passar dos anos uma democratização da idéia, e tanto nobres
como plebeus podiam desfrutar da existência celeste, desde
Entretanto, para garantir a vida eterna não bastava ao
recém ingresso no post-mortem ter meios para arcar com as
Os rituais realizados no citado tribunal estão descritos
gamento era a descoberta da verdade e a realização da justiça, em outras palavras, não valeriam as riquezas, nem a posição social do falecido em vida, mas apenas seus atos seriam
levados em conta.
do Antigo Egito foi a primeira na história da humanidade
a crer que a sorte dos mortos dependia do valor da sua
mágicas, orações e hinos do Antigo Egito, escri-
ajudar o morto na sua viagem pelo mundo subpoderia encontrar na viagem para o Além. Emse teológica, constitui uma das principais fontes
36. lembro que a sociedade grega, cerca de mais de mil anos
depois, acreditava que os mortos iriam para o mundo ine lá vagariam pela eternidade independentemente do que
realizassem em suas vidas terrenas, posto que o Olimpo era
morada exclusiva dos deuses.
Basicamente, o julgamento no tribunal presidido por
sistia em pesar o coração do morto em uma balança cujo
37. José Anastácio de Sousa Aguiar
ao julgamento. Diante desse tribunal é que o candidato à eternida-
para com os deuses, para com sua própria pessoa e o bem alheio.
lugar no reino do além. Caso contrário, o morto estaria cheio de
da ao post-mortem. Sua pele verde
simboliza o renascimento.
cabeça de falcão e os olhos representando o sol e a lua.
sabedoria, à escrita, à aprendizagem,
à magia e à medição do tempo.
ção e à vida após a morte.
38. “E conhecereis a Verdade, e a Verdade vos
libertará.”
Em que pese a quantidade de documentos oriundos da
tradição cristã sobre o tema vida após a morte ser superior aos
talvez justamente por isso – não é fácil encontrar uma postura
res e em consequência possuem doutrinas e orientações peculiares
para seus seguidores. O fato de Jesus, o Cristo, ter predominantemente ensinado por meio de parábolas, torna mais nebuloso ainda
“E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os
santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória;
E todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará
uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas;
E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda.
“O Sermão da Montanha”, óleo de
39. José Anastácio de Sousa Aguiar
Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde,
preparado desde a fundação do mundo;
Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e
destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me;
Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive
na prisão, e fostes ver-me.
Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quan-
E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo
Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda:
Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado
para o diabo e seus anjos;
Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede,
e não me destes de beber;
Sendo estrangeiro, não me recolhestes; estando nu, não
me vestistes; e enfermo, e na prisão, não me visitastes.
Então eles também lhe responderão, dizendo: Senhor,
quando te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou
Então lhes responderá, dizendo: Em verdade vos digo
40. E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a
vida eterna.”
Vaticano, Roma.
41. José Anastácio de Sousa Aguiar
mento após a morte, bem como da vida eterna, segundo a
tradição cristã, implicará em adentrar em assuntos da fé, que,
por certo, não é escopo deste livro.
domo da capela de São Brizio em Orvieto, Itália. A capela é também conhecida como Capella della Madonna di San Brizio.
São Pedro recebe as chaves dos céus em Mateus 16:19: “E
eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o que ligares
na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra
será desligado nos céus.” A cultura popular tem interpretado a
referida passagem como São Pedro sendo o responsável pela
40
43. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Num universo tão complexo, no seio de um
organismo de forças regido por uma lei tão sápodes acreditar que teu destino esteja abandoPietro Ubaldi
É imperioso que se entenda qual é a origem da palavra
pecado. Em verdade, esse termo “é a tradução do latim peccattum
hamartia
sua vez é a transcrição do hebraico hatta’t, que se deveria
24
Nesse contexto, pecar é não atingir o objetivo desejado,
nho que levaria ao alvo.
A orientação religiosa sobre o pecado no Ocidente
que houve a sistematização do assunto, ele assim asseverava: “O pecado é toda
ação, palavra ou cobiça contra a lei eterna”. “O pecador se
25
24
25
Considerado como um dos mais brilhantes escritores e pregadores da cristandade,
ele entende que Deus não é o autor do mal, pois Deus sendo tão bom não poderia
o cristianismo ocidental concorda com o “Pecado original”, existindo Deus fora do
42
44. desvia então de Deus e se converte à criatura” e apontava ser
o arrependimento o caminho inverso.
26
acrescentando os erros por omissão, pois “é sempre para jun-
imprime na natureza de quem o possui uma má disposição, enmoção, que torna pior o ser e a operação de quem a possui”.27
pintura na Capela Sistina, Roma
26
Gentios” que sintetizaram o entendimento cristão até a época. Entendia que
toda a criação é boa, tudo o que existe é bom, por participar do ser de Deus e
a essência do mal é a privação ou ausência do bem.
27
de Federal Fluminense, p. 18.
45. José Anastácio de Sousa Aguiar
te Rafael, pintor italiano
O pecado original, ou seja, a desobediência primeira de Adão e
Eva às determinações divinas de não colher o fruto da árvore do bem
do pecado por excelência. Ambos entendiam que todos os pecados
seriam derivados do pecado original e o mesmo tinha uma dimensão
a uma ordem do próprio Criador, em pessoa, que lhes havia coberto
de favores, acarretando para eles e seus descendentes o sofrimento,
44
46. não tivesse havido a Redenção, proporcionada por Jesus Cristo, graças a qual os eleitos escapariam dos tormentos eternos.
Convém lembrar que na Idade Média toda a vida e visão
ção do espaço, a hierarquização dos sistemas de valores, giravam em torno da presença do pecado. A esta cultura do pecado pode-se associar um complexo de práticas penitenciais,
que conheceu seu auge nos século XII a XIV.
Essa ênfase no pecado foi bastante importante para o progresso do sentido da responsabilidade individual, posto que proporcionou, a duras penas, um desacordo consigo mesmo, que levou as
gerações seguintes para o despertar da consciência. Desenvolveu
também uma espécie de moral da intenção, gerando uma tensão
criadora, proporcionando ao homem cristão, submisso à culpabilização intensiva, ser levado a se aprofundar e descobrir a sua
verdadeira identidade, retornando mais uma vez à máxima escrita
no portal do oráculo de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo.”
lução do reino de Deus no homem, e não a ausência do reino, como
entendia a sinagoga de Israel e como entendem ainda hoje certos teólogos cristãos. Deus e seu reino nunca estão nem podem estar ausen28
pecado-sofrimento: “O erro na zona espiritual se chama pecado, o erro na zona material se chama sofrimento. Sendo
29
Op. cit., p. 44.
29 Ibid., p. 126.
45
47. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Eu não posso ensinar nada a ninguém, só
posso fazê-lo pensar.”
Sócrates
É imperioso destacar que o conceito de pecado varia
de geração para geração, seja de forma consciente ou não,
“os vitorianos, por exemplo, viam a preguiça e a libertinagem
de forma exacerbada, enquanto a inveja e a avareza eram
subestimadas”.
Alguns entendem que o atual estado da nossa sociedade
banalizar a noção de virtude, maximizando o relativismo e o
liberalismo comportamental e pondo em risco valores antes
tidos como sagrados, levando a sociedade ocidental a uma
grave crise cultural.
Já outros entendem que o atual status quo
uma adequação a novos valores que antes estavam adormeci-
intimamente associada ao conceito de relativismo. O tema é
GUINESS – Op. cit., p. 20.
Mais detalhes sobre este tema, recomendo a leitura do tópico “Refutação do
relativismo” no livro ROGUE, Christophe – Compreender Platão: tradução de
46
48. Em verdade, os eventos que trouxeram à baila Sócrates ,
tema relativismo.
-
para vencer contentas por meio da argumentação – tivesse
ela fundamento na moral e na virtude ou não, e recebiam
relativista de mundo, expressa pela máxima de Protágoras : “O homem é a medida de todas as coisas, das coisas
que são enquanto são, e das coisas que não são, enquanto
não são”.
Sócrates tinha posição diametralmente oposta e levanta
uma série de objeções a esse relativismo subjetivista, entendendo que o homem deve ter uma vida virtuosa, em busca
do discernimento e auto-conhecimento. Asseverava que “as
ter a sua essência própria e permanente; elas não existem em
e descoberta dos próprios valores: a dialética.
homem-medida acima destacado, que conduz à conclusão de que cada coisa é
do um relativismo absoluto. Este relativismo protagórico foi também severamente
combatido por Platão, que entendia que ele colocava em perigo os fundamentos
dade, quer se fale ou não se fale.” ROGUE, Christophe – Compreender Platão –
Este axioma maximiza a idéia do subjetivismo, entronizando o homem como
da por Sócrates.
47
49. José Anastácio de Sousa Aguiar
sos caprichos, mas são independentes”.
Platão
isto é, como discurso renunciando de partida a reaplicação do
é acusado de fabricar imagens de discurso” .
Essa luta tem durado mais de vinte séculos e não parece
De qualquer forma, o consectário lógico da superposide referência, bem como da noção de limites, o que parece
ser parte da relativização dos valores morais.
Op. cit., p. 215.
ção de ensino superior do mundo ocidental. Platão é conhecido por ter introduzido
ROGUE, Christophe – Op. cit., p. 27.
48
50. “O
do Prado em
Madrid. Datando de entre 1490 e 1510, quando Bosch tinha cerca de 40 ou
50 anos é o seu mais conhecido e mais ambicioso trabalho. Em nenhum outra
uma advertência didática sobre os perigos das tentações da vida terrena.
Nesse contexto, recordo-me de uma certa aula teórica
sobre direitos humanos ocorrida numa tarde fria do outono
londrino nos idos de 2008. A professora descortinava temas
relacionados aos direitos das crianças frente ao relativismo
cultural, em outras palavras, tratava do tema da universalidade dos direitos do homem em oposição à prática de atos
degradantes, mas aceitáveis por parte de certas culturas.
O foco em questão era a prática da mutilação genital
continua a existir em razão de uma suposta promoção da virgindade e prevenção da promiscuidade feminina.
49
51. José Anastácio de Sousa Aguiar
Até então os alunos apenas ouviam as explanações, quando
a professora perguntou para a turma qual era a nossa opinião sobre o tema. O primeiro a se manifestar foi um colega africano que
argumentou em alto e bom tom que as culturas locais têm o direito
de preservar suas tradições sem a interferência do Ocidente.
-
quase de imediato a colega inglesa retrucou, dizendo que aquela
postura era absurda, pois práticas abusivas contra o ser humano
desrespeitam a declaração da ONU sobre o tema.
Quase que imediatamente o colega africano respondeu
te dominante, e não representava as reais necessidades locais.
A discussão foi tomando proporções apaixonantes com
fessora achou melhor dar um intervalo para a turma.
a sensação de que para nós todos naquela classe, naquele
dia, foi mais uma tarde fria de outono, enquanto para algumas
crianças pelo mundo afora, pode ter sido uma tarde de horror
A despeito dessa crise cultural para uns ou simples constatação de mudança cultural para outros, far-se-á referência
nesta obra aos conceitos clássicos de pecado e virtude. As
noções elaboradas em torno dos Sete Pecados Capitais basi-
50
52. leção por paisagens, pintou quadros que realçavam o absurdo na vulgaridade,
expondo as fraquezas e loucuras humanas, que lhe trouxeram muita fama.
“O Julgamento”, detalhe localizado no canto superior direito do quadro
51
53. José Anastácio de Sousa Aguiar
mamos, o que nos tornamos, graças a outros
ou contra eles.”
André Comte-Sponville
52
54. Em oposição aos Sete Pecados Capitais, tem-se as Sete
Virtudes Capitais, que são derivadas do poema épico Psicomaquia, escrito por Prudêncio
pela Igreja como padrão de comportamento e caminho para a
santidade para seus adeptos. São elas:
de Birmingham, Birmingham, Alabama.
Caridade
Paciência
Diligência
Generosidade
Castidade
Manuscrito do século XI conservado na Biblioteca
Psychomachia
tornou-se ascético, época em que escreveu suas obras, dentre elas “A Batalha
Psicomaquia
55. José Anastácio de Sousa Aguiar
está no Museu Isabella Stewart Gardner, em Boston. A vida terrena é representada
alegoricamente como uma batalha entre o desejo, representado pelo Cupido de pé
ria de André Comte-Sponville: “É uma força que age, ou que pode
agir. Assim a virtude de uma planta ou de um remédio que é tratar,
de uma faca, que é cortar, ou de um homem, que é querer e agir
40
É imperioso notar que de acordo com a noção acima exposta,
as virtudes seriam independentes do uso que se faz delas, como
assemelhada à excelência. E assim entende o referido autor quando
41
Montaigne42 amplia o conceito ao falar das virtudes morais, que seriam o que fazem um homem parecer mais huma40
Op. cit., p. 7.
41 Ibid., p. 8.
42
em seus trabalhos abordar as condições humanas. Sem ser ético ou moralista,
procura abordar as posturas humanas, mas não apresenta um sistema de conmedida em que descrê da possibilidade de atingir o conhecimento pleno pela
razão, mas conforma-se com a precária condição humana.
54
56. no ou mais excelente. Aristóteles parece concordar na medide fazer o bem”.44
. Ao tratar
do assunto, ele o coloca na forma de uma busca de uma maneira de viver e existir. Entende que a experiência moral se
refere à idéia de completude, de plenitude e de realização e a
virtude exigiria o desenvolvimento da razão como seleção do
ção de um cuidado de agir, de viver e de conservar o seu ser
sob a condução da razão.
45
iniciado46
toda a história da humanidade desde então até os dias atuais. Boa parte do le-
44
45
Op. cit., p. 9.
dos grandes racionalista do século XVII. São duas as suas obras mais conheobra de Spinoza: “Spinoza – a life”, de autoria de Steven Nadler. O livro trata
sobre sua trajetória de vida e obra.
46
-
55
57. José Anastácio de Sousa Aguiar
natureza humana. Ele entendia que “sua missão era exortar as
pessoas a cuidar de suas almas buscando entender e adquirir
as virtudes”47
dadeiramente virtuoso se não soubesse o que era a virtude, e
48
Já Platão, entende que a virtude é um meio para atingir
a bem-aventurança. Aristóteles, por seu turno, entende que
as virtudes não são hábitos do intelecto como queriam seus
antecessores, mas da vontade. Para ele não existiriam virtudes
inatas, mas todas se adquirem pela repetição dos atos, que
geraria o costume. Esses atos para gerarem virtudes não deveriam desviar-se nem por falta, nem por excesso, pois a virtude
consistiria na justa medida, longe dos extremos, e próxima da
verdade.49
relação virtude-verdade ao asseverar: “na realidade objetiva
47
48 Ibid., p. 186.
49
Op. cit., p. 184.
tes de um grupo de coisas é a condição para conceber um sistema teórico. Para
a construção de tal conhecimento, Aristóteles não se satisfez com a dialética de
Platão, segundo a qual o caminho para chegar à verdade era a depuração dos
argumentos e pontos de vista por intermédio do diálogo. Aristóteles quis criar
silogismo. Ele consiste de três proposições - duas premissas e uma conclusão
que, para ser válida, decorre das duas anteriores necessariamente, sem que
mens são mortais. Sócrates é um homem. Portanto, Sócrates é mortal. Isso não
basta, porém, para que a lógica se torne ciência. Um silogismo precisa partir de
verdades, como as contidas nas duas proposições iniciais. Elas não se sujeitam
real - ganha, assim, papel central na concepção de ciência de Aristóteles, em
contraste com o pensamento de Platão.
56
58. 50
que fazem oposição aos pecados capitais, temos duas outras
-
As virtudes cardiais são: prudência, que é virtude racional por essência e se dispõe a aperfeiçoar a razão; justiça, que
é racional por participação e se dispõe ordenar a vontade; for50
Op. cit., p. 147.
57
59. José Anastácio de Sousa Aguiar
51
Elas polarizariam todas as outras virtudes e seu conceito teológico teria sido derivado inicialmente do esquema de
Aristóteles e Platão, elaborado em suas obras como Protágoras
Milão52
do Vaticano.
As virtudes teológicas são: a fé, a esperança e a caridade
51
52
Op. cit.,p.18.
ciou os dogmas da Igreja como, por exemplo, a sua defesa da identidade da
58
60. ra, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estes três,
mas o maior destes é a caridade.”
59
61. José Anastácio de Sousa Aguiar
“A felicidade só pode ter por alicerce a liberfeliz quem conhece a verdade, a verdade vivida e saboreada experencialmente.
De maneira que o homem, livre por sua essência
divina, não é livre por sua existência humana.
inconsciência da nossa escravidão.
Pela ciência, o intelecto nos torna conscientes da nossa escravidão.
Pela sapiência, a razão nos liberta da escravidão.
A verdade sobre Deus, a verdade sobre o
mundo, a verdade sobre nós mesmos – eis a
grande libertadora!
Compreender o universo, diz Spinoza, é estar
libertado dele. Compreender tudo, é estar livre de tudo. Somos escravos de tudo o que ignoramos – somos livres de tudo que sabemos.
A ética racional é a proclamação da supre-
Um dos principais objetivos das virtudes, no entendimento da doutrina cristã, é fazer o contraponto aos
têm incentivado as pessoas a cultivar uma vida virtuosa,
60
62. As formas de enfrentamento aos pecados variaram bastante
com o decorrer da história. Inicialmente, a igreja cristã optou
por demonizar a questão, entendendo que a solução para muitos
pela igreja e o advento do estado laico, as soluções passaram a
ser menos radicais. Chega à nossa geração, então, duas formas
A primeira pode ocorrer, por exemplo, por meio do
mento do impulso de pecar. Já a segunda forma, ocorre com
da utilização das virtudes.
“Alegoria
das
Virtudes”,
quadro
A obra encontra-se no Museu do
“É importante lembrar que adquirir as virtudes, como em um jardim, não é o
Op. cit
61
63. José Anastácio de Sousa Aguiar
Ocorre que em outras culturas existem abordagens diferentes, senão vejamos. A Cultura Bön54, bastante difundida
pois se houver a supressão, o sentimento negativo reaparece
em outro momento e normalmente em outro formato, até por
meio de doenças. Enfrentar também seria desaconselhável,
Acredita-se que a longo prazo os instintos voltariam com mais
A tradição Bön entende que o apropriado para lidar nesque criam seus efeitos e reequilibrar as energias corporais.55
Outras crenças parecem concordar com essa postura,
pelo menos é o que pensa Nilton Bonder, ao batizar sua técnica de “adoçamento do ódio”: “Devemos aprender a fazer
uso do mal e não o afugentar. O potencial contido no mal, ou
mesmo numa desavença, é muito importante para que o des-
-
é, com certeza, jogado para dentro de nosso sistema. Como
energia não dissipada, espera um momento de tensão tal que
possa descarregar-se.”56
54 Cultura Bön – tradição de origem tibetana anterior á chegada do budismo naassim como a Natureza.
55
-
56
2004 – p. 149 e 150.
62
64. Outra postura semelhante quanto à abordagem do pecado é de autoria de James Allen57
o aparente sucumbimento à tentação não é, na verdade, um
processo repentino. A queda é o resultado do que começou na
mente, provavelmente, muitos anos antes. O pensamento desejado uma vez instalado na mente ganha, com o passar do temDessa forma, a fonte e causa de todas as tentações são
oriundas do desejo interno, consciente ou não. As circuns-
ser humano.
Na sua visão, o objetivo da tentação seria mostrar onde
reside e qual é a causa e a natureza das fraquezas humanas.
Nesse contexto, quando a tentação é entendida e conquistada, a evolução é garantida. Em assim sendo, a tentação não é
cia na qual a alma precisa se submeter na sua passagem para
uma vida superior.
Já Epicuro58
ra feliz sem viver sabiamente, bem e justamente, nem viver
sabiamente, bem e justamente, sem também viver de manei57
livros escritos abordam temas relativos à moral, ao pecado e à evolução humana. Considerado por muitos como o pioneiro dos livros motivacionais e do
movimento de auto-ajuda. Seu livro mais conhecido é “As a Man Thinketh”,
se caracteriza por uma linha de pensamento que tem por objeto atingir a felicidade e tem como bem supremo o prazer, entendido como a quietude da mente
65. José Anastácio de Sousa Aguiar
ra feliz. Assim, as virtudes e a sabedoria são a medida e o
“todos os danos provêm aos homens do ódio ou da inveja ou
do desprezo, coisas às quais o sábio se faz superior por meio
quanto a assumi-la.”59
59
64
66. “Aquele que estudar cuidadosamente o passado, pode prever os acontecimentos que se
produzirão em cada Estado, e utilizar os mesmos meios que os empregados pelos antigos.
Ou então, se não há mais os remédios que
já foram empregados, imaginar outros novos,
segundo a semelhança dos acontecimentos.”
Nicolau Maquiavel
Outra questão tem colocado em posição oposta as tradições orientais e ocidentais, o tempo. Somos ensinados a entender o tempo como algo linear e que nunca se renova. Entretanter alguma consciência de que as coisas no nosso cotidiano
ocorrem em ciclos, sejam os ciclos da natureza, como o próprio dia; ou os ciclos diários das nossas atividades. Mas será
Muitos crêem que os fatos da vida de cada um desenrolam-se sem qualquer relação com os fatos passados, e por
consequência, sem qualquer compromisso com o futuro.
-
no ocorrem como decorrência lógica do ciclo anterior, o fato de
não estar preparados para o desempenho do próximo ciclo, acarretará o surgimento de vários problemas não resolvidos.
65
67. José Anastácio de Sousa Aguiar
Citarei um exemplo simples. Alguém que se disponha a
casar, e pretenda, ao estar casado, continuar com o estilo de vida
do ciclo anterior de solteiro, por certo, passará mais rápido do
que imagina para o ciclo seguinte, o de separado. E assim, com
maior ou menor ênfase, ocorrem em outros tantos exemplos.
Destaco Santo Agostinho: “Quem poderá deter o coranão passada nem futura, sempre imóvel, determina o futuro e
60
60
66
68. te levar a transgredir tua fé, a perder tua honra,
a odiar, a suspeitar, a amaldiçoar, a dissimular,
a cobiçar o que terá que ser oculto por muros
ou véus. Quem privilegia a razão, seu deus intepresta a espetáculo, não se lamenta, não procura
a solidão e a multidão, mas viverá sem desejos e
sem temor. Nisso reside o maior dos bens.”
Marco Aurélio
Creio que responder esta pergunta é essencial para o verdadeiro entendimento
do tema pecado.
61
Ora, para muitos, como enfatizado por Santo Agostinho,
o pecado é contra Deus. Em assim sendo, somente Ele poderia
dar a salvação.
Entretanto, há outras formas de abordar o assunto. Vejamos um tema correlato que tem despertado o interesse de
Natureza, senão vejamos o que nos ensina Pietro Ubaldi62:
61
Janeiro: Ediouro, 2006.
62
sua vida adulta veio morar no Brasil até a sua morte. Dedicou-se ao estudo da
na universalidade, dentre os quais os dois destacados nesta obra: “A Grande
-
67
69. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Num universo tão complexo, no seio de um organismo de
damente, como podes acreditar que teu destino esteja abane te parece injustiça, não seja condição de mais alto e mais
Epicuro entende: “Nada pode originar-se do nada. Se
assim fosse, tudo poderia ter origem em tudo, sem que para
isso se necessitasse, pelo menos, de uma matéria criadora. E
se aquilo que desaparece se dissolvesse no nada, então tudo
que existe realmente já há muito se teria perdido, pois nada
existiria em que pudesse se dissolver. A totalidade daquilo
a eternidade, porque nada existe em que pudesse se transformar. Nada existe fora do universo que possa penetrar nele e
provocar tal transformação.”64
O conceito “Ordem Universal da Natureza” parece estar
intimamente ligado às noções de Relativo e Absoluto. Pou-
Esta questão não é nova. Já foi abordada por quase todos
arkhé
Plotino65
lo Vieira da Silva – Fraternidade Francisco de Assis – 19ª Edição – 1997, p. 188.
Editora Martin Claret – 2005, p. 48.
conhecida como neoplatonismo, que se baseava nos ensinamentos de Platão,
68
70. como visto anteriormente, ou até mesmo nas elucubrações
66
quanto o Vir-a-ser , como também
doto, que defendia que “nada nasce do não-ser”67.
Vejamos esta visão. Entenda-se por Relativo tudo que estiver sob a égide da relação tempo-espaço. Se algo está sujeito
enquadra-se e pertence ao Relativo.
bem como, alterado qualquer fator anterior de medição, pode
vo está intimamente ligado aos valores do observador e tem
que o mal não tinha existência real no mundo e que o homem poderia obter a
de tudo que existe, por meio de emanações sucessivas. Considerado por alguns
da investigação, o do ser e o do não-ser, sendo que o primeiro é o caminho
da certeza, pois conduziria à verdade; e o segundo seria imperscrutável ao
por buscar a essência das coisas; e à moderna teoria da relatividade – por fazer
a distinção entre o relativo e o absoluto.
67 “Nada nasce do não-ser, porque, do contrário, qualquer coisa poderia absurdamente gerar-se de qualquer coisa sem necessidade de qualquer semente
geradora; e nada se dissolve do nada, porque, do contrário, nesse momento,
tudo já teria perecido e nada mais seria. E dado que nada nasce e nada perece,
então o todo, isto é, a realidade na sua totalidade, foi sempre tal como é agora
e será assim sempre; com efeito, além do todo, não há nada no qual este possa
vanni – Op. cit., p. 170.
69
71. José Anastácio de Sousa Aguiar
-
Cumpre alertar, entretanto, que em que pese todas as
verdades que possamos alcançar sejam relativas, este relativismo é diferente daquele proposto por Protágoras. Ele apontava pertencer a cada qual a sua verdade, o que não nego,
mas enfatizo que há outro grupo de verdades que podem ser
tão abstratas quanto a totalidade das idéias, mas tem o seu
valor independentemente do contexto que forem analisadas,
senão vejamos Fernando Pessoa68 sobre o tema:
“O universo não é uma idéia minha.
A minha idéia do universo é que é idéia minha.
A noite não anoitece pelos meus olhos,
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos
A noite anoitece concretamente
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.”
-
70
72. Já para o Absoluto, a regra é exatamente a oposta. Ele
poderá ser entendida.
asseverava que: “Essa essência una,
-
cessantes, através de todos os tempos e espaços. Deus nunca
-
no seu agir. Em nenhum dos seus efeitos pode Deus revelar-se total e exaustivamente, o que equivaleria a criar um novo
Deus e com isso esgotar todas as suas potencialidades criado69
Pietro Ubaldi acrescentava que: “Nós, como tudo que
existe, estamos em Deus, porque nada pode existir fora de
Deus, nada lhe pode ser acrescentado nem tirado”.70
Sistema Plotiniano, que tem por base a distinção platônica en-
69
de Jean Melville – São Paulo – Editora Martin Claret – 2002, p. 20, 21 e 22.
70
71
73. José Anastácio de Sousa Aguiar
matéria, assim “as hipóstases e o próprio mundo são apenas
graus diversos do Divino, em cada grau ou momento está presente, em certo sentido, o todo, o Uno está no todo, ainda que
de maneira diversa, conforme cada coisa seja capaz de contê-lo, e o todo está no Uno.”71
O referido enfoque, se efetivamente fosse entendido e
vivido, como pregava a doutrina de Anaxágoras72 – que entendia que tudo estava em tudo, aportaria indubitavelmente em
um maior amadurecimento de todos e de cada um.
Nessa visão, diferentemente do conceito agostiniano anteriormente apontado, vemos que pecar além de ser um ato
contra Deus, é contra si próprio e todos.
71
72
permeia o mundo e de alguma forma controla todos os processos naturais.
72
74. Capela Sistina, Roma.
com essa realidade, que chamamos conhecer, é sempre relaco, para todos os tempos e todos os homens”.
Op. cit., p. 47.
78. “De ordinário, as grandes asneiras são,
como as cordas grossas, formadas por
pequenos motivos determinantes, e direis,
Entrançai-os, porém, e torcei-os todos, e
Desde já é bom que se diga que a indicação do pecado
superbia
74
, ou75
tros a vaidade , entretanto nesta obra utilizaremos a soberba76,
Um dos grandes nomes da Idade Média que se dediDe Malo
Summa Theologica
a busca da própria excelência é um bem, a desordem, a
distorção dessa busca é a soberba que, assim, se encontra
em qualquer outro pecado: seja por recusar a superioridade
de Deus que dá uma norma, norma esta recusada pelo pe74 Como no livro GUINESS – Sete Pecados Capitais: navegando através do caos
em uma época de confusão moral – São Paulo: Shedd Publicações – 2006.
75
apontava como a mãe e fonte de todos os outros pecados, colocando assim o
76
77
79. José Anastácio de Sousa Aguiar
cado, seja pela projeção da soberba que se dá em qualquer
outro pecado.”77
Detalhe do quadro “Os Sete Pecados Capitais” referente à soberba, pinta-
canônica dos sete pecados capitais, “a soberba ocupou o primeiro lugar. O primado advém não só por ter sido cronologicamente o primeiro pecado cometido pelos Anjos rebeldes,
77
78
80. mas porque segundo o profeta Jeremias, todo pecado se reduz
à soberba, transformando-se no delito mais monstruoso e guia
78
A soberba tem sido considerada como o primeiro e mais
seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o
79
Outro argumento para demonstrar a sua periculosidade
seria o fato de ser considerado por muitos que sua origem não
estaria no mundo, nem na carne, mas no próprio Diabo. Ele
não teria consciência.
na atualidade é a sua transformação em virtude, na medida
em que seja confundida soberba com orgulho, e este com respeito próprio e auto-estima. Em outras palavras, a impugnação
da motivação da soberba aportaria na confusão dos conceitos
virtude80
81
79 GUINESS – Op. cit., p. 41.
80
virtude, e elas não podem ser ignoradas. A forma mais comum é mudar sua
mesmo. É prejudicial não ter auto-estima. Portanto, por que o orgulho deveria
Ibid
81
temas voltados ao comportamento humano, em especial as religiões e a moral
judaico-cristã. Pretende ser o desmascarador de todos os preconceitos do gêne-
79
81. José Anastácio de Sousa Aguiar
que defendia que “o ataque à soberba é uma máscara para
encobrir o ressentimento do fraco.”82
Entende-se que a soberba “é o desejo de desprezar todas
as outras pessoas, ou em outros termos, é negar-se a reconhecer e admitir a presença, a igualdade ou mesmo a superioridade de qualquer outro ser.”
ser soberbo “é, basicamente, o desejo de colocar-se acima
dos demais”84, ou como diria Santo Agostinho “a soberba é
um distorcido desejo de grandeza.”85 O que invariavelmente
geraria a competição do soberbo86 contra tudo e contra todos,
aportando inexoravelmente na solidão e na insegurança.
cas principais da soberba são: o sentimento de superioridade,
basicamente ao fato da negação da relação de dependência
da criatura com o Criador. Dar-se-ia uma espécie de competição entre ambos, tentando aquele atingir os limites Deste.
A história da humanidade está repleta de exemplos de
soberbos. Os exemplos mais claros parecem vir da Antiguidade, em especial dos tiranos, reis e imperadores que assolaram
o mundo antigo com suas guerras de conquistas, tais como
sés II, entre outros. Entretanto, foi a história moderna que ofertou um momento impar no qual o soberbo encontra seu auge,
82 GUINESS – Op. cit., p. 40.
Op. cit
84
Op. cit
85
Op. cit., p. 80.
86 “É a comparação que nos torna orgulhosos: o prazer de estar por cima dos outros.
Não havendo o fator competição, o orgulho desaparece.” GUINESS – Op. cit., p. 45.
80
82. perador da França. Naquela oportunidade, Napoleão convocou o próprio papa Pio VII à Paris para coroá-lo na catedral
-
Entretanto, as conquistas perpetradas por Napoleão não
durariam muito, poucos anos depois seria derrotado em Wa-
evitar a cobiça da glória, pois ela tolhe a liberdade da alma,
pela qual devem se empenhar principalmente os homens
87
87
Op. cit., p. 87.
81
83. José Anastácio de Sousa Aguiar
Pertinente ao presente caso é a parábola do galo de briga e a águia de Esopo88. Dois galos se degladiavam para o comando e controle de um galinheiro. Após uma feroz luta, um
pôs o outro para correr e o galo derrotado afastou-se e foi se
recolher em lugar sossegado. O vencedor voou exultante até
o alto de um muro e bateu suas asas e cantou orgulhoso. Uma
águia que pairava nas cercanias lançou-se sobre ele e levou-o preso em suas garras. O galo derrotado saiu do seu canto e
reinou absoluto dali por diante.
No que se refere à Divina Comédia, de Dante Alighieri,
os soberbos, que pecaram mais intensamente, estão imersos
do Inferno. Os soberbos, que pecaram menos intensamente,
Purgatório, em processo de expiação dos seus pecados.
“ave dotada de uma simbologia quase contraditória. Se na Mitologia Grega aparece como animal sagrado e nos primórdios
do Cristianismo é a imagem da imortalidade, baseada na ideia
ristia, como Signum Ressurrectionis et Vitae Aeternae, o facto
é que vai perdendo a aura sagrada e acaba desvirtuado como
89
88 Esopo – fabulista grego do século VI a.C. é considerado pai da fábula como
gênero literário.
89
82
84. “Se acaso encontrares nessa vida algo melhor do que a justiça, a verdade, a temperança, a coragem, melhor ainda do que o
pensamento que a si mesmo basta quando,
submisso à razão, fornece o rumo certo de
atividade, que com seu destino se conforma ao aceitar a sorte que não escolheu, se,
-te a isso com todas as forças e goza o bem
supremo que descobristes.”
Marco Aurélio
vro do Gênesis, que parecem melhor retratar a soberba.
São as que se referem ao pecado original e à construção da
Quanto aos eventos relacionados ao cometimento do
pode ser mais caracterizador da soberba do que os atos
perpetrados pelo primeiro casal ao comer o fruto da árvore
proibida. Ficaria, segundo esse entendimento, bem caracterizada a negação da relação de dependência e subordinação da criatura para com o Criador, bem como a vontade
de igualar-se a Deus, tomando posse de todo o conheci-
85. José Anastácio de Sousa Aguiar
Entretanto, há quem entenda essa questão como um paradoxo, posto que a obtenção
do fruto proibido tinha como consectário lógico a obtenção do conhecimento e a equiparação a Deus, o que a toda evidência é o
à santidade90. Nesse contexto, entende-se que
“por alguma razão inexplicável, a aquisição
de conhecimento, supostamente o resultado “O Pecado Original”,
salutar da reivindicação quadro pintado por Mide liberdade pessoal,
torna-se uma ameaça localizado em Viena
que deve ser reprimida. no Kunsthistorisches
- Museum.
chamento permanente
da porta à igualdade completa com Deus.”91
-
verdadeiro não deveria viver simplesmente a vida do homem
probo, mas, mais ainda, a vida dos Deuses, entendendo que
92
90
nhece o potencial extraordinário dos homens para escalar alturas éticas, como
o vasto golfo separando Deus e os mortais. Ironicamente a promessa colocada
-
dução Soraya Borges de Freitas – São Paulo: Madras – 2010, p. 61.
91 Ibid.
92
84
86. Quanto à construção da torre de Babel, a sua realização
o projeto e fez com que a torre ruisse, depois castigou os hoeles não se entendessem e não pudessem voltar a construir
uma torre com esse propósito.
Flavio Josefo, renomado historiador judaico-romano
reinado de Nimrod, bisneto de Noé: “Pouco a pouco, transformou o estado de coisas numa tirania, sustentando que a
fazê-los continuamente dependentes do seu próprio poder.
Ele ameaçou vingar-se de Deus, se Este quisesse novamente
inundar a terra; porque construiria uma torre mais alta do
que poderia ser atingida pela água e vingaria a destruição
dos seus antepassados. O povo estava ansioso de seguir este
conselho, achando ser escravidão submeter-se a Deus; de
modo que empreenderam construir a torre [...] e ela subiu
com rapidez além de todas as expectativas.”
85
87. José Anastácio de Sousa Aguiar
dro encontra-se em Viena no Kunsthistorisches Museum.
A toda evidência, Nimrod adota uma postura de competição com Deus diametralmente oposta a de seu bisavô, Noé,
86
89. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Mas o que temos de fazer para chegar a
Como poderemos ver essa Beleza imensa
que permanece, por assim dizer, no interior
do santuário e não se dirige para fora para
fazê-lo siga-a até a sua interioridade, abandonando a visão dos olhos, e não se volte
para o esplendor dos corpos que admirava
antes. Quando vemos as belezas corporais,
não devemos correr atrás delas, mas saber
que elas são imagens, traços e sombras; e
que portanto, devemos fugir em direção
àquela Beleza da qual elas são uma imagem.
Se corrermos para apanhar as imagens como
se fossem reais, seremos semelhantes ao homem que quis apanhar sua bela imagem ree desapareceu.”
Plotino
, poder-se-ia dizer que o exemplo clássico
de vaidade oriundo da mitologia refere-se à lenda de Narciso.
Op. cit., p. 82.
88
90. Narciso nasceu possuidor de uma beleza excepcional, o
que já teria despertado descontentamento nos deuses gregos,
que não admitiam que mortais fossem aquinhoados de qualdeuses imortais era permitido o exagero.
tar um oráculo para perguntar se ele viveria muito tempo, obtendo a seguinte resposta: “Ele pode viver muito tempo, desde
que aprenda a conhecer a si próprio.”
89
91. José Anastácio de Sousa Aguiar
Narciso, a despeito das paixões que despertava nas ninfas e donzelas, preferia viver só, pois julgava que não havia
encontrado ninguém que julgasse merecedora do seu amor.
montes, companheira favorita de Diana em suas caçadas, mas
vertindo-se com as ninfas, saiu à sua procura. Eco usou a sua
conversa para entreter a deusa enquanto suas amigas ninfas se
-a a não falar uma só palavra por sua iniciativa, a não ser repeCerto dia, a ninfa passeava pelo bosque quando viu Narciso, e logo se apaixonou, mas não podia falar nada em razão
da maldição, e o seguiu. Era preciso esperar que ele falasse
primeiro para então responder-lhe.
mas Narciso ouviu o barulho e caminhou em sua direção.
palavras. A ninfa desesperada e movida pela paixão correu
em direção ao amado e ao vê-la, Narciso, exclamou: “AfastaNarciso fugiu e Eco, envergonhada, correu para esconder-se nos bosques. Daquele dia em diante, passou a se esconder,
não se alimentava e evitava outros seres, até que veio a morrer,
restando apenas a sua voz, que respondia a todos que chamaAs ninfas se revoltaram e foram procurar Nêmesis, a
deusa da Justiça. Esta após ouvir as queixas, sentenciou que
90
92. Certo dia, Narciso cansado de um dia de caça, chegou
a uma fonte de água cor de prata, que nenhum homem ou
animal havia bebido. Narciso ao se debruçar sobre as águas
nando-se pela beleza daquele ser e não mais se contendo,
abraçá-lo, mas o contato das mãos na água fazia o ser sumir
para voltar logo depois, tão belo quanto antes.
cá-la e esquecendo-se de se alimentar, veio a falecer.
91
93. José Anastácio de Sousa Aguiar
baseando-me no meu conhecimento da naninguém o compreenda, a dar, sob caloroso
aplauso da multidão, o meu acordo em tolices.
Renuncio de boa vontade ao belo, que não
traz prazer, e desprezo também os seus tolos
admiradores.
Então quem obedece à natureza, e não às
vãs opiniões a si próprio, se basta em todos
por natureza, toda aquisição é riqueza, mas,
até a maior riqueza é pobreza.
A quem não basta pouco, nada basta.
A vida do insensato é ingrata, encontra-se
em constante agitação e está sempre dirigida
para o futuro.”
Epicuro
92
94. É quase uma unanimidade considerar a humildade como
contraponto à soberba.94 Entende-se que pela prática daquela,
95
Entretanto, nem todos têm essa visão. Alguns entendem que
“é bastante comum acharmos que a humildade é o outro extremo
extremo oposto ao orgulho é a falta de auto-estima. O humilde em
nada tem a ver com aquele que não consegue reconhecer e apreciar a si como parte das maravilhas deste mundo. Sua atitude, porém, é distinta da do orgulhoso, que é totalmente centrado em si.” 96
Nesse contexto, a humildade seria uma meta a ser buscada e
“A Virtude da Modéstia”, gravura pintada
94
ta, na moral cristã, chama-se humildade.” GUINESS – Op. cit., p. 45.
95 “Devemos ser humildes porque Deus nosso criador é humilde. Se Deus não é
Op. cit., p. 44.
96 BONDER, Nilton – Op. cit
mando que “de todos, no entanto, o orgulho de quem se acha em crescimento como
ser humano é o pior. Para estes o orgulho representa uma armadilha traiçoeira, pois
experimenta em seu desenvolvimento a sensação de superioridade que é em si um
95.
96. Capítulo III
“Eis que o varão merecedor
desse nome, aquele que se
esforça por colocar-se de
imediato entre os melhores,
é qual um sacerdote, ministro dos deuses, amigo Daquele que nele habita e o torinvulnerável ao sofrimento,
dado à maldade, combatente
do mais nobre dos embates
– aquele que se trava para
dominar as paixões, – interiormente impregnado de
justiça, aberto a todos os
sucessos, conformado com
o destino, só raramente é
levado por necessidade imperiosa ou pelo interesse comum, cogita do que dizem,
fazem ou pensam os outros.
Aplica a sua atividade exclusivamente à sua própria
vida, medita constantemente
a respeito da sorte que lhe
assemelhar. Para o homem, a felicidade consiste em fazer o que lhe é
natural. E o natural do homem é ser benevolente para com seus semelhantes, desdenhar da carência dos sentidos, discernir as ações que merecem
o que perturba, e, vendo as coisas realmente como são, delas me servir
Marco Aurélio
97.
98. dos tesouros do faraó, deixava-se passar
fome e se alimentava de cevada. Disseram-
Mansour Challita
invidia
como “o segundo pior e mais predominante pecado capital.”97
perpetradores nunca apreciam e raramente confessam”. 98
Etimologicamente, o termo “inveja” tem origem no vervidere
com maus olhos, projetar sobre o outro um olhar malicioso.
Detalhe do quadro “Os Sete Pecados Capitais” referente à inveja, pintado
97 GUINESS – Op. cit., p. 75.
98 Ibid.
97
99. José Anastácio de Sousa Aguiar
São os olhos, então, os órgãos do corpo humano associados à inveja, e talvez por isso tenha Dante Alighieri descrito a condenação das almas no purgatório em sua obra “A
99
sidera como mal próprio, porque diminui a própria glória ou
excelência”.
Apesar de ser considerada como o mais triste dos hábitos , a inveja gera um paradoxo na medida em que é entendida por alguns como essencial para o desenvolvimento da
economia moderna, posto que pode ser considerada como “a
chave de toda propaganda e a força poderosa que impulsiona
a economia”101, e até mesmo da democracia, sendo entendida
como estando na “origem da própria democracia e servindo
para vigiar o desempenho correto do sistema”.102
100
veja na disputa de um osso. A inveja, simbolizada no cão, surge com a cabeça coroada de serpentes, porque se alimentava
de serpentes peçonhentas.”
99
Paulo – Martins Claret, p. 250.
100
Op. cit.
101 Ibid., p. 57.
102
Op. cit.,
Op. cit., p. 57.
98
100. “Aquele que ambiciosamente muitas coisas
cobiçou, orgulhosamente desprezou, insolentemente venceu, traiçoeiramente enganou, desonestamente roubou e prodigamente dissipou seus bens, necessariamente terá
próprio de uma mente segura de si e sossegada poder percorrer todas as épocas de sua
se estivesse subjugado, não pode se voltar
sobre si mesmo e se examinar. Portanto sua
vida se precipita num abismo; e, tal como
não é de nenhum proveito procurar encher
quido, se não há fundo que o receba ou sustenta, assim não importa quanto tempo tens
à disposição; se não tens como retê-lo, ele
vazará como de almas rachadas e furadas. O
guns parece não existir, pois está sempre em
antes de vir a ser; é tão incapaz de deter-se,
quanto o mundo ou as estrelas, cujo infatigável movimento não lhes permite permanecer
no mesmo lugar.”
Sêneca
bem o pecado da inveja, quais sejam: Caim e Saul.
99
101. José Anastácio de Sousa Aguiar
A história do primeiro e de seu irmão Abel está retratada
é lavrador da terra e o caçula, pastor de ovelhas. Os dois ofereceram oferendas fruto de seu trabalho a Deus, que recusou
Caim convida seu irmão para ir ao campo e o mata.
100
102. Os fatos que envolvem o rei Saul concernentes ao pecasos, e ao volverem ao seu lar, Israel, as mulheres de todas as
dez milhares”. Daquele dia em diante, Saul passou a invejar e
tramar a morte de Davi.
101
103. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Saul atacando David”, pintado por Giovanni Francesco Barbieri
Essas duas passagens ilustram bem o comportamento do
invejoso. Na primeira ao ver sua oferta recusada por Deus;
Caim, após comparar-se com seu irmão, sentiu-se injustiçado
e impossibilitado de vingar-se de Deus, eliminou a parte mais
fraca, o irmão. Percebe-se que em situações limite como esta,
a inveja gera o ódio e o sentimento de vingança, levando o
invejoso a cometer outros pecados.
Na segunda passagem, a inveja em ver o povo aclamar
alguém que não ele próprio, leva o rei Saul a orquestrar a
morte de Davi.
102
104. “Se aquilo que ocasiona prazer aos libertinos
menos da natureza, da morte e das dores, e
se ainda ensinasse o conhecimento da limi-
Nada faças na vida algo que te cause medo
se teu vizinho vier a sabê-lo. O fruto mais
O mais belo fruto da justiça é a paz da alma.
O essencial para nossa felicidade é a nossa
E consideramos um grande bem bastar-se a
pre pouco, mas para nos contentarmos com
pouco no caso em que não possuamos muito, legitimamente persuadidos de que desfruaqueles que menos necessidades têm, e que
o que é vaidade. A serenidade espiritual é
o fruto máximo da justiça. O justo é sumamente sereno; o injusto, cheio da maior perturbação. O homem que tenha alcançado o
que ninguém se encontre presente.”
Epicuro
105. José Anastácio de Sousa Aguiar
“A Inveja” pintado por Giotto di Bon-se na capela Scrovegni, Pádua, Itália.
Nem mesmo Pitágoras escapou das garras da Inveja. O
mo, porém seus feitos mais conhecidos estão no campo da
matemática, em especial o famoso teorema que leva o seu
Conta a lenda que Pitágoras foi o primeiro a idealizar a
palavra matemática, concebida como um sistema de pensamento fulcrado em provas dedutivas. O mesmo teria aconteres eram conhecidos como sábios. Pitágoras não teria querido
para si a alcunha de sábio, preferindo mais ser conhecido
104
106. adquirindo conhecimentos sobre astronomia, matemática,
ciências, misticismo e religião. Ao retornar à sua cidade nailha de Crotona, no sul da Itália, fundando a Escola Pitagórica, que pode ser considerada a primeira universidade da
história da humanidade.
A sua escola era um misto de irmandade religiosa e intelectual, abordando temas ecléticos que variavam da mateensino da metempsicose à proibição de beber vinho e comer
carne. Os alunos eram submetidos a testes de iniciação e poucos eram admitidos. Pois bem, um dos não admitidos dedicou-se a realizar propaganda com o escopo de destruir tanto
Pitágoras como a sua escola. Algum tempo depois, a escola
mestre assassinado.
da elevação espiritual do ser humano, dentre os seus pensamentos destaco:
Educai as crianças e não será preciso punir os homens;
Pensem o que quiserem de ti, faz aquilo que te parece justo;
O que fala, semeia; o que escuta, recolhe;
Ajuda teus semelhantes a levantar a carga, mas não a
carregues;
Com ordem e com tempo encontra-se o segredo de fazer
tudo e tudo fazer bem;
A melhor maneira que o homem dispõe para se aperfeiçoar
105
107. José Anastácio de Sousa Aguiar
é aproximar-se de Deus;
A vida é como uma sala de espetáculos: entra-se, vê-se e
sai-se;
A sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas os
rava: “Anima-te por teres de suportar as injustiças; a verdadeira desgraça consiste em cometê-las”.
106
108. “Quanto melhor alguém é, mais benevolente se torna com relação a todas as coisas e
com relação aos homens.”
Plotino
107
109. José Anastácio de Sousa Aguiar
comparação o mecanismo desencadeador da inveja. A partir
-
pecados, como nos casos de Caim e Saul.
ximo do invejoso, que por conhecer a história do invejado,
sente-se injustiçado em não ter o que o outro tem, procurando sistematicamente rebaixar os méritos do invejado e o
invejoso mostra-se, em geral, reticente em louvar as qualidades do próximo.
preferindo a destruição do bem, antes que o outro o possua.
to e hipocrisia.
los. Com exceção daqueles que conseguimos perceber como
extensão nossa – daqueles que geram uma sensação de que
nos multiplicamos como objeto de prazer, alegria e sucesso –
invejamos a todos.” 104
doto para a inveja, pois “o que há de fundamental, portanto, na consideração da inveja, é a questão de nossa capacidade de estreitar ou ampliar o grupo dos que consideramos
105
104 BONDER, Nilton – Op. cit., p. 14.
105 Ibid.
108
110. Nesse contexto, talvez a capacidade de ver a todos como
e crenças, o que em outras palavras, pode ser entendido como
109
114. “Não permitirei que homem algum denigra
minha alma por haver-me feito odiá-lo.”
Comparado com os outros pecados, a ira (ira
-
indomáveis, sendo considerada como “a fornalha do Diabo, o pe106
“apesar dessa conotação negativa, o leão possui propriedades
que o convertem num animal simbólico com outros valores
107
O pecado da ira tende a originar-se em sentimentos de
inferioridade e de impotência, bem como no ápice de uma
mágoa mal curada.
Detalhe do quadro “Os Sete
Pecados Capitais” referente à
106 GUINESS – Op. cit., p. 118.
107
Op. cit., p. 56.
115. José Anastácio de Sousa Aguiar
Apesar de ser o terceiro pecado capital e do seu reconhecido potencial destrutivo, os estudiosos do tema têm encontrado
entendem que ele tem sua utilidade na medida em que é “uma
boa resposta à ameaça, permitindo que nos defendamos a nós ou
aos outros sob momentos de ataque. Pode ser uma resposta apropriada para a crueldade, injustiça ou sofrimento desnecessário.” 108
Existe também quem pense que nem sempre a ira é pecado,
a desordem, o contrário da razão. Considera-se que existe uma ira
positiva, que é a que tende a suprimir o mal e restabelecer o bem.”109
ser boa ou má, “pois é claro que, quando alguém pretende uma
vingança de acordo com a devida ordem da justiça, isto é um
ato virtuoso, por exemplo, quando – de acordo com a ordem
-se contra o pecado”.110 Assim, o ilustre santo acreditava que a
serviço da razão e da justiça, a ira poderia ser boa e virtuosa.
No geral, é apresentada uma espécie de gradação, na qual
A raiva, no entanto, torna-se um pecado capital quando deriva-se
de motivo doentio, quando a expressão da emoção é desordenada,
ou quando essa ira contra o mal se transforma em ódio tornando-se
assim mais importante que o amor a Deus ou ao seu próximo.”111
um consenso, em especial quando analisada sob o enfoque
da ira de Deus, que veremos a seguir.
108
Op. cit., p. 78.
109
Op. cit., p. 81.
110
Op. cit., p. 96.
111 GUINESS – Op. cit., p. 116.
114
116. acordo com a sua posição evolutiva, um
sentido completamente diferente. Para os inferiores que saem de baixo, o plano humano
pode ser um ponto de chegada bastante alto.
subir a planos mais elevados, a terra pode
ser um baixo ponto de partida. Assim, viver
em nosso mundo pode representar para os
primitivos a maior e mais alegre realização
da existência, enquanto para os mais adiantados, pode constituir doloroso estado de sufocação da vida.”
Pietro Ubaldi
co pecado capital que alguns admitem que possa ser cometi-
112
rando-se uma vasta gama de interpretações com dois limites
opostos. Em uma das extremidades estão aqueles que aceitam a
um livro a ser lido em seu sentido literal. Na outra, aqueles que
posições com aceitações parciais de uma ou outra interpretação.
112
Op. cit., p. 79.
115
117. José Anastácio de Sousa Aguiar
Para aqueles que estão no primeiro grupo, eles “só conseguem conceber um tipo de ira que seja justa: a ira de Deus
contra o mal.” Nesse diapasão, “o pecado capital da ira é
descreve-se que Deus está irado, no sentido de estar indignado por motivo justo.” 114 Para tentar esclarecer seu entengumas religiões orientais. Ele é um Deus de amor ardente e de
115
O respaldo para tal entendimento
vingança e a retribuição.”
Op. cit., p. 88.
114 GUINESS – Op. cit., p. 115.
115
Op. cit., p. 84.
116
118. próprios ensinamentos de Jesus, o Cristo, que teria vindo a
este mundo para pregar a paz e o amor, sendo assim, seria
tiva ou negativa.
Em defesa desse entendimento temos Baruch de Espino-
116
Nesse contexto, Deus, como essencialmente uno, seria
o que apontaria, necessariamente, para a impossibilidade de
nenhum dos seus efeitos pode Deus revelar-se total e exaustivamente, o que equivaleria a criar um novo Deus e com isso
ato criador. Assim, nesse entendimento, tentar entender Deus
116
117
119. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Se alguém tem alguma crença – por absurda que for – nunca discutas com ele... Diz-me, com a mão no coração: - que lhe darias
de uma criança.”
Mário Quintana
sofa, astrônoma e matemática, caso os atos de violência de um
pequeno grupo religioso não a tivesse imortalizado como uma
pintura “A Escola de
Atenas”, pintado por
Rafael Sanzio. O pintor colocou no afresco
os maiores estudiosos
antigos como se fossem amigos que discutiam e desenvolviam
as formas de pensar e
mulher representada.
118
120. Considerada como uma das mais notáveis matemáti-
que levava o nome da cidade. Filósofa neo-platônica e seguidora de Plotino, destacou-se por suas pesquisas no campo da matemática, tendo sido ferrenha defensora dos estudos
lógico-matemáticos, em detrimento da até então consagrada
Acusada de ter sido a causa das desavenças entre o representante do Império Romano, Orestes e o Patriarca, Cirilo,
mente assassinada.
Alguns historiadores consideram que sua morte marca o
-
119
121. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Nunca perder o controle. Grande ênfase deve
pôr a prudência em não perder o controle. Assim
se portam os grandes homens, pois a magnanihumores da alma, e qualquer excesso indispõe a
prudência. Se a moléstia sai da boca, sua reputade si próprio na prosperidade como na adversidade, ninguém irá censurá-lo, mas admirá-lo.”
Baltazar Gracian
“A Ira” pintado por Giotto di Bondone
na capela Scrovegni, Pádua, Itália
120
122. ca mais caracterizadora da mesma está na passagem de São
mansidão, misericórdia e paz.
Em verdade, Jesus, mais uma vez, inovava em relação ao
sistema vigente até então, seja administrativo-romano ou religioso-judaico, ao pregar que não bastavam as imposições éticas de
bondade e paciência, não somente destinada aos amigos e famimanidade, amar a todos, inclusive os inimigos.
121
124. Capítulo V
“A tragédia do homem moderno não é saber cada vez menos sobre o propósito
da própria vida, mas que isso o incomode cada vez menos.”
125.
126. “A preguiça, como pecado capital, é a re-
Josef Pieper
acedia
de a ser confundida com outros termos como desocupação,
ociosidade, letargia e indolência. Em razão disso, é imperioso que comecemos mostrando o que os autores entendem
por preguiça.
de ser um pecado de omissão, e não um de comissão, a ausência de uma atitude positiva, e não a presença de uma atitude
que desistiu de buscar a Deus, à verdade, ao bom e ao belo.” 117
Detalhe do quadro
“Os Sete Pecados
Capitais” referente à
preguiça, pintado por
117 GUINESS – Op. cit., p. 149.
125
127. José Anastácio de Sousa Aguiar
Nesse contexto, ela seria diferente dos termos anteriortimento, de mente e, consequentemente, de corpo proveespirituais”118
de Aquino, que descreve a preguiça como a tristeza ou a falta
de empenho para conseguir um bem espiritual ou divino. Sano tédio ou a tristeza em relação aos bens interiores e aos bens
119
da preguiça, como pecado capital, independentemente da
pelas coisas espirituais, ou, em outras palavras, pela transcendência da existência humana individual, pois, “de fato, desistir de se transcender implica desistir da própria existência humana e em estar satisfeito por pertencer ao reino animal.”120
Incapaz de encontrar interesse ou satisfação pelas coisas
da matéria, que após superado este interesse mundano, ou
mesmo antes disso, lança-se na “incapacidade de encontrar
satisfação em qualquer coisa ao seu redor.” 121 Insatisfação
vida, e ela nos leva a não encontrar nenhum prazer na vida,
nhuma novidade, nada de interessante, nada pelo qual valha
a pena sair da cama.” 122
118 Ibid., p. 150.
119
Op. cit
120 GUINESS – Op. cit.
121
Op. cit., p. 157.
122 Ibid., p. 154.
126
128. Vê-se que o conceito de preguiça aqui exposto não se
mesmo à opção mais cômoda entre tarefas e responsabilidaevolução, desistindo do ideal de vir a ser.
o burro, entretanto “às vezes a preguiça relacionava-se com o
porco e o boi, dois animais indolentes por natureza”.
Op. cit., p. 57.
127
129. José Anastácio de Sousa Aguiar
“A preguiça anda tão devagar que a pobreza
facilmente a alcança.”
The
National Gallery
128
130. Seguindo o entendimento acima exposto de que a preguiça, pelo menos a que é entendida como pecado capital,
refere-se primariamente à falta de interesses pelas questões
associada ao pecado da soberba na medida em que um dos
seus efeitos “é fazer-nos pensar que ninguém tem sabedoria
pena ser ouvido”. 124
lução espirirtual – se entrelaça, “a glutonaria oferece um turbilhão de danças, banquetes, esportes e pequenos afazeres
que nos fazem ir de cá para lá que nos deixam pasmos com
as belezas, mas que, quando as alcançamos, maculam-nos
com a vulgaridade e o esbanjamento. A cobiça nos arranca
nossos negócios; a inveja nos incita a fofocar e a difamar,
a escrever cartas impertinentes aos jornais e a desenterrar
apropriada neste mundo tão cheio de malandros e demônios
125
124
Op. cit.
125 GUINESS – Op. cit., p. 158 e 159.
129
131. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Num duelo espiritual, aquele que é vencido, ganha, contanto que tenha ampliado os
seus conhecimentos.”
Epicuro
Inicialmente é interessante destacar que na Grécia Antiga, o que se opunha à preguiça era a atividade e não o traba-
cidadãos atenienses, em especial, desempenhavam suas atividades em harmonia com suas potencialidades, e este era um
nascimento da arte de pensar.
132. referia à preguiça, assim entendido como “fundamentalmeninvade a alma ao pensar nos bens espirituais – na virtude, na
bondade, no amor a Deus e ao próximo – precisamente porque não são fáceis de alcançar nem de conservar.” 126
da história127. Para superá-lo o homem tem buscado ultrapassar seus limites, o que teria proporcionado grandes descobertas e acontecimentos.
Por outro lado, alguns vêem a nossa atual sociedade
como a mais entediada da história criando um paradoxo de
como explicar “a ironia de que a mesma sociedade que, pela
primeira vez, conquistou a natureza por meio da tecnologia e
transformou o mundo numa fábrica gigante de jogos e diversão,
em um quarto de jogos de crianças ricas, na sociedade que tem
128
Um aspecto interessante a destacar sobre a questão da
-
comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste
tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás.”
sétimo dia descansarás: na aradura e na sega descansarás.”
As referências à preguiça encontram-se em especial no
126
127
128
Op. cit., p. 122.
Op. cit., p. 158.
133. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Vai ter com a formiga, ó preguiçoso; olha para os seus
caminhos, e sê sábio;
Pois ela, não tendo chefe, nem guarda, nem dominador,
Prepara no verão o seu pão; na sega ajunta o seu mantimento.
Um pouco a dormir, um pouco a tosquenejar; um pouco
a repousar de braços cruzados;
Assim sobrevirá a tua pobreza como o meliante, e a tua
“O que trabalha com mão displicente empobrece, mas a
mão dos diligentes enriquece.
“Diz o preguiçoso: Um leão está no caminho; um leão
está nas ruas.
Como a porta gira nos seus gonzos, assim o preguiçoso
na sua cama.
O preguiçoso esconde a sua mão ao seio; e cansa-se até
de torná-la à sua boca.
Mais sábio é o preguiçoso a seus próprios olhos do que
134. “Não há quem apresse mais os outros do
que os preguiçosos depois de haverem sadiligentes.”
135. José Anastácio de Sousa Aguiar
A diligência é entendida como o contraponto à preguiça. Entretanto, é oportuno que se esclareça que esta diligênoposto do amor não é o ódio, mas sim a indiferença. Se a
indiferença está na essência da preguiça, então a preguiça é a
inimiga do amor.” 129
rados os que têm fome e sede de justiça, pois serão satisfeitos.”
De qualquer forma, diligência pressupõe “uma atenção
esmerada e cuidadosa para apreciar o valor dos deveres a
cumprir, e para os escolher conscientemente, como fruto de
, apontando inexoravel-
129 Ibid., p. 78.
FAUS, Francisco – Op. cit., p 16.
136. Capítulo VI
“O sábio que se pôs à prova nas necessidades da vida, melhor sabe dar generosados desejos que em si possui.”
Epicuro
137.
138. minante no universo; justiça e não injustihonestidade e não corrupção é a força modeladora e impulsionadora do governo espiritual do mundo. Assim sendo, o homem
tem apenas que endireitar a si próprio para
endireitar o universo, e durante o processo
de endireitar-se, ele descobrirá que na merelação às coisas e ao próximo, as coisas e
minuto sucessivo se apresenta a você são as
imagens estranhamente adaptadas de seus
pensamentos em permanente mutação.”
James Allen
avaritia
como o segundo mais perigoso pecado capital e o animal que
o simboliza é o sapo: “tudo, neste pobre animal, concorre
para causar asco. A pele escura e viscosa, os sons emitidos
quando coacha, os movimentos lentos e desconjuntados, os
olhos parados. Eis porque, como animal simbólico, aparece
Interessante notar que dos sete pecados capitais é a avaOp. cit., p. 169.
Op. cit., p. 56.
139. José Anastácio de Sousa Aguiar
mandamento da lei mosaica: “Não cobiçaras a casa do teu
próximo, não cobiçaras a mulher do teu próximo, nem o seu
servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento,
nem coisa alguma do teu próximo.”
Detalhe do quadro “Os Sete Pecados Capitais” referente à avareza, pinta-
“está ligado a uma desordenada ambição de dinheiro.”
tes: “obter o que não temos e preservar o que temos”.
EnNesse
também tenderia a ser o motor gerador de outros pecados, tais
como a fraude e a violência, para obter o que se deseja, e a
Op. cit., p. 100.
Op. cit., p. 169.
140. Nesse contexto, alguns autores entendem que haveria no
atual estágio da nossa sociedade uma espécie de gradação entre os termos: interesse próprio, ambição e avareza, sendo o primeiro, necessário; o segundo, aceitável; e o terceiro, condenánecessidades e as daqueles que dependem de mim. Uma ambição saudável consegue realizar grandes coisas. Contudo, a
avareza sempre consome. Em particular, ela consome a pessoa
que ela domina. Nunca se satisfaz e sempre deseja mais.”
Indubitavelmente, a gênese da avareza está no desejo
precisaria ter sido inventado.”
avareza é incompleta, posto que é fundamental que seja acrescentado o elemento “desordem”. É, na verdade, o desejo desordenado que caracteriza a avareza. Assim, “a avareza não é o
desejo em si de ter bens temporários, mas o desejo exagerado
de tê-los. É natural desejar coisas externas como meios, mas a
tura se transforma em um deus, ela passa a ser um demônio.”
Outro ponto intimamente associado à questão da identino ato de desejar e guardar, e a partir de que momento o
desejo passa a ser doentio.
Muito pode ser dito a respeito dos meios de aferir esse
limite, e este livro não tem a pretensão de esgotar o tema, mas
entendemos a exata função do “ter” e do “ser”.
Op. cit
Op. cit., p. 122.
Op. cit
141. José Anastácio de Sousa Aguiar
“A temperança, que é a moderação nos desejos sensuais, é também a garantia de um
desfrutar mais puro ou mais pleno. É um
A temperança é essa moderação pela qual
permanecemos senhores de nossos prazeres,
de suportar seu corpo! Que felicidade desfrutá-lo e exercê-lo! O intemperante é um
escravo, mais subjugado ainda por transporliberdade só estar submetido à natureza! A
temperança é um meio para a independência, assim como esta é um meio para a felicidade. Ser temperante é poder contentar-se
com pouco; mas não é o pouco que importa:
é o poder, e é o contentamento.”
André Comte-Sponville
É fato que em nossa sociedade hodierna existe uma cultura voltada para o “ter”. O atual sistema capitalista ocidental
tende a valorizar o desejo pelos bens de consumo, que é a
mola propulsora da economia de mercado
É fato também que para manter esse sistema funcionando,
incentivo à cultura do “ter” e à competição no livre mercado.
140
142. “Avareza”, gravura do pintor Jacques Callot
Nesse diapasão, o dinheiro em suas diversas matizes
status
Alguns entendem que o dinheiro seria a causa dos males
da humanidade e na tentativa de suprimir eventuais mazelas
resultantes da má aplicação do dinheiro, tentou-se até mesmo
comunismo, que, como não poderia ser diferente, só resultou
em mais sofrimento para a população subjugada.
Em verdade, o erro dessa avaliação está no fato da equivocada demonização do dinheiro, posto que o dinheiro por si só não tem
para solucionar a questão do mal uso do dinheiro por qualquer
sociedade passa pela reeducação do ser humano, na busca do
desenvolvimento das qualidades inerentes ao “ser” e não ao
“ter” e na aplicação de uma legislação que iniba os excessos.
141
143. José Anastácio de Sousa Aguiar
“Seres desiguais não podem pensar da mesma maneira. Sempre haverá evidente contraste entre o servilismo e a dignidade, a
torpeza e o gênio, a hipocrisia e a virtude.
A imaginação dará a uns impulso original
em direção ao perfeito. A imitação organizará em outros os hábitos coletivos. Sempre
sui um sentido das diferenças que lhe permite distinguir entre o ruim que observa e o
melhor que imagina. Os homens sem ideais
são quantitativos; podem apreciar o mais ou
menos, mas nunca distinguem o melhor do
-lo em páginas decisivas.”
Jose Ingenieros
A preocupação em combater os excessos, em especial
no que se refere à exploração do homem pelo homem é um
como dia de descanso.
Em Êxodo 20:9-10 temos: “Seis dias trabalharás, e farás
todo o teu trabalho, mas o sétimo dia é o sábado do Senhor
teu Deus. Nesse dia não farás trabalho algum, nem tu, nem teu
teu animal, nem o estrangeiro que está dentro das tuas portas.”
142
144. normatização limitadora foi um grande avanço como proteção
aos excessos cometidos na relação senhor-servo, sendo então
Um dos episódios mais interessantes e contundentes do
que veio a casar com o rei Acab, de Israel, como resultado de
O rei Acab procurava governar dando liberdade religiorazão da personalidade forte da rainha Jezabel, os interesses
ta Elias, que teve que fugir para o reino de Judá em razão da
perseguição real aos profetas de Javeh.
Pois bem, certa feita houve um incidente envolvendo uma
palácio de Acab. O rei tentou comprar a vinha sem sucesso.
Sua esposa, mulher determinada e independente, que não se
evento tramou a morte Nabote e tomou a vinha para o rei.
O profeta Elias ao saber do ocorrido profetizou que cães
devorariam Jezabel no campo de Jizreel. Um comandante
real e o corpo da rainha foi jogado da janela do palácio pelos
próprios eunucos reais e comido pelos cães.
138 Ibid., p. 142.
145. José Anastácio de Sousa Aguiar
“A morte de Jezabel”, de Paul
No contexto da Divina Comédia, de Dante Alighieri, há
duas referências aos avaros: a primeira no canto VII da parte que
se refere ao Inferno e a segunda no canto XXII do Purgatório.
“Os Avarentos”, de
Paul Gustave Dore
vura retrata os avarentos empurrando
enormes sacos no
Inferno,
segundo
Dante em sua obra
“A Divina Comédia”
As riquezas dos avarentos estão representadas por enormes sacos cheios de dinheiro e barras de ouro que são empurrados colina acima pelos pecadores.
144
146. “O mais belo fruto da justiça é a paz da
cargos ou o poder produzem a felicidade e a
bem-aventurança; produzem-na a ausência
de dores, a moderação nos afetos e a dispotes impostos pela natureza.”
Epicuro
“A Generosidade concedendo seus
presentes”, quadro de Giovanni
-se, como dito anteriormente, pelo desejo desordenado de obter o que não temos e guardar o que temos, “o contraponto
ambos são o cerne da misericórdia”
GUINESS – Op. cit., p. 199.
145
147. José Anastácio de Sousa Aguiar
A generosidade também é tida como garantia de bondade e
ela estabelece limites para a aquisição de bens e introduz um fator essencialmente importante: as necessidades das outras pessoas
que poderiam ser os recipientes de nossa generosidade.” 140
-
“Curai os enfermos, ressuscitai os mortos, limpai os leprosos,
expulsai os demônios; de graça recebestes, de graça dai.”
nalmente, sede todos de um mesmo sentimento, compassivos,
cheio de amor fraternal, misericordiosos, humildes, não retritrário, bendizendo, porque para isso fostes chamados, para
herdardes uma benção.”
“A Virtude da Compaixão”, gravura pinta-
140
146
Op. cit., p. 144.
148. Capítulo VII
“Compreensão de si mesmo. Do caráter, do talento, do discernimento e das
emoções. Ninguém consegue dominar-se se não compreende a si próprio.
Baltazar Gracian
149.
150. “A alma atrai aquilo que ela secretamente
abriga; aquilo que ela ama e também aquilo que teme; ela atinge o apogeu de suas
são os meios pelos quais a alma recebe o
que lhe é devido. O mundo exterior das cirpensamentos, e as condições externas, tanto
as agradáveis como as desagradáveis, são fa-
sua própria colheita, o homem aprende tanto pelo sofrimento como pela felicidade. Os
homens não atraem aquilo que eles querem,
mas aquilo que eles são.”
James Allen
gula
pecados capitais, e é também o primeiro dos dois pecados da
carne, ditos também como “quentes”.
O animal que lhe é associado é o porco. “Se, nos nossos
porco era associado à imagem de fecundidade e de bem-estar.
Contudo, pela sua voracidade, aponta-se como o mais indicado para simbolizar a gula.”141 Assim, “os glutões, ao reduzir
toda a comida a uma lavagem, assemelham-se a porcos”. 142
141
Op. cit., p. 56 e 57.
142 GUINESS – Op. cit., p. 205.
149
151. José Anastácio de Sousa Aguiar
Um aspecto peculiar relativo à gula é que por algum
tempo nos idos do século IV ela era considerada pelos monges monásticos como o pior dos pecados capitais, posto que
se entendia que o primeiro e mais importante inimigo a ser
combatido era o que estava dentro de nós e se expressava por
um guloso apetite.
Detalhe do quadro “Os Sete Pecados Capitais” referente à gula, pintado
Aquino, entendendo-se que a gula diz respeito mais ao cortodos têm que se alimentar de alguma maneira, que alguém
viesse a se exceder.
Op. cit., p. 96.
150
152. Entretanto, hodiernamente essa questão está longe de ter
que o pecado da gula, assim entendido como uma obsessão
desordenada por comida, bebida ou pelo simples consumo,
144
,
ou de uma forma mais abrangente seja uma maneira de demonstrar a não aceitação da própria vida, tendo em vista que
“o ato de comer é a aceitação da vida” 145.
Santo Agostinho deixou claro que: “não temo a impureza da comida, mas a do desejo. Fica claro, portanto, que a
gula se refere às paixões e se opõe à temperança enquanto diz
respeito aos desejos e prazeres do comer e beber.”146
é a inexistência clara de limites para o que comer e beber.
Ao falar em limites inevitavelmente trata-se não só dos excessos dos glutões, mas também da rejeição dos anoréxicos e da
144 GUINESS – Op. cit., p. 206.
145
Op. cit., p. 51.
Op. cit., p. 104.
151
153. José Anastácio de Sousa Aguiar
pensamentos habituais. As idéias colorem a
alma. Sendo assim, tinge-a pela meditação
de pensamentos como este: em qualquer
lugar em que se pode viver, pode-se viver
bem. A ninguém acontece nada que a natureza não lhe dê forças para suportar.”
Marco Aurélio
dar o prazer foi o epicurismo. Segundo a doutrina de Epicuro,
de Samos, seu fundador, o sumo bem reside no prazer. Como
prazer dos sentidos e dos excessos, mas o prazer da quietude
“A Gula”, gravura do pintor Jacques
152
154. A gula transforma uma necessidade básica humana, a
comer e o beber não são os censurados, mas sim “o comer e
147
.
da. A comida ou bebida passa a ser utilizada como mecanisentendida como medicação e consolo, passa a ser prioritária
e essencial.
cia, a alegria néscia, a loquacidade desvairada e a expansividade debochada.148
Op. cit., p. 45.
Op. cit., p. 105.
155. José Anastácio de Sousa Aguiar
cia cósmica acima do comum da humanidade-massa suspeitam ou adivinham, com
maior ou menor clareza, que existe uma
vasta e profunda unidade do universo para
além dessa aparente multiplicidade de feque alguém possa avaliar com justeza e
verdade um gênio, deve ele mesmo possuir
fácil um sábio aprender de um tolo, do que
um tolo aprender de um sábio.”
de forma indireta no contexto de alguma parábola, como
aplicar as palavras de Cristo, senão vejamos.
esplendidamente.
que jazia cheio de chagas à porta daquele;
da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe
as chagas.
154